DECRETO N. 366 – DE 6 DE JUNHO DE 1891
Concede autorização a Carlos de Almeida Gonzaga para organizar uma sociedade anonyma sob a denominação de Companhia Cooperativa Popular.
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, attendendo ao que requereu Carlos de Almeida Gonzaga, resolve conceder-lhe autorização para organizar uma sociedade anonyma sob a denominação de Companhia Cooperativa, Popular e com os estatutos que a este acompanham; não podendo, porém, a mesma companhia constituir-se definitivamente sem preencher as formalidades exigidas pela legislação em vigor.
O Ministro de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o faça executar.
Capital Federal, 6 de junho de 1891, 3º da Republica.
Manoel Deodoro DA Fonseca.
Barão de Lucena.
Estatutos da Companhia Cooperativa Popular, a que se refere o decreto n. 366 de 6 de junho de 1891.
TITULO I
DENOMINAÇÃO, FINS E SEU CAPITAL
Art. 1º E’ constituida a Companhia Cooperativa Popular, com séde e fôro juridico na Capital Federal, de conformidade com as leis que regem as sociedades anonymas – tendo por fins:
§ 1º Adquirir com brevidade armazens de seccos e molhados em grande escala para a venda de generos tanto por atacado como a varejo, nos mais concorridos desta Capital.
§ 2º Fazer acquisição, nos suburbios de grande população, de mais armazens que serão filiaes á companhia, facilitando a todas as classes a compra de general por preços mais inferiores aos que compram em outras casas e evitando ainda as grandes despezas de transportes.
§ 3º Adquirir uma fabrica de cerveja de grande consumo, afim de poder proporcionar-se com vantagens a venda desse genero, quer nos armazens, quer no consumo geral.
§ 4º Ter contracto com os principaes importadores, quer no estrangeiro, quer nos Estados da capital, o fornecimento de todos os generos necessarios, que demonstradamente facilitará aos consumidores a compra por baixo preço; evitando-se com isso a que não se sujeitem ao monopolio que ordinariamente se dá nesse mercado.
§ 5º Ter uma tabella de preços correntes no estabelecimento central e nos de suburbio, para a venda fixa de seu commercio, quer seja em grande escala ou a retalho.
§ 6º Fazer um abatimento proporcional aos accionistas, principalmente nas vendas por atacado.
§ 7º Fazer a venda dos generos só a dinheiro, visto as grandes vantagens que indiscutivelmente terão os consumidores.
§ 8º Desenvolver este importantissimo ramo de commercio o melhor possivel no fornecimento para hoteis, collegios, asylos e outros estabelecimentos de 1ª ordem.
§ 9º Operar em outras transacções ad libitum da directoria, que tragam vantagens á companhia e principalmente na acquisição por compra ou arrendamento de terrenos nos bairros e suburbios desta capital e onde sejam de facil condução, para edificar-se casas e avenidas em grande escala afim de serem alugadas ás classes proletarias.
Art. 2º Seu Capital é de 1.000:000$, dividido em 5.000 acções de 200$ cada uma, podendo ser elevado a 5.000:000$ a juizo da directoria.
Art. 3º As entradas de capital realizar-se-hão nas condições seguintes: a primeira será de 20% no acto de assignarem-se os estatutos, e as demais de 10% com intervallos de 30 dias até perfazer 60% do capital; o resto será integralizado a juizo da directoria.
Art. 4º A companhia poderá funccionar logo que esteja subscripto e com as respectivas entradas um terço do capital.
TITULO II
DOS ACCIONISTAS
Art. 5º São accionistas todos os que possuirem uma ou mais acções, devidamente registradas no livro competente.
Art. 6º E’ licito a todo accionista fazer qualquer proposta e discutir em assembléa geral, porém só terão o direito de votar, os accionistas que forem possuidores de 10 acções pelo menos.
§ 1º Cada grupo de 10 acções representa um voto até ao numero de 10, maximo dos votos que possa ter o accionista, seja qual for o numero de acções.
§ 2º Os accionistas que não realizarem o pagamento nos prazos fixados nestes estatutos e o realizarem dentro de trinta dias subsequentes, incorrerão na multa de 1% sobre a prestação retardada; e si ainda assim não o realizarem perderão o direito ás prestações anteriores.
TITULO III
DA ASSEMBLÉA GERAL
Art. 7º Haverá annualmente uma assembléa geral ordinaria, que estará legalmente constituida quando em virtude da convocação se acharem reunidos accionistas que representem pelo menos dous terços do capital em acções inscriptas no registro da companhia, com 30 dias de antecedencia ao da reunião.
Art. 8º A assembléa geral de que trata, o art. 7º tem autoridade para resolver todos os actos em discordancia, que possam affectar os interesses da companhia; resolver sobre reforma dos estatutos, dissolução e liquidação da companhia.
Art. 9º As assembléas geraes extraordinarias far-se-hão todas as vezes que a directoria julgar necessarias ou quando forem requisitadas pelo conselho fiscal e por accionistas que representem pelo menos um terço do capital da companhia.
Art. 10. A convocação das assembléas geraes será feita por annuncios com 15 dias de antecedencia, declarando-se nos annuncios o objecto da convocação. Sendo mallograda a primeira reunião, o prazo será reduzido a cinco dias.
Art. 11. Si por qualquer impedimento o accionista não puder tomar parte na assembléa geral, delegará os seus poderes por procuração a outro accionista, comtanto que não exceda a dez o numero de votos de cada accionista, seja qual for a quantidade de acções que possua.
Art. 12. As procurações devem ser entregues no escriptorio da companhia tres dias antes da assembléa, sob pena de não produzirem effeito algum; firmando o director secretario da companhia um recibo que dará ao portador, como prova do deposito da procuração.
Art. 13. Reunidos os accionistas no logar annunciado, o presidente da companhia e, na sua falta, o vice-presidente, depois de verificar que a inscrição dos accionistas presentes constitue numero legal, convidará a assembléa a que nomeie por acclamação o accionista de mais aptidão para presidir os trabalhos, e assim designado, o presidente designará os secretarios para se constituir a mesa.
Art. 14. Na reunião annual da assembléa geral, além do que trata art. 8º, apresentar-se-ha o relatorio da directoria acompanhado do balanço, conta de lucros e perdas, e parecer do conselho fiscal, para ser discutido e votado pela assembléa geral.
Paragrapho unico. Em caso de empate na votação das decisões tem voto de qualidade o presidente da assembléa.
TITULO IV
DA ADMINISTRAÇÃO E SEUS DEVERES
Art. 15. A companhia será administrada por quatro membros directores, eleitos pela assembléa geral de seis em seis annos, por maioria relativa de votos e escrutinio secreto.
Art. 16. Qualquer director que deixar de assumir o cargo dentro do prazo de 10 dias, ou que depois de assumil-o deixar de exercer por mais de tres mezes consecutivos sem motivo justificado, contar-se-ha resignado.
Art. 17. No caso de vaga de um dos directores, será chamado um dos membros do conselho effectivo para exercer o cargo, e para a vaga deste em supplente.
O director assim eleito exercerá o cargo por todo o tempo que exerceria aquelle a quem substitue.
Art. 18. Só poderá ser membro director quem for possuidor de mais de 100 acções e estas ficarão no cofre da companhia para cobrir as suas responsabilidades, até que a assembléa geral dê plena e geral quitação á sua gestão.
Art. 19. E’ dever da directoria superintender em todos os negocios da companhia; praticar todos os actos de administração interna e externa que for a bem da mesma; fazel-a representar em juizo e fóra delle; contractar, transigir, adquirir e alienar os bens immoveis e semoventes que julgar necessarios, podendo dar plena e geral quitação.
Art. 20. Compete especialmente ao director-presidente:
§ 1º Presidir as sessões da directoria e convocal-as, extraordinariamente quando assim julgue ou seja preciso.
§ 2º Assignar com o secretario as acções e cautelas respectivas, e com o gerente os balancetes e balanços que se organizarem.
§ 3º Apresentar á assembléa geral o relatorio annual das operações da companhia.
§ 4º Estabelecer o dividendo das acções semestralmente; rubricar todos os livros e papeis pertencentes á companhia.
§ 5º Nomear, suspender ou demittir os empregados necessarios aos serviços do escriptorio central, marcar-lhes os ordenados e gratificações, e tudo fazer para a boa gestão da companhia.
§ 6º Executar e fazer cumprir fielmente estes estatutos, todos os regulamentos e as decisões da assembléa geral.
Art. 21. No impedimento do director-presidente, o vice-presidente o substituirá em todas as suas attribuições.
Art. 22. Compete ao director-secretario.
§ 1º Fiscalizar toda a escripturação e assignar toda a correspondencia.
§ 2º Ter a seu cargo e zelar o archivo da companhia, e de accordo com a directoria confeccionar o relatorio annual.
§ 3º Lavrar as actas das sessões da directoria.
§ 4º Assignar com o presidente as acções e cautelas, e assignar os recibos de que trata o art. 12.
§ 5º Fiscalizar com o gerente todo o movimento do escriptorio central.
Art. 28. Compete ao director-thesoureiro:
§ 1º Effectuar o pagamento de todas as contas e transacções da companhia, depois de processadas e com o–pague-se–do presidente, assim como assignar os cheques.
§ 2º Arrecadar todos os dinheiros e titulos pertencentes á companhia e dar o seu competente destino, sendo que todos os pagamentos aos empregados e outros misteres serão sempre auxiliados pelo gerente.
§ 3º Ter sob a sua guarda e com fiel observancia os cofres da companhia, de que é o unico responsavel.
TITULO V
DO CONSELHO FISCAL
Art. 24. Será eleito annualmente um conselho fiscal effectivo de quatro membros e quatro supplentes, que poderão substituir no caso de impedimento os primeiros, e os effectivos deverão possuir pelo menos 50 acções cada um, e compete-lhes:
§ 1º Apresentar o seu parecer sobre os negocios da companhia, entregando ao director-presidente, para ser publicado com o respectivo relatorio.
§ 2º Convocar extraordinariamente a assembléa geral, quando entender conveniente por motivos urgentes e a directoria recusar-se a fazer.
§ 3º Pedir á directoria todas as informações de que carecer, denunciando quaesquer omissões e fazer tudo que julgar conveniente, de accordo com as leis regulamentares a bem dos interesses da companhia.
Art. 25. Os membros effectivos do conselho fiscal terão a remuneração de 2:400$ annuaes cada um, podendo ser pagos mensalmente.
Art. 26. E’ facultativa a reeleição.
TITULO VI
DO GERENTE
Art. 27. Compete ao gerente:
A fiscalização de todos os estabelecimentos da companhia.
§ 1º Dirigir, nomear e suspender empregados ao serviço do escriptorio e de outros estabelecimentos, dando conta do seu acto ao presidente.
§ 2º Ter correspondencia directa com os importadores quer do interior quer do exterior, para compra dos generos necessarios aos armazens da companhia, e outros materiaes que assim sejam precisos.
§ 3º Contractar trabalhadores ou empreiteiros quando se tenham de alargar as operações da companhia, na edificação de casas e avenidas; reconstrução e melhoramentos de predios sub-locados ou arrendados; examinar minuciosamente com o procurador da companhia, todos os documentos de contractos, quer de arrendamentos ou compras, propondo todas as medidas de providencias necessarias ao bom exito da companhia.
§ 4º Representar com o procurador a companhia, perante os poderes publicos e judiciaes, acceitando e propondo acções nos limites da legalidade.
§ 5º Effectuar todas as operações de credito, mercadorias por conta de terceiros e em depositos da companhia, emprestimos a prazo curto com reendosso, e finalmente todas as operações hypothecarias.
§ 6º Receber diariamente as ferias dos estabelecimentos da companhia, documentando os empregados no quantum da entrega e dando conta ao thesoureiro, que lhe passará recibo.
§ 7º Exhibir mensalmente nas sessões da directoria um balancete da escripturação da companhia e fornecer annualmente todos os dados necessarios á confecção do relatorio, que terá de ser apresentado em assembléa geral.
§ 8º Propôr á directoria a incorporação de companhias ou emprezas que sejam de reconhecida utilidade.
§ 9º O gerente será de plena confiança da directoria, e depositará nos cofres da companhia, 50 acções, pelo menos, que serão inalienaveis, para cobrir a sua responsabilidade.
TITULO VII
LUCROS DIVIDENDOS E FUNDO DE RESERVA
Art. 28. Serão consideradas lucros sociaes as rendas auferidas das operações especificadas nos paragraphos do art. 1º destes estatutos, deduzidas as respectivas despezas.
§ 1º Dos lucros liquidos se fará entre os accionistas o dividendo, que nunca será maior de 12%.
§ 2º Os dividendos serão semestraes.
§ 3º Os bonus serão marcados pela directoria.
§ 4º Dos lucros liquidos serão tirados ate 15% que serão divididos pela directoria.
§ 5º Dos lucros liquidos, depois de deduzida a parte destinada ao fundo de reserva, tiver-se-hão as porcentagens de dividendos a accionistas e porcentagem da directoria, sendo o restante distribuido como bonificação a accionistas.
§ 6º A divisão que declara o § 4º alcança o gerente.
Art. 29. Não se fará divisão de lucros quando se tenham dado perdas que desfalquem o capital social e este não tiver sido integralmente restaurado.
Art. 30. Os casos não previstos nestas estatutos serão regulados pela lei que rege as sociedades anonymas.
Art. 31. Considerar-se-hão prescriptos os dividendos não reclamados pelos accionistas ou seus representantes legaes, no prazo de dous annos, revertendo em favor dos cofres da companhia.
TITULO VIII
DISPOSIÇÕES GERAES E TRANSITORIAS
Art. 32. A duração da companhia será de 50 annos, podendo ser prorogada e o anno social se contará de 1 de janeiro a 31 de dezembro.
Art. 33. A companhia deverá possuir edificios proprios para seu estabelecimento.
Art. 34. A directoria nomeará um procurador de sua confiança, que, além das attribuições mencionadas no art. 27 e seus paragraphos, terá de promover, com o gerente, especulativamente nas compras ou arrendamentos e outros contractos de utilidade companhia; fiscalizar as casas alugadas ou por alugue pertencentes á companhia; receber os alugueis e outros contas amigavel ou judicialmente, dando conta dos seus actos ao presidente e thesoureiro.
Art. 35. O procurador nomeado dará em deposito á sua fiança 50 acções pelo menos que serão inalienaveis.
Art. 36. O seu ordenado será marcado pela directoria.
Art. 37. Ficará ao cuidado da directoria obter do Governo todos os favores possiveis para o bem desenvolvimento da companhia.
Art. 38. Por excepção á disposição dos presentes estatutos, a primeira directoria, cujo mandato durará seis annos, será composta dos seguintes accionistas:
Presidente, Dr. José Ribeiro Junior, advogado.
Vice-presidente. Honorio S. Salgado do Nascimento.
Secretario, Carlos Gonzaga.
Thesoureiro, José Clemente de Moraes.
Conselho fiscal effectivo
Manoel dos Santos Leonor.
José de Paiva Brito Junior.
João Ferreira Lopes Gonçalves.
José Joaquim Gomes.
Supplentes
Dr. Antonio Alves de Mesquita Junior.
Manoel Rodrigues Alves.
Francisco Siqueira da Motta.
Faustino Vieira de Carvalho.
Gerente, Diogo Hartley Pinto.
Art. 39. São arbitrados em 500$, mensaes os honorarios de cada um dos directores. O gerente terá o ordenado do 400$ mensaes
Art. 40. Fica autorizada a directoria a pagar as despezas de incorporação, de accordo com a proposta que for approvada pela assembléa geral constitutiva, paga a primeira prestação no acto da installação e a segunda 60 dias depois.
Art. 41. As disposições do Codigo Commercial, do decreto n. 164 de 17 de janeiro de 1890, e demais leis em vigor, regalarão todos os casos omissos nestes estatutos.
Art. 42. A directoria e os accionistas reconhecem e assignam, acceitando a responsabilidade que lhes é attribuida pela lei e approvam estes estatutos.
Directoria do Commercio – Segunda Secção – Rio de Janeiro, 18 de abril de 1891.– Thomaz Cochrane.