DECRETO N

DECRETO N. 2.063 – DE 19 DE OUTUBRO DE 1937

Outorga ao Governo Municipal de São Leopoldo concessão para aproveitamento progressivo de energia-hidráulica no rio Santa Maria acrescido com águas do rio Santa Cruz, Estado do Rio Grande do Sul

O Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil, usando das atribuições que lhe confere o n. 1 do art. 56 da Constituição, Federal e tendo em vista o decreto n. 24.643, de 10 de julho de 1934 (Código de Aguas) e o que requereu o Governo Municipal de São Leopoldo,

Decreta:

Art. 1º Respeitados os direitos de terceiros, anteriormente adquiridos, é outorgada ao Governo Municipal de São Leopoldo, ou à emprêsa que êle organizar, concessão para o aproveitamento progressivo de energia hidráulica, para produção de energia elétrica, destinada aos serviços públicos federais, estadoas e municipais, bem como à iluminação particular, usos domésticos e industriais e fornecimento de fôrça no município de São Leopoldo e ao fornecimento de energia elétrica, em alta tensão, às empresas concessionárias dos municípios incluídos na zona a que alude o art. 3º

Art. 2º A concessão, objeto dêste decreto, abrange a energia obtida numa queda bruta de cerca de seiscentos e sessenta (660) metros desde as cabeceiras do rio Santa Maria até o povoado do Sander, município de Taquara, juntando as águas do Santa Maria as do rio Santa Cruz, lançadas no primeiro por um tunel, entre o local do Salto, no município de São Francisco de Paula e nas cabeceiras do rio Santa Maria, no município de Taquara.

§ 1º O aproveitamento será feito progressivamente, com o número de usinas que os estudos a proceder demonstrarem ser necessárias, devendo ser construída em primeiro lugar a usina mais econòmicamente aconselhável, tendo em vista as necessidades da zona de fornecimento, a juizo do Govêrno Federal.

§ 2º Serão construídas, no rio Santa Cruz, de acôrdo com o resultado dos estudos, as barragens necessárias para melhor regularização da descarga dêsse rio.

Art. 3º O Governo municípal de São Leopoldo, ou a Emprêsa que êle organizar, de acordo com o Governo Federal, terá para fornecimento em alta tensão às empresas existentes, a zona constituída pelos municípios de Bento Gonçalves, Caxias, Farroupilha, Garibaldi. Gravataí, Monte Negro, Nova Hamburgo, Porto Alegre, São Francisco de Paula, São Sebastião do Caí, Taquara, Viamão e Flores da Cunha.

Parágrafo único. Essa zona poderá ser ampliada, no caso de possibilidade de interconexão, de usinas existentes em outros municípios.

Art. 4º A título de exigências preliminares das contidas no art. 158 do Código de Aguas, e que, por isso mesmo deverão ser cumpridas integralmente, sob pena de ficar de nenhum efeito o presente decreto, o concessionário obriga-se a:

I – Apresentar, dentro do prazo de dois (2) anos, contados da data da publicação dêste decreto, e em três (3) vias :

a) estudos hidrológicos das bacias hidrográficas do rio Santa Cruz e do rio Santa Maria;

b) planta geral em escala razoável da região a ser servida pelo sistema de usinas;

c) plantas em escala de um por dois mil (1:2000) dos trechos dos rios a serem aproveitados com indicação dos terrenos marginais a serem inundados pelo remonte (remous) da barragem; perfil do rio a montante das barragens e justificação do cálculo do remonte (remous) ;

d) projeto, em escala razoável, das obras hidráulicas;

e) estudo detalhado da acumulação, cubação da bacia, plantas, etc., barragem, método de cálculo, projeto e justificação do tipo adotado; perfil geológico do terreno no local da barragem, afim de se julgar a perfeita estabilidade da obra;

f) cálculo e desenho detalhados dos vertedouros, adufas, comportas, castelos dágua, canal de adução, condutos, etc. Descarga máxima a ser utilizada. Dispositivos que assegurem a livre circulação dos peixes. As escalas a adotar serão as seguintes : um por cem (1:100) para as plantas e um por cincoenta (1:50),para as secções transversal e longitudinais. Escala razoável para os longos canais de adução e conduto. Cubagem de todas as obras e respectivo orçamento;

g) centrais; turbinas – justificação do tipo adotado; rendimento em diferentes cargas, em múltiplos de 1|4 e 1|8 até a plena carga. Velocidade característica, de embalagem ou de disparo. Desenho das turbinas. Reguladores e aparelhos de medição. Regulação da velocidade com 25.50 e 100% de variação de carga. Canal de fuga, vertedouros, etc. Orçamento;

h) geradores – justificação do tipo adotado. Potência. Tensão, fator de potência com que foi calculado, rendimento em diferentes cargas em múltiplos inteiros de 1|4 ou 1|8 até a plena carga res- pectivamente com cos PHI = 1 e cos PHI = 0.8. Frequência. Regulação da tensão e sua variação. Reguladores. Exvitatrizes; tipo, potência, tensão rendimento e acoplamento; queda de tensão de curto-circuito dos geradores. Detalhes e característicos em escala fornecida pelos fabricantes. Orçamento; PD2 do grupo motor e gerador. Esquema das ligações elétricas, inclusive proteção;

i) transformadores elevadores; as mesmas exigências feitas aos geradores ;

j) aparelhos montáveis fóra dos paineis da alta tensão de transmissão, antes e depois das barras gerais. Isoladores, chaves, interruptores, transformadores de corrente de tensão. Cabos, barras e seguranças, disposições entre si e as paredes;

k) linha de saída de alta tensão de transmissão. Para raios, bobinas de choque, ligação a terra. Isoladores. Cabos. Interruptores. Proteção contra super-tensões. Cálculo mecânico e elétrico da linha de transmissão – perda de potência relativa – tensão na partida – potência na chegada – comprimento – distância entre condutores. Fator de potência. Projeto da linha de transmissão, acompanhado de mapa da região em escala razoável e com detalhes;

l) memória justificativa, incluindo orçamento global e detalhado, de todas as partes do projeto, bem como das desapropriares a fazer.

II – Obedecer em todos os projetos, salvo o que o contrato expressamente determinar, as prescrições das normas seguintes que estiverem em vigor :

a) Verband Deutscher Elecktrotechniker (V.D.E.) ;

b) Verband Deutscher Ingenieure (V.D.I.),

c) American Institut of Electrical Engineers (A.I.E.E.) ;

d) American Society Mechanical Engineers (A.S.M.E.) ;

e) British Engineering Standards Association (B.E.S.A.) ; não sendo aceitos os carteis ou normas inferiores e outros derivados ou não das normas acima citadas.

Art. 5º A minuta do contrato disciplinar desta concessão, do qual constarão todas as exigências de ordem técnica, fiscal, administrativa e penal, previstas no Código de Águas, será preparada pêlo Serviço de Águas, do Departamento Nacional da Produção Mineral, e submetida à aprovação do Ministro da Agricultura.

Art. 6º Para explorar a concessão de que trata o presente decreto, poderá o Governo Municipal de São Leopoldo organizar uma emprêsa nas seguintes condições :

a) a empresa será organizada em sociedade anônima;

b) o capital social será representado por ações ordinárias e ações preferênciais;

c) as ações ordinárias representarão, no mínimo, trinta por cento (30 %) do capital social, e serão nominativas, mesmo depois de integralizadas ;

d) as ações preferênciais terão direito a um dividendo, proporcional à justa remuneração garantida ao capital invertido.

§ 1º O govêrno municipal de São Leopoldo subscreverá cincoenta e um por cento (51 %) das ações ordinárias e oferecerá as restantes aos Governos Federal e municipais incluídos na zona descrita no art. 3º deste decreto.

§ 2º As ações preferenciais serão oferecidas à subscrição pública.

§ 3º As ações ordinárias que não forem subscritas pelos Governos Federal e municipais de que trata o § 1º serão por igual oferecidas à subscrição pública.

Art. 7º A concessão vigorará pele prazo de cincoenta (50) anos contados a partir da data da publicação do presente decreto.

Art. 8º O investimento ou o capital a remunerar será o efetivamente invertido nas instalações para exploração da presente concessão, concorrendo, de forma permanente, para produção, transformação, transmissão, distribuição e fornecimento de energia elétrica.

Art. 9º As tabelas de preço de energia nos contratos de fornecimento serão fixadas de acôrdo com o que estabelece a respeito o código de Águas, fixando-se por igual no contrato de concessão a Justa remuneração do capital, a que se refere o inciso III do art. 180 do mesmo Código.

Art. 10 Para manutenção da integridade do capital a que se refere o art. 8º do presente decreto, será criado um fundo de reserva que proverá às renovações determinadas pela depreciação ou impostas por acidentes.

Parágrafo único. A constituição dêsse fundo, que se denominará fundo de estabilização, será realizada por quotas especiais que incidirão sôbre as tarifas, sob a forma de percentagem. Essas quotas serão determinadas tendo-se em vista a duração média do material a cuja renovação o dito fundo terá de atender, podendo ser modificadas trienalmente, na época da revisão das tarifas.

Art. 11 Se a receita do concessionário for insuficiente para remanutenção dos serviços, os “deficits” verificados em cada triênio estabelecida no contrato de concessão, e, ainda mais, para atender á manutenção dos serviços, os “deficits” verificados, em cada triênio (período marcado na lei para revisão de tarifas), serão registrados a débito de uma conta especial intitulada “Lucros a compensar”, cujo saldo vencerá os juros que forem fixados para o capital invertido (art. 8º do presente decreto), saldo que será amortizado em período subsequente de tarifas, sendo para isso computado como despesa neste período.

Art. 12 Se, ao contrário, a receita exceder às necessidades a que se refere o artigo precedente, a parte excedente será registrada a crédito de uma conta, também especial, que será denominada “Lucros de compensação".

Parágrafo único. O saldo desta conta será considerado como receita no período de tarifa subsequente.

Art. 13 Findo o prazo da concessão, reverterão para o Estado do Rio Grande do Sul, mediante indenização pelo custo histórico menos a depreciação, todas as instalações de produção, transformação, transmissão, distribuição e fornecimento de energia elétrica.

Art. 14 Se o Estado do Rio Grande do Sul não fizer uso do direito de que trata o artigo precedente ao concessionário será assegurada preferência, em igualdade de condições, para a renovação da concessão.

Art. 15 O concessionário gozará, desde a data da assinatura do contrato de concessão, e enquanto êste vigorar, dos favores constantes do art. 151 do Código de Aguas e das leis especiais de apoio às empresas de serviços de utilidade púbica.

Art. 16 Revogam-se as disposições em contrário.

Rio de Janeiro, 19 de outubro de 1937, 116 da Independência e 49º da República.

Getulio Vargas.

 Odilon Braga.