DECRETO N. 835 - DE 11 DE OUTUBRO DE 1890

Approva as modificações feitas nos estatutos do Banco de Credito Real de Minas Geraes.

O Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação,

Attendendo ao que requereu, por sua directoria, o Banco de Credito Real de Minas Geraes, com séde na cidade de Juiz de Fóra, resolve approvar as seguintes alterações, feitas nos estatutos do dito Banco pela assembléa geral dos accionistas:

Substitua-se o art. 6º, que diz:

«O capital social é de 500:000$000, dividido em 2.500 acções de duzentos mil réis cada uma» - pelo seguinte:

«O capital social é de 3.000:000$000, dividido em 15.000 acções de duzentos mil réis cada uma, subordinando-se ao regimen creado pelos estatutos, quanto ao capital primitivo e a todas as clausulas organicas do banco.»

Substitua-se a seguinte parte do § 4º do art. 18, que diz:

«Os depositos assim recebidos não poderão exceder á metade do capital realizado, e não poderão ser retirados sem aviso previo de 60 dias» - pelo seguinte:

«Os depositos assim recebidos não poderão exceder á importancia do capital realizado, nem poderão ser retirados sem aviso previo de 60 dias.»

O Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Fazenda assim o faça executar.

Sala das sessões do Governo Provisorio, 11 de outubro de 1890, 2º da Republica.

Manoel deodoro da fonseca.

Ruy Barbosa.

Generalissimo - Ao presente decreto, que submettemos á vossa approvação, acompanha a nova tarifa que tem de regular nas Alfandegas e Mesas de rendas habilitadas da Republica a cobrança dos direitos de importação ou consumo dos generos estrangeiros entrados nos nossos mercados.

Não temos a presumpção de apresentar um trabalho perfeito.

Si em todas as producções do engenho humano nunca se consegue semelhante desideratum, muito menos em um trabalho de semelhante especie.

Em verdade, é tão complicado o mecanismo de uma tarifa aduaneira, tem ella de obedecer a tão differentes e algumas vezes contradictorias leis economicas, de sujeitar-se a tantos factos de ordem positiva, que nem é possivel satisfazer a todos os interesses em jogo, nem attender ás diversas modalidades dos serviços que se trata de regular.

Em economia politica consideram-se as tarifas aduaneiras em duas classificações principaes:

Livre - cambista.

Proteccionista.

Podem ainda as tarifas ser consideradas:

Fiscaes ou equilibristas.

Tomada a questão em abstracto, qual desses differentes systemas póde ser considerado o melhor?

E' assumpto no qual ha mais de um seculo trabalham os mais notaveis publicistas do mundo, sem nunca chegarem a uma solução satisfactoria do mundo, sem nunca chegarem a uma solução satisfactoria para tão ingente problema.

Em ambos os campos destacam-se contendores de igual pujança.

E a razão é que uma tarifa aduaneira não deve nem póde ser moldada em principios de escola, em leis abstractas; ella pertence ao numero dos factos de ordem positiva, que teem de obedecer em sua execução ás questões praticas que é chamada a resolver ou regular.

E sempre que qualquer das escolas economicas tem conseguido supplantar a outra impondo á sociedade as suas leis absolutas, temos visto os excessos destruirem os effeitos esperados, os resultados absurdos contrariarem e nullificarem os principios e opiniões emittidas.

Os excessos dos livre-cambistas produziram o nosso systema fiscal, repousando unicamente sobre a renda das Alfandegas; encerrando a riqueza nas mãos dos senhores da terra, que tinham o monopolio do café; matando a industria e privando o paiz da classe industrial, que não podia medrar em tal meio asphyxiante, e que tanta falta nos tem feito no mecanismo politico da sociedade.

Isto para expor um exemplo de casa.

Os absurdos dos proteccionistas produziram os autos de fé, as fogueiras consumindo as mercadorias, a guerra das tarifas, o odio e o ciume entre as Nações.

De um lado diz-nos o eminente economista Rossi: «O livre cambio é o unico principio que a theoria deve autorizar. O regimen prohibitivo perecerá, porém, pelo suicidio, perecerá pelos seus proprios excessos. No dia em que um dos grandes Estados productores entrar francamente nas vias da liberdade, o regimen prohibitivo receberá algures, pela força mesma das cousas, um golpe mortal.»

De outro lado temos opiniões autorizadas que pensam que - «Si o reinado da liberdade commercial universal deve vir um dia, esse dia está ainda afastado.»

Os Estados Unidos constituem debaixo das nossas vistas, graças á protecção, um immenso poder industrial; a Russia é votada ao systema restrictivo; a Austria-Hungria, a Hespanha, a Italia e a Suissa levantam suas tarifas, etc.

Como resolver a questão?

E' applicar as leis do systema á ordem pratica dos factos, estudados cada um de per si em suas circumstancias especiaes.

Quanto a nós, sem pôr em pratica um proteccionismo exaggerado que podia trazer grande diminuição na renda das Alfandegas, transtornos no proprio desenvolvimento das industrias, perturbações em nossas relações commerciaes com os paizes estrangeiros, devemos no emtanto, por um protecção lenta a applicada com criterio em cada caso, e estudada em seus effeitos, ir preparando a industria nacional para poder, em epoca mais, ou menos proxima, produzir de modo a equilibrar a balança da permuta commercial e a substituir lentamente o nosso systema fiscal, creando as rendas internas muito mais consentaneas com os principios da economia politica do que as de origem aduaneira.

Tratemos de passar de um paiz exclusivamente consumidor para um paiz productor.

O nosso grande erro tem sido applicar ao Estado em grande escala o systema em geral seguido pelos nossos ricos cultivadores. Produzir muito café, tratar exclusivamente do café, ainda que tenham de comprar tudo o mais, inclusive os generos de primeira necessidade, que com facilidade poderiam produzir.

E é preciso dizer aqui que o desenvolvimento da industria não é sómente para a Nação uma questão economica; é, mais do que tudo, uma questão politica.

No regimen decahido, todo de exclusivismo e privilegio, a Nação, com toda a somma de actividade social, pertencia a classes ou familias dirigentes.

Tal systema não permittia a creação de uma democracia intelligente e independente, que pudesse perturbar a posse mansa e pacifica do poder, que constituia para os privilegiados uma verdadeira exploração.

Não assim o systema republicano.

A Republica se consolidará entre nós em bases seguras, quando o seu funccionamento repousar sobre a democracia do trabalho industrial, peça necessaria no mecanismo do systema, que trará o equilibrio conveniente para o seu regular funccionamento.

Foram estas, Generalissimo, as idéas capitaes nas quaes foi moldada a tarifa que temos a honra de apresentar á vossa alta consideração.

Essa tarifa, sem obedecer em absoluto a qualquer dos systemas de escola, procura, entre todos elles, um verdadeiro equilibrio, no qual, como principio fundamental, são respeitados os interesses do fisco, do commercio e da industria no estado a que essas actividades sociaes se encontram no paiz presentemente.

Reunidos no Thesouro todos os dados existentes, foi nomeada uma commissão composta de empregados competentes em semelhante assumpto para o estudo desses dados e organização da tarifa.

Preparado e impresso em fórma de projecto o resultado desse trabalho, foi distribuido largamente pelos interessados, aos quaes foi dado um longo prazo para a apresentação de suas reclamações.

As reclamações apresentadas foram ainda objecto de acurada analyse, sendo algumas attendidas por seus fundamentos, outras rejeitadas por improcedentes.

Os motivos e fundamentos das alterações que soffreram os diversos artigos da tarifa e o estudo das reclamações apresentadas constam, detida e minuciosamente, dos relatorios que foram apresentados pelos funccionarios nomeados em commissão para estudarem o assumpto.

Esses relatorios serão publicados no Diario Official, acompanhando o presente decreto.

Capital Federal, 11 de outubro de 1890. - Ruy Barbosa.