DECRETO N. 1036 B - DE 14 DE NOVEMBRO DE 1890
Concede ao Banco Colonial do Brazil e a Arthur Ferreira Torres autorização para organizarem uma companhia com a denominação de Banco de Credito Popular do Brazil.
O Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação,
Considerando que a creação ora solicitada ao Governo Provisorio, corresponde a uma das mais imperiosas necessidades sociaes, preenchendo entre as nossas instituições bancarias, uma lacuna deploravel, qual a que se traduz pela ausencia de estabelecimentos de credito popular;
Considerando que esses estabelecimentos, em todos os paizes onde ha verdadeira intelligencia das necessidades das classes laboriosas, exprimem um dos elementos mais activos da civilização contemporanea, e constituem um dos factores mais poderosos da riqueza publica;
Considerando que elles exercem na economia da vida nacional uma funcção inestimavel como promotores dos sentimentos de previdencia, economia e amor do trabalho, accumulando, multiplicando e distribuindo em beneficios de incalculavel utilidade o capital apurado no labor quotidiano das classes menos favorecidas e mais numerosas;
Considerando que, graças ao engenhoso mecanismo desses institutos, as migalhas poupadas ao fructo do suor da pobreza laboriosa se transformam em milhões, destinados a reverter, por canaes habilmente dirigidos, em auxilio dos seus productores;
Considerando que elles cobrem ás centenas, aos milhares, a face dos paizes civilizados, ao passo que entre nós não se conhece um ensaio regular, accommodado a esse desideratum, a que se dedicam, na Allemanha as instituições ligadas ao nome de Delitsch e Raiffeisen, nas nações hespanholas as Cajas de Ajorro, na França as Caisses d'Epargne, na Italia os Banche Populari, na Belgica os Union de Credito, e, na Austria, na Russia, na Suissa, innumeras creações similares com vastos cabedaes;
Considerando que essas instituições, em varios Estados, teem sido agraciadas pelos governos com favores especiaes, que a natureza singular de seus serviços amplamente justifica, sobretudo quando se trata de implantar a primeira tentativa desse grande melhoramento social no seio de uma nacionalidade, onde a iniciativa particular, em geral frouxa a todos os respeitos, ainda não haja começado a procurar essa direcção;
Considerando que ellas representam, para a algibeira popular, a emancipação contra a usura, mal que devora o suor do povo, e que, entre nós, especialmente, lavra em proporções de espantosa crueldade, um ramo de commercio onde não penetra a luz, absorvendo, em proveito da mais insaciavel onzena, o salario das classes trabalhadoras;
Considerando que, em varios paizes, se tem reconhecido necessario dar a instituições dessa ordem o direito de emissão em limites razoaveis para diffundir até ás minimas necessidades da população os beneficios desse systema de credito, e auxilial-o nas difficuldades de seu periodo inicial;
Considerando que, entre nós, presentemente se póde subordinar essa concessão ao pensamento, dominante nos actos financeiros do Governo Provisorio, de alliviar os encargos do Estado e substituir o papel do Thesouro, pelo papel bancario;
Considerando que as instituições officiaes de economia popular, por mais bem dirigidas e ordenadas que sejam, não podem pela natureza da sua origem e pelo caracter de seu regimen exercer no seio do povo, a favor dos habitos de previdencia, a propaganda activa, de que depende o desenvolvimento delles com a rapidez necessaria ao nosso progresso;
Considerando, emfim, que delineada, como se acha no projecto dos peticionarios, a instituição planejada virá ainda auxiliar de varios outros modos o nosso desenvolvimento moral, economico, bem como o serviço da administração;
Decreta:
Art. 1º E' concedido ao Banco Colonial do Brazil e a Arthur Ferreira Torres autorização para organizarem uma companhia com a denominação de - Banco de Credito Popular do Brazil - tendo a séde na Capital Federal, caixas filiaes nas principaes cidades da Republica e agencias nos povoados de mais de cem familias.
Art. 2º O prazo da duração do Banco será de cincoenta annos e o capital de vinte mil contos de réis, podendo elevar-se ao duplo.
Art. 3º O Banco poderá emittir até á importancia de seu capital, em notas de quaesquer valores na fórma do decreto n. 165, de 17 de janeiro de 1890, art. 1º § 8º, parte final; dependendo do accordo com o Governo a emissão de notas de valores inferiores aos das actualmente em circulação.
Um quarto da emissão será sobre apolices, e o resto sobre base metallica, nos termos do decreto n. 253 de 8 de março do corrente anno.
As notas gozarão dos mesmos favores conferidos ás dos outros bancos emissores.
Art. 4º As operações do Banco serão divididas nas seguintes secções:
Caixa de penhor nacional.
Credito geral popular.
Desconto e emprestimo aos operarios e pequenos agricultores sob firma individual, sob palavra ou por antecipação de colheitas.
Carteira commercial e industrial:
Operações geraes e usuaes de commercio e industria;
Desconto e redesconto, operações del credere, cauções, subscripções de acções e incorporações de companhias, emissões de debentures, compra e venda de titulos commerciaes, commissões, importações e exportações, etc.;
Emprestimos a largo prazo, maximo de tres annos, com amortizações trimestraes.
Caixa Economica Geral:
Recebimento de deposito a prazo fixo ou não, com juro ou sem juro, com cadernetas nominaes ou ao portador.
Secção de agricultura e colonização:
Organização de nucleos coloniaes e serviço de immigração, por conta propria e de outros.
Organização cooperativa de armazens nas cidades e nas povoações que parecerem convenientes, para compra e venda de generos e mercadorias de producção nacional ou estrangeira.
Conta corrente geral em credito, caução ou a descoberto.
Lucros em comparticipação.
1º Cada documento (do Banco) de caderneta, conta corrente, Caixa Economica e penhor, será numerado e marcado conforme a serie a que pertencer.
Esses numeros serão sorteados annualmente para entrarem em conta de participação dos lucros do Banco em valor proporcional.
2º Os titulos de caderneta, de deposito, de conta corrente e Caixa Economica, poderão, mediante pequena porcentagem, constituir uma contribuição para apolices de seguro de vida.
3º Os titulos de penhor, de pequenos emprestimos, que não forem premiados no sorteio geral, entrarão em sorteio especial para serem simplesmente liberados, em certo numero, estabelecido pela directoria e conforme os lucros do Banco, pertencentes a essa secção.
Art. 5º O juro do Banco para os emprestimos aos pequenos agricultores e industriaes e para os emprestimos sobre penhor, não excederá de 9%, ao anno.
Art. 6º O juro das caixas economicas abonavel pelo Banco será de 6% ao anno.
Art. 7º O Banco gozará dos favores que teem sido concedidos a emprezas que se propoem a construir edificios para habitações de operarios e da classe pobre.
Art. 8º O Governo poderá encarregar as agencias do Banco, sem onus algum para o Estado, do serviço de agencia postal nos logares em que esse serviço ainda não haja sido estabelecido.
Art. 9º O Banco fará propaganda gratuita no paiz e no estrangeiro a favor da immigração e colonização.
Art. 10. Organizará, si assim o Governo entender, caixas economicas escolares.
Art. 11. O Banco entregará ao Thesouro 2% da sua emissão para amortização do papel-moeda do Estado.
Art. 12. 15% dos lucros liquidos annuaes serão applicados ao fundo destinado ás operações em comparticipação de que trata a art. 4º, e quando os lucros a dividir pelos accionistas excederem de 14% ao anno, uma 4ª parte do excesso irá augmentar o predito fundo.
Art. 13. Si o Banco, passados seis mezes da data da intimação que para fundar caixas filiaes lhe for feita, de accordo com o Governo Federal, pelo Governo de qualquer Estado, deixar de estabelecer pelo menos uma dessas caixas, poderá ao mesmo Estado o gozo dos favores que lhe são concedidos pelo presente decreto.
Art. 14. O Banco terá isenção de imposto sobre o dividendo, do sello de seus documentos e capital, bem como de qualquer outra contribuição.
Art. 15. O Governo nomeará fiscaes, remunerados pela companhia, incumbidos de inspeccionar todas as operações do Banco.
Art. 16. Ficam revogadas as disposições em contrario.
O Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Fazenda assim o faça executar.
Sala das sessões do Governo Provisorio, 14 de novembro de 1890, 2º da Republica.
MANOEL DEODORO DA FONSECA.
Ruy Barbosa.