DECRETO N. 1179 - DE 18 DE DEZEMBRO DE 1890

Concede autorização ao Dr. V. Liberalino de Albuquerque e outros para organizarem uma sociedade anonyma, sob a denominação de - Companhia Moagem do Café do Brazil.

O Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, attendendo ao que requereram o Dr. V. Liberalino de Albuquerque, José M. Navarro e Diniz Nunes Pinto, resolve conceder-lhes autorização para organizarem uma sociedade anonyma, sob a denominação de - Companhia Moagem do Café do Brazil e com os estatutos que apresentaram; não podendo, porém, constituir-se definitivamente sem preencher as formalidades exigidas pela legislação em vigor.

O Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o faça executar.

Sala das sessões do Governo Provisorio, 18 de dezembro de 1890, 2º da Republica.

Manoel Deodoro DA Fonseca.

Francisco Glicerio.

Estatutos da Companhia Moagem do Café do Brazil

CAPITULO I

DOS FINS DA COMPANHIA

Art. 1º A companhia tem por fim:

a) Explorar especialmente o commercio de café moido, aperfeiçoando o systema de torrefação e moagem;

b) Exportar este genero, assim preparado, e convenientemente acondicionado para os Estados da Republica e para o estrangeiro;

c) Emprehender, em grande escala, a moagem de todos os cereaes em grão, por conta propria ou de terceiros;

d) Desenvolver a manipulação do chocolate, empregando para tal fim os mais modernos apparelhos, de modo a eleval-o á maxima perfeição;

e) A companhia abrirá cafés em pontos dos mais frequentados da cidade e onde mais se fizer conveniente aos interesses da companhia, afim de com maior facilidade divulgar a excellencia do seu producto;

f) A companhia, para bem servir aos consumidores de seus productos, terá um pessoal habilitado e pratico que pelos meios rapidos e de facil conducção fará todo o possivel em attendel-os, estabelecendo os meios necessarios de uma bem combinada propaganda;

g) A companhia finalmente se encarregará, por conta propria ou de terceiros, de beneficiar em suas machinas quaesquer especies de cereaes, tomando a si o ensaque dos mesmos.

CAPITULO II

DA COMPANHIA, SUA SÉDE, DURAÇÃO E CAPITAL

Art. 2º Fica constituida nesta Capital Federal uma companhia anonyma que se denominará Companhia Moagem do Café do Brazil.

Art. 3º A séde, o fôro juridico e a administração geral da companhia serão, para todos os effeitos legaes, nesta cidade.

Paragrapho unico. A companhia estabelecerá agencias fóra do seu perimetro, e onde lhe convier em qualquer dos Estados Unidos do Brazil, e no estrangeiro, a juizo da directoria.

Art. 4º A duração da companhia será de 30 annos, contados da data de sua fundação, e só poderá ser dissolvida nos casos previstos pela lei; podendo, porém, este prazo ser prorogado por deliberação da assembléa geral.

Art. 5º O capital da companhia é de 400:000$ (quatrocentos contos de réis), dividido em 2.000 acções do valor nominal de 200$ (duzentos mil réis) cada uma, podendo ser elevado até 1.200:000$, dividido em series.

§ 1º A emissão de acções se fará pelo valor do capital subscripto e não se poderá augmental-o sem que o anterior esteja completamente integralizado.

§ 2º A sociedade considerar-se-ha constituida desde que estejam pagos 30% do capital subscripto, podendo desde logo começar a companhia as suas operações.

CAPITULO III

DOS ACCIONISTAS E DAS ACÇÕES

Art. 6º Realizada a primeira entrada para constituição da companhia, as outras serão feitas em prestações nunca maiores de 20% com intervallo de 30 dias pelo menos.

§ 1º O accionista é responsavel pela quota do capital das acções que subscrever ou lhe forem cedidas por qualquer titulo, e o que não entrar em tempo com a prestação correspondente a qualquer chamada, poderá fazel-o dentro de 15 dias posteriores, com a móra de 9%.

§ 2º Não realizado neste prazo, ficará o accionista sujeito aos termos do decreto de 13 de outubro de 1890. As entradas até ahi feitas serão levadas ao fundo de reserva e a directoria poderá emittir novas acções em substituição áquellas.

§ 3º A transferencia das acções será feita nos termos da lei.

§ 4º Os possuidores de acções primitivas terão preferencia em qualquer subscripção de acções a que se proceda para augmento do capital social.

§ 5º As acções serão indivisiveis e a sociedade não reconhece mais do que um proprietario para cada acção.

§ 6º A subscripção de acções comprova-se com a firma do subscriptor, a quem a sociedade expedirá o recibo correspondente, o qual lhe servirá de titulo provisorio para obter a respectiva cautela da acção, que será substituida por um titulo definitivo quando o valor nominal da acção estiver totalmente realizado.

§ 7º A responsabilidade dos accionistas é limitada sómente até ao valor das acções subscriptas.

Art. 7º A inscripção, como accionista, importa a adhesão completa aos presentes estatutas.

CAPITULO IV

DA ASSEMBLÉA GERAL

Art. 8º A assembléa geral é o poder soberano da companhia, achando-se legalmente constituida por accionistas possuidores de cinco acções, e as suas deliberações, sendo tomadas de accordo com o disposto nestes estatutos, obrigam a minoria.

Art. 9º A assembléa se considerará legalmente constituida quando, em virtude da sua convocação, acharem-se reunidos accionistas que representem pelo menos 1/4 do capital realizado, em acções inscriptas nos livros de registro da companhia, com 30 dias de antecedencia do da reunião.

Paragrapho unico. Assim constituida, a assembléa geral poderá resolver sobre tudo que for da sua competencia, excepto sobre reforma dos estatutos, liquidação, dissolução da companhia e augmento do fundo social, para o que são necessarios pelo menos dous terços (2/3) do capital.

Art. 10. Quando não se reunir o numero de accionistas exigido para constituir a assembléa geral, observar-se-ha o disposto no art. 15, §§ 3º e 4º, do decreto de 17 de janeiro de 1890.

Art. 11. A convocação da assembléa geral ordinaria ou extraordinaria será feita por annuncios nos jornaes, com 15 dias de antecedencia, declarando-se o motivo da convocação.

Paragrapho unico. Este prazo, quando forem necessarias segunda e terceira reuniões, por falta da primeira, ficará reduzido a cinco dias, deliberando-se com qualquer numero de accionistas.

Art. 12. Terá logar a reunião ordinaria da assembléa geral, no correr do mez de março, e da extraordinaria, sempre que a directoria o resolver por acto seu ou a requerimento de sete ou mais accionistas que representem pelo menos um quinto (1/5) do capital social, observadas as disposições do § 9º do art. 15 do decreto já citado.

Art. 13. Cada grupo de cinco acções dá direito a um voto e nenhum accionista poderá ter mais de vinte e cinco votos.

§ 1º Podem votar: Os tutores por seus pupillos, os maridos por suas mulheres, um dos socios pela firma, os prepostos de corporações e os procuradores, sendo accionistas, desde que os representantes estejam no caso de fazer parte da assembléa geral.

§ 2º A votação será sempre por escrutinio secreto.

§ 3º Não podem votar nas assembléas geraes os directores para approvar seus balanços, contas e inventarios, e os fiscaes, os seus pareceres.

Art. 14. São permittidos votos por procuração para eleição dos directores e fiscaes, comtanto que os mandatarios sejam accionistas e tenham para isso poderes especiaes.

Paragrapho unico. Não podem ser mandatarios os directores e fiscaes da companhia.

Art. 15. Os trabalhos preliminares da assembléa, até constituir-se a mesa, serão dirigidos pelo presidente da companhia.

Paragrapho unico. A mesa se formará, por acclamação, de um accionista para presidente, convidando este dous accionistas para secretarios. Todavia, se procederá á eleição da mesa se tres accionistas, pelo menos, o propuzerem e for approvado, excluida toda e qualquer discussão.

Art. 16. Compete á assembléa geral:

a) Alterar ou reformar os estatutos;

b) Julgar as contas annuaes;

c) Nomear e demittir os membros da directoria e da commissão fiscal;

d) Resolver sobre o assumpto de capital, liquidação e dissolução da companhia, e sobre qualquer objecto para que for convocada, dentro dos limites da sua competencia.

Art. 17. O relatorio da directoria, acompanhado do balanço, conta de lucros e perdas e parecer da commissão fiscal, será apresentado na sessão ordinaria annual da assembléa geral, para ser discutido e approvado, ou não, pela mesma assembléa.

§ 1º Nessas reuniões é permittido tratar de todos os assumptos de interesses da companhia.

§ 2º Nas reuniões extraordinarias tratar-se-ha tão sómente do assumpto para que forem convocadas.

Art. 18. Os membros da directoria serão eleitos pela assembléa geral dentre os accionistas de 50 ou mais acções, por escrutinio secreto e maioria de votos, e quando não haja este no primeiro escrutinio, se procederá a segundo entre os candidatos mais votados, em numero duplo dos que tiverem de ser eleitos, prevalecendo a maioria apurada neste, e decidindo a sorte, no caso de empate.

CAPITULO V

DA ADMINISTRAÇÃO

Art. 19. A companhia será administrada por uma directoria composta de tres membros, a saber: um presidente, um secretario e um thesoureiro, percebendo, mensalmente, cada um delles o ordenado de 400$ (quatrocentos mil réis), com excepção do presidente, que vencerá mais 100$ (cem mil réis) mensaes pro labore.

Paragrapho unico. A eleição da directoria terá logar no dia em que se realizar a assembléa geral ordinaria.

Art. 20. A directoria durará por tres annos no exercicio de suas funcções, e será eleita por maioria de votos da assembléa geral dos accionistas, excepto a primeira directoria que fica nomeada por seis annos e composta da fórma seguinte:

V. Liberalino de Albuquerque, presidente.

Francisco J. Bethencourt da Silva, secretario.

Commendador Diniz N. Pinto, thesoureiro.

Conselho fiscal

Visconde de Assis Martins.

Commendador José Pereira da Rocha Paranhos.

José Manoel Navarro.

Supplentes

Dr. Eduardo Mendes Limoeiro.

Christiano C. Coutinho.

Dr. João Baptista Meirelles Filho.

Art. 21. A directoria designará dentre os seus membros aquelles que devem desempenhar as respectivos cargos, e bem assim nomeará os empregados da companhia.

Art. 22. Os directores garantirão a sua gestão com 50 acções, podendo qualquer accionista prestar tal fiança pelo director, nos termos da lei.

Art. 23. As sessões ordinarias da directoria terão logar, pelo menos, uma vez por semana e as extraordinarias, quando convocadas pelo presidente ou requisitadas pelos outros directores.

Paragrapho unico. Pra que funccione a directoria basta a presença de dous directores, e suas deliberações serão tomadas  por maioria.

Art. 24. Não poderão exercer cunjunctamente o cargo de director accionistas que forem-sogro e genro, os cunhados durante o cunhadio, os parentes por consanguinidade até ao 2º gráo e os socios de firmas commerciaes, assim como não poderão ser eleitos os impedidos de negociar, de accordo com as disposições do codigo commercial.

Art. 25. Quando por motivo de fallecimento, impedimento legal ou resignação do cargo, se verificar a vaga de director, a directoria poderá preenchel-a nomeando um accionista, que reuna as condições de elegibilidade.

§ 1º O mandato do nomeado durará unicamente até á primeira reunião da assembléa geral ordinaria.

§ 2º Si algum director deixar de exercer as funcções do seu cargo, por tempo excedente a seis mezes, entender-se-ha que resignou o logar, podendo este ser preenchido conforme o disposto no artigo precedente.

Art. 26. Compete á directoria:

1º Nomear, suspender e demittir os empregados, marcar-lhes vencimentos, fianças e attribuições;

2º Representar a companhia em juizo ou fóra delle, podendo para esse fim constituir mandatarios revogaveis;

3º Contractar o pessoal necessario para todos os serviços da companhia;

4º Fazer acquisição de bens moveis ou immoveis e semoventes, que entenda necessarios á installação de armazens, depositos e mais dependencias da casa matriz;

5º Organizar o relatorio, contas e balanço, que annualmente devem ser apresentados á assembléa geral;

6º Fazer chamadas de capital;

7º Fixar os dividendos semestraes;

8º Deliberar sobre a convocação da assembléa geral ordinaria ou extraordinaria;

9º Deliberar e resolver sobre todos os assumptos e negocio da companhia que não exijam autorização especial da assembléa geral;

10. Contrahir emprestimos por debentures, até á importancia da metade do capital social;

11. Superintender e dirigir os negocios que fazem objecto da companhia, e praticar em geral todos os actos para a sua boa gestão.

Art. 27. O presidente é orgão da directoria, competindo-lhe:

a) Executar e fazer executar as deliberações da directoria e da assembléa geral;

b) Assignar os documentos que importem responsabilidade - contractos, titulos, escripturas, etc. etc.;

c) Velar pela fiel execução dos presentes estatutos e presidir as sessões da directoria.

Art. 28. Ao secretario compete:

a) Substituir o presidente e o thesoureiro no caso de impedimento de algum delles;

b) Redigir e escrever ou mandar escrever as actas das sessões da directoria;

c) Dirigir e fiscalizar o escriptorio e vigiar que a escripturação seja feita com inteira regularidade;

d) Assistir aos exames que tiverem de ser feitos pelo conselho fiscal e fornecer-lhe todos os documentos que elle exigir.

Art. 29. São deveres do thesoureiro:

a) Promover as cobranças de todas as quantias devidas á companhia;

b) Effectuar os pagamentos que forem resolvidos pela directoria, quer por compra de quaesquer especies, quer por obras e serviço do pessoal empregado nos estabelecimentos;

c) Depositar no banco que for designado pela directoria todas as quantias arrecadadas, não podendo conservar na caixa, que fica a seu cargo, quantia excedente ás necessarias ao movimento e serviço da companhia, fixada pela directoria;

d) Assignar, conjunctamente com o presidente, os cheques para retirar do banco as quantias necessarias para pagamentos autorizados;

e) Examinar cuidadosamente todas as contas e despezas que tenham de ser pagas.

Art. 30. Os directores não contrahem obrigação solidaria pessoal pelos actos praticados no exercicio do mandato; mas respondem pelos prejuizos causados á companhia por fraude, dólo, culpa, negligencia ou omissão no desempenho das funcções de que tratam estes estatutos ou a lei.

CAPITULO VI

DO CONSELHO FISCAL

Art. 31. O conselho fiscal, composto de tres accionistas, será eleito annualmente em assembléa geral ordinaria, vencendo cada membro a gratificação mensal de 150$ (cento e cincoenta mil réis).

Art. 32. Haverá tres supplentes do conselho fiscal eleitos na fórma do artigo antecedente.

Art. 33. Compete ao conselho fiscal:

a) Examinar os livros da companhia, verificar o estado da caixa e exigir quaesquer informações da directoria;

b) Dar parecer sobre as contas e balanços;

c) Suggerir quaesquer medidas e alvitres que entenda necessarios ao bem da companhia;

d) Em geral exercer todos os actos de fiscalização, de conformidade com as leis em vigor.

Art. 34. Os fiscaes podem assistir ás sessões da directoria, nas quaes terão voto consultivo, e assignarão, quando o emittirem, a respectiva acta com a directoria.

CAPITULO VII

DOS LUCROS, DIVIDENDOS E FUNDO DE RESERVA

Art. 35. Dos lucros liquidos verificados por balanço semestral das operações effectuadas dentro do semestre, se deduzirão 5% para o fundo de reserva e o restante será distribuido aos accionistas como dividendo.

Art. 36. Si os lucros liquidos excederem de 15% do capital realizado, depois de deduzida a quota para o fundo de reserva, os incorporadores terão direito, cada um, a um beneficio de 1% dos mesmos lucros.

Art. 37. O fundo de reserva é destinado a reconstituir o capital por ventura desfalcado por perdas, e só deixará de ser accumulado quando represente 50% do capital.

Art. 38. Semestralmente se distribuirão os dividendos pelos accionistas.

Paragrapho unico. Não haverá distribuição de dividendos emquanto o capital não estiver integralmente reconstituido das perdas soffridas.

Art. 39. Os dividendos não reclamados pelos accionistas ou seus procuradores no prazo de cinco annos prescreverão em favor da companhia, passando a fundir-se no fundo de reserva,

CAPITULO VIII

DISPOSIÇÕES GERAES E TRANSITORIAS

Art. 40. O anno social é contado de 1 de janeiro a 31 de dezembro.

Art. 41. A companhia poderá possuir predios proprios para seus estabelecimentos, si assim entender a directoria.

Art. 42. Poderá a companhia fazer acquisição de um ou mais estabelecimentos e artigos concernentes a seu ramo de negocio, que continuarão a funccionar por conta da companhia logo que ella se ache constituida.

Art. 43. Fica desde já a directoria autorizada a satisfazer todas as despezas resultantes da acquisição dos estabelecimentos de que trata o artigo antecedente, assim como as despezas de installação da companhia.

Art. 44. Todos e quaesquer casos omissos nestes estatutos serão regulados pelo que dispõe a lei em vigor, a cujo cumprimento, em todas as suas faltas, se obrigam a administração e os accionistas da Companhia Moagem do Café do Brazil.

Art. 45. Os accionistas reconhecem e acceitam a responsabilidade que lhes é attribuida pela lei, e approvam estes estatutos tal como nelles se contém.

Rio de Janeiro, 11 de outubro de 1890.

Os incorporadores:

José Manoel Navarro.

Diniz Nunes Pires.

V. Liberalino de Albuquerque e demais accionistas.