DECRETO N. 267 – DE 2 DE MAIO DE 1891
Concede autorização a Manoel Joaquim Cafezeiro e ao Banco da Bolsa, do Estado da Bahia, para organizarem uma sociedade anonyma sob a denominação de Companhia de Carnes Verdes e Industrias Accessorias.
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, attendendo ao que requereram Manoel Joaquim Cafezeiro e o Banco da Bolsa, instituido na capital do Estado da Bahia, resolve conceder-lhes autorização para organizarem uma sociedade anonyma sob a denominação de Companhia de Carnes Verdes e Industrias Accessorias, com os estatutos que apresentaram; não podendo, porém, a mesma companhia constituir-se definitivamente sem preencher as formalidades exigidas pela legislação em vigor.
O Ministro de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o faça executar.
Capital Federal, 2 de maio de 1891, 3º da Republica.
Manoel Deodoro DA Fonseca.
Barão de Lucena.
Estatutos da Companhia de Carnes Verdes e Industrias Accessorias, a que se refere o decreto n. 267 de 2 de maio de 1891
TITULO I
Art. 1º Sob a denominação – Companhia de Carnes Verdes e Industrias Accessorias – fica constituida nesta capital do Estado da Bahia uma sociedade anonyma, que reger-se-ha pelos presentes estatutos, organizados de accordo com as disposições vigentes.
Art. 2º A séde e o fôro da companhia, para todos os effeitos legaes, serão nesta cidade.
Art. 3º O prazo de sua duração será de 30 annos, podendo ser prorogado por deliberação da assembléa geral.
Art. 4º O capital será de 1.200:000$, representados por 12.000 acções de 100$ cada uma, podendo ser elevado até 3.000:000$, para o que fica a directoria autorizada.
Art. 5º Será realizado o dito capital por prestações, a saber: a 1ª de 30 % no acto da assignatura dos estatutos e as mais de 10 %, á medida das necessidades sociaes, a juizo da directoria.
Art. 6º Entre uma e outra chamada mediará o espaço nunca menor de 30 dias e serão ellas feitas com antecedencia de 15 dias, por annuncios em dous jornaes de maior circulação.
Art. 7º As acções serão nominativas até serem integralizadas, depois do que poder-se-hão converter em titulos ao portador.
Art. 8º Os accionistas que não realizarem as entradas subsequentes á primeira, no prazo fixado pela directoria ou até 60 dias depois com a multa de 1 %, perderão, em beneficio do fundo de reserva, as entradas anteriormente feitas, e quaesquer lucros que lhes pertençam, sendo as acções declaradas em commisso, salvo o caso de força maior, a juizo da directoria.
As acções declaradas em commisso poderão ser reemittidas para complemento do capital.
TITULO II
DOS FINS DA COMPANHIA
Art. 9º Os fins da companhia são:
a) abastecer de carnes verdes por sua ou alheia conta o mercado desta cidade, assim como o de quaesquer outras deste Estado, logo que, quanto a estas, a directoria julgue conveniente;
b) vender a carne directamente, por sua conta ou aos açougueiros, em condições de poderem estes revendel-a por preço modico;
c) estabelecer salgadeiras e cortumes pelo systema mais aperfeiçoado, para aproveitar deste modo, assaz lucrativo, os couros das rezes que forem abatidas, comprando, outrosim, quando se torne necessario, já neste, já nos outros Estados da União, os couros que precisos forem para o maior desenvolvimento dessa industria;
d) explorar em grande escala a industria da colla e do fabrico de sebo, aproveitando as gorduras das rezes.
Art. 10. Para consecução destes fins, e tendo, sobretudo, em mira expôr á venda carne da melhor qualidade e a maior modicidade nos preços, a companhia propõe-se, e fica a directoria expressamente autorizada com amplos e plenos poderes, a:
1º Adquirir, por compra, aforamento, arrendamento ou qualquer outra convenção, terrenos ou fazendas nas proximidades desta cidade, assim como no reconcavo e sertão, já apropriadas á criação e á solta, quando sejam reconhecidamente productivas e julgue a directoria opportuno, já onde possam estacionar convenientemente e engordar as rezes ainda não refeitas;
2º Crear agencias para compra e venda de gado na Feira de Sant’Anna, Villa Nova e em quaesquer outros pontos;
3º Adeantar a soltadores idoneos, mediante modico premio, quantias para compra de gado que tenham de soltar e remetter á companhia por conta delles, assim como, independentemente de premio, aos que trouxerem gado de diversos pontos;
4º Montar regularmente, pelo systema mais apropriado, o serviço de conducção das rezes para os açougues, aproveitando, emquanto não for elle montado e para não haver interrupção no dito serviço, os actuaes carros, cuja acquisição fará;
5º Estabelecer ou contractar, quando a mesma directoria julgar conveniente, o serviço do transporte das rezes, da Cachoeira para esta cidade, por meio de barcas a vapor, para assim proporcionar-se ao gado da Feira a maior commodidade, evitando-se os prejuizos que teem resultado da conducção por outro modo, ainda que em ferro-vias, conducção esta que, pela fórma por que tem sido feita, é reputada altamente prejudicial, em consequencia das contusões que produz nas rezes, que, destinadas ao consumo, precisam conservar o seu melhor estado;
6º Comprar, arrendar ou locar predios e terrenos em que se possam estabelecer depositos para as rezes abatidas, talhos, salgadeiras e cortumes;
7º Adquirir, mediante a competente indemnização, que não excederá de 40:000$, a Frank George Williamson, as salgadeiras a este pertencentes, com todos os seus accessorios, bem assim os favores que obteve do Governo deste Estado, por acto de 16 de outubro de 1890, relativamente ao estabelecimento nesta cidade, em logar apropriado, de uma fabrica de cortume de couros, para manufactura de sola, correias, couros denominados da Russia, atanados e productos similares, etc., podendo outrosim a directoria estabelecer ou contractar, si entender conveniente, matadouro particular, que funccionará com licença e fiscalização dos poderes competentes, assim como contractar com o dito Frank Williamson a continuação por um anno na administração das salgadeiras, mediante o honorario de 10:000$000;
8º Contractar com Cafezeiro & Gordilho e Affonso Pedreira de Cerqueira, mediante a indemnização de 100:000$, desistirem ou abrirem mão do referido negocio de carnes verdes, para que possa a companhia contar com os mesmos elementos de que estes dispunham, e que a companhia, por sua administração, procurará manter e estender, isto é, para que possa contar com todas as vantagens resultantes das freguezias e multiplas relações commerciaes ha muito firmadas e enraizadas por aquellas casas commerciaes, indemnização essa compensativa da consequente cessação dos lucros que auferiam desse genero, cujo movimento todo, exclusive o activo e passivo das mesmas casas, passará para a companhia, que igualmente fará acquisição, por cessão delles, de todo o material existente em seus depositos, açougues, etc., e da fabrica de sebo estabelecida no Retiro;
9º Igualmente fica a directoria autorizada a dar aos incorporadores uma porcentagem de 3 % deduzidos do capital social;
10. A companhia poderá entrar em fusão com qualquer outra, si a directoria reconhecer nisso vantagem, ouvindo para esse fim o conselho fiscal.
TITULO III
DA ASSEMBLÉA GERAL
Art. 11. A assembléa será constituida por accionistas de 10 ou mais acções que se acharem inscriptas no respectivo registro tres mezes, pelo menos, antes do dia fixado para a reunião ordinaria ou extraordinaria; suas decisões serão tomadas por maioria de votos, conforme o art. 12.
Art. 12. O accionista terá um voto por cada grupo de 10 acções, não podendo, porém, nenhum ter mais de 10 votos, seja qual for o numero de acções que possuir.
Os que tiverem menos de 10 acções terão o direito de assistir ás assembléas geraes, discutir e propôr o que entenderem conveniente, mas não poderão votar.
Art. 13. Na assembléa geral serão representados: os menores, os fallidos e os interdictos, por seus tutores e representantes legaes, sendo os das massas fallidas devidamente autorizados; as mulheres, por seus maridos; as sociedades anonymas ou corporações, por um dos seus mandatarios; as firmas sociaes, por um dos seus gerentes; e as heranças, pelos respectivos inventariantes legalmente reconhecidos.
Art. 14. Para todos os effeitos os accionistas poderão fazer-se representar por procuradores com poderes especiaes, comtanto que não sejam estes outorgados aos directores e aos fiscaes, e os procuradores sejam accionistas.
Art. 15. Os documentos comprobatorios da qualidade do mandato o que se refere o art. 13 serão apresentados no escriptorio da companhia tres dias, pelo menos, antes da reunião da assembléa e vigorarão por um anno.
Art. 16. A assembléa poderá deliberar legalmente quando achar-se presente um numero de accionistas que represente pelo menos a quarta parte do capital social, salvo os casos especificados no § 4º do art. 15 da lei n. 164 de 17 de janeiro de 1890.
Si na primeira reunião ou na segunda, nos casos a que se refere o § 4º do art. 15 da citada lei, não comparecer o numero legal, convocar-se-ha outra nos termos da mesma lei.
Art. 17. A assembléa geral reunir-se-ha todos os annos no mez de janeiro, satisfeitas as formalidades legaes.
Art. 18. O primeiro balanço da companhia far-se-ha em dezembro proximo vindouro, e dahi em deante serão semestraes.
TITULO IV
DA ADMINISTRAÇÃO
Art. 19. A companhia será administrada por tres directores, eleitos pela assembléa geral, com excepção da primeira administração, que fica constituida pela fórma adeante declarada.
Art. 20. O mandato durará por seis annos e é permittida a reeleição.
Art. 21. Nenhum director entrará em exercicio sem caucionar cem acções, que ficarão inalienaveis até que finde sua responsabilidade com approvação das contas relativas ao tempo de seu mandato.
Art. 22. Si esse deposito não for feito dentro de 30 dias depois da eleição, entender-se-ha que o eleito não acceitou a nomeação.
Art. 23. Não poderão exercer conjunctamente o cargo de director, ascendentes e descendentes, sogro e genro, irmãos e cunhados durante o cunhadio, e parentes dentro do segundo gráo, por direito civil, assim como os socios de firmas commerciaes.
Art. 24. A’ directoria c mpete praticar todos os actos de gestão relativos ao fim e ao objecto da companhia, assim como represental-a em juizo activa e passivamente.
Art. 25. O honorario annual dos directores será de 6:000$000.
Art. 26. No caso de vaga de director, os demais e os fiscaes designarão substituto provisorio, que poderá ser accionista ou não, attendendo á especialidade do serviço.
Paragrapho unico. No caso de não ser accionista o nomeado, deverá este, para entrar em exercicio, cumprir a formalidade prevista no art. 21.
Art. 27. O mandato do substituto nomeado, de accordo com o artigo acima, não se estenderá além do tempo que faltar para completar o prazo do mandato do director substituido.
TITULO V
DO CONSELHO FISCAL
Art. 28. O conselho fiscal compor-se-ha de tres membros effectivos e tres supplentes, que serão os immediatos em votos, eleitos annualmente, e que poderão ser reeleitos.
Art. 29. Será remunerado com 1:200$ annuaes cada um dos effectivos.
Art. 30. Ao conselho fiscal assistirá, além das mais attribuições, o direito de intervir com voto consultivo nos trabalhos da directoria, sempre que julgar conveniente.
Do fundo de reserva e dividendos
Art. 31. Haverá um fundo de reserva destinado ás perdas do capital social e que será constituido pelo menos com 10 % dos lucros liquidos, verificados pelos balanços semestraes, quota esta que poderá ser augmentada pela directoria, tendo em attenção a natureza especial da negociação e as perdas inherentes a esta.
Art. 32. Logo que o fundo de reserva attingir a 30 % do capital social cessará a accumulação semestral.
Art. 33. Dos lucros liquidos semestraes, depois de deduzido o fundo de reserva, far-se-ha o dividendo até 12 % sempre que aquelles o comportem.
Do restante deduzir-se-ha uma commissão de 10 % para ser distribuida em partes iguaes pela directoria e conselho fiscal, applicando-se o excesso, si houver, á integralização das acções, e feita esta, ao fundo de reserva.
Art. 34. Os dividendos não reclamados dentro de cinco annos, contados do dia fixado para começo do pagamento, serão considerados renunciados e levados ao fundo de reserva.
Disposições geraes e transitorias
Art. 35. Todos os casos omissos nestes estatutos serão regulados pelas disposições em vigor relativas ás sociedades anonymas.
Art. 36. Os incorporadores ficam autorizados a requerer ao Governo a approvação dos presentes estatutos e a acceitar as modificações ou alterações que por ventura forem feitas.
Art. 37. São incorporadores da companhia o Sr. Manoel Joaquim Cafezeiro e o Banco da Bolsa.
Art. 38. Os accionistas reconhecem e acceitam a responsabilidade que lhes cabe pela lei, inclusive a de que trata o art. 5º da mesma, e, usando da faculdade que lhes é por esta conferida, nomeam:
Directores
Pedro Alves de Lima Gordilho.
Affonso Pedreira de Cerqueira.
Dr. José Allioni.
Membros do conselho fiscal
Manoel Joaquim Cafezeiro.
Fernando Antunes da Luz.
Dr. Augusto Alves Guimarães.
Supplentes
Bernardo Martins Catharino.
José da Cunha Soares.
Dr. João Evangelista Pedreira de Cerqueira.
Art. 39. Approvados pelo Governo, os presentes estatutos entrarão em execução para todos os effeitos legaes, satisfeito o disposto nos §§ 4º e 5º da lei n. 164 de 17 de janeiro de 1890.
Bahia, 24 de março de 1891.
Os incorporadores – Manoel Joaquim Cafezeiro. – Pelo Banco da Bolsa, Fernando A. da Luz, director.