DECRETO N. 502 – DE 22 DE AGOSTO DE 1891

Concede autorização a Affonso Henriques Pereira de Carvalho e outros para organizarem uma sociedade anonyma sob a denominação de Grande Companhia de Vinhos.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, attendendo ao que requereram Affonso Henriques Teixeira de Carvalho, Augusto Viriato da Cunha Porto e Antonio Soares da Silva, resolve conceder-lhes autorização para organizarem uma sociedade anonyma sob a denominação de Grande Companhia de Vinhos, com os estatutos que a este acompanham; devendo, porém, a mesma companhia, antes de constituir-se definitivamente, preencher as formalidades exigidas pela legislação em vigor.

O Ministro de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o faça executar.

Capital Federal, 22 de agosto de 1891, 3º da Republica.

Manoel Deodoro DA Fonseca.

João Barbalho Uchôa Cavalcanti.

Estatutos da Grande Companhia de Vinhos, a que se refere o decreto n. 502 de 22 de agosto de 1891.

CAPITULO I

DENOMINAÇÃO, SÉDE E DURAÇÃO DA COMPANHIA

Art. 1º De conformidade com as leis vigentes, é fundada a Grande Companhia de Vinhos, sociedade anonyma de responsabilidade limitada, que se regerá pelos presentes estatutos.

Art. 2º A séde da companhia é na cidade do Rio de Janeiro, onde terá o seu fôro juridico, podendo estabelecer succursaes, filiaes, agencias ou correspondentes nas principaes cidades, da Republica, nomeadamente nos centros de maior consumo, e no estrangeiro, nos paizes de producção vinicola.

Art. 3º A duração da companhia será de 50 annos.

Art. 4º O anno social decorre de 1 de janeiro a 31 de dezembro.

CAPITULO II

OBJECTO OU FINS

Art. 5º O fim ou objecto da companhia é principalmente o negocio em grande escala de vinhos, bebidas alcoolicas e seus congeneres, e para isso realizará:

a) a compra, preparo e exportação, por conta propria ou alheia, dos referidos generos, nos paizes productores, com destino ao Brazil e a outros mercados consumidores;

b) a acquisição de estabelecimentos nos paizes exportadores com pessoal habilitado para dirigir as compras e tratamento dos liquidos, assim como para promover e fazer dirigir para a companhia os negocios que outras casas continuarem fazendo á consignação;

c) a acquisição de uma casa commercial no Rio de Janeiro, trabalhando no mesmo ramo de negocio, e cuja boa freguezia sirva de principal elemento para o desenvolvimento das transacções da companhia;

d) o estabelecimento nos portos do Brazil de armazens proprios para a recepção dos vinhos, seu descanço indispensavel e tratamento antes da venda;

e) o estabelecimento de casas de venda ao publico (a varejo) de vinhos e demais bebidas, de fórma a augmentar o consumo dos vinhos da companhia e a tornar conhecida a sua marca;

f) a acquisição de propriedades viticolas em condições de se poder assegurar a boa qualidade e o credito da producção de um dominio proprio;

g) a exploração por sua conta, e por navios proprios ou fretados, da navegação entre os portos do Brazil e entre estes e os estrangeiros, de que procedam os generos de sua importação;

h) exportação de generos nacionaes para com o seu producto satisfazer a importancia dos que receber;

i) operações de cambio para o mesmo fim;

j) todas as transacções necessarias para o bom andamento dos negocios da companhia.

Art. 6º Realizará, outrosim, a companhia quaesquer negocios que concorram para o augmento dos proventos sociaes, e nesse intuito, poderá:

a) receber por conta de terceiro, á consignação, vinhos, cognaes, licores, cervejas e vinagres.

b) encarregar-se, mediante encommenda, da importação dos mesmos generos por conta de terceiros;

c) receber á consignação qualquer embarcação de navegação transatlantica ou de cabotagem;

d) adquirir trapiches alfandegados para armazenagem de mercadorias suas ou de terceiros, estabelecendo serviço de carga e descarga de navios;

e) effectuar seguros contra fogo e contra risco maritimo;

f) realizar quaesquer operações de carteira;

g) importar por conta propria ou de terceiros todos os generos denominados de estiva;

h) encarregar-se do recebimento de alugueis, juros, dividendo e de quaesquer outras cobranças ou liquidações por conta de terceiros.

CAPITULO III

CAPITAL

Art. 7º O capital da companhia e de 10.000:000$000, divididos em cincoenta mil acções de 200$000 cada uma.

Art. 8º As entradas serão realizadas pela fórma seguinte: 30 % no acto da subscripção e as demais em prestações de 10 % com intervallos nunca menores de 60 dias.

CAPITULO IV

ACCIONISTAS

Art. 9º O accionista é responsavel pela quota de capital das acções que subscrever, realizando-a de accordo com estes estatutos.

Paragrapho unico. E’ permittida a antecipação de entradas com o premio que se concordar.

Art. 10. A impontualidade de entradas no prazo estipulado obriga o accionista ao pagamento de 2 % de multa sobre o valor da entrada em atrazo, si elle a fizer dentro de 30 dias contados desde a data da expiração do referido prazo.

Art. 11. O accionista que nem nas condições do artigo anterior tiver cumprido a entrada, perde o direito ás acções, revertendo a favor do fundo de reserva o valor que estas tiverem.

Art. 12. As acções cahidas em commisso serão substituidas por outras de igual numeração.

Art. 13. Emquanto não se acharem integralizadas, as acções serão nominativas e transferiveis por termo assignado no escriptorio da companhia, podendo, depois de integralizadas, ser passadas ao portador e vice-versa, à vontade do possuidor.

CAPITULO V

ADMINISTRAÇÃO

Art. 14. Administrará a companhia um conselho director composto de cinco membros.

Art. 15. Esta directoria (excepto a primeira) será eleita pela assembléa geral de entre os accionistas de 100 ou mais acções, por escrutinio secreto e maioria absoluta de votos. Quando não a haja em primeiro escrutinio, proceder-se-ha a segundo entre os nomes dos mais votados, em numero duplo dos que tiverem de ser eleitos; a maioria apurada prevalece, ou a sorte, em caso de empate.

Art. 16. A eleição far-se-ha de seis em seis annos.

Art. 17. Os directores eleitos caucionarão cada um, dentro de 30 dias da posse, 100 acções (cem) inalienaveis antes de approvação de contas.

Art. 18. O cargo de director não poderá ser exercido conjunctamente por parentes consanguineos e affins até ao segundo gráo, nem por socios de firmas commerciaes.

Art. 19. No caso de impedimento ou ausencia prolongada de algum dos directores, os outros poderão, si assim o entenderem necessario, e de accordo com o conselho fiscal, designar os respectivos substitutos.

Art. 20. Entender-se-ha que resignou o cargo o membro da directoria que não exercer as suas funcções por tempo excedente a seis mezes.

Paragrapho unico. Exceptua-se o caso de que, ainda mesmo ausente, esteja prestando serviços á companhia.

Art. 21. A directoria poderá ser reeleita no todo, ou em parte.

Art. 22. Nenhum membro da directoria poderá ser destituido sinão no caso de negligencia, dólo ou culpa no exercicio das suas respectivas funcções.

Art. 23. A directoria fica autorizada a estabelecer as secções que foram necessarias para o serviço da companhia e a elaborar regulamentos internos.

Art. 24. Reunir-se-ha em sessão a directoria todas as vezes que disso tiver necessidade; não deixando de o fazer duas vezes ao menos em cada mez, lavrando acta.

As resoluções serão tomadas por maioria de votos.

Art. 25. São da competencia da directoria, de accordo com o regulamento interno que elaborar, todos os actos de livre administração, relativos ao objecto da companhia, e para isto fica investida dos precisos poderes.

Art. 26. A primeira directoria compor-se-ha dos Srs.:

Conselheiro Candido Luiz Maria de Oliveira.

Conselheiro Carlos Affonso de Assis Figueiredo.

Affonso Henriques Teixeira de Carvalho.

Augusto Viriato da Cunha Porto.

Antonio Soares da Silva.

Art. 27. Os honorarios da directoria ficam fixados em dezoito contos de réis (18:000$) para o presidente e doze contos de réis (12:000$) para cada um dos outros membros, annualmente.

CAPITULO VI

CONSELHO FISCAL

Art. 28. O conselho fiscal compor-se-ha de cinco membros effectivos, accionistas de 50 ou mais acções e de tres supplentes accionistas de 25 e mais acções. Serão eleitos na sessão ordinaria annual da assembléa geral, exercerão o mandato por um anno e poderão ser reeleitos.

Art. 29. Reunir-se-ha o conselho fiscal uma vez, pelo menos, cada mez, lavrando acta.

Art. 30. Compete-lhe dar parecer annualmente sobre o balanço e contas que tenham de ser apresentados á assembléa geral ordinaria, para o que receberá todos os annos, até 31 de janeiro, cópias exactas do balanço e contas.

Art. 31. O conselho fiscal deverá assistir ás reuniões da directoria, quando seja convidado, terá voto consultivo e assignará as actas.

Art. 32. O primeiro conselho fiscal compor-se-ha dos Srs.:

Barão do Alto Mearim.

Henrique Chaves.

Dr. Manoel Rodrigues Peixoto.

Antonio Barroso Fernandes.

Desiderio José Nunes dos Santos.

membros effectivos, sendo supplentes os Srs.:

Leonidio José de Almeida Machado.

Dr. Cornelio Vaz de Mello.

Dr. Graciliano Aristides do Prado Pimentel.

Art. 33. Os honorarios serão de tres contos de réis annuaes para cada um dos membros effectivos.

Art. 34. Em caso de impedimento de algum dos membros effectivos, os restantes escolherão substituto entre os supplentes.

Paragrapho unico. Em seguida ao primeiro anno a substituição será feita pelo mais votado dos supplentes, decidindo a sorte em caso de empate.

CAPITULO VII

LUCROS, FUNDO DE RESERVA E DIVIDENDOS

Art. 35. Lucros liquidos são o resultado favoravel das operações indicadas no capitulo II, arts. 5º e 6º, deduzidas as despezas geraes.

Art. 36. Dos referidos lucros liquidos se deduzirão, em primeiro logar e annualmente, 10 % para fundo de reserva, até que este attinja a quarta parte do capital nominal.

Art. 37. Em seguida se fará o dividendo aos accionistas até 12 % annuaes do capital realizado.

Art. 38. O excedente a estas deducções será applicado pela seguinte fórma:

Uma quarta parte para distribuição em partes iguaes aos incorporadores ou a seus herdeiros;

Uma dita para divisão em partes iguaes á directoria, a titulo de bonificação;

As duas quartas partes restantes se levarão ao fundo de reserva, ou se applicarão a uma conta de lucros suspensos ou se dividirão pelos accionistas como bonus ou dividendo supplementar.

A directoria poderá resolver este caso, assim como applicar as referidas duas quartas partes restantes com igualdade ao fundo de reserva, á conta de lucros suspensos e a dividendo supplementar.

Paragrapho unico. Si a quarta parte concedida á directoria exceder a 4 % dos lucros liquidos, só se dividirá até este limite de 4 %.

Art. 39. Os dividendos que não forem reclamados dentro de cinco annos, a contar do ultimo dia fixado para seu pagamento, serão considerados prescriptos e levados á conta de lucros e perdas.

CAPITULO VIII

ASSEMBLÉA GERAL

Art. 40. A sessão de assembléa geral ordinaria será effectuada annualmente em março.

Art. 41. Far-se-hão tantas assembléas extraordinarias, quantas o exigirem os interesses sociaes.

Art. 42. A assembléa geral e a autoridade soberana da companhia, achando-se legalmente constituida.

Art. 43. Achando-se, em virtude de convocação, reunidos accionistas que representem, pelo menos, a quarta parte do capital social em acções inscriptas no registro da companhia com 30 dias de antecedencia ao da reunião, estará legalmente constituida a assembléa.

Paragrapho unico. A convocação será feita por annuncios nos diarios, com antecedencia de 15 dias.

Art. 44. A assembléa geral assim constituida poderá decidir tudo que for de sua competencia, excepto sobre a reforma de estatutos, dissolução, liquidação ou augmento de fundo social, casos para os quaes são necessarios dous terços, pelo menos, do capital, presentes.

Art. 45. Não se reunindo numero de accionistas para deliberarem de accordo com o preceituado nos arts. 43 e 44, observar-se-ha o disposto no decreto n. 164 de 17 de janeiro de 1890.

Paragrapho unico. Si for necessario convocar segunda ou terceira reuniões, o prazo para a convocação poderá ser reduzido a cinco dias.

Art. 46. Havendo accionistas presentes em numero legal, o presidente da companhia, ou, em sua ausencia, qualquer dos membros da directoria, constituirá a assembléa, e convidal-a-ha a acclamar o accionista que deva presidir a reunião. Este escolherá os secretarios.

Art. 47. A assembléa só discutirá o assumpto para que foi convocada.

Art. 48. Os votos serão contados por grupos de cinco acções; não podendo, comtudo, exceder de 20 para qualquer possuidor, seja qual for a importancia das acções que tenha.

Paragrapho unico. O accionista de menos de cinco acções pode comparecer á assembléa e discutir; mas não póde votar.

Art. 49. E' admittida a votação por procuração nos termos da lei.

Paragrapho unico. As procurações devem ser entregues tres dias antes na secretaria da companhia, sem o que não produzirão effeito algum.

A prova da entrega poderá fazer-se por meio de recibo de dous membros da directoria.

Art. 50. Quando, no caso previsto no art. 46, não tenha comparecido nenhum dos directores, a assembléa será constituida com a presidencia do maior accionista presente, ou por eleição em escrutinio secreto, si o exigirem dous ou mais accionistas.

Art. 51. Os possuidores de acções ao portador não poderão fazer parte das assembléas, nem envolver-se nas discussões, votações e deliberações, sem que tenham depositado as mesmas acções na companhia, até tres dias antes dos fixados para as reuniões.

Paragrapho unico. As acções que tiverem caucionadas ficam dispensadas do deposito; mas è necessario o aviso por escripto, dentro do prazo especificado.

Art. 52. As deliberações da assembléa geral serão tomadas symbolicamente ou por escrutinio secreto.

§ 1º Este é obrigatorio para a eleição de administradores e fiscaes.

§ 2º Quando dous ou mais accionistas o requeiram, a votação far-se-ha pela representação do capital.

Art. 53. Em caso de empate na votação, tem voto de qualidade o presidente da assembléa.

Art. 54. Compete á assembléa geral:

Julgar as contas annuaes;

Alterar ou reformar os estatutos;

Nomear e destituir os membros da directoria e os do conselho fiscal;

Resolver todos os assumptos concernentes ao capital, liquidação, dissolução da companhia e qualquer outro objecto de interesse social e para o qual houver sido convocada.

CAPITULO IX

DISPOSIÇÕES GERAES

Art. 55. Em tudo quanto estiver omisso nestes estatutos, reger-se-ha a companhia pelas leis e decretos da Republica.

Art. 56. Fica a directoria autorizada a:

Adquirir edificios proprios para seus estabelecimentos;

Levantar emprestimos por meio de obrigações ao portador (debentures), dentro ou fóra da Republica, vencendo juros modicos e com amortizações;

Pagar as despezas geraes de incorporação e de installação até ao maximo de 10 % do capital nominal da companhia;

Fazer acquisição dos estabelecimentos no paiz e no estrangeiro, de que tratam os arts. 5º e 6º.

Art. 57. Os honorarios estipulados nestes estatutos serão, pagos mensalmente.

Art. 58. A directoria procurará sempre ultimar por meio de arbitros as questões que se suscitarem na gestão dos negocios da companhia.

Art. 59. A liquidação da companhia, no fim do prazo de sua duração, será feita por uma commissão eleita pela assembléa geral e de preferencia composta de accionistas.

Art. 60. Os accionistas reconhecem que a posse de uma ou mais acções importa em plena adhesão a estes estatutos, acceitam a responsabilidade que lhes é attribuida por lei e approvam estes estatutos.

Declara-se em tempo que a fls. 8 foi riscado o nome do Dr. Graciliano Aristides do Prado Pimentel e substituido pelo Dr. Manoel Rodrigues Peixoto, e a fls. 9 o nome deste ultimo foi igualmente riscado, sendo nomeado em seu logar o Dr. Cornelio Vaz de Mello.

Rio de Janeiro, 20 de julho de 1891.– Affonso Henriques Teixeira de Carvalho.– A. V. Cunha Porto.– Antonio Soares da Silva.