DECRETO N. 987 - DE 8 DE NOVEMBRO DE 1890
Concede a João Carlos de Mendonça Furtado e outros autorização para organizarem uma sociedade anonyma sob a denominação de Companhia Agricola e Manufactora Brazileira
O Marechal Manoel Deodorod a Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, attendendo ao que requereram João Carlos de Mendonça Furtado, Antonio José Bastos, Francisco Silverio de Oliveira e Antonio Tertuliano dos Santos, resolve conceder-lhes autorização para organizarem uma sociedade anonyma sob a denominação de Companhia Agricola e Manufactora Brazileira e com os estatutos que apresentaram; não podendo, porém, constituir-se definitivamente sem preencher as formalidades exigidas pela legislação em vigor.
O Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o faça executar.
Sala das sessões do Governo Provisorio, 8 de novembro de 1890, 2º da Republica.
Manoel Deodoro DA Fonseca.
Francisco Glicerio.
Estatutos da Companhia Agricola Manufactora Brazileira a que se refere o decreto n. 987 desta data.
CAPITULO I
TITULOS, SÉDE, FINS, DURAÇÃO E REGIMENTO DA COMPANHIA
Art. 1º Com a denominação de Companhia Agricola e Manufactora Brazileira, fica fundada nesta cidade do Rio de Janeiro, Capital Federal dos Estados Unidos do Brazil, onde será sua séde, uma sociedade anonyma, cujo fim é tratar da cultura do trigo, do açafrão, do linho, das frutas européas, e de todos os cereaes, assim como do aproveitamento da folha e haste do trigo para o fabrico do papel, da exploração das madeiras de lei de suas fazendas e da moagem do trigo e manufacturagem de massas alimenticias, tornando-se por isso a companhia agricola e industrial, e assim explorando e commerciando francamente em tudo que diz respeito a esses dous ramos.
Art. 2º O prazo de duração da companhia será de 30 annos, podendo ser prorogado pela assembléa geral que deliberará, bem como sobre a liquidação ou dissolução.
Art. 3º A companhia se regerá pelos presentes estatutos e, nos casos omissos, pelas disposições do decreto n. 164 de 17 de janeiro de 1890 que reforma a lei de 4 de novembro de 1882.
CAPITULO II
DO CAPITAL, MODO DE O REALIZAR, E SEU AUGMENTO
Art. 4º O capital da companhia é de 1.000:000$ representados por 5.000 acções de 200$ cada uma.
Art. 5º O capital será realizado pela seguinte fórma; 10% no acto da assignatura dos presentes estatutos e o restante em chamadas de 10 a 20%, a juizo da directoria, com intervallos nunca menores de 30 dias.
Art. 6º O capital da companhia poderá ser elevado até 10.000:000$, de conformidade com as necessidades da companhia e a bem de seu desenvolvimento e interesses.
Paragrapho unico. Dado o augmento de capital terão os accionistas preferencia na subscripção das acções em relação ao numero das que possuirem.
CAPITULO III
DO FUNDO DE RESERVA E DIVIDENDOS
Art. 7º O fundo de reserva formar-se-ha por quotas de 10% que serão retiradas dos lucros liquidos semestraes.
Paragrapho unico. Cessará a deducção de 10% dos lucros para o fundo de reserva desde que este tenha attingido a somma correspondente á metade do capital.
Art. 8º O fundo de reserva será empregado em apolices da divida federal dos Estados ou quaesquer outros titulos reputados seguros e garantidos e no resgate de quaesquer emprestimos.
Paragrapho unico. Os juros do fundo de reserva accrescerão ao mesmo fundo.
Art. 9º A distribuição dos dividendos effectuar-se-ha no fim de cada semestre com o resultado dos lucros liquidos desse semestre, depois de deduzida a porcentagem destinada ao fundo de reserva.
§ 1º Não se fará distribuição de dividendos emquanto achar-se desfalcado o capital.
§ 2º Serão considerados como renunciados em favor da companhia os dividendos não reclamados no prazo de dous annos e por isso levados ao fundo de reserva.
CAPITULO IV
DOS ACCIONISTAS E DAS ACÇÕES
Art. 10. São accionistas os possuidores de uma ou mais acções inscriptas no livro do registro da companhia.
Art. 11. A responsabilidade dos accionistas é limitada ao valor de suas acções.
Art. 12. Cada acção é indivisivel; si o seu valor pertencer a dous ou mais individuos, sómente um destes designado pelos outros poderá exercer direito em virtude della.
Art. 13. As acções são nominativas e transferiveis por termo nos livros da companhia, com assignatura dos transferentes e adquirentes ou seus bastantes procuradores.
Art. 14. O accionista que não realizar as entradas de suas acções dentro dos prazos marcados, ou com a multa de 10% no prazo supplementar de 30 dias, perderá em beneficio da companhia a importancia das entradas que já houver realizado, sendo essa importancia levada a fundo de reserva e as acções declaradas em commisso.
§ 1º As acções assim declaradas em commisso serão substituidas por outras de igual numeração e emittidas novamente.
§ 2º Fica todavia salvo á companhia o direito de compellir judicialmente o accionista remisso a solver a responsabilidade que lhe compete na referida qualidade de accionista.
CAPITULO V
DA ADMINISTRAÇÃO DA COMPANHIA
Art. 15. A companhia será administrada por uma directoria de quatro membros, sendo: um presidente, um secretario, um thesoureiro e um gerente que servirão por tres annos e poderão ser reeleitos.
Art. 16. Os directores serão eleitos em assembléa geral de accionistas representando dous terços do capital da companhia, dentre os accionistas que então possuirem 50 ou mais acções e reunirem por escrutinio secreto maioria de votos, sendo que no caso de empate decidirá a sorte.
Art. 17. Para que os directores entrem no exercicio de seus cargos caucionarão no livro de registro da companhia 50 acções cada um.
§ 1º As acções assim caucionadas são consideradas inalienaveis emquanto durar o mandato dos directores e emquanto não forem approvadas as respectivas contas da companhia por sua assembléa geral.
§ 2º Si dentro de 30 dias, a contar da data da eleição, não for effectuada a referida caução, considerar-se-ha vago o logar do director remisso.
Art. 18. Por morte ou renuncia de qualquer membro da directoria, os directores restantes e o conselho fiscal designarão para substituil-o um accionista que possua 50 ou mais acções e que as caucione na fórma do artigo antecedente, afim de entrar em exercicio até que a primeira assembléa geral ordinaria preencha a vaga.
§ 1º No caso de impedimento justificado de qualquer dos directores, os restantes escolherão dentre si aquelle que, durante esse impedimento, o deva substituir.
§ 2º Si vagarem dous logares, será immediatamente convocada a assembléa geral para preencher as vagas.
Art. 19. Os directores reunir-se-hão em sessão todas as quinzenas de cada mez ou quando o conselho fiscal os convocar, deliberando por maioria de votos e cabendo ao presidente, no caso de empate, o voto de qualidade. Do resultado, de suas reuniões lavrarão actas em livro proprio e assignadas pelos membros presentes.
§ 1º O director que tiver interesse opposto ao da companhia não poderá votar, nem tomar parte na deliberação, sendo obrigado a fazer o necessario aviso aos outros directores, lavrando-se declaração disso na acta da sessão.
§ 2º Os directores poderão nomear agentes que os auxiliem na gestão diaria dos negocios da companhia, responsabilisando-se por seus actos.
Art. 20. Compete á directoria:
§ 1º Velar pela fiel execução dos estatutos, cumprindo e fazendo cumprir as suas clausulas, bem como executar as deliberações da assembléa geral.
§ 2º Nomear e demittir livremente os empregados da companhia, marcando-lhes os vencimentos e a fiança dos que devam prestal-a, bem como organizar o regulamento de suas attribuições e o regimento interno da companhia.
§ 3º Fazer a chamada dos capitaes, decretar o commisso das acções, promover a responsabilidade dos accionistas remissos, organizar annualmente o balanço, as contas e o relatorio, e apresental-o á assembléa geral acompanhado do parecer do conselho fiscal, e fixar e distribuir semestralmente o dividendo depois de ouvido o conselho fiscal.
§ 4º Celebrar contractos de que provenham direitos e obrigações para a companhia, saccar e acceitar letras, fazer transacções e concordatas, demandar e ser demandada, dar poderes especiaes e illimitados para conciliações no juizo de paz. Transigir, renunciar direitos, hypothecar ou empenhar bens sociaes, contrahir obrigações, alienar bens e direitos, arrendar, construir ou comprar predios, terras, terrenos, fazendas, machinismos, accessorios e tudo que for necessario á companhia.
§ 5º Escolher o banco para a companhia depositar em conta corrente as sommas disponiveis.
§ 6º Representar a companhia em juizo ou fóra delle, por si ou por seus procuradores.
§ 7º Exercer finalmente livre e geral administração, para o que lhe são conferidos illimitados poderes.
Art. 21. Ao presidente compete:
§ 1º Executar as deliberações tomadas pela directoria.
§ 2º Assignar os balancetes e balanços que houverem de ser publicados, as acções emittidas e as cautelas provisorias.
§ 3º Autorizar os pagamentos para o custeio da companhia e visar os cheques assignados pelo director thesoureiro.
§ 4º Convocar a assembléa geral dos accionistas na epoca marcada e as extraordinarias quando lhe forem competentemente requeridas ou quando a directoria entender conveniente.
§ 5º Presidir as reuniões da directoria e os trabalhos preparatorios das assembléas geraes até á installação da mesa eleita ou acclamada.
Art. 22 Ao secretario compete:
§ 1º Substituir o presidente ou thesoureiro em seus impedimentos.
§ 2º Redigir as actas das sessões da directoria.
§ 3º Abrir, encerrar e rubricar os livros de actas da directoria, do conselho fiscal e das assembléas geraes.
§ 4º Manter em boa ordem a escripturação e archivo da companhia.
§ 5º Assistir á transferencia de acções, assignando o termo respectivo.
Art. 23. Ao thesoureiro compete:
§ 1º Substituir ao secretario em seus impedimentos transitorios e ao presidente na falta do secretario.
§ 2º Ter sob sua guarda os dinheiros, valores e titulos da companhia; recebel-os e passar os competentes recibos.
§ 3º Effectuar os pagamentos autorizados.
§ 4º Assignar os recibos para o movimento da conta corrente com os estabelecimentos bancarios e depositar nelles os dinheiros da companhia.
Art. 24. Ao gerente compete:
§ 1º Dirigir todas as secções da companhia, fiscalizando e determinando os seus trabalhos.
§ 2º Organizar as folhas de pagamento ao pessoal da companhia e effectuar o pagamento depois do visto do thesoureiro.
§ 3º Apresentar relatorios e estudo sobre quaesquer melhoramentos ou alterações a fazer a beneficio da companhia.
§ 4º Exercer finalmente livre gerencia, de accordo com os demais directores.
CAPITULO VI
DO CONSELHO FISCAL
Art. 25. O conselho fiscal é composto de tres membros effectivos e de tres supplentes eleitos annualmente dentre os accionistas.
§ 1º A eleição é feita como a dos directores por escrutinio secreto e maioria de votos em assembléa geral de accionistas que representem dous terços do capital.
§ 2º Os accionistas supplentes só funccionarão na falta ou impedimento dos effectivos.
§ 3º Esgotada a lista dos supplentes, a substituição será feita por acto do presidente da Junta Commercial a requerimento da directoria, como preceitua a lei.
§ 4º Na primeira reunião que o conselho celebrar, elegerá o seu presidente e secretario.
§ 5º O conselho fiscal póde funccionar com dous de seus membros.
Art. 26. Compete ao conselho fiscal:
§ 1º Dar parecer sobre os negocios que a directoria submetter o seu estudo, assistir ás reuniões da directoria, quando seja por ella convocada, assim como convocar a directoria, quando entender conveniente.
§ 2º Examinar no escriptorio da companhia os livros, documentos e caixa para formular parecer sobre as contas da administração, a tempo de ser apresentado á assembléa geral ordinaria.
§ 3º Exercer finalmente todas as attribuições que, por lei, lhe são conferidas.
CAPITULO VII
DA ASSEMBLÉA GERAL DE ACCIONISTAS
Art. 27. A assembléa geral é a reunião de accionistas habilitados, em numero legal e regularmente convocada.
§ 1º Consideram-se accionistas habilitados os que possuirem acções inscriptas no registro da companhia com antecedencia de 30 dias da assembléa geral.
§ 2º Os accionistas que tiverem menos de dez acções e os que as possuirem sem a inscripção feita 30 dias antes da assembléa geral, poderão fazer numero e discutir, mas não poderão votar.
§ 3º E' numero legal o de accionistas que representem um quinto do capital social nos casos geraes, e dous terços nos casos especiaes.
Art. 28. São casos especiaes: 1º augmento do capital, 2º reforma dos estatutos, 3º prorogação do prazo social e 4º dissolução e liquidação da companhia durante o prazo de sua duração.
Art. 29. A convocação é feita pela imprensa por annuncios repetidos da directoria com antecedencia de 15 dias, tratando-se de reunião ordinaria; e de cinco a oito dias nos demais casos, guardadas as normas do art. 15 do decreto de 17 de janeiro de 1890.
§ 1º A convocação é sempre motivada.
§ 2º Em qualquer reunião podem ser apresentadas quaesquer propostas, mas só se vota sobre o objecto da ordem do dia; salvo, tratando-se de proposta da directoria ou do conselho fiscal alheia aos casos do art. 28, a qual poderá ser logo discutida e votada, sendo a reunião ordinaria.
Art. 30. A assembléa geral ordinaria terá logar no mez de fevereiro de cada anno.
Art. 31. A reunião extraordinaria terá logar quando a directoria julgar conveniente ou lhe for competentemente requisitada.
Paragrapho unico. São competentes para requisitar uma assembléa geral extraordinaria o conselho fiscal ou accionistas em numero de sete, representando um quinto do capital social.
Art. 32. A reunião ordinaria tem por objecto principal a apresentação, discussão e deliberação sobre o relatorio e contas da directoria e parecer do conselho fiscal, bem como a eleição do mesmo conselho e seus supplentes e dos membros da directoria.
Art. 33. A reunião extraordinaria tem por objecto o que a motivou.
Art. 34. As deliberações são tomadas por maioria de votos, tendo o presidente voto de qualidade no caso de empate.
§ 1º A votação é feita per capita ou por acções, quando assim for reclamado por qualquer accionista.
§ 2º As eleições são sempre feitas por escrutinio secreto.
§ 3º Cada accionista tem um voto por 10 acções, mas seja qual for o numero de acções não terá mais de 30 votos.
§ 4º Os accionistas teem o direito de se fazer representar por procuração, comtanto que esta seja passada a outro accionista e que este apresente a procuração a qualquer membro da directoria antes da assembléa geral.
Art. 35. Os directores e fiscaes não podem votar sobre suas contas e pareceres.
Art. 36. A assembléa é presidida por um accionista acclamado na occasião ou por eleição quando seja reclamado por tres ou mais accionistas.
Paragrapho unico. O presidente acclamado ou eleito convidará immediatamente dous accionistas para 1º e 2º secretarios ficando assim constituida a mesa da assembléa.
Art. 37. Compete á assembléa geral:
§ 1º Deliberar sobre as contas da directoria, nomear seu presidente e eleger os directores e membros do conselho fiscal effectivos e supplentes.
§ 2º Resolver finalmente todos os negocios da companhia, sem outra limitação mais do que a estabelecida em preceitos imperativos ou prohibitivos dos estatutos e da lei.
Art. 38. As deliberações da assembléa geral obrigam a todos os accionistas, ainda que ausentes ou dissidentes.
CAPITULO VIII
DISPOSIÇÕES GERAES E TRANSITORIAS
Art. 39. O anno social terminará em 31 de dezembro.
Art. 40. Fica desde já a directoria da companhia autorizada a, de accordo com o conselho fiscal, contrahir emprestimos por obrigações de preferencia (debentures) e bem assim fazer acquisição de quaesquer fabricas, officinas ou engenhos centraes de canna, com garantia de juros ou sem ella.
Art. 41. Serão directores da companhia durante os seis primeiros annos os seguintes accionistas:
Francisco Silverio de Oliveiva, director-gerente;
Antonio José Bastos, director-presidente;
João Carlos de Mendonça Furtado, director-secretario;
Antonio Tertuliano dos Santos, director-thesoureiro.
Paragrapho unico. O director-gerente perceberá o honorario annual de 12:000$, e os demais directores o de 8:000$, pagaveis em prestações mensaes a cada um.
Art. 42. Serão membros effectivos do conselho fiscal durante o primeiro anno os seguintes accionistas:
Carlos Gaspar da Silva;
Manoel Cardoso Pereira;
Eugenio Mariz.
Paragrapho unico. Os membros effectivos do conselho fiscal perceberão o honorario annual de 1:200$ pagos em prestações mensaes a cada um.
Art. 43. Serão supplentes do mesmo conselho fiscal os seguintes accionistas:
João Teixeira Machado;
Casimiro Viguier;
Joaquim Martins da Silva Lima.
Art. 44. Os accionistas acceitam e approvam os presentes estatutos em todas as suas partes e se obrigam a cumpril-os, em prova do que os subscrevem.
Rio de Janeiro, 18 de outubro de 1890. - João Carlos de Mendonça Furtado. - Francisco Silverio de Oliveira. - Antonio Tertuliano dos Santos. - Antonio José Bastos.