DECRETO N. 1283 - DE 15 DE JANEIRO DE 1891

Concede autorização ao Dr. Henrique Sales para organizar uma sociedade anonyma sob a denominação de Companhia Industrial e Agricola de Villa Rica.

O Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, attendendo ao que requereu o Dr. Henrique Sales, resolve conceder-lhe autorização para organizar uma sociedade anonyma sob a denominação de Companhia Industrial e Agricola de Villa Rica, e com os estatutos que a este acompanham; não podendo, porém, constituir-se definitivamente sem preencher as formalidades exigidas pela legislação em vigor.

O Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o faça executar.

Sala das sessões do Governo Provisorio, 15 de janeiro de 1891, 3º da Republica.

Manoel Deodoro da Fonseca.

Francisco Glicerio.

Estatutos da Companhia Industrial e Agricola de Villa Rica, a que se refere o decreto n. 1283 de 15 de janeiro de 1891

CAPITULO I

DA ORGANIZAÇÃO, SÉDE E DURAÇÃO DA COMPANHIA

Art. 1° E' estabelecida nesta cidade de Ouro Preto uma sociedade anonyma, sob a denominação de Companhia Industrial e Agricola de Villa Rica, para os fins consignados nestes estatutos.

§ 1º A sua duração será pelo prazo de 60 annos, salvo sua liquidação e dissolução determinadas por occorrer algum dos casos previstos na lei.

§ 2º Findo o prazo de sua duração, si não for este prorogado por determinação dos accionistas, em assembléa geral, entrará a empreza em liquidação, dando-se partilha aos accionistas, pago o seu passivo, de todos os valores existentes em dinheiro, titulos, bens devidamente avaliados e quaesquer effeitos.

§ 3º A empreza terá sua sede na cidade de Ouro Preto, centro de suas operações, e que será o fóro competente para o processo e julgamento de quaesquer questões judiciarias em que se veja envolvida.

Art. 2º A empreza operará de accordo e sobre o contracto de 14 de março de 1890 celebrado com o Governador deste Estado de Minas Geraes e mais actos expedidos sobre o mesmo objecto.

Art. 3º Para todos os effeitos, o anno social decorrerá de 1 de janeiro a 31 de dezembro, sendo que o primeiro exercicio terminará a 31 de dezembro de 1891.

CAPITULO II

DO CAPITAL DA COMPANHIA

Art. 4º O capital é de 500:000$, dividido em 2.500 acções do valor de 200$ cada uma, e poderá ser elevado, nos termos e condições do contracto celebrado com o Governo, por meio de novas emissões ou emprestimos.

Art. 5º Realizados 50% do capital, serão dados aos accionistas os titulos definitivos de suas acções, sendo que os restantes 50% se irão realizando com os lucros liquidos que excedam o dividendo annual de 8%.

Paragrapho unico. Realizado todo o capital cessará a limitação do dividendo de 8%.

Art. 6º A primeira entrada de capital será de 10% e as seguintes em prestações successivas de 10 a 20%, com um intervallo nunca menor de 30 dias uma da outra, precedendo aviso prévio de 15 dias pelos jornaes.

Paragrapho unico. Ao accionista é facultado entrar de uma só vez com todo o capital de suas acções, ficando a parte do capital assim realizada equiparada á que se realizar em prestações.

Art. 7º O accionista é legalmente responsavel pela quota do capital de suas acções, qualquer que seja o titulo por que as haja adquirido.

§ 1º O accionista em móra pagará, além da entrada ou entradas que não houver realizado, o juro á razão de 10% sobre o valor dellas.

§ 2º O accionista que dentro de seis mezes, a contar do dia em que devia realizar a primeira entrada em móra, deixar de effectuar o pagamento nos termos do paragrapho anterior, será accionado pelo valor das entradas não realizadas e juros da móra até real e effectiva solução de sua responsabilidade.

Art. 8º As acções integralizadas poderão ser substituidas por titulos ao portador, á vontade do accionista e vice-versa, mediante o pagamento de uma pequena commissão, marcada pela directoria.

Art. 9º A companhia terá no Rio de Janeiro, a cargo de pessoa idonea ou estabelecimento de credito, um livro para o registro dos accionistas alli inscriptos e para transferencia de acções, sendo pagos na mesma praça os respectivos dividendos.

CAPITULO III

DAS OPERAÇÕES DA COMPANHIA

Art. 10. A empreza estabelecerá successiva ou simultaneamente usinas para o preparo e fabrico de chá, conservas, doces, licores, vinho e outros productos da uva, lacticinios e mais generos facultados pelo contracto que tem com o Governo e autorizações subsequentes.

Art. 11. Na fundação das usinas e fabricas terão preferencia na adopção as destinadas ao preparo e manufactura de generos de resultados mais immediatos e já conhecidos como remuneradores.

Art. 12. A empreza fará acquisição das materias primas que devam ser manufacturadas em suas fabricas por compras nos seus estabelecimentos, ou por contractos com os cultivadores, e bem assim se encarregará de beneficiar os generos por conta alheia.

Art. 13. A empreza adiantará aos cultivadores, seus freguezes, as quantias necessarias a occorrer ás despezas de redução até ao maximo de cinco contos de réis a cada um e a juro de 8%, correndo por conta da empreza as avaliações, escripturas e sellos necessarios para a realização dos emprestimos.

§ 1º Os juros destes emprestimos serão pagos semestralmente ou accumulados na conta do mutuario.

§ 2º Do terceiro anno em deante pagará o mutuario com o juro do emprestimo uma taxa de amortização que será fixada de modo que a divida se extinga no prazo do artigo seguinte.

Art. 14. Os emprestimos serão pelos prazos de 1 a 10 annos, conforme convencionarem mutuario e directoria da empreza.

Art. 15. A empreza emprestará sobre hypotheca de immoveis urbanos, ou ruraes que estejam sendo cultivados, penhor agricola de fructos pendentes, titulos publicos ou bancarios, letras endossadas por pessoa idonea.

Art. 16. Reputar-se-ha vencida a divida desde logo exequiveis os respectivos titulos, si o mutuario deixar tres semestres consecutivos de pagar ou a quota de juros ou a da amortização, ou ambas, nas epocas ajustadas.

Art. 17. As avaliações dos bens dados na garantia dos emprestimos serão feitas por peritos da empreza e servirão de base ao emprestimo que nunca excederá de 3/5 do valor dado pelos avaliadores.

Art. 18. Realizada a acquisição de terras devolutas e dos proprios nacionaes e do Estado - Jardim Botanico e Asylo Agricola a empreza dividirá em lotes de 5 a 20 hectares os respectivos terrenos para nelles collocar familias de colonos nacionaes ou estrangeiros que ahi se queiram estabelecer.

§ 1º Divididos os lotes, a empreza construirá casas em boas condições para a installação dos colonos.

§ 2º A estes fornecerá a empreza instrumentos aratorios, adubos e materias fertilisantes, plantas, mudas e sementes de que carecerem elles para o cultivo e exploração das terras.

§ 3º Durante seis mezes receberá o colono em quotas mensaes ou semanaes, á sua escolha, e a titulo de installação ou primeiro estabelecimento, a quantia necessaria á sua subsistencia e de sua familia, a qual será fixada tendo a directoria em attenção o numero de pessoas da familia do colono.

§ 4º Ao ser installado firmará o colono um titulo de divida á empreza, do valor total das despezas de sua installação, comprehendidos os gastos da medição do lote, construcção de casa e todos os fornecimentos dos paragraphos anteriores.

§ 5º Nestes titulos se estabelecerão o juro de 6% a que ficará sujeito o devedor e a taxa e systema de amortização que poderá começar do 3º anno em deante; de modo, porém, que a divida se extinga no prazo maximo de 18 annos.

§ 6º Paga ou extincta a divida, ficará o colono subrogado nos direitos da empreza sobre o lote de terras, casas e instrumentos fornecidos. Para este effeito a empreza dará ao colono um titulo de transferencia do seu dominio, nos mesmos termos e condições em que houver adquirido.

Art. 19. O colono, emquanto não se mostrar quite com a empreza, será freguez desta dos productos de sua lavoura vendendo-os á empreza, ou levando-os ás suas fabricas para alli serem beneficiados, tudo pelos preços ordinarios das fabricas; pena de se considerar devedor em móra e poder ser executado pelo total do titulo do § 4º e juros. Fica entendido que a prohibição de levar os productos a outras fabricas ou de vendel-os por conta propria só se refere aos generos que devam ser beneficiados pelas fabricas da empreza, e as materias primas de sua manufactura. Esta disposição se applicará igualmente aos cultivadores que contrahirem emprestimos nos termos do art. 13 e seus paragraphos.

Art. 20. Poderá a empreza cultivar por si as terras devolutas do art. e arrendar para o mesmo fim propriedades agricolas na zona de sua concessão.

CAPITULO IV

DA ASSEMBLÉA GERAL

Art. 21. A assembléa geral é a reunião dos accionistas da companhia possuidores de cinco ou mais acções, inscriptas com antecedencia de 30 dias, convocada na fórma legal.

§ 1º Os possuidores de acções convertidas em titulos ao portador só poderão fazer parte da assembléa geral quando tenham depositado os seus titulos na companhia oito dias antes do das reuniões.

§ 2º Os accionistas de menos de cinco acções não teem o direito de votar nem o de concorrer para a formação da assembléa geral, mas lhes é permittido comparecer ás reuniões, discutir o assumpto sujeito a deliberações e propôr e que entender conveniente.

§ 3º A caução não impede o accionista de fazer parte da assembléa geral e votar.

Art. 22. A convocação da assembléa geral, seja ordinaria, seja extraordinaria, será feita por annuncios no jornal official do Estado e nos de maior circulação, com 15 dias de antecedencia, que se reduzirão a 5 si, mallograda a primeira, se houver de convocar novas reuniões.

Paragrapho unico. Nos annuncios declarar-se-ha o objecto da convocação.

Art. 23. Reunir-se-ha ordinariamente a assembléa geral todos os annos nos mezes de fevereiro ou março, e extraordinariamente sempre que a directoria entender necessario, ou o requererem sete ou mais accionistas.

Art. 24. As assembléas geraes serão presididas pelo membro da directoria na occasião investido no cargo de presidente que constituirá a mesa, convidando dous accionistas para 1º e 2º secretarios.

Art. 25. A votação na assembléa geral será assim regulada:

Cada cinco acções dá direito a um voto.

Podem votar os tutores por seus pupillos, os maridos por suas mulheres, um dos socios pela firma, os prepostos de corporações e os procuradores, sendo accionistas.

As procurações devem ser entregues no escriptorio da companhia oito dias antes do da ruunião, sob pena de não produzirem effeito algum.

A votação para eleição será sempre por escrutinio.

CAPITULO V

DO FUNDO DE RESERVA E DIVIDENDO

Art. 26. O fundo de reserva será constituido com dez por cento sobre os lucros liquidos de cada semestre e com os dividendos não reclamados depois de cinco annos.

Art. 27. Dos lucros liquidos resultantes das operações feitas em cada semestre se fará o dividendo, deduzida a quantia destinada ao fundo de reserva.

CAPITULO VI

DA DIRECTORIA

Art. 28. A administração da companhia será exercida por uma directoria composta de tres membros, eleitos de seis em seis annos, revogaveis e reelegiveis, os quaes designarão entre si o presidente.

Paragrapho unico. Os eleitos antes de entrarem em exercicio caucionarão cada um vinte e cinco acções da companhia, como responsabilidade de sua gestão.

Art. 29. Não poderão exercer conjunctamente cargos na administração, pae e filhos, sogro e genro, irmãos e cunhados durante o cunhadio, socios da mesma firma.

Art. 30. Salvo licença concedida pela assembléa geral, entende-se haver renunciado o cargo o director que deixar de exercer as funcções por mais de tres mezes.

Art. 31. A vaga de director será preenchida provisoriamente por um accionista, designado pela directoria até a primeira reunião da assembléa geral, que proverá sobre a nomeação definitiva.

Art. 32. Nas assembléas geraes ordinarias, a directoria apresentará o relatorio e balanço das operações da empreza, realizadas no anno anterior.

Art. 33. Além das attribuições que lhe são conferidas pela lei, á directoria compete:

§ 1º Celebrar contractos em nome da companhia.

§ 2º Resolver sobre quaesquer operações que interessem á empreza, sobre acquisição ou alienação de bens, e sobre quaesquer despezas necessarias á boa execução dos serviços e operações da empreza.

§ 3º Emittir quaesquer titulos em casos de operações de credito autorizadas por estes estatutos e pela assembléa geral.

§ 4º Fixar no fim de cada semestre o dividendo a distribuir.

§ 5º Fazer chamadas de capital e promover nos termos do artigo as execuções contra os accionistas remissos.

§ 6º Saccar sobre os capitaes da empreza depositados em qualquer estabelecimento bancario, devendo os cheques ser assignados por um director, com o visto de outro.

§ 7º Cumprir e fazer cumprir estes estatutos e as resoluções da assembléa geral.

§ 8º Solicitar dos poderes publicos quaesquer favores, privilegios e isenções.

§ 9º Nomear uva gerente, que poderá ser um de seus membros.

§ 10. Nomear e contractar todos os empregados necessarios ao bom andamento dos negocios da empreza e marcar-lhes os vencimentos e honorarios.

§ 11. Representar a empreza por seu presidente em todos os actos publicos ou particulares, para o que lhe são conferidos poderes geraes e os de procurador em causa propria.

§ 12. Prover, finalmente, em tudo que for tendente aos negocios da empreza, aqui não especificados, e que não dependam de deliberação da assembléa geral.

Art. 34. Ao gerente compete:

§ 1º Promover os negocios da empreza, administrando e fiscalizando os serviços da fabrica por si, ou por prepostos nomeados pela directoria, á sua indicação.

§ 2º Providenciar sobre a compra de mercadorias necessarias aos serviços das fabricas, e exportação dos productos por ellas beneficiados ou manufacturados.

Art. 35. O director-presidente é o orgão da directoria e nessa qualidade a elle compete:

§ 1º Presidir as reuniões da directoria.

§ 2º Assignar quaesquer procurações e actos expedidos em virtude de resolução da directoria.

§ 3º Representar a empreza e a directoria em juizo ou fóra delle, para o que poderá constituir mandatarios.

§ 4º Superintender todos os negocios da empreza.

§ 5º Executar e fazer cumprir e executar todas as resoluções da directoria.

Art. 36. A directoria vencerá os honorarios e porcentagens sobre os lucros, que forem estipulados na primeira reunião de accionistas.

Art. 37. O gerente, si for um dos directores, terá mais uma gratificação pro labore estabelecida pelos outros dous membros da directoria. Si for, porém, pessoa estranha á directoria terá o vencimento que for por esta marcado.

CAPITULO VII

DO CONSELHO FISCAL

Art. 38. A companhia terá um conselho fiscal composto de tres membros eleitos anualmente na sessão ordinaria da assembléa geral, sendo reelegiveis e servindo gratuitamente.

Paragrapho unico. Serão tambem eleitos na mesma occasião tres membros supplentes do conselho para substituirem os effectivos no caso de impedimento.

Art. 39. Compete aos fiscaes:

1º Emittir parecer sobre os negocios e operações da companhia, tendo por base o balanço, inventarios e mais contas da administração, para, publicado com o relatorio, ser apresentado á assembléa geral;

2º Convocar a assembléa geral dos accionistas, si, tendo requisitado da directoria a sua convocação, ella o não tiver feito dentro de 30 dias.

DISPOSIÇÕES GERAES

Art. 40. A directoria é autorizada a fazer nestes estatutos as modificações que forem indicadas pelo Governo por occasião de sua approvação nos termos do contracto.

Paragrapho unico. Estas modificações entrarão logo em execução independentemente de approvação pela assembléa geral dos accionistas.

O incorporador, Henrique Sales.