DECRETO N. 4864 – DE 15 DE JUNHO DE 1903

Manda observar o regulamento para o serviço medico-legal do Districto Federal.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, considerando que as praticas periciaes, no estado actual, não prestam á justiça e causa publica os serviços que dellas se devem esperar, por omissões e infracções de preceitos essenciaes, consignados aliás pela sciencia medico-legal:

Resolve, usando da attribuição conferida pelo art. n. 48, n. l, da Constituição, mandar observar o regulamento para o serviço medico-legal do Districto Federal que a este acompanha, assignado pelo Ministro de Estado da Justiça e Negocios Interiores.

Rio de Janeiro, 15 de junho de 1903, 15º da Republica.

Francisco DE Paula Rodrigues Alves.

J. J. Seabra.

Regulamento a que se refere o decreto n. 4864, desta data

CAPITULO I

Disposições preliminares

Art. 1º Os serviços medico-legaes do Districto Federal devem seguir a orientação aqui traçada em linhas geraes.

Visando prevenir a omissão de preceitos essenciaes nos processos medico-judiciarios, nenhuma coacção profissional decorre de taes normas, uma vez permittidas as variantes individuaes, sanccionadas pela pratica autorizada.

A uniformização dos processos, por um methodo geral de technica, aspirando permittir a comparação dos resultados e completar, o mais possivel, os exames periciaes, não impede a menção de quaesquer informes uteis á justiça.

Art. 2º Os exames medico-legaes proceder-se-hão mediante ordem da autoridade competente incumbida da elaboração de um corpo de delicto ou por qualquer motivo interessada por uma investigação pericial.

Art. 3º A ordem de praticar o exame deve trazer bem claro o fim a que se propõe a justiça publica, mandando-lhe a effectuação.

CAPITULO II

Exames no vivo

I

EXAME MEDICO-LEGAL DOS ALIENADOS

Art. 4º Tratando-se de alienação mental, suspeita ou allegação de tal estado, os peritos devem satisfazer as indagações seguintes:

I. Preliminares:

Menção da autoridade que ordenou o exame; fim e condições deste; quesitos judiciaes; material de observação (processo, informações, exames directos, etc.);

II. Historia do caso:

Nome, idade, raça, profissão, estado civil, religião, naturalidade do examinado.

1) Anamnese:

A) Balanço genealogico: estado de saude da familia; doenças nervosas e mentaes; alcoolismo; syphilis; particularidades estranhas; crimes, suicidios; consanguinidades; casamentos desproporcionados em idade; accidentes da prenhez materna respectiva, parto laborioso, operado; nascimento legitimo ou espurio;

B) Infancia: estados nevropathicos, convulsões; doenças febris, eruptivas e outras; intoxicações; inicio e condições da marcha e da palavra; dentição; desenvolvimento physico; desenvolvimento da intelligencia e do caracter; alterações da evolução normal, perversão dos sentimentos, por traumatismo, doença, causas diversas; conducta no meio domestico e na escola; educação em collegio, asylo, convento; desenvolvimento sexual, onanismo precoce; habitos anormaes; raivas estateladoras, mentiras calumniosas, furtos, assombramentos, terrores nocturnos, pesadellos, loquacidade hypnogica, micção no leito;

C) Puberdade: parada de desenvolvimento mental; perturbações psychicas transitorias; convulsões; risos, choros immotivados; primeira menstruação, regra catamenial; primeiras praticas sexuaes; masturbação; ergasthenia por estafa mental, cansaço physico ou esgoto venereo;

D) Edade adulta: caracter, regularidade, firmeza; inclinações: ethylismo, jogo, libertinagem, usura, vaidade, philanthropia, collecções, etc.; installação na vida, protegido ou desajudado; particularidades nos costumes, habitos, gostos; casamento, relações com o outro conjuge, lar feliz desaccorde, quantos filhos vivos, condições de sua sobrevivencia, quantos mortos, causa lethal especificada, prenhezes a termo e abortadas, seus intervallos, menopausa proxima ou chegada; condições de vida, trabalho, preoccupações de fortuna e bem-estar social; doenças infecciosas graves, syphjlis, febres eruptivas, typhica, amarella, peste, pneumonia, grippe, etc.; intoxicações agudas ou chronicas pelo alcool, tabaco, chumbo, arsenico, alimentos deteriorados, etc.; traumatismos physicos e psychicos, quedas, emoções violentas; doenças nervosas e mentaes antecedentes, fórma, caracter, evolução, duração, tratamento das mesmas; accusações e condemnações anteriores; excessos, privações, perversões genesicas; operações cirurgicas pregressas, actos e crimes attribuidos, informados pelo processo, depostos pelo examinado.

2) Exame directo:

A) Attitude, apresentação, expressão physionomica, mimica, fallada, actuada;

B) Exame somatico:

a) Altura, corpulencia, musculatura (atrophias), desproporções (aleijados, anões), adiposidade, côr da pelle e das mucosas, pellugem, glabrismo; vicios de conformação (pé chato, poly e syndactilia, epispadias, hypospadias cryptorchidia, asymetrias orelhas em aza, em ponta, beiço de lebre, guela de lobo, etc.);

b) Cabeça fórma, deformações asymetrias; diametros transverso e longitudinal maximos, curva transversa biauricular; indice cephalico; calvicie, canicie; sensibilidade á pressão; percussão;

c) Face, desvios, contracções, tremores; sensibilidade dos pontos nervosos á pressão; ereutophilia; cicatrizes. Olhos, tampo visual, vicios de refracção, estrabismo, daltonismo, nysagmus, desigualdade chromatica das iris, desigualdade pupillar, exame ophtalmoscopico, si preciso.

Lingua e bocca: projecção tremores grossos ou fibrillares saburra; dentes, excessivos, vicios de implantação, diastema abobada palatina, estreita, funda, em carena; fórma e direcção da uvula. Prognatismo. Nariz, fórmas, desvios do septo. Ouvido, cheiro, gosto;

d) Orgãos thoracicos e pelvianos; inversões visceraes; desvios, deformações; hernias; pulso, rythmo respiratorio e cardiaco;

e) Sensibilidade: tactil, thermica, dolorosa. Sentido muscular. Signal de Romberg. Zonas hysterogenas;

f) Motilidade: dynamometria, paralysias, paresias, contracturas, convulsões, tremores, tremor intencional, incoordenação, tremor da mão estendida, tetania, catalepsia;

g) Reflexos: pupillar, pharyngêo, rotuliano, abdominal, cremasteriano, plantar, achilleano, etc.;

h) Exame de urina, reacção, toxidez, phosphatos, assucar, albumina;

C) Falla. Voz baixa ou forte. Falla tranquilla, demorada, arrastada, rapida, fluente, tarda, tartamuda, escandente, tremulante, tropeçante, incoordenada. Aphonia. Mutismo. Repetição dos paradigmas (libellula, flanella leve, profligar, magnificencia, tres mil tresentos e trinta e tres artilheiros da terceira brigada de artilharia). Contracções correlatas dos musculos da face, labios, ticos, etc.;

D) Escripta: mediante dictado, usando paradigmas (artilharia, republica, apropriação, constitucionalismo, constantinopolitano, etc.), ou espontanea, em cartas, reclamos, memoriaes, composições litterarias, publicações, palimpsestos, testamentos, desenhos, etc., apreciando intensidade, fórma, dimensão, direcção, continuidade, ordem, significado;

E) Exame mental: pelo interrogatorio e observação de actos e palavras do examinado. Importa verificar:

a) Noção do tempo, logar, meio;

b) Confusão de espirito, alheiamento ao mundo exterior (respostas dubias, embaraçadas, desconnexas, fragmentos de delirio, palavras soltas, mutismo);

c) Humor do examinado, com ou sem correspondencia no meio ambiente: alegre, arrogante, folgazão, reservado, desconfiado, triste, ancioso, indifferente, colerico, furioso. Explicativa destes estados pelo arguido. Excitação, depressão, angustia. Associação de idéas, tarda ou precipitada: logorrhéa, syllabação. Apathia ou delirio de acção: actos extravagantes, ridiculos, pueris, deshonestos, immundos, violentos, aggressivos, destruidores, estereotypados, mimeticos, sem causalidade nem effeito, saltos, dansas, corridas, etc. Transformações da personalidade;

d) Percepção, illusões, allucinações. Delirios: de perseguição, grandeza, ruina, peccado, negação, querela, possessão demoniaca, divina, etc.; fixos, immutaveis, coherentes, raciocinados, organizados em systema ou transitorios, fugazes, variados, desconnexos, insustentaveis. Relações com o meio: attenção voltada para si, para si e para o exterior, sem destino algum. Impulsões;

e) Intelligencia. Precipitação, volubilidade, incoordenação das idéas. Correspondencia entre as idéas actuaes e a educação recebida: desintegração das acquisições da cultura, calculo, religião, historia, politica, geographia. Memoria: factos antigos e recentes. Juizo do examinado sobre si mesmo e sobre os outros;

f) Estado geral da nutrição. Somno, insomnias. Auto-intoxicações. Perturbações coenesthesicas.

III. Sommatorio:

1. Summula das acquisições que denunciam doença.

2. Juizo sobre alienação existente ou não, na phase dos exames; prejulgamento, si possivel, do estado no momento do crime ou outra acção que importe á justiça ou causa publica.

3. Deducção diagnostica, caracterizando a fórma nosologica, si posssivel.

4. Resposta aos quesitos propostos.

II

EXAME MEDICO-LEGAL DAS LESÕES CORPORAES

Art. 5º A’ pericia, nos casos de lesão corporal, importam: o ferimento e o ferido.

Devem ser minuciosamente examinadas as lesões existentes, indicando o numero, precisando a séde, referindo-as a determinadas regiões do corpo, descrevendo a fórma, extensão, direcção e profundidade, quando possivel. Deste exame o perito concluirá a causa provavel do traumatismo, apontando o instrumento causador, a direcção em que actuou, as condições de violencia e a intenção com que parece terem sido praticadas. Taes deducções não devem ser o resultado de uma affirmação desacompanhada, embora, categorica, mas succeder a uma descripção minudente e em termos, para que se possa ajuizar de seu acerto, deante da lesão observada.

Quanto ao ferido, recolhidos todos os dados objectivos e subjectivos, deve indagar-se sua qualidade, laços naturaes (crimes familiaes, máos tratos domesticos, sevicias nas crianças) ou sociaes (magistrados, funccionarios publicos, imprudencia, negligencia, impericia de artistas ou profissionaes); deducção possivel das intenções do culpado (ferimentos involuntarios, excusaveis, premeditados, perversos, cannibaes); anamnese, (data da ferida), diagnostico (classificação motivada: leves, graves, mortaes), prognostico legal (complicações, influencia dos tratamentos, cura); influencias modificadoras dos ferimentos: estudo das concausas penaes; damno material e circumstancias aggravantes (incommodo de saude que inhabilite o paciente do serviço activo por 30 dias ou mais, mutilação, amputação, deformidade, privação permanente do uso de um orgão ou membro, enfermidade incuravel e que prive para sempre o offendido de poder exercer o seu trabalho, instrumento aviltante. No ajuizar e classificar o damno causado, os peritos devem valer-se da hypothese que o offendido se sujeite a um tratamento regular que auxilie e promova a cura, justificando-se sempre que necessario.

Sob pretexto algum o procedimento pericial deve ser nocivo ao offendido: ficam impedidas praticas de semeiotica, como sondagens e manobras outras, capazes de retardar a cura ou complicar a lesão.

III

EXAME MEDICO-LEGAL NOS CASOS DE VIOLENCIA CARNAL, PRENHEZ, ABORTO, PARTO

Art. 6º Os exames periciaes por allegação ou suspeita de attentados contra o pudor, defloramento, estupro, gravidez, aborto criminoso, parto, deverão ser sempre realizados na presença de uma ou duas testemunhas, sem o dissentimento da parte, ou, si menor, de quem de direito.

Art. 7º Nos casos de attentados contra o pudor, estupro, defloramento proceder-se-hão: ás informações primarias ao exame da victima, ao exame do accusado, sempre que possivel.

As informações primarias consistem na historia do facto relativo á pericia, estando de sobreaviso ás narrações dos queixosos e pessoas da familia, notavelmente ás das crianças, muito susceptiveis de simulação e mentira.

O exame da victima levará em consideração o estado geral (constituição, escrophula, lymphatismo, nevropathia), estado local (coxas, baixo ventre, grandes e pequenos labios, clitoris, meato urinario, vestibulo e orificio vaginal; hymen: collocação, fórma, disposição, consistencia, erosões, dilaceramentos; corrimentos: caracteres, resultado do exame microscopico, tendo em vista especialmente os gonococcos; ulcerações; signaes de masturbação; anus e perineo; manchas de esperma, sangue, fezes sobre o corpo e vestes, devidamente sujeitas á elucidação microscopica.

O exame do accusado referir-se-ha ao estado physico (forças, vestes, molestias cutaneas, etc.); ao estado dos orgãos sexuaes (aspecto geral, proporções, particularidades, corrimento urethral, (a examinar microscopicamente), impotencia invocada ao estado mental, si necessario.

Art. 8º O exame medico-legal das mulheres gravidas, allegadas ou suspeitas de tal estado, consiste em procurar informações prévias, observar a paciente, realizar verificações complementares, si precisas.

As informações prévias referem-se á historia do facto relativo á pericia, á anamnese da paciente, indagando-se da regra menstrual, seu começo, habito, data do inicio do ultimo periodo, provavel ou possivel do coito fecundante, prenhezes e partos anteriores, doenças pregressas.

Precedendo ao exame objectivo da paciente, pesquizem-se os signaes de probabilidade – no facies (mascara gravidica), nos seios (turgescencia, pigmentação da aureola, hypertrophia dos tuberculos de Montgomery, presença do colostro), no ventre (desenvolvimento, pigmentação da linha branca; depressão umbilical, marcas plicadas (vergetures); nas partes genitaes (vulva, furcula, hymen ou seus destroços; congestão, edema, corrimentos possiveis; coloração vinhosa da vagina), nos membros inferiores (varizes, edemas); signaes digestivos (appetites extravagantes, nauseas, vomitos) – e, sobretudo, os de certeza – os movimentos passivos do feto, percebidos pela palpação e pelo toque; os movimentos activos, pela vista, pelo toque, pela escuta; os movimentos do coração fetal pela escuta mediata ou immediata, excluidas as causas de erro.

Complementarmente póde-se, á pericia, juntar informes sobre o talhe e o esqueleto da examinada, especialmente sua pelvimetria, estado das symphyses, etc.

Não sendo obtida uma conclusão desse exame, os peritos podem reservar-se para occasião ulterior, solicitada, com o fim de assegurar o seu juizo. No caso affirmativo, concluirão si está ou não gravida a examinada, qual o tempo da prenhez e a época provavel do parto.

Art. 9º Nos casos de aborto criminoso, os peritos indagarão: das circunstancias do facto, dos meios empregados, pesquizando vestes, pannos, instrumentos, substancias chimicas ou vegetaes possiveis; das páreas, placenta, porção placentaria do cordão, membranas, examinando-as medindo-as, pesando-as, verificando si completas, intactas ou dilaceradas, picadas, destruidas; do embryão ou feto procedendo conformemente para determinar a idade e provaveis offensas. Como peças de convicção ou de elucidação ulterior, feto e annexos podem ser conservados devidamente.

O exame da paciente póde integrar um juizo, revelando não só lesões do collo e corpo do utero por manobras illicitas, como signaes de probabilidade da prenhez abortada, si já não desappareceram.

Art. 10. No exame pericial das puerperas, suspeitas ou pretendidas taes, procurem-se informações prévias e a observação da paciente.

As informações constam da historia do facto relativo á pericia, dos antecedentes, do exame dos pannos, vestes, manchas de sangue, lochios, meconio, liquido amniotico, inducto sebaceo do feto, etc.

Na observação da paciente indagar-se-ha: do trabalho do parto dores, dilatação do collo, expulsividade uterina, duração, termo auxilios; do recemnascido, movimentos, apresentação, posição, proscidencias, desprendimento, respiração, chôro; do delivramento, apresentação placentar, expulsão espontanea, provocada, hemorrhagias; dos annexos, membranas, placenta, cordão; do estado presente da puérpera, respiração, pulso, temperatura, estado geral, altura do utero acima da symphyse, lesões vulvo-perineaes, praticas obstetricas e cuidados tomados.

CAPITULO III

Exames no cadaver

I

RECOMMENDAÇÕES GERAES

Art. 11. As necropsias devem, nas condições ordinarias, ser realizadas por dous medicos, dos quaes um se incumbirá da secção cadaverica, de conformidade com a orientação prévia de ambos, revezando-se, si preciso, dictando a um escrivão, á medida que se realizam as operações, os dados recolhidos.

Não havendo serventuario especialmente indicado para a escripta, um dos medicos servirá de secretario ao outro.

Excepcionalmente, um só medico, reconhecidamente idoneo, poderá operar a secção, dictando, como no primeiro caso, os resultados ao escrivão presente.

Si muitos peritos forem nomeados pela autoridade para o mister, fica prohibido, como regra de technica, o intervirem mais de dous, a um tempo, na secção.

Art. 12. Em caso algum realizar-se-ha uma necropsia antes de seis horas depois do fallecimento, sendo de imprescindivel necessidade certificar-se da realidade do obito pelos signaes thanathoscopicos, quando ella se tiver de effectuar entre a sexta e a vigesima quarta hora, depois da morte.

Art. 13. Um estado adeantado de putrefacção não constitue motivo de excusa á pratica de uma necropsia: em qualquer época, é possivel, de um cadaver, colher informes uteis á justiça.

II

RECOMMENDAÇÕES PRELIMINARES

Art. 14. As necropsias realizar-se-hão, sempre que possivel, de dia e á luz natural; as excepções a esta regra carecem de absoluta defesa escripta no protocollo.

Art. 15. Para uma technica regular devem os peritos exigir uma caixa contendo o instrumental seguinte:

6 escalpellos de fórma e dimensões variadas, rectos e convexos, finos e resistentes, sendo um de lamina estreita e longa para secção da medulla do canal vertebral e um de lamina estreita e curta para abertura da articulação esterno-clavicular;

3 facas de necropsia;

2 facas para secção da massa cerebral, lamina fina, larga, de cerca de dez centimetros de comprimento;

2 chrondrotomos;

1 martello, cujo cabo termine em gancho;

2 escôpros;

2 serras de tamanho e grossura variados;

1 serra de cadeia;

2 tesouras: uma resistente, tendo um ramo pontudo, outro rombo e outra fina, disposta semelhantemente;

2 pinças de dissecção;

2 ruginas;

2 erinas duplas;

1 boticão;

1 par de estyletes de barbatana abotoados, para sondagens;

1 tentacanula;

1 enterotomo;

1 costotomo;

6 agulhas curvas de tamanhos variados;

6 sondas urethraes de cautchú, para retirar urina e sondar ferimentos;

2 trocartes;

1 compasso de espessura;

1 pelvimetro;

1 metro dividido em centimetros e millimetros;

1 balança podendo pesar até cinco kilogrammas;

1 vaso graduado podendo conter duzentos centimetros cubicos;

1 boa lente;

Papel reactivo;

Fios para suturas e ligaduras;

Gesso de boa qualidade (200 a 300 grammas) para moldagens;

1 microscopio e accessorios, montado convenientemente, com uma amplificação de 500 a 750 diametros;

Liquido conservador, permittido recolher fragmentos de visceras para exame microscopico;

Tubos scellados e esterilizados, podendo receber com segurança amostras de liquidos organicos suspeitos;

Pipetas e tubos estereis para a colheita desses liquidos.

Art. 16. As necropsias devem ser completas: apenas nos casos ordinarios, e em falta de solicitação de qualquer especie, limitar-se-hão ás tres grandes cavidades – encephalica, thoracica e abdominal.

Art. 17. Por muito numerosas e profundas que sejam as secções, nunca devem chegar a romper a continuidade do orgão, dividindo-o em fragmentos.

Nunca se deve perder de vista que uma recomposição é de regra, sinão como uma exigencia de esthetica e de fórma, mas ainda para poupar alguns sentimentos piedosos de respeito ao morto e, sobretudo, o que é essencial, porque essa reunião de partes divididas permittirá não só novos exames, mas tambem poder fazer-se um juizo de conjunto sobre a séde e extensão de uma lesão.

Art. 18. Toda a vez que, para complementar elucidação anatomo-pathologica, for mister retirar um orgão ou fragmento delle, será o facto claramente consignado no protocollo.

Art. 19. A ordem das secções não é arbitrada, sendo, sempre que possivel, acatada a anatomica: adeante serão mencionadas as infracções a esta regra, podendo o perito justificar outras, si preciso.

III

EXAME CADAVERICO

I – Inspecção externa

Art. 20. A inspecção juridica do cadaver, preliminar á necropsia propriamente dita, consiste em um exame externo do mesmo e das condições do meio em que se achava primitivamente.

Si os peritos não tiverem sido notificados para esta phase da inspecção, por ultimo mencionada, ordinariamente devolvida á autoridade policial, poderão exigir dados e informações recolhidas, e mesmo a visita aos sitios em que se realizaram os successos e o exame dos objectos alli apprehendidos.

Procedendo á inspecção juridica, começarão os peritos por verificar si a morte é real, procurando determinar a época provavel a que ella remonta, pesquizando em seguida si existem indicios de morte violenta, por um attentado ou accidente, ou si foi consequencia de uma enfermidade.

Si possivel, devem ser observadas todas as circumstancias ambientes, o logar em que foi o cadaver encontrado, sua natureza e disposição, vestigios de desordem, luta e resistencia provaveis, armas ou instrumentos outros encontrados nas proximidades, visinhança ou mesmo no corpo do morto, manchas, pegadas, signaes, estado das vestes, seu arranjo e dilacerações, etc., emfim todas as informações, que em mais de uma emergencia podem ter subido valor.

A attitude e a posição do corpo reclamam exame attento, tendo alto valor significativo em certos generos de morte.

O exame minucioso do cadaver deve ser precedido da retirada completa das vestes, tendo-se o cuidado, no acto de suspender o corpo e transportal-o para a mesa de trabalho, de não exercer pressão alguma nem alterar a posição natural das grandes cavidades.

Depois do signaes de morte, procurem-se os de identidade, e então, o sexo, a edade, a estatura, as proporções, o estado geral da nutrição, os vicios de conformação, tatuagens, cicatrizes, estigmas profissionaes, etc., devem ser consignados.

Tratando-se de individuo desconhecido, a autoridade policial que ordenar a remoção para o necroterio communicará, por escripto, e immediatamente, ao Gabinete de Identificação, afim deste providenciar no sentido de ser reconhecida a identidade pela photographia e systemas anthropometrico e dactyloscopico, si houver logar.

A’ pesquiza dos signaes de morte violenta proceda-se examinando o cadaver, da cabeça aos pés, não devendo escapar região alguma: o couro cabelludo, o interior da bocca, os conductos auditivos, os olhos, as fossas nasaes, si por elles se escapam sangue ou liquidos pathologicos, o pescoço, o thorax, as axillas, as mammas, o abdomen, os membros, as partes genitaes, especialmente as da mulher, o anus e, finalmente, o dorso.

Erupções, feridas, ulceras, tumores, hernias, etc. devem ser notados, seguindo-se a ordem anatomica para sua descripção.

II – Inspecção interna

Art. 21.

1. Craneo e encephalo:

O cadaver collocado em decubito dorsal, a cabeça levantada por um cepo em que repousa a nuca, dividam-se os cabellos por uma risca, indo pelo alto e por detraz de uma orelha a outra, e trace-se uma incisão transversal tendo como extremos as apophyses mastoides; rejeitem-se os dous retalhos, para a frente, sobre o rebordo orbitario e para traz ao nivel da protuberancia occipital externa.

Examinem-se as partes molles descolladas e, feita a excisão dos musculos temporaes, toda a face externa da abobada craneana. A cabeça, trazida para a borda da mesa, será serrada circularmente, um centimetro acima do descollamento das partes molles. Completada a secção da calota, levante-se cuidadosamente, separando-a de suas adherencias, com a duramater ou si difficilmente separaveis, incisando circularmente a meninge e retirando de uma vez calota e dura-mater.

Examinada internamente a superficie da calota retirada e externamente a dura-mater, comece-se por abrir o seio longitudinal superior.

Para desprender a dura-mater excize-se-a circularmente no sentido da secção ossea ou crucialmente, seguindo incisões parallelas de cada lado do seio longitudinal superior, sendo cada retalho dividido em dous por uma secção perpendicular á primeira.

Inspeccionem-se então a superficie interna da meninge excizada, a porção apreciavel da pia-mater e a casca cerebral subjacente.

Extraia-se o cerebro, cortando successivamente, de deante para traz, todos os nervos craneanos, cerce com seus buracos efferentes, até a tenda do cerebello, incizada ao nivel de suas inserções, depois, posteriormente, os ultimos nervos da base e a medulla, o mais baixo possivel, introduzindo o escalpello no buraco occipital.

Examinando ligeiramente em seu conjuncto e encephalo, disposto convenientemente, afastem-se brandamente os hemispherios cerebraes; incida-se sobre o corpo calloso, abrindo os ventriculos lateraes. A abertura dos cornos anteriores e posteriores faça-se por quatro cortes, pequenas curvas de concavidade externa dirigidas em um plano horizontal.

Vistos os ventriculos lateraes, seu conteúdo e particularidades, os plexos choroides, prosiga-se na procura do ventriculo medio, examinando de caminho a tela choroidiana e indo até o ventriculo inferior, introduzida a lamina pelo aqueducto de Sylvio e incizados os tuberculos quadrigemeos, glandula pineal e cerebello.

O exame dos hemispherios e nucleos cinzentos internos faça-se por uma serie do cortes, de dentro para fóra, dispostos horizontalmente, mas não completos até romper externamente a continuidade da pia-mater contentora.

Os grandes ganglios centraes receberão cortes radiados em fórma de leque, tendo um ponto commum de encontro, o pedunculo cerebral, para se não destruir completamente a continuidade.

O cerebello será seccionado em cada uma de suas metades, por um corte horizontal, separando-as inferior e superiormente e em seguida por uma serie de incisões radiadas, partindo da extremidade externa e superior do corte central de cada hemispherio cerebelloso.

A protuberancia e o bolbo serão examinados por secções seriadas transversaes.

Descolladas da base do craneo as meninges que a revestem examine-se cuidadosamente esta vasta e anfractuosa superficie ossea.

2. Face: olhos, ouvidos, bocca, nariz:

Fazendo-se preciso o exame de parte ou de toda a face, ha praticas diversas a seguir.

Olhos: Disseque-se a pelle da testa, desde o ponto em que foi seccionado o craneo, até á borda superior da arcada orbitaria; partindo da apophyse orbitaria externa e do ponto mais interno da arcada orbitaria, de cada lado, comprehendendo a porção frontal deixada no corte da calota craneana, tracem-se duas linhas de serra, que de fóra para dentro vão convergindo até se encontrarem no buraco optico. Afastado o fragmento osseo tem-se descoberto o globo ocular, que póde ser retirado da cavidade depois de separado de suas adherencias e de isolado o nervo optico com sua bainha.

Ouvidos: Prolongando-se para baixo a incisão craneana que veiu até as apophyses mastoides, fazendo a dissecção, póde-se examinar o conducto auditivo externo e a glandula parotida. Seccionadas as partes molles serre-se a porção do temporal correspondente ao orgão da audição, por meio de dous córtes: um dirige-se pela fossa média da base do craneo á cella turcica, outro ahi vindo ter, passando pela fossa posterior.

Bocca: A partir da extremidade livre do labio inferior, na linha média, seccionem-se todos os tecidos molles até á symphyse do mento, e dahi para baixo até á fosseta jugular; dissequem-se lateralmente os retalhos, separando as partes molles do corpo do maxillar inferior interna e externamente, e sobre a linha média, com a serra, divida-se o osso em duas porções. Desligados de suas inserções os musculos do pavimento buccal, será fácil á vista o accesso de toda a cavidade, lingua, paredes, fundo da garganta, orificio do pharynge, etc.

Nariz: Descolle-se internamente o labio superior, comprehendendo na separação a parte anterior do nariz, até uma certa altura, em que, continuando a raspar o maxillar superior, tenham-se apparentes os dous orificios anteriores das fossas nasaes. Uma tentacanula introduzida por um destes orificios vae sahir no fundo da garganta de um dos lados da uvula. A partir dahi, de cada lado, seccione-se o véo do paladar, depois as partes molles que revestem a abobada palatina, até os espaços que separam os incisivos medianos, dos lateraes. Do lado da bocca serre-se a borda alveolar do maxillar, na frente, e a abobada palatina em seguida. Uma tesoura introduzida pelos dous orificios anteriores corta o septo em toda a sua extensão, permittindo retirar o pequeno plastrão.

3. Medulla espinhal:

Deitado o cadaver convenientemente, em decubito ventral, pratique-se uma incisão, indo do occipital á base do coccyx ao longe das apophyses espinhosas. Disseque-se a pelle e as partes molles, massas musculares espinhosas de um e de outro lado, raspando o osso. Muito proximo á base das apophyses espinhosas e de cima para baixo, serrem-se de cada lado as laminas vertebraes. Levantado todo o plastrão osseo, si se consegue, ou, uma a uma, todas as porções seccionadas das vertebras, examine-se exteriormente a dura-mater, abra-se esta meninge por um incisão longitudinal, inspeccionem-se a piamater e a medulla em toda sua extensão. Seccionem-se de cada lado por um corte longitudinal as raizes nervosas da medulla, extraia-se sua porção inferior do sacro e coccyx e superior do buraco occipital e, desligadas todas as connexões, retire-se do canal, e, fóra, examine-se mais detidamente, praticando uma serie de cortes parallelos e transversaes, deixando para continuidade do todo as meninges anteriores.

4. Pescoço, cavidades thoraxica e abdominal (incisão geral):

A partir do mento, trace-se uma incisão que vá, através do pescoço, thorax, abdomen, contornando á esquerda a cicatriz umbilical, á symphyse do pubis, comprehendendo apenas as partes molles externas. Com precaução faça-se uma pequena abertura penetrante até o peritoneo, consentindo a passagem de dous dedos, que afastados em V, deixem facilmente operar a incisão completa, sem o menor perigo de lesar os orgãos subjacentes.

Verificado com o dedo o estado dos canaes inguinaes e, na mulher, dos canaes de Nuck, proceda-se a uma outra incisão transversal, de traz para deante, do meio para os lados, seccionando em baixo a parede na altura das inserções pubianas dos musculos rectos e seguindo ao longo da arcada crural.

Levantada em cima a parede seccionada e repuxada para cima e para fóra, ao nivel das falsas costellas e parallelamente a ellas, destaquem-se as inserções musculares e, raspando a caixa thoracica neste ponto, desnude-se até certa altura de suas partes molles, cinco centimetros, cerca, para fóra, distante do ponto de juncção das cartillagens costaes nas costellas. Na secção das partes molles notem-se todas as particularidades encontradas e complete-se esta parte do exame com a observação do diaphragma, sua disposição, abobadamento, marcando com os dedos o gráo dessa elevação ou a correspondencia do seu nivel superior com uma das costellas ou espaços inter-costaes, disposição das visceras ou algum conteudo insolito que porventura exista.

5. Thorax:

Pela incisão já feita anteriormente e completada por duas transversaes, ladeando as claviculas e indo de um acromio a outro, resolutamente, faça-se a dissecção das partes molles, separando-as em cada lado em grande extensão.

Cortem-se seguidamente as cartilagens costaes, a começar da segunda, uma a uma, o mais distante possivel da linha média, proximo á juncção com as costellas. Seccionado o feixe esternal do musculo esterno-cleido-mastoidiano, corte-se o ligamento costo-clavicular, e só então, um a dous centimetros para fóra do nivel em que foi cortada a segunda, incida-se sobre a primeira costella, com bastante precaução, para não lesar os vasos subjacentes. Tomado o esterno por sua extremidade inferior, separem-se as inserções do diaphragma, nas cartillagens costaes e no appendice xyphoide, levante-se progressivamente para cima, separe-se do mediastino, raspando cautamente a superficie interna do osso, para não lesar os vasos intrathoracicos, nem o pericardio; observem-se então o estado dos saccos pleuraes e o conteúdo anormal que possam apresentar, o aspecto, o gráo de distensão ou de compressão das partes visiveis do pulmão, particularidades sobre os vasos e ainda sobre o mediastino e ganglios ahi existentes.

6. Pericardio e coração:

Abra-se o sacco pericardico com uma tesoura, notando symphyses, se extirem, espessura, conteúdo, estado do coração, seu aspecto exterior, dimensões, estado dos vasos coronarios, replecção das cavidades, rijeza e consistencia.

Para o exame do coração a regra offerece dous modos de proceder, que se excluem por vantagens e inconvenientes reciprocos, competindo ao perito escolher, de accordo com o caso que visar.

Abertura do coração dentro do thorax: Introduzindo o indice esquerdo sob o coração, neste ponto de apoio suspenda-se e faça-se com os outros dedos girar o mesmo sobre o seu eixo, da direita para a esquerda, de sorte que bem claro se tenha a borda direita ou inferior da viscera em que vão ser dados os dous primeiros córtes.

1º Uma incisão que parta do meio do espaço que separa as embocaduras das veias cavas e termine na mesma borda, immediatamente adiante da base, abrirá convenientemente a auricula direita.

2º Ainda nessa borda, como em continuação da linha precedente, começando da base, incise-se profundamente para que a lamina penetre no interior do ventriculo, e dahi, dirigindo-se para a ponta, muito mais levemente, para no extremo não lesar o septo intraventricular: ficará patente a cavidade do ventriculo direito e permittido o estudo de seu conteúdo.

Tomando a ponta do coração e levando-a para cima e para a esquerda, abraçada a viscera em baixo e á direita pela mão, colloque-se de tal sorte que fiquem bem á mostra a borda superior e esquerda e parte da parede posterior: nesta posição procedam-se ao terceiro e quarto córtes.

3º Começará sobre a veia pulmonar superior á esquerda, indo até á base, servindo de reparo neste ponto a veia coronaria, sobre um dos lados da qual terminará o mesmo: deixará aberta a auricula esquerda.

4º Indo, na borda correspondente, desde immediatamente abaixo da base até um pouco antes da ponta, energicamente abra-se o ventriculo esquerdo.

Proceda-se concurrentemente ao exame das cavidades: da auricula direita e seu conteúdo, notando logo a amplitude do orificio auriculo ventricular, introduzindo por elle o indice e o medio, sem violencia; o ventriculo direito, a auricula esquerda e ventriculo respectivo, seguidamente.

O exame mais minudente do orgão só se póde effectuar no exterior, extrahindo-o, pois, para fóra do thorax. Levante-se o coração com a ponta dirigida para cima e, cerce com suas implantações na viscera, por tres ou quatro grandes golpes, desprenda-se-o dos grossos troncos vasculares da base. Apreciem-se as secções da aorta e da arteria pulmonar, seu calibre, consistencia das paredes e mantendo uma ou outra, respectivamente, em posição vertical, de sorte que o plano do orificio fique exactamente horizontal sem experimentar desvios nem tracções, faça-se correr sobre o interior dellas um pequeno fio d’agua. Em virtude disso, as valvulas sigmoides adaptar-se-hão, fazendo perfeita occlusão, si sufficientes, não permittindo que o liquido escape, ou ao contrario deixando-o escoar-se, si uma insufficiencia aortica ou pulmonar existir.

Para experimentar a sufficiencia das valvulas auriculo-ventriculares,recorra-se á pratica de Cornil, immergindo o coração em um vaso de agua, deixando esta penetrar e encher-lhe as cavidades, comprimindo subitamente a porção ventricular, observando si o liquido jorra pelas valvulas mal occlusas, ou negativamente.

Para abrir eompletamente os ventriculos são precisos mais dous cortes, convenientemente dispostos, para nem só poupar os musculos papillares e lacinias valvulares tricuspides e mitraes, como as sigmoides arteriaes.

5º Disposto sobre um plano, como em sua posição normal, trace-se uma linha que, do meio da arteria pulmonar, se dirija sobre o meio da borda inferior do ventriculo, vindo cahir sobre a linha primitiva de secção deste, com pequeno desvio, quasi em angulo recto: o instrumento póde ser disposto entre as sigmoides direita e esquerda, levando a secção a terminar-se entre o pillar anterior da tricuspide e a parede anterior do infundibulo, seguindo uma linha parallela a este.

6º Voltando a borda esquerda para cima, proceda-se no ventriculo correspondente uma incisão, que, partindo da ponta, no logar em que termina a anterior da mesma borda, se vá desviando em angulo agudo para terminar no meio do espaço comprehendido entre o orificio da arteria pulmonar e o appendice esquerdo, guiando no extremo o instrumento para passar entre as sigmoides, sem lesal-as.

Este methodo tem sua escolha imposta nos casos em que se supponha vantajoso apreciar a qualidade e a quantidade relativa de sangue contida em cada uma das cavidades do coração, e ainda quando, em presença de uma grande embolia pulmonar, se deseje pesquisar o embolo, sem deslocal-o. Quando maior conveniencia houver em se indagar do estado de sufficiencia occlusora das valvulas ventriculares, por processo mais preciso que a pratica de Cornil, recommendada anteriormente, recorra-se ao seguinte.

Extracção primitiva do coração para fóra do thorax: Examinado exteriormente, levante-se o coração pela ponta e seccionem-se, rente com o pericardio parietal, os grandes vasos dependentes. Conduzido para fóra, um novo exame externo, muito mais preciso, póde ser conseguido.

Incisadas, pelo meio já indicado, as auriculas direita e esquerda permittirão o exame de seu interior e da superficie auricular das valvulas mitral e tricuspide.

A prova da corrente da agua, pelo meio já prescripto para as sigmoides, demonstrará sua sufficiencia.

Para fazer a mesma indagação da mitral, sustente-se o coração na palma da mão esquerda, com os seus medio e indice prenda-se a aorta, e deixe-se cahir sobre a face auricular da mitral um fio de agua que encha o ventriculo e depois a auricula. Comprimindo com a mão direita o ventriculo repleto, sangue, coalhos, agua, são expellidos; limpa a cavidade, si a valvula fôr sufficiente, as suas bordas livres adaptar-se-hão e nem uma gotta de liquido surdirá através do orificio occluso. Respectivamente para a tricuspide. Abra-se então a viscera, dando as outras incisões prescriptas anteriormente.

Depois do coração abram-se e examinem-se os grandes vasos, deixando a aorta para depois de retirados os pulmões.

7º Pulmões:

Examinados os saccos pleuraes, seu conteúdo normal ou pathologico, pericardio, coração e grandes vasos, procure-se retirar os pulmões da caixa thoracica. Para isso busque-se com a mão isolal-os de qualquer adherencia, e livres, repuxados um pouco para baixo e para a frente, seccionem-se horizontalmente, primeiro o bronchio esquerdo, depois o direito. Examinem-se, então, detidamente, as pleuras, suas superficies, estado, disposição e particularidades encontradas e todas as circumstancias externas dos pulmões, volume, fórma, coloração, consistencia, podendo até submettel-os á prova hydrostatica.

Para inspeccional-os internamente colloquem-se sobre um plano, por sua face diaphragmatica, mantenha-se a borda anterior por uma das mãos e pratique-se uma longa e profunda incisão comprehendendo quasi toda a espessura, de cima a baixo, na direcção do hilo.

Golpes parallelos, convergindo para o hilo, permittirão mais completo exame, mantendo as connexões do orgão. Por meio de tesouras vão se abrindo successivamente as vias aereas e circulatorias, das maiores ás mais finas ramificações, até as diminutas que não permittam mais esse exame.

Complete-se a inspecção revistando as paredes internas da caixa thoracica.

8º Pescoço:

Comece-se applicando sobre o esophago uma ligadura acima do nivel da crossa da aorta, para impedir que as materias provindas do estomago sujem a cavidade thoracica, seccionando o orgão assim ligado.

Descollem-se, de cada lado, as partes molles externas, pela incisão já ordenada precedentemente.

Cortadas as inserções inferiores de todos os musculos do pescoço, voltados então para cima, observem-se os vasos da região, especialmente suas paredes, a thyroide, o larynge, a trachéa, incisando-os e abrindo-os, successivamente.

Identicamente proceda-se com o esophago e o pharynge.

O corpo e os cornos do osso hyoide devem ser bem examinados para o reconhecimento das fracturas de que podem ser séde.

O exame complementar das amygdalas, ganglios lymphaticos, nervos e glandulas salivares, estados das massas musculares profundas do pescoço e porção cervical da columna vertebral devem seguir-se.

9º Abdomen:

Por motivos de dependencia anatomica e conveniencia technica, deve-se obedecer á seguinte ordem de inspecção dos orgãos abdominaes:

1º Epiploon;

2º Baço;

3º a) Rim esquerdo, capsula supra renal, uretherio;

b) Rim direito, capsula supra renal, uretherio

4º Bexiga urinaria, urethra;

5º a) Prostata, vesiculas seminaes, penis, cordão espermatico;

 b) Vagina, utero, trompas, ovarios;

6º Recto;

7º Duodeno, porção intestinal do cholédoco;

8º Estomago;

9º Ligamento hepato-duodenal, conductos excretores da bilis, veia porta, vesicula felica, figado;

10º Pancreas, ganglio celiaco;

11º Mesenterio, ganglios lymphaticos, vasos, etc.;

12º Intestinos, delgado e grosso;

13º Ganglios lymphaticos retro-peritoneaes, aorta, veia cava inferior.

10. Epiploon:

Já examinado por occasião da abertura do abdomen, o grande epiploon e o peritoneo parietal podem agora ser detidamente estudados.

11. Baço:

Apprehendido e isolado o baço, trazido para fóra e para cima, seccionem-se os vasos na proximidade do hilo, retire-se-o da cavidade abdominal, apreciando o volume, fórma, consistencia, coloração, disposição e espessamento da capsula. Procedam-se então a córtes longitudinaes convergindo para o hilo, permittindo verificar o estado dos tecidos, sua vascularização e modificações possiveis.

12. Rins, capsulas supra-renaes e uretherios:

No mesmo lado do baço, á esquerda, levantando e rejeitando á direita os orgãos abdominaes circumvisinhos, porções ascendentes e descendentes do intestino, etc., procure-se o rim esquerdo, capsula supra-renal e uretherio, pondo-os a descoberto para um summario exame externo.

Destaque-se o diaphragma ao nivel de suas inserções costaes, trace-se uma incisão semi-circular atrás do rim, ao longo de sua borda convexa, e outra semelhante na borda concava e voltada para elle, comprehendendo vasos renaes, uretherio, capsula supra-renal, e é facil sua retirada. Examinada a camada cellulo-gordurosa que o reveste, faça-se na superficie da capsula, ao longo da borda convexa, uma incisão pouco profunda, para descorticar o orgão.

Desadherida a capsula envoltora, tem-se a nú a superficie de rim, permittindo a observação de seu aspecto, côr, tamanho, consistencia, peso, fórma, etc.

O exame interno é feito após a secção em duas metades, operada por incisão ao longo da borda interna ainda, externa e profunda, até o bassinete. A secção dos calices e bassinetes completará o estudo necroptico.

Para o rim direito o processo será o mesmo, devendo-se, para procural-o, trazer para a esquerda o intestino e orgãos deslocados, desligar o coecum, os colons ascendente e transverso, afastando-os tambem para a esquerda, assim como o figado, que convem levantar um pouco para não ser lesado.

13. Orgãos genito-urinarios. Recto:

Procure-se a bexiga, examine-se no logar, e, desprendida de suas adherencias na symphyse pubiana, incise-se sua parede anterior por meio de tesouras, permittindo larga inspecção e palpação da superficie interna pelos dedos e a apreciação de seu conteúdo.

Os orgãos pelvianos são então retirados em massa para um exame ulterior, fóra da cavidade.

Com a faca procure-se destacar o recto, da parede posterior, trazendo-o para cima e para deante, e, raspando resolutamente a superficie interna da bacia, excave-se a mesma, desprendendo todas as partes molles.

Na borda inferior da symphyse pubiana destaque-se a parte superior da urethra, no homem, e, por largas incisões parallelas, seccionem-se as partes molles no perineo até o anus, que deve ser retirado com o recto, tendo sido circumscripto por um córte circular.

Puxando a bexiga e o recto para cima e para trás, com a ponta da faca, cortando as ultimas connexões, tem-se em bloco os orgãos genito-urinarios e a ultima porção do intestino grosso a examinar.

Na mulher, afastadas as côxas, ao lado dos grandes labios trace-se uma incisão curva de concavidade interna indo encontrar-se acima com o do lado opposto, no monte de Venus, abaixo, nas circumvisinhanças do anus.

A urethra é incisada por tesouras em toda a sua extensão até á bexiga, sendo a porção peniana ao longo do raphe mediano dos corpos cavernosos.

A proposta será examinada por incisões obliquas, na direcção dos conductos ejaculadores.

A bexiga largamente aberta permittirá ver o collo, o trigono, a desembocadura dos uretherios.

As vesiculas seminaes são examinadas separando a bexiga do recto e procedendo a alguns cortes.

Nas bolsas façam-se lateralmente incisões cutaneas e depois das varias tunicas que envolvem os testiculos, notando adherencias, corpos livres, exsudados, liquidos anormaes. Os testiculos a nú, procedam-se incisões longitudinaes, passando através do corpo de Highome, indo ter ao epididymo, separando-o.

Na mulher, a urethra será incisada em sua face anterior, seccionando-se conjunctamente o vestibulo, clitoris, e o penis, na linha mediana.

A bexiga será aberta como no homem.

A vagina será incisada lateralmente e á esquerda, em toda a extensão.

O collo uterino inspeccionado, com uma tesoura faça-se uma incisão em sua face anterior, continuando a secção até o fundo do utero; dos extremos desta, transversalmente, procedam-se a duas outras para os lados, na direcção das trompas, de modo a riscar nas paredes do orgão uma secção em T que permitta bem examinal-o.

Abram-se as trompas em toda sua extensão e os ovarios no sentido de seu grande eixo.

O recto será aberto com tesouras, ao longo de sua borda posterior, em todo seu cumprimento, observando-se particularidades da mucosa, gráo de vascularização, estado de esphincter, etc.

14. Duodeno. Estomago:

Inspeccionadas as partes visiveis, procure-se com a mão assegurar-se da situação, fórma, mobilidade, consistencia e volume dos orgãos. O dedo, explorando externamente o pylóro, penetra facilmente no hiato de Winslow e póde verificar o estado do epiploon gastro-hepatico e da pequena curvatura.

Para abril-os, faça-se uma extensa incisão ao longo da grande curvatura, indo até á face anterior do duodeno. A’ medida que este córte vae abrindo a viscera, aprecie-se o seu conteúdo, que se poderá recolher, para um exame minucioso, seguindo-se a inspecção da superficie interna.

Indague-se o estado de permeabilidade do cholédoco e do cystico, fazendo expressão na vesicula biliar e notando o escoamento que se faz no duodeno; examine-se a veia porta e só depois retirem-se o estomago e o duodeno para maiores pesquizas fóra da cavidade.

15. Figado e vesicula biliar:

Apreciados em sua situação normal estes orgãos, sob o ponto de vista de sua disposição, fórma, consistencia, cor, dimensões, relações com os orgãos visinhos, retirem-se da cavidade. Tomando entre as mãos o lóbo esquerdo e trazendo para cima e para fóra, desprendam-se profundamente todas as adherencias, seccionando-as.

O pediculo do ligamento hepato-duodenal seccionado é separado de suas adherencias com o figado e a vesicula felica; esta por sua vez isolada e aberta com tesoura permittirá o estudo de seu conteúdo.

Ao longo da face convexa do figado, de um lado e de outro, nos dous lóbos, trace-se uma grande incisão transversal, a que se podem seguir outras aos lados, parallelamente, procurando no hilo guardar a contiguidade das porções seccionadas do orgão.

16. Pancreas. Ganglios e plexos:

Descoberto o pancreas e examinando externamente, uma incisão anterior e longitudinal, da cabeça á cauda, permittirá examinar o tecido da viscera e o canal respectivo, si attingido pelo córte.

Retirada a glandula, será facil examinar o ganglio celiaco e o plexo solar, adeante dos pilares do diaphragma, entre a origem do tronco celiaco e as capsulas supra-renaes.

17. Mesenterio:

Inspeccinado já no começo, por occasião da abertura do abdomen, o mesenterio deve agora ter o seu exame completo, com todos os seus diverticulos, chamando a attenção o estado dos vasos e ganglios mesentericos.

18. Intestino delgado e grosso:

Depois de ter examinado cada uma das porções do intestino, notado a extensão, consistencia, volume, etc., desprenda-se inteiramente, a partir do coecum e indo até o jejuno, sua insersão mesenterica.

Com tesouras ou enterotomos, a começar do jejuno, abra-se todo o intestino, totalmente ou por pares, tendo o cuidado, neste caso, de fazer ligaduras prévias entre os diversos tractos, observem-se a natureza do conteúdo, o estado da superficie interna e notadamente certas regiões, como a parte terminal do intestino delgado, a valvula ileo-coecal, o appendice vermicular, etc.

19. Vasos, ganglios, etc.:

Desprenda-se o mesenterio de suas adherencias á columna vertebral e delle libertado examinem-se e abram-se a aorta descendente e as arterias illiacas, as veias cavas e illiacas, passando em seguida aos ganglios retro-peritoneaes.

Pesquize-se o estado do canal thoracico e da cisterna de Pecquet, anormalmente manifestos.

20. Membros:

O exame dos membros é feito quando requerido por circumstancias particulares: luxação, fracturas, lesões osseas, articulares, etc. Não ha carencia de regras especiaes para esse exame, feito, entretanto, com a minucia dos antecedentes, si exigido.

IV

ENVENENAMENTO

Art. 22. Toda vez que haja uma suspeita de envenenamento a necropsia deve dirigir-se de um modo especial, com o fim de colher, com segurança, a causa da morte e o agente que a motivou.

Como condição preparatoria para uma necropsia desta natureza, faça-se a acquisição de vasos de vidro, de bocca larga, fechados a esmeril ou com tampos adaptados exactamente, podendo conter cinco litros, cerca, os maiores, e 100 a 200 grammas os menores.

Devem ser extremamente limpos com agua acidulada por acido chlorhydrico ou agua alcoolisada e enxaguados com agua distillada. Folhas de papel pergaminho e de cautchú para revestir externamente o boccal dos vidros, fio para prendel-os, rotulos em branco para inscripção, firmas e outras precauções para assegurar a authenticidade, completam o material.

O exame externo póde, em casos especiaes, dar informes uteis ao porteiro: será procedido rigorosamente, aliás como nos casos geraes do art. 19.

O exame interno deverá sempre iniciar-se pela cavidade abdominal.

A’ simples inspecção verificar-se-ha o estado e disposição das visceras, assim como sua vascuralisação, exsudados anormaes, côr, cheiro que exhalem. A primeira determinação nestes casos é retirar as visceras e seus conteúdos sem que nenhuma porção destes se perca nem soffra a juncção de substancia extranha, sob qualquer pretexto que seja. O preceito immediato é recolhel-as e os conteúdos em vasos separados.

Si existe um exsudado ou transudado peritoneal, deve ser recolhido, ao menos em parte, e confiado ao primeiro frasco.

Ponha-se uma dupla ligadura no extremo inferior do esophago e outra ao nivel do pyloro, e, assim circumscripto o estomago, seja retirado da cavidade, seccionando entre as duas duplas ligaduras. Leve-se a um dos vidros, abra-se com tesouras na região indicada, extravasem-se as materias contidas no interior, observando a côr, o cheiro, a reacção e qualidades particulares.

Examinando o conteúdo recolhido ao frasco e esvasiado o estomago, leve-se viscera a uma placa de vidro bem limpa e distenda-se aberta para o exame de suas paredes. Para isso póde-se laval-a com precaução, para melhor apreciar as lesões, recolhendo a agua da lavagem, pois é possivel tenha acarretado um pouco do toxico. Cada substancia particular, segundo sua acção immediata, feiçoando essas lesões, sinão com um cunho caracteristico para cada uma, ao menos com uma apparencia variavel dentro de certos limites, mas constante para um certo grupo de toxicos, será preciso notar o genero, modo, extensão e caracteres das lesões observadas. Completo o exame, rejeite-se o orgão para o vaso que já recebeu seu conteúdo.

Duas outras ligaduras collocadas ao nivel do recto e no extremo do intestino delgado permittirão isolar estas duas porções do tubo intestinal, indo-se abril-os em dous vasos differentes, que receberão, respectivamente, seu conteúdo e, depois de exame, os ductos abertos.

A necropsia da cavidade abdominal completar-se-ha pelo exame do figado, baço, rins, uretherios, bexiga urinaria, etc.

A do thorax permittirá verificar a existencia de liquidos pleuriticos e recolhel-os, o estudar o coração e seu conteúdo, pulmões, vasos e, finalmente, esophago, recolhido então ao vaso destinado ao estomago.

A medulla e o cerebro depois de um rapido exame serão juntamente colleccionados.

Fragmentos de ossos longos e largos, de carne muscular, tirada de preferencia ao psoas, diaphragma e dos membros, de pelle, em algum logar ulcerado ou ferido, serão igualmente recolhidos.

Será esta a distribuição dos orgãos e liquidos normaes e patologicos confiados aos vasos portadores:

Vaso:

exsudado ou transudado, peritoneal (si houver).

   »   :

esophago, estomago e seu conteúdo.

   »   :

intestino delgado e seu conteúdo.

   »   :

intestino grosso e seu conteúdo.

   »   :

figado e vesicula biliar.

   »   :

rins e bexiga urinaria.

   »   :

urina.

   »   :

exsudado ou transudado pleural (si houver).

   »   :

sangue.

10º

   »   :

coração, pulmões, baço.

11º

   »   :

cerebro e medulla.

12º

   »   :

500 grammas de musculos.

13º

   »   :

fragmentos de ossos.

14º

   »   :

Pedaços de pelle ferida ou chagada.

Porções ainda não dissolvidas de veneno encontradas no estomago, ultimas dejecções do envenenamento e substancias rejeitadas pelo vomito, recolhidas em casos especiaes, devem ser respectivamente confiadas a vasos portadores.

Nos casos de exhumação, além dos orgãos, seus destroços ou residuos putrefeitos, cabellos e ossos, si mais não existir, recolham-se em vasos adequados, fragmentos do esquife, da mortalha, substancias pulverulentas achadas, amostras da terra adherente, sobreposta, sobposta, de aos lados do cadaver e de alguns metros distante, de natureza analoga, para os effeitos do exame comparativo, si preciso.

Fixe-se então, em cada um dos frascos, a rolhas ao gargalo, pelas carapuças de cautchú e de papel pergaminho humedecido, atados por numerosas voltas de fio, bem amarrado, sobre o qual se derrame um pouco de cêra e imprima-se o sello ou signal para dar caracter de authenticidade.

Convenientemente rotulados e authenticados com as firmas dos peritos e da autoridade, serão estes vidros enviados ao laboratorio medico geral, para a pericia toxicologica, acompanhados do protocollo na necropsia.

V

INCENDIO, ASPHYXIAS (INUNDAÇÃO E MORTE POR ANESTHESICOS INCLUSAS)

Art. 23. Nos casos de incendio, asphyxias (inundação e morte pelos anesthesicos, comprehendidas), as necropsias serão conduzidas como geralmente, levando-se entretanto as pesquizas além das tres cavidades, sempre obrigadas, pois são capitaes em alguns destes generos de morte lesões do pescoço, da face, da medulla.

Toda vez que preciso, para delucidação pericial, sangue ou outros tecidos organicos serão enviadas ao laboratorio medico legal para exames espectroscopicos, chimicos, cryoscopicos, etc.

VI

INFANTICIDIO

Art. 24. Os peritos devem começar obtendo, além de todas as informações pregressas sobre o parto, sua facilidade ou trabalho, occurrencias, logar em que se deu, circumstancias que o cercaram, testemunhas que o presenciaram ou por qualquer motivo delle tiveram conhecimento, outras relativas á criança, o modo por que foi achada, como em que disposição, logar e condições ambientaes, mencionando objectos, pannos, manchas recolhidas.

Vindo o recemnascido acompanhado dos annexos fetaes, cumpre fazer o seu exame. Descreva-se a placenta, mencionando si unilobulada e arredondada, ou chanfrada em ultilobulada, caracteres particulares, vasos do cordão rôtos em sua proximidade, peso, comprimento, largura, espessura, verificando si está integra ou esphacellada e si apresenta signaes pathologicos. Observe-se a porção placentaria do cordão, seu modo de inserção, torção, divisões, dimensões. Membranas, si existirem, devem ser descriptas.

Inspeccione-se externamente o cadaver, notando-se seu desenvolvimento, constituição, estado dos tegumentos, côr, disposição, rugas, manchas pergaminhadas provenientes da dissecação, livores cadavericos de hypostase, manchas de sangue, de meconio, inducto fetal, rigidez cadaverica, signaes de putrefacção, etc., descrevendo com minuciosidade a situação, extensão e particularidades desses signaes.

Determine-se o sexo, a altura, o peso e complete-se o exame externo.

Cabeça: Apreciados o tamanho, conformação, proporções em relação ao resto do corpo, investigue-se, parte por parte, o couro cabelludo, pellos de que é revestido, estado das fontanellas, bossas sero-sanguinea, traços de violencia e assim a face, descrevendo olhos, orelhas, nariz, bocca; mencionando circumstancias anatomicas e quaesquer indicios de violencia externa que possam existir. Com o compasso de espessura tomem-se os diametros antero-posterior ou occipito frontal, o transverso (bi-parietal ou bi-temporal), o occipito-mentoniano e o sub-occipito-bregmatico.

Pescoço: Descrevam-se seus caracteres, mencionem-se manchas, impressões, suffusões sanguineas, erosões e traços de lesões outras encontraveis.

Thorax: Descrevam-se a conformação geral e traços de lesões encontraveis, tomem-se as circumferencias no vertice e na base, os diametros bi-acromial e esterno-vertebral.

Abdomen: Aprecie-se o estado dos tegumentos, abobadamento ou depressão de parede, traços de violencia; o estado do cordão, extensão, disposição, nós que porventura tenha, enrolamento possivel sobre o pescoço, thorax, abdomen, notando o sulco resultante; si cortado, a superficie de secção, dilaceramentos, rupturas, ligaduras,– si cahido ou retrahido em cordão fibroso escurecido, seus caracteres e os da ferida ou cicatriz umbilical com suas particularidades; os orgãos sexuaes, investigando particularmente o escroto e a situação dos testiculos, nos meninos, e clitoris, nymphas, vagina e grandes labios nas meninas, o anus; tome-se o diametro bi-iliaco.

O dorso, a columna vertebral, os membros, especialmente nestes o estado das unhas, devem ser examinados para o conhecimento de sua conformação, disposição, proporções e traços de lesões apreciaveis.

Incisão externa e abertura do abdomen: Do labio inferior ao pubis, incisem-se as partes molles, tendo o cuidado de desviar a linha para a esquerda do umbigo e de não comprometter na secção os vasos umbilicaes. Note-se o gráo de abobadamento do diaphragma, medindo com os dedos sua correspondencia externa com as costellas ou espaços intercostaes. Passe-se uma dupla ligadura no cardia e no pyloro.

Bocca e pescoço: Incisem-se as bochechas a partir da commissura dos labios á orelha do mesmo lado e dissequem-se as partes molles abaixo da incisão, até a parte inferior do pescoço. Inspeccione-se a cavidade buccal, suas paredes, lingua, fundo da garganta, pharynge, orificio superior do larynge, parte posterior das fossas nasaes. No pescoço examine-se o estado dos vasos, do larynge, do osso hyoide, dos musculos, da porção cervical da columna vertebral. Uma ligadura abaixo do larynge permitte abril-o sem deixar expostas as vias aereas.

Thorax: Destacadas as partes molles, retire-se o plastrão esternal, cortando as claviculas pelo meio e levando as secções parallelamente até a base do thorax. Examine-se o thymo, sua fórma, desenvolvimento, côr e signaes particulares. Notem-se os pulmões, si deprimidos na parte superior do thorax, não lobulados, lisos, côr de figado, vermelho escuro, ou, ao contrarioroseos, menos compactos e densos, riscados de pequenas marmorizações ou linhas escuras circumscrevendo os lobulos e enchendo o thorax. Examinem-se o pericardio, seu conteúdo, manchas lenticulares e o coração, observando a quantidade e a qualidade do sangue que contém, esmiuçando todas as dependencias, ventriculos, auriculas, valvulas, buraco oval, aorta, arteria pulmonar, veias, canal arterial. Retirem-se então os pulmões para o exame externo e para a prova docimasica. A palpação e inspecção podem informar da consistencia das diversas partes do orgão, dos signaes de putrefacção, existencia de pequenas bolhas de ar, zonas atelectasicas, etc.

Em um vaso de capacidade sufficiente, largo e profundo, cheio de agua, na temperatura, ordinaria, serão os pulmões collocados, com cautela, sem adherirem ás paredes por ponto algum; observem-se então si sobrenadam ou si submergem, rapida ou lentamente, e, neste caso, si ficam em meio do liquido ou vão ter ao fundo do vaso. Retire-se a arvore aerea, separem-se os dous pulmões para iguaes verificações, isolados, integros, a principio, seccionados por fragmentos, posteriormente, notando por occasião das secções a consistencia, superficies de incisão, quantidade de sangue, estado dos bronchios, alterações atelectasicas ou outras encontradas.

Incisões ao longo da trachéa e dos bronchios permittirão seu estudo e de algum conteúdo anormal que offereçam.

Abdomen: Voltando ao abdomen, primitivamente aberto, procura-se o estomago, já ligado ao nivel do cardia e do pyloro por duas duplas ligaduras, e isole-se o orgão por ellas delimitado. Examine-se externamente, observando o estado do replecção ou vacuidade e submetta-se á prova hydrostatica. Si alguma parte sobrenada, tira-se a prova real da existencia do ar incluso: introduzindo através das paredes a agulha de um trocarte, escapar-se-hão bolhas gazosas. Abra-se em seguida a viscera, notando o estado de suas paredes e sobretudo seu conteúdo, sentindo-lhe o cheiro, observando côr, aspecto, consistencia e rocolhendo-o, si preciso, para um exame toxicologico. O esophago aberto, em seguida, note-se o estado de suas paredes e de seu conteúdo, si existir. Verifiquem-se a situação do figado na cavidade abdominal, suas relações e influencias sobre o abobadamento do diaphragma e notadamente seu peso, dimensões, côr, estado de irrigação sanguinea; vesicula biliar o seu conteúdo. Pese-se o baço, examinem-se sua superficie, dimensões, côr e lesões encontraveis.

Notem-se o estado dos rins, sua coloração, peso, estado de irrigação e presença possivel de infarctos nas papillas renaes. Abra-se a bexiga, certificando si contém urina, sua quantidade e qualidade. Examinem-se os orgãos sexuaes internos, os testiculos, si ainda não desceram para as bolsas, os ovarios e o utero, nas crianças do sexo feminino. Já ligado o duodeno, abaixo do pylóro, e collocada uma outra ligadura no recto, separe-se concluso o intestino, posto tambem á prova docimasica e aberto depois ao nivel da incisão mesenterica, observando a vacuidade ou o conteúdo de certas partes, a presença do meconio e suas qualidades nas diversas porções do intestino grosso.

Craneo e cerebro: Usando a mesma incisão retro-auricular das partes molles, desnudo-se o craneo. Estudem-se o periosteo e as fontanellas, suas dimensões, caracteres e gráo diverso de ossificação dos ossos do craneo. Com uma tesoura e o maior cuidado, a partir da fontanella anterior seccione-se circularmente o craneo, retirando a pequena calota, respeitando todavia as lesões encontradas, para o que dará outra orientação aos golpes. Lesões apparentemente despercebidas podem ter grandes effeitos internos: convem examinar contra a luz o couro cabelludo e pequena calota, pesquizando-os. Descrevam-se o estado das meninges, da massa cerebral, sua superficie, particularidades, lesões, e retirada da cavidade, procedam-se aos cortes variados prescriptos. Afastada a massa encephalica, inspeccione-se cuidadosamente a base do craneo. Para proceder á docimasia otica ou auricular incise-se, transversalmente, a base, atrás das apophyses mastoides e adiante pelo meio das arcadas zygomaticas, desarticule-se o maxillar inferior e o atlas e sobre o bloco isolado abra-se com tesouras a cavidade da orelha média, investigando a existencia de grumos mucosos da caixa do tympano, si desappareceram parcialmente ou estão substituidos por algum conteúdo insolito.

Medulla: A abertura operada com tesouras permittirá saber a relação das lesões externas com as do canal vertebral e seu conteudo ou lesões especiaes a este.

Membros: O exame dos membros é carecido, não só para a verificação de fracturas, luxações, despedaçamentos, esmagamentos, mas sobretudo para o informe do gráo de ossificação dos diversos ossos, circumstancia de altissimo alcance; nunca se deve omittir o exame da extensão do nucleo de ossificação da epiphyse inferior do femur, entre outros.

VII

RECOMPOSIÇÃO CADAVERICA

Art. 25. Realizada a autopsia, cumpre aos peritos recompor o cadaver em todas as suas partes, collocando respectivamente os orgãos em sua situação natural e fazendo externamente nos tegumentos a sutura das partes incisadas, para que se disfarcem o mais possivel as mutilações praticadas.

VIII

RELATORIO PERICIAL

Art. 26. Levada a termo a necropsia e tomadas ordenadamente, á medida que se realizarem as secções, todas as notas, descripções, reparos e particularidades, com esses elementos, e como complemento da acção pericial, será redigido o protocollo ou relatorio do exame cadaverico.

Este instrumento juridico compõe-se essencialmente de tres partes: preambulo, exposição, conclusões.

No preambulo os peritos mencionarão seus nomes por extenso, titulos que os recommendam e dão sancção legal a seu sacerdocio, declaração do facto sobre que vão depor e da autoridade que lhes conferiu a investidura.

Na exposição relatarão os factos observados, seguindo um methodo uniforme, accorde com a technica adoptada. Para isso, na descriptiva da autopsia, rubricas diversas dividirão ordenadamente as declarações do exame. Esses assignalamentos podem ser feitos por letras e numeros, segundo o modelo seguinte:

I – Inspecção externa

1, 2, 3, até 20, por exemplo – diversas secções desse exame.

II – Inspecção interna

A – Cavidade craneana

21, 22, 23 até 35, por exemplo – diversas apreciações desse exame, parte por parte.

B – Cavidades thoraxica e abdominal

36, 37, 38 até 42, por exemplo – diversos dados e relações communs.

a) CAVIDADE THORAXICA

43, 44, 45 até 55, por exemplo – observações relativas aos orgãos diversos e seus exames.

b) CAVIDADE ABDOMINAL

56, 57, 58 até 70, por exemplo – observações relativas aos orgãos e secções abdominaes.

As conclusões trarão deductivamente o juizo pericial deante dos factos observados.

Em todos os casos será sempre o relatorio pericial elaborado immediatamente depois da necropsia, permittindo-se apenas que a ultima parte, as conclusões, seja posteriormente appensa, legalmente authenticada, como as primeiras.

O relatorio deve ser elaborado em linguagem clara, precisa, intelligivel, sem qualificações nem classificações inopportunas, mas accessivel, mesmo aos não profissionaes, procurando antes descrever que nomear, mencionar que classificar.

Devem-se evitar as apreciações vagas o dizer antes em que consistem os factos observados que capitular, a esmo, de inflammado, ulcerado, insolito, normal, cotundido, dilacerado, etc.

Outro tanto se deve fazer com certas qualificações que nada dizem em sua vasta imprecisão: prefira-se medir, pesar, esquadrinhar, comparar, a escrever consideravel, pouco, muito, bastante, claro, corado, plethorico, edemaciado, etc.

Além destes relatorios, podem os peritos, voluntariamente ou por solicitação da autoridade, offerecer quaesquer commentarios medico-legaes elucidativos.

CAPITULO IV

Exames de laboratorio

Art. 27. Além dos exames directos no vivo e no cadaver, a pratica pericial exige muitas vezes, como complemento, affirmação, decisão, para seu juizo, technicas especiaes que se podem ser conseguidas nos laboratorios: é o caso das analyses toxicologicas, microchimicas, espectroscopicas, pesquizas de sangue, esperma, etc., em manchas suspeitas; distincção qualitativa de pellos e cabellos e seus artificios tinctoriaes, conservação e moldagem de marcas, preparo e conserva de peças de convicção, exames histologicos e bacterioscopicos, photographia medico-legal, praticas de cryoscopia, cyto-diagnostico e outras de que a miudo se valle a sciencia para deducções medico-judiciarias.

Art. 28. Obedecidas com exacção todas as regras prescriptas no art. 21, os frascos portadores das visceras destinadas ao exame toxicologico, acompanhados do protocollo da necropsia, serão enviados, sem detença, ao laboratorio, para iniciar-se a pesquiza methodica.

Em livro competentes será feita a escripturação respectiva, mencionando o recebido e em que condições, assim como o destino especial que deve ter.

Em regra, o perito reservará metade de cada um dos frascos, reacondicionada, convenientemente, como de começo, para possibilidade de nova pericia ou confirmação requerida da primeira.

A metade utilizada será por sua vez dividida, para formação do conjuncto homogeneo sobre que se instituirão as pesquizas ordenadas e separação de fragmentos de cada orgão para os estudos de localização e dosagem relativa do toxico.

Havendo indicios flagrantes ou alludidos de um determinado veneno, a analyse chimica começará pelas indagações correlatas; no caso contrario seguirá os processos geraes de pesquiza, permittindo investigações sobre os principaes toxicos, determinando, si possivel, não só a dose, como a fórma de combinação em que foi administrado.

No diario do laboratario serão minuciosamente mencionadas todas as phases da operação chimica, processos e reacções empregados, experiencias physiologicas realizadas.

O relatorio constará das tres partes classicas mencionadas, podendo utilizar-se na exposição de quaesquer observações anteriores, precursoras ou associadas do veredicto chimico.

Art. 29. As pesquizas de sangue, esperma, meconio, etc. em substancia ou em manchas suspeitas, cabellos, pellos, porções de fibras textis, etc., realizam-se com os cuidados e precauções dos exames similares já aludidos, segundo praticas scientificas autorizadas, exigindo-se o transporte dos objectos a examinar em frascos convenientes, ou caixas asseiadas, si se tratar de pannos e pedaços de madeira, etc., de grande volume, regularmente authenticadas.

O relatorio mencionará condições da remessa, objectos examinados, processo e technica operatoria usados.

Art. 30. A conservação e moldagem das marcas realizam-se pelos processos indicados em arte, attendendo á natureza da marca e o destino do molde exacto.

Qualquer orgão ou tecido que o perito pretenda reservar como peça de convicção será guardado em vaso fechado, de dimensões proporcionaes, cheio de liquido conservador apropriado, de que é typo o de Kaiserling e suas variantes (formalina 800 gr., acetato de potassio 85 gr., azotato de potassio 45 gr., agua distillada 4.000 gr.).

Art. 31. O exame histologico, precisado muitas vezes para delucidações da anatomia morbida e consequente diagnostico medico-judiciario da morte, dependendo, em exito, da maneira de colher os tecidos e das manipulações prévias ao exame, são de seguir-se as regras indicadas, si outras de sciencia autorizada tambem se não interpuzerem. Neste caso, taes praticas carecem de justificativa escripta no protocollo.

Tomem-se fragmentos de differentes partes do orgão, nitidamente cortados com faca bem afiada, em cubos de um centimetro de aresta, no maximo, para que se possam bem impregnar de fixadores e endurecedores. A capsula que reveste certos orgãos (rim, etc.) deve ser incluida no fragmento. Os orgãos ôcos (bexiga urinaria, estomago, intestino, etc.) e as membranas (mesenterio, meninges, etc.) serão distendidos por meio de alfinetes em laminas de cortiça. Nos tumores convem colher cubos da peripheria, centro e porção intermedia.

As amostras recolhidas devem ser postas em frascos de bocca larga, cheios de liquido fixador, sempre que possivel em volume 50 vezes superior ao fragmento a fixar, impedido o contacto directo com o fundo e paredes do vaso por uma pasta de algodão hydrophilo.

Os fixadores são physicos e chimicos e estes simples e complexos. Os primeiros são mais usados para tecidos liquidos (sangue, lympha, pus, etc.) Os fixadores chimicos, simples, são principalmente o alcool, a formalina, os bichromatos, o bichloreto de mercurio, os acidos chromico, osmico, picrico.

Quando o alcool absoluto for usado, devem os fragmentos de tecido ser muito pequenos para facilidade de penetração, suspensos no meio do liquido, mudado este diariamente durante os primeiros dias: é o fixador preferido para os epithelios, musculos, glandulas e a maior parte dos tumores. Usando do methodo dos alcooes progressivamente mais fortes, põem-se primeiro os fragmentos em alcool ao terço, depois a 50, a 70, a 90 e por fim absoluto: assim é a deshydratação mais lenta, mais completa a coagulação das substancias albuminoides, menos frequentes as retracções.

A formalina usa-se em solução de 3 a 6 p. 100 em alcool a 85, para visceras (figado, rim, testiculo, etc.), de 10 p. 100 para o systema nervoso.

Os bichromatos mais usados são os de potassio e de ammonio, em solução aquosa a 20 p. 1.000, especialmente o primeiro sob a formula, de Müller (bichromato de potassio 20 gr., sulfato de sodio 10 gr., agua distillada 1.000 gr.); empregam-se geralmente para o systema, nervoso e para as visceras congestas e orgãos muito vascularizados, devido á perfeita conservação dos globulos vermelhos; convem renovação frequente do liquido e evitar a permanencia das peças por mais de mez, porque se tornam quebradiças e frageis.

O bichloreto é usado em solução aquosa concentrada, devendo os fragmentos ficar no fundo do vaso até se tornarem brancos ou opacos; tem vantagem sobretudo para os córtes em que se pretende investigar a presença de microbios.

Acido chromico: é usado até 1 p. 100.

Acido osmico a 1 p. 100, p. 200, p. 500, em quantidade de solução equivalente a 20 vezes o volume do objecto: usado para a gordura, myelina.

Acido picrico em solução aquosa a 4 p. 100: descalcificante preferido dos ossos pouco volumosos.

Os fixadores complexos mais usados são:

1º, liquido de Müller 3 partes, formalina 1 parte: após immersão por 24 ou 48 horas removam-se os fragmentos para o alcool absoluto, por sua vez renovado todas as 24 horas;

2º, alcool absoluto 2 partes, formalina 1 parte;

3º, liquido de Fleming, etc.

Sendo muitas destas praticas apenas iniciadas pelos peritos por occasião da colheita, no acto da autopsia, convem sempre mencionar o realizado, para conhecimento e procedimento consecutivo do profissional do laboratorio.

Art. 32. Fazendo-se preciso exame bacterioscopico ulterior, as amostras devem ser colhidas em condições de segurança, evitando, pelas praticas asepticas, ingerencias estranhas. Para o fim utilizar-se-hão laminas, pipetas, tubos capillares fechados a lampada, agulhas, trocartes, seringas, vasos, devidamente esterilizados. Os liquidos recolhidos convenientemente são conservados em tubos estereis, fechados com algodão ou a lampada, ou entre duas laminas juntas, devendo seguir-se o exame immediatamente. Preparados podem ser obtidos para o exame em estado fresco ou preliminarmente tratados para a coloração consecutiva: espalhada a substancia sobre a lamina, por meio de fio de platina ou bordo de outra lamina, estereis, em camada muito delgada, seccada ao ar livre, sob uma campanula por meio de substancias hygroscopicas ou com auxilio commedido do calor, fixada por algumas gottas de alcool-ether, pela passagem na chamma ou pela platina evaporante, ou ainda pelo aquecimento seguido da acção do sublimado a 3 p. 103 – póde ser enviada para coloração e exames microscopicos.

Entre outros, nos casos de suspeita ou possibilidade de contaminação gonococcica, nos attentados contra o pudor, o exame bacterioscopico é formalmente exigido.

Art. 33. As technicas da cryoscopia, do cyto-diagnostico e outros elementos da semeiotica contemporanea, teem cabida em praticas medico-legaes: utilizadas como nos processos geraes de diagnose medica, exigem as cuidadosas maneiras de recolher os liquidos a examinar, prescriptas anteriormente.

Art. 34. A photographia é um elemento de prova pericial muito importante, sobretudo nas indagações da identidade. O dispositivo para posição do cadaver, a restituição, por compressas humidas ou injecção na camara posterior de um pouco de agua glycerinada, dos meios oculares evaporados, a retracção das palpebras pelo sulfato de alumina, indicados pelo professor posse, recompondo o olhar e dando ao morto uma apparencia de vida, para o fim da photographia, são aconselhaveis. Outrotanto, as praticas de Richardson e Tourdes, tendentes a recompor a physionomia em seus traços, fazendo desapparecer a côr anegrada e a tumefacção cadaverica, peculiares a certos generos de morte (1º, loção da face, por 24 horas, pelo menos, com panno embebido em uma solução phenicada de 50 a 100 p. 1000, ou de chloreto de cal ou zinco de 100 p. 1000; 2º banho, si não bastou a loção, por 24 ou 48 horas, com inmersão completa, em agua contendo 10 kilogrammas de chloreto de sodio, 500 gr. de acido chlorhydrico; 3º, injecção pela carotida ou femural de uma solução de chloreto de zinco e ferro em agua chlorada, ou de glycerina boratada, segundo a formula de Bouchard (100 gr. de borato de sodio, 100 de alcool, 1000 de glycerina).

Art. 35. Quaesquer praticas scientificas outras, não consignadas ou ainda não utilizadas em medicina legal, teem cabida, por este regulamento, uma vez justificadas criteriosamente no relatorio e obedecidos os principios basicos estatuidos.

CAPITULO V

Disposições complementares

Art. 36. Os serviços medico-legaes do Districto Federal a que se refere o presente regulamento serão confiados aos sete profissionaes já designados, cabendo a um delles os trabalhos do laboratorio e aos outros seis, igualmente, as praticas periciaes no vivo e no cadaver.

Art. 37. Ao medico perito indicado, nos termos do art. 46 do regulamento que acompanhou o decreto n. 4764, de 5 de fevereiro de 1903, para dirigir o serviço, além dos deveres communs a todos os medicos legistas, compete:

1º Regular, indistinctamente, por prévio accordo, e com audiencia do chefe de policia, a ordem no revesamento dos peritos para os dias e trabalhos exigidos.

2º Corresponder-se com o chefe de policia, sobre tudo quanto concernir ao gabinete medico-legal.

3º Propôr as medidas que julgar necessarias á regularidade do serviço.

4º Visar todos os documentos medico-legaes, chamando a attenção para quaesquer infracções deste regulamento, e communicando-as ao chefe de policia, si desattendido.

5º Encaminhar com a devida informação os pedidos ou reclamações dos medicos peritos.

6º Ter sob sua guarda o museu do crime, a bibliotheca e o material do gabinete.

7º Prestar ao chefe do gabinete de identificação e de estatistica todas as informações que lhe requisitar para o bom desempenho dos serviços a seu cargo.

Art. 38. Ficam revogadas as disposições em contrario.

Rio de Janeiro, 15 de junho de 1903.

J. J. Seabra.