DECRETO N. 948 - DE 5 DE NOVEMBRO DE 1890

Crêa uma brigada de artifices militares.

O Generalissimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, reconhecendo a necessidade de dar melhor organização á classe dos artifices embarcados, garantindo o seu futuro e melhorando um pouco o vencimento de cada um, para não sobrecarregar o orçamento, e considerando ao mesmo tempo que esta reforma tinha de ser feita de harmonia com as recentemente realizadas na marinha; resolve crear uma brigada de artifices militares, observando-se o incluso regulamento assignado pelo Vice-Almirante Eduardo Wandenkolk, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Marinha, que assim o fará executar.

Sala das sessões do Governo Provisorio, 5 de novembro de 1890, 2º da Republica.

Manoel Deodoro DA Fonseca.

Eduardo Wandenkolk.

Regulamento para a brigada de artifices militares a que se refere o decreto n. 948 desta data

CAPITULO I

DA ORGANIZAÇÃO E FINS DA BRIGADA

Art. 1º Os carpinteiros, calafates, serralheiros e caldeireiros de cobre, actualmente embarcados, e os que de futuro o forem, formarão a brigada de artifices militares, destinados especialmente a servir como operarios a bordo dos navios da Armada Nacional.

Art. 2º O Quartel General fixará annualmente (mez de dezembro) o quadro da brigada, segundo as necessidades do serviço, tendo em vista o numero de navios em completo armamento e os em via de o completarem.

Este quadro será dividido em tres classes: 1ª, 2ª e 3ª

Art. 3º Os artifices militares executarão a bordo todos os serviços e trabalhos inherentes ás suas artes ou officios, dentro dos limites de suas habilitações, conforme os elementos de que dispuzerem.

Art. 4º Na hierarchia militar serão os artifices equiparados:

Os de 1ª classe, aos mestres;

Os de 2ª classe, aos contramestres;

Os de 3ª classe, aos guardiães.

Serão, porém, sempre considerados inferiores aos officiaes marinheiros, quer em serviço ou fóra delle, e nas relações officiaes.

Art. 5º Os artifices militares arrancharão com os officiaes de prôa, e entre estes terão alojamento.

Art. 6º Ficam directamente subordinados ao chefe do estado-maior general, como chefe que é de todo o pessoal de embarque.

Art. 7º Quando desembarcados, a residencia dos artifices militares será a Capital Federal.

Art. 8º Serão nomeados por portaria do Ministro da Marinha, mediante proposta do chefe do estado-maior general.

Art. 9º Contarão tempo de serviço, antiguidade e perceberão vencimentos da data em que se apresentarem ao chefe do estado-maior general, que lhes dará posse de seus empregos.

Art. 10. Sempre que for possivel, o pessoal da brigada de artifices militares será escolhido entre os operarios do quadro ordinario e do de extranumerarios dos arsenaes de marinha da Republica.

Art. 11. Nos navios de 1ª e 2ª classes embarcarão os artifices de 1ª classe, e só por excepção ou falta absoluta destes se dará em taes navios embarque aos das demais classes, sendo que, em caso algum, poderão os artifices de 3ª classe embarcar em navios de 1ª classe.

Art. 12. O Quartel General fixará a lotação de artifices militares para os navios da Armada, attendendo ás suas classes.

Art. 13. Os navios em desarmamento ou em disponibilidade não terão na sua lotação artifices militares.

Art. 14. A bordo dos navios em que não embarcarem calafates as obrigações destes ficarão a cargo dos carpinteiros.

Art. 15. O artifice militar que entrar para o quadro, e que, designado para embarque que lhe compita, delle desistir, será declarada de nenhum effeito a sua nomeação;

Art. 16. As remoções ou substituições de uns para outros embarques serão feitas attendendo-se á escala do serviço, baseado no direito de antiguidade dos mais folgados, competindo sempre aos mais antigos o direito de primeiro serviço.

Art. 17. Os artifices militares usarão do uniforme que por lei lhes for marcado.

Art. 18. A ferramenta e mais utensilios de que carecerem para a execução de seus trabalhos ser-lhes-ha fornecida pelo Estado, mediante as garantias e cautelas de que trata o art. 30 do decreto n. 4542 A de 30 de junho de 1870.

Art. 19. Os artifices militares são responsaveis pelo estrago, perda e desvio das ferramentas que lhes forem confiadas, e obrigados a indemnizar o respectivo custo por meio de descontos em seus vencimentos.

CAPITULO II

DA ADMISSÃO AO SERVIÇO

Art. 20. Depois de organizada a brigada de artifices militares, ninguem poderá ser admittido sinão na 3ª classe, mostrando previamente:

1º Que é cidadão brazileiro e está no gozo de seus direitos civis e politicos, o que será comprovado com documento proprio (folha corrida no civel e no crime);

2º Que é maior de 18 e menor de 25 annos, o que impreterivelmente será provado com certidão de idade;

3º Que tem a necessaria robustez para a vida do mar, o que será julgado por junta de saude;

4º Que sabe ler e escrever correctamente, arithmetica até fracções e systema metrico decimal;

5º Que conhece perfeitamente a sua arte ou officio.

Art. 21. As provas de habilitação serão prestadas perante uma commissão examinadora, composta, conforme o officio do artifice militar, de um ajudante da directoria de construcções ou machinas e de dous mestres das mesmas officinas e do escrevente da direcforia, que servirá de secretario.

§ 1º O ajudante da directoria conhecerá e julgará, além da habilitação profissional do candidato, as de que trata o § 4º do artigo precedente, cabendo aos mestres sómente o conhecimento e julgamento severo da aptidão artistica.

§ 2º a commissão, segundo o merito artistico do candidato, o julgará, no termo que do exame lavrar, e que, pelos tramites legaes, remetter ao chefe do estado-maior general, habilitado ou não para pertencer á brigada de artifices militares.

§ 3º Conjunctamente com este termo, apresentará o chefe do estado-maior general a proposta da nomeação do candidato habilitado.

Art. 22. Serão sempre preferidos para a admissão na brigada de artifices militares os operarios do quadro ordinario dos arsenaes de marinha da Republica, aos quaes se dispensarão as provas de aptidão exigidas por este regulamento; ficando, entretanto, subentendido, que a admissão será sempre na 3ª classe, seja qual for a classe do operario do arsenal.

Art. 23. Os operarios dos arsenaes de marinha da Republica que se alistarem na brigada de artifices militares serão eliminados do respectivo quadro.

§ 1º Perdem o direito á pensão que lhes confere o decreto n. 745 de 12 de setembro deste anno, sendo por isso indemnizados da importancia das contribuições com que houverem concorrido para o respectivo monte de pensões.

Art. 24. O tempo de serviço que houverem prestado naquelles estabelecimentos ser-lhes-ha, pelo modo marcado no citado decreto de 12 de setembro do corrente anno, contado como util para a reforma de que trata este regulamento.

Art. 25. Fica subentendido que para os operarios dos arsenaes, que pretendam alistar-se na brigada de artifices militares, subsiste a condição de idade marcada no § 2º do art. 20 deste regulamento.

CAPITULO III

DAS PROMOÇÕES E REMUNERAÇÕES

Art. 26. As vagas do quadro da brigada de artifices militares serão graduaes e successivas da classe menor para a de maior categoria.

Art. 27. Nenhuma promoção será feita entre os artifices militares sem que o candidato se submetta a exame profissional, prestado pelo modo indicado no art. 21, para provar a sua aptidão e, portanto, o direito ao accesso que pretender.

Art. 28. Além do exame obrigatorio de que trata o artigo anterior e que será, por intermedio do Ministro da Marinha, requisitado pelo chefe do estado-maior general á Inspectoria do arsenal, para o preenchimento das vagas da brigada de artifices militares, se attenderá na promoção ás seguintes condições de merecimento:

1ª Maior tempo de embarque;

2ª Desempenho irreprehensivel de deveres, probidade e zelo pelo serviço;

3ª Aptidão profissional, provada por trabalhos extraordinarios;

4ª Boa conducta civil e militar.

Art. 29. As vagas serão preenchidas, guardada a disposição do art. 27, dous terços por merecimento e um terço por antiguidade.

Art. 30. A reforma e todas as vantagens de que gozam actualmente os officiaes marinheiros da Armada, são extensivas aos artifices militares.

Para os effeitos da reforma, licenças, etc. considerar-se-ha dous terços do vencimento como soldo ou ordenado e um terço como gratificação.

Art. 31. São obrigados a contribuir com um dia de vencimento para o Asylo de Invalidos, afim de poderem utilisar-se dos beneficios dessa instituição.

Art. 32. Os que tiverem 15 annos de serviço effectivo na Armada só poderão ser demittidos em virtude de sentença condemnatoria.

Art. 33. Os que contarem mais de 30 annos de serviço na Armada serão reformados com todo o vencimento.

Art. 34. Os artifices militares, presos por qualquer circumstancia, não ficam por isso inhibidos do desempenho de suas obrigações.

CAPITULO IV

DISPOSIÇÕES PENAES

Art. 35. Os artifices militares ficam sujeitos á disciplina militar e á penalidade criminal que vigora na Armada; sendo, porém, isentos dos castigos de ferros, prisão no porão, prisão solitaria e golilha.

Estas penas serão substituidas pelas seguintes: prisão no alojamento, no camarote, privação de licença, descontos nos vencimentos, que não excederão, em caso algum, de um terço em cada mez.

Art. 36. Os artifices militares que tiverem conducta irregular, forem indisciplinados e se mostrarem inhabeis no seu officio ou arte, serão demittidos, com impossibilidade de readmissão no quadro, si não tiverem completado os 15 annos de serviço, de que trata o art. 32, e, si os tiverem attingido ou excedido, reformados administrativamente.

Art. 37. Os artifices militares accusados de deshonestos e immoraes serão submettidos a conselho de guerra, e, verificada a accusação e condemnados consequentemente, serão, depois de cumprida a sentença, eliminados do quadro, seja qual for o tempo que tenham de serviço.

CAPITULO V

DOS VENCIMENTOS

Art. 38. Os artifices militares terão os vencimentos marcados na tabella annexa a este regulamento.

Art. 39. Quando desembarcados, por motivo alheio á sua vontade, perceberão dous terços do seu vencimento de embarque e ficarão addidos ás officinas dos arsenaes, cujos trabalhos coadjuvarão.

Art. 40. Aos artifices militares ficam extensivos os favores e vantagens concedidos nas tabellas que baixaram com o decreto n. 4885 de 5 de fevereiro de 1872 aos officiaes marinheiros, ex vi do decreto n. do corrente mez.

CAPITULO VI

DISPOSIÇÕES COMPLEMENTARES

Art. 41. Na organização da brigada de artifices militares serão aproveitados os actuaes carpinteiros, calafates, serralheiros e caldeireiros de cobre, de embarque, que maior tempo de serviço tiverem e que melhores notas apresentarem do seu bom procedimento civil e militar, e das suas aptidões profissionaes.

Serão escolhidos os mais habeis e classificados por ordem de antiguidade nas respectivas classes.

Art. 42. Nesta organização fica dispensado o exame de habilitação e proficiencia para a promoção que porventura se tenha de fazer.

Art. 43. O reconhecimento dos serviços e classificação dos artifices militares será feito por uma commissão composta de tres commandantes de navios, nomeados livremente pelo quartel-general, e de ajudantes das directorias competentes do Arsenal de Marinha desta capital, designados pelo Ministro da Marinha.

Art. 44. Aos operarios dos arsenaes de marinha, actualmente embarcados como carpinteiros, calafates, serralheiros e caldeireiros de cobre, que quizerem se alistar na brigada de artifices militares, são applicaveis as disposições do art. 23 deste regulamento; áquelles, porém, que preferirem voltar para os arsenaes, ser-lhes-ha garantido, no quadro da officina a que pertencerem, o respectivo logar.

Art. 45. Na 1ª secção do quartel-general será creado o livro-mestre de assentamentos dos artifices militares, o qual será escripturado pelo mesmo modo por que o é o dos officiaes marinheiros.

Art. 46. Na falta de pessoal da brigada de artifices militares, poderá o Governo contractar, temporariamente, para o serviço, calafates, carpinteiros, caldeireiros de cobre e serralheiros, satisfazendo os contractados as provas de capacidade exigidas por este regulamento.

Art. 47. Os contractos, que serão effectuados no quartel-general, especificarão a classe, vencimentos do engajado e sujeição ás leis penaes e do processo em vigor, contribuição para o asylo e a duração do engajamento.

Art. 48. Nenhum contracto será celebrado por tempo menor de um anno.

Art. 49. Os artifices contractados gozarão, durante o tempo do seu engajamento, de todas as vantagens e vencimentos concedidos aos de igual classe da brigada.

Art. 50. Ficam revogadas as disposições em contrario.

Capital Federal, 5 de novembro de 1890. - Eduardo Wandenkolk.

Tabella dos vencimentos dos artifices militares da Republica

Designação

 Classes

 

 Annualmente - Republica

 

 

 

Carpinteiros e calafates...............................................

1:400$000

1:200$000

1:000$000

Serralheiros..................................................................

1:700$000

1:500$000

1:300$000

Caldeireiros de cobre...................................................

1:700$000

1:500$000

1:300$000

Em paiz estrangeiro

 

 

 

Carpinteiros e calafates...............................................

1:800$000

1:550$000

1:300$000

Serralheiros..................................................................

2:200$000

1:950$000

1:700$000

Caldeireiros de cobre...................................................

2:200$000

1:950$000

1:700$000

Mensalmente - Republica

 

 

 

Carpinteiros e calafates...............................................

116$666

100$000

83$333

Serralheiros..................................................................

141$666

125$000

108$333

Caldeireiros de cobre...................................................

141$000

125$000

108$333

Paiz estrangeiro

 

 

 

Carpinteiros e calafates...............................................

150$000

129$166

108$333

Serralheiros..................................................................

183$333

162$333

141$666

Caldeireiros de cobre................................................

183$333

162$333

141$666

Observação

Além dos vencimentos designados nesta tabella teem os artifices militares, quando embarcados, direito ao abono da ração diaria.

Capital Federal, 5 de novembro de 1890. - Eduardo Wandenkolk.