DECRETO N

DECRETO N. 2.038 – DE 13 DE OUTUBRO DE 1937

Aprova o regulamento para concessão de férias aos tripulantes das embarcações nacionais

O presidente da República, dando cumprimento ao que dispõe o art. 4º da lei n. 450, de 19 da junho de 1937, que concede direito a férias anuais aos tripulantes das embarcações nacionais, e usando da atribuição que lhe confere o art. 56, inciso 1, da Constituição,

decreta:

Art. 1º Fica aprovado o regulamento para concessão de férias aos tripulantes das embarcações nacionais, que a êste acompanha, assinado pelo ministro de Estado dos Negócios do Trabalho, Indústria e Comércio, para execução da lei n. 450, de 19 de junho de 1937.

Art. 2º Revogam-se as disposições em contrário.

Rio de Janeiro, 13 de outubro de 1937, 116º da Independência e 49º da República.

Getulio VargAs.

Agamemnon Magalhães.

Regulamento das férias dos tripulantes das embarcações nacionais, a que se refere o decreto n. 2.038, de 13 de outubro de 1937

CAPÍTULO I

DOS TRIPULANTES

Art. 1º Os tripulantes das embarcações nacionais pertencentes a emprêsas de navegação marítima, fluvial, ou lacustre, privadas ou públicas, municipais, estaduais ou federais, ainda que de caráter desportivo ou de beneficência, terão anualmente direito a 15 dias úteis de férias, sem prejuízo dos respectivos vencimentos.

Parágrafo único. Quando a remuneração for paga por viagem, tarefa, comissão, diária, porcentagem, ou gratificação, considerar-se-à vencimento, para pagamento do salário correspondente ao período de férias, a média mensal anualmente apurada.

Art. 2º São considerados tripulantes, nos têrmos do art. 1º, todos aqueles que, sem exceção de classe, forem matriculados ou inscritos como tais nas Capitanias de Portos ou repartições a estas subordinadas.

Art. 3º Terá também direito às férias o tripulante que estiver, sem prejuízo do respectivo salário, à disposição do armador, assim considerada, para os efeitos dêste regulamento, tôda emprêsa, sociedade, ou firma individual, nas condições do art.

Art. 4º O tripulante que, por determinação do armador, for transferido para o serviço de outro terá computado, para o efeito do gôzo de férias, o tempo de serviço prestado ao primeiro, obrigando-se a conceder-lhe as férias o armador em cujo serviço êle se encontrar na época de gozá-las.

Art. 5º No caso de serviço militar obrigatório, será computado ao tripulante, para os efeitos do presente regulamento, o tempo de trabalho anterior à sua apresentação a autoridade competente do Ministério da Guerra, desde que, dentro do prazo de 90 dias, contados da data em que se verificar a baixa, êle se apresente ao respectivo armador.

CAPÍTULO II

DO DIREITO ÀS FÉRIAS E DA CONCESSÃO

Art. 6º O direito às férias é adquirido, anualmente, depois de 12 meses de trabalho no mesmo armador, na forma do art. 4º, devendo ser gozadas, consoante o art. 7º, no curso dos 12 meses seguintes.

Parágrafo único. Não se aplicará a última parte dêste artigo ao caso previsto no art. 9º.

Art. 7º Aos tripulantes empregados no mesmo armador, e dentro do prazo de 12 meses, serão concedidos: aos que contarem mais de 250 dias, quinze dias de férias; aos que contarem menos de 250 e mais de 200, onze dias de férias, e aos que contarem menos de 200 e mais de 150, sete dias de férias.

§ 1º O tripulante que tiver menos de 150 dias de trabalho no mesmo armador não terá direito a férias, ressalvado o que dispõe o art. 4º.

§ 2º O tripulante que, sem haver incorrido em qualquer das faltas graves estabelecidas em lei, for demitido, ou afastado do serviço, por conveniência do armador, terá direito à indenização correspondente a 15 dias de férias, dêsde que conte mais de 200 dias de serviço prestado ao mesmo armador.

Art. 8º As férias poderão ser concedidas, a pedido das interessados e com aquiescência do armador, parceladamente, nos portos de escala de grande estadia do navio, aos tripulantes ali residentes.

§ 1º Será considerada grande estadia a permanência do navio no pôrto por prazo excedente de seis dias.

§ 2º Os embarcadiços, para gozarem férias nas condições dêste artigo, deverão pedí-las, por escrito, ao armador, antes do início da viagem, no porto de registo ou armação, apresentando nesse ato a carteira de identidade expedida pelo respectivo sindicato profissional.

§ 3º As férias serão tidas por gozadas quando o tripulante, por sua livre vontade, deixar de proveitá-las.

§ 4º Residindo o tripulante, com a familia, a bordo, ser-lhe-á  facultado receber as férias em dinheiro.

Art. 9º É facultado ao tripulante acumular férias, contanto que a soma destas não exceda seis períodos, devendo o interessado, por intermédio do seu sindicato, e com a antecedência mínima de oito dias, notificar ao armador essa disposição, ficando este último obrigado a dar ou recusar aquiescência em igual prazo.

Art. 10. É vedado ao tripulante prestar serviços a outros armadores durante o período de férias.

Parágrafo único. O tripulante que infringir êste artigo perderá o direito às férias no ano subsequente.

Art. 11. A concessão das férias será, comunicada ao tripulante, com a antecedência de oito dias, mediante aviso escrito.

Art. 12. E’ vedada, salvo conveniência do armador, a concessão de férias a mais de um tripulante, simultaneamente, sendo inferior a seis número dos que compuzerem a guarnição.

Art. 13. Em caso de necessidade, determinará pelo interêsse público, e comprovada rela autoridade competente, poderá o armador  ordenar a suspensão das férias já iniciadas ou iniciar, ressalvando ao tripulante o direito ao respectivo gôzo posteriormente.

Art. 14. No caso de desembarque do tripulante, por comum acôrdo ou mesmo por efeito de dispensa, o armador, além de seus vencimentos, pagar-lhe-á, a importância correspondente as férias a que êle tiver direito, nos têrmos dêste regulamento.

Art. 15. A mudança de proprietário bem com o arrendamento, ou afretamento, da embarcação não será motivo para perda do direito à férias.

Art. 16. Não acarretam a perda da direito as férias as interrupções do serviço causadas por enfermidade, atestada por  médico do Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos, nem tampouco as interrupções de serviço, de curta duração, que não sejam imputáveis a ato faltoso do interessado e cuja total não exceda seis semanas, si devidamente justificadas, a juizo do responsável pela administração do estabelecimento.

Art. 17. O salário do tripulante no gozo do férias será acrescido da importância correspondente à etapa que estiver vencendo.

Art. 18. O tripulante, ao terminar as férias, apresentar-se-á ao  armador que deverá designá-lo para qualquer de suas embarcações ou o adir a algum dos seus departamentos no serviço da respectiva profissão e com os vencimentos integrais.

Parágrafo único. O armador poderá embarcar, preferencialmente na primeira vaga que se verificar, o tripulante que terminar na férias, respeitada a respectiva categoria.

CAPÍTULO III

 DAS RECLAMAÇÕES 

Art. 19. As reclamações relativas à não concessão de férias serão dirigidas às autoridades competentes pelo interessado ou pelo sindicato de sua profissão, instruídas com documentos que provem o direito às férias.

Parágrafo único. E’ lícito aos menores de 21 anos, independenemente da assistência dos país ou autores, apresentar suas reclamações contra o não cumprimento de preceito, dêste regulamento, ou recorrer para êsse fim ao patrocínio da autoridade competente.

CAPÍTULO IV

DA FISCALIZAÇÃO

Art. 20. A fiscalização da observância do presente regulamento será exercida pelas Delegacias do Trabalho Marítimo.

Parágrafo único. Nas localidades onde não houver Delegacia de Trabalho Marítimo, a fiscalização competirá às Delegacias ou Agências de Capitanias dos Portos.

Art. 21. Aos funcionários da fiscalização incumbe:

a) examinar as cadernetas-matrícula dos tripulantes, fôlhas de pagamento e outros documentos comprobatórios da execução dêste regulamento;

b) efetuar as diligências necessárias à fiel execução dos dispositivos do presente regulamento;

c) comunicar à autoridade competente qualquer infração de disposições do presente regulamento.

Art. 22. Sem prejuízo da fiscalização estabelecida no artigo anterior, poderão as Federações ou Uniões de Sindicatos e, na falta destas, os Sindicatos do classe, por intermédio do representantes devidamente autorizados pelo Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, verificar a existência de infrações do presente regulamento, lavrando o respectivo têrmo e remetendo-o à autoridade competênte.

Parágrafo único. O têrmo a que êste artigo se refere deverá conter a indicação precisa do fato, data e hora da sua verificação e nome do armador e das testemunhas.

Art. 23. A autoridade competente, de posse da comunicação do fiscal, ou do têrmo de infração a que, alude o art. 22, notificará o armador, por meio de telegrama, ou ofício, ou carta, êstes sob registo postal, para que, no prazo de 15 dias, contados da data da notificação, comprove o cumprimento da lei ou apresente razões de defesa.

Art. 24. No caso do armador deixar de atender à notificação, dentro de 15 dias, a autoridade competente repetirá a intimação, e, findo novo prazo de 15 dias, si não for atendida, será lavrado o têrmo de revelia e intimado o infrator a indenizar o tripulante, dentro de oito dias, de acôrdo com êste regulamento.

CAPÍTULO V

DAS PENALIDADES

Art. 25. O armador, findo o prazo de 8 dias marcados no art. 24, não indenizando o tripulante, será intimado a recolher à repartição federal arrecadadora da respectiva localidade a devida importância, correspondente ao dôbro da quantia a que o tripulante faria jus trabalhando durante os dias em que devera ter gozado as férias não concedidas, além da multa prevista no art. 26.

Parágrafo único. A importância determinada neste artigo, uma vez recolhida, será pela repartição arrecadadora entregue ao interessado, à vista de simples requerimento dêste, visado pela autoridade indicada no art. 20.

Art. 26. Salvo o disposto no art. 27, as infrações dos dispositivos do presente regulamento serão punidas com multa de 100$ (cem mil réis) a 1:000$ (um conto de réis), elevada ao dôbro na reincidência, conforme a natureza e a gravidade da infração.

Art. 27. O armador que, por motivo não fundado em disposição dêste regulamento, deixar de conceder férias ao tripulante que às mesmas houver feito jus ficará obrigado a pagar-lhe a importância estabelecida no art. 25.

CAPÍTULO VI

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 28. Os tripulantes que, sob fundadas razões e obediente às regras de disciplina e respeito, tiverem reclamado, ou derem motivo a reclamação, por inobservância de preceito dêste regulamento não poderão, sem causa justificada, ser dispensados no espaço de um ano, contado da data em que houver sido recebida a reclamação.

Parágrafo único. Ao tripulante que apresentar reclamação julgada manifestamente improcedente pela competente autoridade aplicar-se-á o disposto no parágrafo único do art. 10.

Art. 29. Os recursos das decisões que impuserem multas e as respectivas cobranças obedecerão ao disposto no decreto n. 22.131, de 23 de novembro de 1932.

Art. 30. No caso de falência do empregador, considerar-se-á crédito privilegiado do empregado a importância relativa às férias a que tiver direito.

Art. 31. Ficam isentos de sêlo quaisquer petições, recursos, recibos e outros documentos relativos à execução do presente regulamento.

Art. 32. O presente regulamento entrará em vigor na data de sua publicação, a partir da qual terá início a concessão de férias aos tripulantes que já contarem 12 meses de serviço, na forma dêste regulamento.

Art. 33. Enquanto não se criar um tipo especial de caderneta profissional para os marítimos, as férias serão anotadas pela Capitania do Pôrto na caderneta-matrícula do tripulante, na página das observações.

Parágrafo único. Ficam os tripulantes obrigados a firmar recibo quando gozarem as férias.

Art. 34. É nulo, de pleno direito, qualquer acôrdo, ou convenção, firmado entre tripulante e armador, si tendente a infringir disposições dêste regulamento.

Art. 35. O período de férias será computado, para todos os efeitos do decreto n. 22.872, de 29 de junho de 1933, como tempo de serviço efetivo, ficando os armadores, bem como os tripulantes, obrigados aos descontos previstos no decreto citado neste artigo.

Art. 36. Não são aplicáveis aos tripulantes das embarcações nacionais as disposições da lei n. 4.982, de 24 de dezembro de 1925, e respectivo regulamento, aprovado pelo decreto n. 17.496, de 30 de outubro de 1926, nem as do decreto n. 19.808, de 28 de março de 1931, e quaisquer outras em contrário ao presente regulamento.

Rio de Janeiro, 13 de outubro de 1937. – Agamemnon Magalhães.

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

Sr. Presidente da República.

A lei n. 450, de 19 de junho de 1937, concedeu o direito de férias aos tripulantes das embarcações nacionais, condicionande o exercício dêsse direito à regulamentação do Poder Executivo.

Atendendo à natureza dos serviços a cargo do pessoal por ela beneficiado, designei uma comissão, composta de representantes do Sindicato dos Armadores Nacionais e da União dos Sindicatos Profissionais Marítimos, para elaborar um ante-projeto de regulamento.

No regulamento da lei foram adotadas tôdas as providências indispensáveis à, sua fiel execução, harmonizando-se as necessidades do descanso anual dos trabalhadores com as do serviço de transporte sôbre água.

Tenho, pois, a honra de submeter à elevada consideração de V. Ex. o respectivo projeto, com o do decreto que o aprova.

Rio de Janeiro, 29 de setembro de 1937. – Agamemnon Magalhães.