DECRETO N

DECRETO N. 4.099 – DE 23 DE JULHO DE 1901

Autoriza a organisação da Companhia de Seguros de Previdencia «Cruzeiro do Sul» e approva os respectivos estatutos.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, attendendo ao que requereu José Machado da Cunha:

Resolve autorizar a organisação da Companhia de Seguros de Previdencia «Cruzeiro do Sul», e approva, mediante as seguintes condições, os estatutos que a este acompanham, pelos quaes reger-se-ha a mesma companhia:

Primeira – Só poderá estabelecer agencias, dentro ou fóra do paiz, com autorização, porém, do Governo Federal;

Segunda – Não poderá praticar operação alguma que não seja directamente relativa a seus fins principaes, sob pena de ser cassada immediatamente a autorização para funccionar;

Terceira – E' expressamente vedado resegurar os seus seguros em companhia estrangeira, dentro ou fóra, do paiz.

Capital Federal, 23 de julho de 1901, 13º da Republica.

M. FERRAZ DE CAMPOS SALLES.

Joaquim Murtinho.

Estatutos da Companhia de Seguros de Previdencia «Cruzeiro do Sul»

CAPITULO I

DA SOCIEDADE, SÉDE, FINS, DURAÇÃO E DISSOLUÇÃO

Art. 1º A companhia denominada «Cruzeiro do Sul» é uma sociedade anonyma de accordo com a legislação em vigor, com séde no Rio de Janeiro, podendo ter agencias nos Estados.

Art. 2º O fim da sociedade é operar sobre seguros de previdencia, emittindo titulos nominativos do valor de dez contos de réis cada um, dados a cada um dos subscriptores e que serão sorteados annualmente em reunião publica e na razão de 1 por 400 do seu numero, sem caducidade durante o tempo da duração ou dissolução da companhia.

§ 1º Os titulos serão transferidos por seus proprietarios, a quaesquer pessoas, mediante aviso previo á directoria, e depois de um anno pelo menos de posse.

§ 2º Os subscriptores destes titulos e suas familias, domiciliadas sob o mesmo tecto, teem direito aos soccorros medicos e ao fornecimento de medicamentos, que lhes serão facultados por conta da companhia.

§ 3º Os subscriptores teem ainda direito á inclusão, por si ou pela pessoa que instituirem, ás vantagens do monte de beneficencia, que garante aos seus alistados uma mensalidade de 20$ durante a sua existencia e a duração da companhia.

§ 4º O monte de beneficencia será garantido por 25 % das annuidades dos titulos emittidos.

Art. 3º Os titulos serão emittidos, subscrevendo os tomadores a quantia de 50$ por uma só vez e mais a contribuição annual de igual quantia, em uma ou mais prestações.

Art. 4º Estes titulos serão sellados com estampilhas federaes, na importancia dos valores subscriptos e do das suas respectivas annuidades.

Art. 5º Os titulos emittidos, uma vez contemplados no sorteio e no monte de boneficencia, perdem os demais direitos facultados pela companhia e serão cancellados.

Art. 6º A duração da companhia será de 60 annos, contados da data da approvação dos presentes estatutos, podendo esse prazo ser prorogado si a assembléa dos accionistas assim o deliberar e o Governo approvar.

Art. 7º A dissolução da companhia e sua liquidação, amigavel ou forçada, serão regidas pela lei vigente.

CAPITULO II

DO CAPITAL, SUA REALIZAÇÃO, LUCROS, FUNDOS E SUAS APPLICAÇÕES

Art. 8º O capital da companhia é de 200:000$ dividido em 2.000 acções de 100$ cada uma.

Art. 9º O fundo realizado é do 100:000$, ou 50 % do capital, podendo as acções ser negociadas e transferidas de conformidade com a lei vigente.

Art. 10. Dos lucros liquidos verificados semestralmente se deduzirão;

15 % para o fundo de reserva.

10 % para o de integralização do capital.

Art. 11. O fundo de reserva destina-se a amparar o capital realizado e o de integralização a valorizar os seus titulos.

Art. 12. O capital realizado, os fundos de reserva e integralização e quotas destinadas ao monte de beneficencia serão empregados em apolices geraes e estaduaes.

Art. 13. Havendo prejuizos que absorvam os Iucros, os fundos estabelecidos e desfalquem o capital realizado, será este inteirado por meio de chamadas; sendo que estas chamadas nunca serão superiores a 10 % e guardem o intervallo de 30 dias, uma das outras.

Art. 14. Os dividendos serão distribuidos semestralmente e nunca superiores a 30 % do capital realizado.

CAPITULO III

DOS ACCIONISTAS

Art. 15. São accionistas os possuidores de uma ou mais acções inscriptas no registro da companhia.

Paragrapho unico. Os menores e interdictos não podem possuir acções da companhia emquanto não estiverem integradas.

Art. 16. A responsabilidade dos accionistas é limitada ao valor de suas acções.

Art. 17. As acções são nominativas e transferiveis por termo nos livros da companhia, com assignatura dos transferentes e adquirentes, ou seus bastante procuradores.

Art. 18. O accionista que não acudir ás chamadas de capital póde realizar a prestação devida, no prazo de 60 dias, com juro de 12 % ao anno.

§ 1º A directoria, ouvido o conselho fiscal, poderá marcar novo prazo ao accionista remisso.

§ 2º Os meios coercitivos a empregar contra o accionista remisso serão os estabelecidos na lei.

Art. 19. Cada acção é indivisivel; si o seu valor pertencer a dous ou mais individuos, sómente um destes, designado pelos outros, poderá exercer direitos em virtude della.

Art. 20. Por morte, fallencia ou interdicção de qualquer accionista é permittido á directoria vender as respectivas acções, ainda não integradas, por intermedio de corretor, ficando o producto da venda em cofre, sem vencimento de juros, para ser entregue a quem de direito.

CAPITULO IV

DA ASSEMBLÉA GERAL

Art. 21. A assembléa geral é a reunião de accionistas habilitados, em numero legal e regularmente convocada.

§ 1º Consideram-se habilitados os possuidores de acções, inscriptas no registro da companhia com antecedencia de 30 dias. Os que possuirem acções sem os 30 dias de inscripção podem fazer numero, discutir, mas não votar.

§ 2º E’ numero legal o de accionistas que representem um quarto do capital social, nos casos geraes; dous terços, nos casos especiaes.

Art. 22. São casos especiaes os de: 1º, augmento de capital; 2º, reforma de estatutos; 3º, prorogação de prazo; 4º, dissolução e liquidação da companhia durante o prazo.

Art. 23. As convocações serão feitas pela imprensa por annuncios repetidos da directoria, com antecedencia de 15 dias, tratando-se de reunião ordinaria; de cinco a oito, nos demais casos.

§ 1º A convocação será sempre motivada.

§ 2º Em qualquer reunião podem ser apresentadas quaesquer propostas; mas só se vota sobre o objecto da ordem do dia, salvo tratando-se de proposta da directoria ou do conselho fiscal, alheia nos casos do art. 22, a qual paderá ser logo discutida e votada, sendo a reunião ordinaria.

Art. 24. A reunião ordinaria tem logar até 31 de março de cada anno, a extraordinaria quando a directoria julgue conveniente, ou assim lhe for competentemente requisitada.

Art. 25. A reunião ordinaria tem por objecto principal a apresentação, discussão e deliberação sobre o relatorio e contas da directoria, e parecer do conselho fiscal, bem como a eleição da directoria e dos membros do conselho fiscal.

Art. 26. As deliberações são tomadas por maioria absoluta de votos, tendo o presidente voto de qualidade no caso de empate. A votação é feita per capita, ou por acções, quando houver quem reclame contra ella.

§ 1º As eleições são sempre feitas por escrutinio secreto.

§ 2º Cada accionista terá um voto por cinco acções, não podendo nenhum accionista dar mais de 80 votos, qualquer que seja o numero de acções que representar por si ou como procurador.

Art. 27. Os accionistas teem o direito de se fazer representar na assembléa geral, para quaesquer deliberações e eleições, por procuradores, tambem accionistas com iguaes direitos.

Art. 28. Os directores e fiscaes não podem votar sobre suas contas e pareceres.

Art. 29. A assembléa é presidida por um accionista acclamado na occasião, ou por eleição, quando o seja reclamado por tres accionistas ou mais.

Paragrapho unico. O presidente convidará, dous accionistas para 1º e 2º secretarios, que serão approvados pela assembléa.

Art. 30. Compete á assembléa geral:

§ 1º Tomar conhecimento de todos os negocios da companhia, dos quaes será informada pela directoria e conselho fiscal.

§ 2º Eleger triennalmente a directoria, e annualmente o conselho fiscal.

§ 3º Marcar e alterar o honorario e gratificação á directoria.

§ 4º Resolver em geral todos os negocios da companhia, sem outra limitação mais do que as estabelecidas na lei ou nos estatutos.

CAPITULO V

DA ADMINISTRAÇÃO

Art. 31. A companhia é administrada, por uma directoria eleita de tres membros, que funccionará tres annos.

§ 1º Si no primeiro escrutinio ninguem obtiver maioria absoluta de votos, proceder-se-ha a segundo, sendo então eleitos os que obtiverem maioria relativa.

§ 2º Só os accionistas poderão ser elegiveis, qualquer que seja o numero das suas acções, mas, para entrar em exercicio, deve cada um dos eleitos possuir 50 acções pelo menos.

§ 3º As cincoenta acções ficam caucionadas á companhia até a approvação das ultimas contas do director.

A caução é feita por termo no livro de registro.

§ 4º O eleito que não entrar em exercicio dentro de 30 dias entende-se que renuncia o cargo.

§ 5º A directoria se reunirá, em sessão, uma vez, pelo menos, mensalmente, e fará lavrar actas, das quaes constam as deliberações tomadas.

Art. 32. Em caso de vaga do cargo, por morte, fallencia, ou renuncia do director, ou por outro motivo, assim como em caso de impedimento ou de ausencia, não justificada maior de 30 dias, os directores restantes e fiscaes nomearão o substituto dentre as accionistas.

O substituto servirá até a primeira assembléa geral.

Art. 33. Cada director vence a mensalidade de 1:000$000 e a porcentagem de 2 % sobre os dividendos.

Art. 34. Os titulos, cheques e mais documentos de responsabilidade da companhia devem ser assignados por dous directores.

Art. 35. Nos casos não regulados nestes estatutos, as deliberações da directoria são tomadas por maioria de votos.

Não havendo maioria, funccionarão os directores e fiscaes em sessão, e prevalecerá o que for decidido por maioria de votos.

Art. 36. Compete á directoria:

§ 1º Cumprir e fazer cumprir os estatutos e as deliberações da assembléa geral.

§ 2º Organisar os regulamentos necessarios ao serviço.

§ 3º Nomear e demittir os agentes, empregados e mais pessoal da companhia, marcar-lhes os vencimentos, gratificações e a fiança dos que devem prestal-a.

§ 4º Organisar o relatorio e contas do anno social, submettendo-os ao exame do conselho fiscal.

§ 5º Fixar o dividendo semestral, e escolher os estabelecimentos bancarios, em que devam ser depositados, em conta corrente, os fundos disponiveis da companhia.

§ 6º Representar a companhia em Juizo e fóra delle, por si ou por procuradores.

§ 7º Exercer, finalmente, livre e geral administração, e transigir, para o que lhe são outorgados plenos poderes.

CAPITULO VI

DO CONSELHO FISCAL

Art. 37. O conselho fiscal será composto de tres membros effectivos e tres supplentes, eleitos annualmente dentre os accionistas, devendo cada um possuir, no acto de tomar posse do logar, 20 acções pelo menos.

Art. 38. Os fiscaes teem direito illimitado a informações e exames de todas as operações sociaes e o dever de fazer a fiscalização mais minuciosa possivel, apresentando annualmente seu parecer á assembléa geral.

Art. 39. O conselho fiscal prestará o seu concurso á directoria todas as vezes que por esta lhe for solicitado em bem dos interesses geraes da companhia.

Art. 40. Os supplentes só funccionarão na falta ou impedimento dos effectivos.

Paragrapha unico. Esgotada a lista dos supplentes, a substituição será feita por acto do presidente da Junta Commercial, a requerimento da directoria.

CAPITULO VII

DISPOSIÇÕES GERAES

Art. 41. O anno economico da companhia conta-se de 1 de janeiro a 31 de dezembro.

Art. 42. Nos casos omissos regerão as disposições consignadas na lei vigente.

CAPITULO VIII

DISPOSIÇÕES TRANSITORIAS

Art. 43. São administradores da companhia os Srs. José Machado da Cunha, Visconde de Duprat, e Antonio José Bastos.

Paragrapho unico. O mandato da primeira administração será de cinco annos, findos os quaes poderão ser re-eleitos, mas de conformidade com o disposto no art. 31.

Art. 44. Os subscriptores approvarão os presentes estatutos e as emendas que o Governo entenda fazer.

Art. 45. Ao incorporador, a titulo dos serviços de installação e proseguimento na execução de seu plano, se abonará a quantia de 5:000$000, após o acto de installação da companhia; e 5 % dos lucros verificados annualmente, para si e seus descendentes até a 3ª geração.

Rio de Janeiro, 10 de junho de 1901. – José Machado da Cunha. Estavam colladas duas estampilhas no valor total de dous mil e cem réis, devidamente inutilizadas.