DECRETO N. 24 – DE 12 DE MARÇO DE 1891

Concede autorização a Cicero de Pontes e outros para organizarem uma sociedade anonyma sob a denominação de Companhia Industrial e Mercantil do Estado do Piauhy.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, attendendo ao que requereram Cicero de Pontes, Claudino Vicente da Rocha e Severino Gonçalves Machado, resolve conceder-lhes autorização para organizarem uma sociedade anonyma sob a denominação de Companhia Industrial e Mercantil do Estado do Piauhy, e com os estatutos que este acompanham; não podendo, porém, a mesma companhia constituir-se definitivamente sem preencher as formalidades exigidas pela legislação em vigor.

O Ministro de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o faça executar.

Palacio do Rio de Janeiro, 12 de março de 1891, 3º Republica.

MANOEL DEODORO DA FONSECA.

Barão de Lucena.

Estatutos da Companhia Industrial e Mercantil do Estado do Piauhy, a que se refere o decreto n. 24 de 12 de março de 1891.

CAPITULO I

CONSTITUIÇÃO, SÉDE, DURAÇÃO, FINS E LIQUIDAÇÃO DA COMPANHIA

Art. 1º Com a denominação de – Companhia Industrial e Mercantil do Estado do Piauhy – fica creada uma sociedade anonyma com séde e fôro na Capital Federal e com agencias nos Estados do Amazonas, Pará, Maranhão, Piauhy, Ceará, Rio Grande do Norte, Parahyba e Pernambuco, além de outras que a directoria julgar necessarias nos demais Estados da Republica.

Art. 2º O prazo de duração será de 30 annos, podendo ser prorogado pela assembléa geral dos accionistas.

Art. 3º A companhia tem por fins:

§ 1º Adquirir, por compra, no Estado do Piauhy, diversas fazendas de criar e nellas introduzir o melhoramento de raça do gado vaccum, cavallar, muar, suino e lanigero.

§ 2º Fundar ao norte e sul do mesmo Estado dous estabelecimentos modelos para o fabrico do queijo, da manteiga, da carne de xarque, de gorduras e dos demais productos relativos a este ramo de negocio, inclusive cortume e fabrico de sabão.

§ 3º Promover, em grande escala, a cultura da canna, café, cacáo, videira, fumo, algodoeiro e outros, de accordo com o clima e aperfeiçoamentos modernos.

§ 4º Fundar na cidade da Parnahyba uma fabrica de tecidos de algodão para o consumo da população dos sertões.

§ 5º Explorar a industria de todos os productos naturaes do mesmo Estado.

§ 6º Fundar cinco burgos agricolas de 5.000 familias, sendo um no valle do Parnahyba, no termo da cidade deste nome; outro no do Puty, no termo de Therezina; outro no de Canindé, no termo de Amarante; outro no do Urussuhy, no termo de Jeromenha, e outro no do Taquarussú, no termo de Santa Philomena.

§ 7º Estabelecer uma linha de paquetes apropriados ao transporte de passageiros e mercadorias, de gado em pé e em xarque para os mercados consumidores e outra de pequenos rebocadores para a navegação do rio Parnahyba até Santa Philomena, que ficará, em todo caso, dependente de prévia autorização do Governo.

§ 8º Comprar nas praças commerciaes todos os generos alimenticios e vendel-os, onde houver falta, por preço ao alcance das classes menos abastadas.

Art. 4º A liquidação da companhia só será determinada e effectuada por algum dos motivos previstos no decreto n. 164 de 17 de janeiro de 1890, mediante processo legal.

CAPITULO II

DO FUNDO SOCIAL, ACÇÕES E ACCIONISTAS

Art. 5º O capital da companhia será de 2.500:000$, dividido em 2.500 acções de 100$ cada uma, podendo ser elevado de conformidade com as disposições da lei vigente e por deliberação da assembléa geral dos accionistas.

Art. 6º O capital será realizado até 50 %, sendo a primeira entrada de 40 % no acto da assignatura dos presentes estatutos e a outra de 10 % no prazo de 30 a 60 dias, precedendo annuncios pelos jornaes diarios desta Capital, com antecipação, pelo menos, de oito dias. O restante de 50 % far-se-ha com o excesso dos dividendos.

Art. 7º Fica, desde já, autorizada a directoria a emittir titulos de obrigação ao portador (debentures), nos quaes serão expressamente determinados o valor, a taxa do juro, a quota de amortização, as epocas de pagamento e sua duração.

Art. 8º O accionista que no prazo prefixado não realizar a entrada de que trata o art. 6º e não justificar, a juizo da directoria, o motivo dessa falta, perderá o direito ao capital com que houver entrado para os cofres sociaes.

§ 1º Acceita pela directoria a justificação do accionista, pagará este a multa de 2 % pela móra de 30 dias e a de 5 % pela de 60 dias.

§ 2º Esgotado o prazo de 60 dias sem que o accionista tenha effectuado a entrada em falta, cahirão suas acções em commisso, sendo o respectivo producto levado á conta do fundo de reserva, procedendo-se em seguida á reemissão dellas.

Art. 9º As acções ou cautelas que as representem serão nominativas enquanto não forem integralizadas.

Art. 10. As transferencias das acções só poderão ser effectuadas no escriptorio da séde da companhia, por termo assignado pelos cedente e cessionario ou seus procuradores, com poderes especiaes, e pelo secretario.

Art. 11. Por fallencia, morte, ou qualquer impedimento physico ou moral de qualquer dos accionistas, antes de se acharem as acções integralizadas, poderá a directoria, depois de ouvido o conselho fiscal, proceder á venda das acções, pertencendo o producto liquido a quem de direito, sem vencer juros.

CAPITULO III

DA ADMINISTRAÇÃO DA COMPANHIA

Art. 12. A companhia será administrada por uma directoria composta de quatro membros, que escolherão entre si um presidente, um thesoureiro, um secretario e um representante no Estado do Piauhy, ficando desde já investida de plenos poderes de gestão e de dar procuração para todos os effeitos, accionar e ser accionada.

§ 1º Os directores serão elegiveis de cinco em cinco annos e poderão ser reeleitos.

§ 2º Só poderá ser eleito director o accionista que possuir, pelo menos, 100 acções que serão caucionadas á companhia até á primeira prestação de contas, depois de ter expirado o seu mandato.

§ 3º A falta de qualquer director será supprida, por escolha da directoria, por algum dos accionistas elegiveis, até á reunião da assembléa geral.

Art. 13. Como auxiliar da directoria, haverá um gerente, encarregado de effectuar todas as compras e vendas que, por ordem da directoria, forem determinadas.

Art. 14. Cada um dos membros da directoria perceberá mensalmente o honorario de 500$ e mais, semestralmente, 2 % do producto liquido da companhia, excepto o representante no Piauhy que terá 3 % do mesmo producto e mais a gratificação mensal de 300$000.

Paragrapho unico. O gerente vencerá o honorario mensal de 500$ e mais 3 % dos lucros liquidos.

Art. 15. São attribuições da directoria:

§ 1º Rever a escripturação da companhia.

§ 2º Reunir-se em sessão, pelo menos, duas vezes por semana, lavrando-se acta das deliberações tomadas.

§ 3º Convocar a assembléa geral ordinaria na epoca determinada nos presentes estatutos e as extraordinarias quando forem necessarias ou devidamente requeridas e apresentar á mesma assembléa relatorio annual da companhia.

§ 4º Fixar o dividendo que houver de ser distribuido.

§ 5º Resolver sobre a acquisição de bens moveis, semoventes e de raiz, e sobre tudo quanto disser respeito ás exigencias da industria e commercio, autorizando as respectivas compras e contrahindo emprestimos em condições vantajosas.

§ 6º Resolver ácerca da chamada de prestação de capital, nos termos dos presentes estatutos, e sobre o commisso das acções.

§ 7º Marcar o numero e os ordenados dos empregados da companhia.

§ 8º Organizar o regulamento interno para os differentes serviços que forem sendo inaugurados.

Art. 16. O presidente é o orgão da sociedade, e compete-lhe:

§ 1º Presidir as sessões da directoria e executar e fazer executar todas as suas deliberações e as da assembléa geral, tomadas em sessão.

§ 2º Representar a companhia em juizo ou fóra delle.

§ 3º Acceitar, conjunctamente com o secretario e o thesoureiro, os titulos de responsabilidade da companhia.

Art. 17. Ao thesoureiro compete:

§ 1º Ter sob sua guarda e unica responsabilidade os dinheiros da companhia, organizando mensalmente um balancete, no qual demonstrará o estado geral da caixa a seu cargo, para ser apresentado na primeira sessão mensal da directoria.

§ 2º Depositar no banco escolhido pela directoria para banqueiro da companhia todas as quantias recebidas, de modo a não existir no cofre a seu cargo, por mais de cinco dias, quantia superior a 5:000$000.

§ 3º Pagar todas as contas e obrigações da companhia, receber e dar quitação em juizo e fóra delle por toda e qualquer quantia de que seja credora por titulo, letra ou contas de qualquer natureza.

Art. 18. Ao director-secretario compete:

§ 1º Lavrar, em livro especial, as actas das sessões da directoria.

§ 2º Ter sob sua guarda e direcção o archivo da companhia.

§ 3º Inspeccionar o livro das transferencias de acções e titulos.

§ 4º Assignar procuração e acceitar todos os titulos e papeis de credito da companhia, conjunctamente com o presidente e o thesoureiro.

Art. 19. Ao gerente compete:

§ 1º Dirigir o movimento de compra e venda da companhia, de accordo com as determinações da directoria.

§ 2º Visar todas as contas e documentos das operações que fizer.

§ 3º Estabelecer regulamentos, de accordo com a directoria, para o bom andamento dos diversos serviços da companhia a seu cargo.

Art. 20. Ao director representante no Piauhy compete:

§ 1º Realizar todas as transacções necessarias para o desenvolvimento e prosperidade da companhia, de accordo com as instrucções que lhe forem dadas pela directoria.

§ 2º Prestar mensalmente, á mesma directoria, conta de sua administração e um relatorio dos diversos serviços realizados.

§ 3º Dirigir e fiscalizar todos os serviços relativos aos fins da companhia na séde de sua administração.

§ 4º Apresentar annualmente á directoria um relatorio circumstanciado de sua gestão.

§ 5º Nomear e demittir todos os empregados dos diversos estabelecimentos sob a sua inspecção e exigir dos mesmos empregados todos os esclarecimentos que julgar convenientes.

CAPITULO IV

DO CONSELHO FISCAL

Art. 21. O conselho fiscal será composto de cinco accionistas e outros tantos supplentes, eleitos pela assembléa geral na mesma sessão ordinaria annual.

§ 1º O mandato dos fiscaes durará um anno, podendo ser renovado.

§ 2º Os fiscaes serão retribuidos com a gratificação mensal de 100$ cada um.

Art. 22. Ao conselho fiscal compete:

Paragrapho unico. Apresentar annualmente parecer sobre os negocios da companhia, entregando-o á directoria para que o faça publicar e apresente-o á assembléa geral.

Art. 23. Durante o trimestre que preceder a reunião da assembléa geral ordinaria, o conselho fiscal procederá ao exame dos papeis da companhia, para dar parecer sobre elles.

Art. 24. Os supplentes servirão no impedimento dos effectivos, na ordem da votação que houverem obtido.

Art. 25. Cada fiscal deve possuir, pelo menos, 50 acções.

CAPITULO V

DA ASSEMBLÉA GERAL

Art. 26. A assembléa geral será composta dos accionistas cujas acções se acharem averbadas no livro respectivo trinta dias antes da data em que ella se verificar.

Art. 27. Presidirá os trabalhos da assembléa geral o accionista eleito por acclamação e este escolherá os secretarios.

Art. 28. As deliberações da assembléa geral serão tomadas por maioria de votos.

Art. 29. A assembléa geral entende-se regularmente constituida, quando concorrerem accionistas que representem, pelo menos, um terço do capital social, salvo o caso previsto pelo art. 15, § 4º, do decreto n. 164 de 17 de janeiro de 1890, que será então representada por dous terços do capital.

Art. 30. As deliberações da assembléa geral, de accordo com estes estatutos e a lei vigente, obrigam a todos os accionistas, ainda que ausentes ou dissidentes.

Art. 31. Só terá voto o accionista que possuir, pelo menos, dez acções e a ordem da votação será um voto para cada grupo de dez acções, até ao maximo de vinte votos.

Art. 32. O accionista possuidor de menos de dez acções poderá propôr qualquer medida e discutir o objecto sujeito a deliberação da assembléa geral, mas não votar.

Art. 33. A assembléa geral se reunirá ordinariamente no mez de abril de cada anno e extraordinariamente toda vez que for necessario, a juizo da directoria, ou quando requerida, pelo menos, por sete accionistas que representem mais da quinta parte do capital.

Art. 34. Na assembléa geral ordinaria se tratará da approvação das contas, leitura de relatorios, eleição da directoria ou de algum de seus membros, quando for caso disto e da nomeação dos fiscaes. Nas assembléas extraordinarias o assumpto a discutir e votar será restricto ao da convocação.

Art. 35. Compete á assembléa geral:

§ 1º Exercer todos os actos previstos nestes estatutos, resolver ácerca de todos os negocios que lhe forem submettidos pela directoria e tomar deliberação sobre os casos omissos ou imprevistos, respeitadas as prescripções legaes.

CAPITULO VI

DO FUNDO DE RESERVA

Art. 36. Dos lucros liquidos semestraes serão tirados 10 % para o fundo de reserva, 12 % para as porcentagens á directoria e ao gerente, 30 % para dividir entre os accionistas, 18 % para os tres incorporadores, em partes iguaes, e 30 % para integralização do capital.

§ 1º O fundo de reserva é instituido exclusivamente para fazer face á perda do capital social.

§ 2º Logo que o fundo de reserva attingir a um decimo do capital, reverterá em favor dos dividendos, começando a ser novamente feita identica deducção para o mesmo fim.

Art. 37. Para pagamento dos dividendos, a directoria fará annunciar pelos jornaes, declarando a quantia por acção ou porcentagem equivalente.

Art. 38. Os dividendos não reclamados não obrigam a companhia a pagamento de juros, e prescrevem dentro do prazo de dous annos, em beneficio do fundo de reserva.

CAPITULO VII

DISPOSIÇÕES GERAES

Art. 39. Em observancia do art. 5º do decreto de 17 de janeiro citado, a primeira assembléa geral para a constituição da companhia deliberará que todas as despezas necessarias á sua fundação corram por conta da companhia.

Art. 40. Todos os casos omissos nestes estatutos serão regulados pelo citado decreto de 17 de janeiro de 1890.

Art. 41. O anno administrativo da companhia principiará em 1 de janeiro e terminará a 31 de dezembro, excepto o primeiro anno, que começará da data da installação da companhia e terminará a 31 de dezembro de 1891.

Art. 42. A directoria nomeará annualmente um dos fiscaes para ir em commissão annual ao Piauhy examinar e apresentar detalhado relatorio de todos os negocios da companhia, correndo as despezas de transporte por conta da mesma. Esse fiscal commissionado vencerá, além de seu honorario, a gratificação mensal de 500$, até quatro mezes, no maximo.

Os abaixo assignados, incorporadores, declaram estar de perfeito accordo com as estipulações dos presentes estatutos, na parte que lhes é referente para todos os effeitos legaes, assignando os mesmos com os subscriptores de acções, declarando estes ultimos que reconhecem e acceitam a responsabilidade que lhes é attribuida pela lei e por estes estatutos, que approvam para todos os effeitos juridicos.

Rio de Janeiro, 21 de outubro de 1890. – Cicero de Pontes. – Claudino Vicente da Rocha. – Severino Gonçalves Machado.