DECRETO N

DECRETO N. 721 – DE 30 DE JANEIRO DE 1892

Concede autorisação a Ramiro Fortes de Barcellos para organizar uma sociedade anonyma em commandita por acções sob a denominação de – A Meridional.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, attendendo ao que requereu Ramiro Fortes de Barcellos, resolve conceder-lhe autorisação para organizar uma sociedade em commandita por acções sob a denominação de – A Meridional – e com os estatutos que a este acompanham; não podendo, porém, a sociedade constituir-se definitivamente sem que tenham sido observadas as formalidades exigidas pela legislação em vigor.

O Ministro de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o faça executar.

Capital Federal, 30 de janeiro de 1892, 4º da Republica.

Floriano Peixoto.

Antão Gonçalves de Faria.

Estatutos da Sociedade Commanditaria – A Meridional

Os abaixo assignados, constituindo uma sociedade commanditaria por acções, sob a firma Ramiro Barcellos & C.ª e denominada – A Meridional, estabelecem e approvam os seguintes estatutos, pelos quaes se regerá a sociedade:

TITULO I

FORMAÇÃO, OBJECTO, RAZÃO SOCIAL, DENOMINAÇÃO, SÉDE E DURAÇÃO DA SOCIEDADE

Art. 1º E’ formada pelo presente contracto uma sociedade em commandita por acções entre o Dr. Ramiro Fortes de Barcellos, socio gerente pessoal e indefinidamente responsavel de uma parte, e de outra parte todas as pessoas que subscreverem ou tornarem-se proprietarias de uma ou mais acções, como socios simples commanditarios, nos termos dos decretos ns. 8821 de 30 de dezembro de 1882 e 164 de 17 de janeiro de 1890.

Art. 2º Consiste o objecto desta sociedade na exploração industrial por conta propria da patente de invenção n. 612 (privilegio para a conservação de carnes, leite, legumes e mais substancias organicas pelo processo do Dr. Domingos José Freire), quer no Brazil, quer em paizes onde estiver a mesma patente confirmada. Para isso a sociedade, durante todo o tempo de sua duração, fica subrogada em todos os direitos e obrigações constantes da escriptura publica de 7 de novembro de 1891, em notas do tabellião Evaristo de Barros, desta Capital, em virtude da qual os Drs. Joaquim Francisco de Assis Brazil, Ramiro Fortes de Barcellos, Candido Gaffrée e Eduardo Palassin Guinle adquiriram o direito á exploração e propriedade na referida patente, por cessão onerosa a elles feita pelo Dr. Domingos José Freire e conselheiro Joaquim Monteiro Caminhoá.

Paragrapho unico. A sociedade iniciará os seus trabalhos fundando desde já um estabelecimento industrial no Estado do Rio Grande do Sul.

Art. 3º A sociedade será denominada – A Meridional, e gyrará sob a firma social Ramiro Barcellos & C.ª

Art. 4º O prazo de duração da sociedade começará da data em que ella ficar legalmente constituida e terminará em 31 do julho de 1904.

Art. 5º A séde e o fôro da sociedade serão na cidade do Rio de Janeiro.

TITULO II

 CAPITAL SOCIAL – ACÇÕES

Art. 6º O capital social será de oitocentos contos de reis. Para sua formação contribuirão: o socio Dr. Ramiro Fortes de Barcellos com a quantia de dez contos de réis, o que não o inhibirá de adquirir acções, e os socios commanditarios com a de setecentos e noventa contos de réis, dividida em acções de um conto de réis cada uma, nominativas, sendo este capital inteira e totalmente subscripto pelos abaixo assignados.

Art. 7º O capital será realizado da seguinte fórma: vinte por cento no acto da subscripção, trinta por cento em julho do corrente anno e o restante á proporção que for necessario, á requisição do gerente, com approvação do conselho fiscal.

Art. 8ª Os titulos das acções serão assignados pelo gerente e um membro do conselho fiscal.

§ 1º As acções serão integralmente realizadas na forma do art. 7º, não admittindo a sociedade o commisso, mas, sendo imposta a multa de dous por cento ao mez ao socio que deixar de attender ás chamadas.

§ 2º Sem autorisação do conselho fiscal não poderão ser transferidas acções a pessoas estranhas á sociedade, tendo os socios direito de opção e preferencia para adquiril-as.

§ 3º A sociedade reserva-se o direito de amortizar acções que forem offerecidas á venda, para cujo effeito fica o conselho fiscal plena e especialmente autorisado a permittir ao gerente fazel-o.

TITULO III

DA GERENCIA E DO CONSELHO FISCAL

Art. 9º O gerente terá os podares expressos no art. 153 do decreto n. 8821 de 30 de dezembro de 1882, não podendo ser destituido ad nutum da assembléa de socios.

§1º Incumbe ao gerente apresentar balancetes mensaes e relatorios semestraes dos negocios da sociedade ao conselho fiscal.

§ 2º No caso de morte do gerente a sociedade não se reputará por isso dissolvida, devendo em tal caso observar o disposto no art. 153 do citado Decreto n. 8821.

§ 3º O gerente terá como remuneração do seu trabalho dezoito contos de réis annualmente.

Art. 10. O conselho fiscal constará de tres membros effectivos eleitos em assembléa geral ordinaria que deve ter logar a 31 de julho de cada anno, devendo ser substituidos, em seus impedimentos, pelos supplentes igualmente eleitos na mesma occasião em numero de tres.

§ 1º O primeiro conselho fiscal será eleito na reunião de installação da sociedade, após a approvação destes estatutos pela mesma.

§ 2º Antes de começarem as operações da sociedade, examinará o conselho si foram cumpridas as respectivas formalidades legaes para a constituição da sociedade.

Art. 11. O Conselho Fiscal reunir-se-ha em sessão ordinaria uma vez por mez e, extraordinariamente, sempre que lhe parecer conveniente, competindo-lhe:

§ 1º Fiscalizar a gerencia, podendo examinar, por si ou por mandatarios especiaes, todos os livros, documentos e titulos, bem como solicitar todas as informações que precisar.

§ 2º Convocar extraordinariamente a assembléa geral de commanditarios, sempre que julgar necessario.

TITULO IV

DA ASSEMBLÉA GERAL

Art. 12. A assembléa geral compor-se-ha do gerente e dos socios commanditarios, nos termos do art. 15 do decreto n. 164 de 17 de janeiro de 1890, reunidos após convocação pela imprensa, si for extraordinaria, e ordinariamente no dia marcado por estes estatutos.

§ 1º Os votos serão contados pelo numero de acções que cada um socio representar, dando cada acção direito a um voto.

§ 2º O gerente, além dos votos a que tiver direito por acções que possua, terá mais o numero de votos correspondente á sua quota de capital, como si fôra dividido em acções.

§ 3º Em todas as resoluções prevalecerá o que for decidido por maioria de votos, expressa pelo numero de acções, obrigando essas decisões aos socios divergentes e aos que não houverem comparecido á assembléa.

Art. 13. Nenhum socio, qualquer que seja a decisão da assembléa, será obrigado a receber em troca de suas acções, obrigações, titulos ou acções de qualquer outra sociedade ou companhia.

Paragrapho unico. No caso de resolver a assembléa geral qualquer transformação na organização da companhia, a cada socio cabe o direito de exigir o seu capital e lucros em moeda corrente, á vista de balanço e inventario.

Art. 14. A assembléa geral reunir-se-ha uma vez por anno, no dia 31 de julho, para exame e approvação de contas e eleição do conselho fiscal.

Art. 15. A assembléa geral extraordinaria poderá ser convocada pelo gerente, por qualquer membro effectivo do conselho fiscal, ou por qualquer numero do socios que represente, pelo menos, um quinto do capital social.

Paragrapho unico Não terão effeito as decisões de qualquer reunião da assembléa extraordinaria, si não tiver havido annuncios de convocação, com antecedencia de 15 dias.

Art. 16. Será presidida a assembléa geral ordinaria ou extraordinaria pelo socio commanditario que for nomeado pelos presentes á reunião.

TITULO V

INVENTARIO, BALANÇOS, FUNDO DE RESERVA E DIVIDENDOS

Art. 17. O anno social terminará em 31 de julho.

Art. 18. Um mez antes da reunião da assembléa geral ordinaria, annualmente, se procederá a inventario e balanço.

Art. 19. A distribuição de dividendos será feita annualmente sob indicação do gerente e parecer do conselho fiscal.

Art. 20. Dos lucros liquidos separar-se-ha a somma necessaria para attribuir ao capital realizado um juro annual até doze por cento, que será pago no mez do julho.

Paragrapho unico. Deduzidos do que restar em lucros tres por cento para constituir um fundo de reserva igual á terça parte do capital, distribuie-se-hão sessenta por cento dos ditos lucros aos proprietarios da patente de invenção, seus herdeiros ou representantes, e quarenta por cento a todos os socios relativamente á sua quota de capital.

TITULO VI

MODIFICAÇÃO NOS ESTATUTOS – DISSOLUÇÃO – LIQUIDAÇÃO

Art. 21. A assembléa geral dos socios, de accordo com o direito vigente, poderá fazer, quando o julgar conveniente, modificações nestes estatutos, dissolver antes do tempo fixado a sociedade, fundil-a em outra, vender o seu activo, decretar o modo e fórma da liquidação, proceder emfim como julgar mais conveniente aos seus interesses, respeitadas as prescripções legaes e resalvados todos os direitos dos proprietarios da patente e o que determina, o paragrapho unico do art. 13.

Art. 22. Em qualquer dos casos previstos no artigo anterior, em que se ponha termo á existencia da sociedade, cessará seu direito á exploração da patente, revertendo a mesma, sem restricção alguma, aos seus actuaes proprietarios ou a seus herdeiros e representantes.

Art. 23. No caso de liquidação e pago o capital, as sobras serão distribuidas na mesma proporção a que se refere a ultima parte do paragrapho unico do art. 20.

TITULO VII

DISPOSIÇÃO GERAL

Art. 24. Só a assembléa geral, em que estiverem representados dous terços do capital social, poderá autorizar qualquer operação da credito sob garantia real de bens moveis ou immoveis.

DISPOSIÇÕES TRANSITORIAS

Art. 25. O deposito de 10 % (dez por cento) do capital será depositado no Thesouro Nacional.

Art. 26. Fica o gerente investido dos poderes necessarios para cumprir as formalidades legaes inherentes á constituição da sociedade.

Rio de Janeiro, 27 de janeiro de 1892. – Ramiro Barcellos.

Sr. Vice-Presidente da Republica:

O art. 2º, n, 1 da lei n. 26 de 30 de dezembro proximo findo determinou ficarem pertencendo á Municipalidade do Districto Federal, além de outros serviços, os concernentes á Assistencia da Infancia Desvalida, a qual fôra regulada pelos decretos do Governo Provisorio ns. 439 de 31 de maio, n. 657 e 658 do 12 de agosto de 1890 e n. 1313 de 17 de janeiro de 1891, e se acha constituida até ao presente pelos educandos da Casa de S. José, pelo Asylo de Meninos Desvalidos, e pela vigilancia, das fabricas desta Capital em que trabalham menores, visto que ao Governo não foi ainda possivel dar a este ramo de serviço todo o desenvolvimento de que cogitou o primeiro dos citados decretos e que teria de comprehender a hospitalisação especial das crianças.

Emquanto, porém, a Municipalidade não estiver definitivamente organizada por lei, que pela affluencia dos trabalhos do Congresso Nacional na ultima sessão não foi dado concluir, tem o Governo o dever de superintender esse ramo administrativo, levada a despeza, em conformidade do que dispõe o paragrapho unico do art. 2º, n. 1, da dita lei n. 26, á conta do producto dos impostos especiaes a que se refere o art. 10 da lei n. 3386 de 24 de novembro de 1888, assistindo-lhe outrosim a faculdade de, quanto possivel, melhorar a instituição uma vez que as circumstancias assim o exijam.

Não obstante os actos acima citados, não houve derogação expressa do decreto n. 9274 de 6 de setembro de 1884, que dera regulamento ao Asylo de Mendicidade e em virtude do qual, segundo o § 1º do art. 1º, continuaram, com flagrante inconveniencia e até deshumanidade, a ser admittidos alli menores de 14 annos encontrados na rua em abandono ou em ociosidade. A simples menção deste facto mostra a urgente necessidade de ficar prohibida semelhante admissão, devendo os menores a que se allude ser recolhidos aos estabelecimentos de assistencia infantil, ainda que em secção especial, até que sejam reclamados mediante ordem da autoridade a cuja disposição tiverem estado.

Ao mesmo tempo, considerando na grande vantagem administrativa, economica e disciplinar que resultará da fusão dos dous referidos estabelecimentos: Casa de S. José, que não possue ainda edificio proprio e até ao presente não pôde pôr em pratica todas as disposições do respectivo regulamento, e Asylo de Meninos Desvalidos, situado em Villa Isabel;

Por outro lado, attendendo a que, em um paiz, como o nosso, em que, já pela riqueza natural, já pelo progresso humano, os industrias tendem a desenvolver-se por modo rapido e fecundo, é por certo lamentavel que jámais a Administração Publica haja curado seriamente da educação e ensino profissional das classes operarias e proletarias, as quaes continuam a procurar seu preparo, aliás insufficiente, em officinas particulares, onde não é possivel dar o aprendizado racional e completo das profissões, excepto quanto ao Lyceo do Artes e Officios, instituição de iniciativa particular, merecedora de todo e elogio e unico estabelecimento de tal genero, mas que, apezar dos grandes serviços prestados, não póde entretanto produzir todos os resultados que hoje exige, não só a Capital da União como toda a Republica;

Attendendo, além disso, a que um dos estabelecimentos da assistencia infantil, o Asylo de Meninos Desvalidos, pela benevolencia da administração publica, está desvirtuado de seus fins e por assim dizer convertido antes em casa de ensino do que de caridade, contra os intuitos de sua creação, existindo alli meninos que não são desamparados;

Finalmente, cabendo ao Governo, em conformidade do disposto no art. 35 n. 2 da Constituição Federal e no art. 4º lettra – D – da lei n. 23 de 30 de outubro de 1891, animar no paiz o desenvolvimento das lettras, artes e sciencias;

Tenho a honra de propor-vos:

I. A derogação do decreto n. 9274 de 1884, na parte a que me referi;

II. A fusão da Casa de S. José com o Asylo de Meninos Desvalidos, sob este ultimo nome, passando a funccionar no proprio nacional onde hoje está o Asylo em Villa Isabel, como instituição de caracter municipal, e reunindo-se em um só os patrimonios de ambos os estabelecimentos;

III. A conversão do actual Asylo de Meninos Dasvalidos em um instituto de educação profissional, dependente do Ministerio a meu cargo, como estabelecimento de ensino, sendo-lhe dado regulamento compativel com a indole de tal instituição, passando esse novo instituto a funccionar no palacio da Quinta da Boa-Vista, conservando o pessoal administrativo e docente, que for necessario, e transferida já para o estabelecimento novamente constituido uma parte dos educandos do asylo que se achem em condições de receber o aprendizado.

Esta medida poderia ser tomada desde já, com dependencia de approvação do Poder Legislativo na parte relativa á despeza, mantendo-se entretanto o instituto, emquanto não fossem votados os meios necessarios, com a quota do producto dos impostos da citada lei n. 3396 destinada a fazer face ás despezas com o estabelecimento supprimido.

Estas idéas acham-se consubstanciadas no decreto junto, que submetto á vossa apreciação.

Capital Federal, 30 de janeiro de 1892. – José Hygino Duarte Pereira.