DECRETO N

DECRETO N. 5652 – DE 26 DE AGOSTO DE 1905

Concede autorização para funccionar ao Banco de Credito da Lavoura da Bahia e approva os respectivos estatutos.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, attendendo ao que requereu o Dr. Joaquim Ignacio Tosta, agricultor, residente no Estado da Bahia:

Resolve conceder ao Banco de Credito da Lavoura da Bahia a necessaria autorização para funccionar e approvar os estatutos que a este acompanham, pelos quaes reger-se-ha o mesmo banco.

Rio de Janeiro, 26 de agosto de 1905, 17º da Republica.

Francisco DE PAuLA RodrigUES ALVeS.

Leopoldo de Bulhões.

Estatutos do Banco de Credito da Lavoura da Bahia

CAPITULO I

ORGANIZAÇÃO, SÉDE, DURAÇÃO E FINS DO BANCO

Art. 1º E’ constituida com a denominação de Banco de Credito da Lavoura da Bahia uma associação anonyma, de conformidade com as leis federaes que regem a materia e a lei estadual n. 474, de 5 de setembro de 1902, para operar em emprestimos á lavoura e ás industrias connexas, neste Estado.

Art. 2º A séde do banco será nesta cidade do Salvador para todos os effeitos juridicos, e a sua duração de 35 annos, a contar da data de sua installação; podendo o prazo ser prorogado por deliberação da assembléa geral.

Art. 3º O banco tem por fim:

a) Emprestar sob hypotheca, penhor agricola ou caução:

1º, aos agricultores, criadores ou profissionaes das industrias connexas;

2º, aos syndicatos agricolas, organizados de accordo com a lei n. 979, de 6 de janeiro de 1903, e ás cooperativas agricolas de todo genero, nas quaes se comprehendem especialmente as caixas ruraes do typo Raiffeisen.

b) Servir de intermediario, em beneficio dos profissionaes da agricultura e das industrias connexas, quer individualmente, quer collectivamente, aggremiadas em associações agricolas, não só para a compra de animaes reproductores de raça, machinas agrarias, apparelhos e utensilios destinados á profissão de seus committentes, como tambem para a venda de seus productos; podendo emittir warrants, nos termos das leis federaes. A commissão por estas operações será estabelecida pela directoria, não podendo exceder de 2 1/2 %.

Art. 4º Com o intuito de facilitar a formação do credito agricola no seio das populações ruraes, o banco dará preferencia, na distribuição dos emprestimos, ás caixas ruraes do typo Raiffeisen.

CAPITULO II

CAPITAL DO BANCO E SUAS OPERAÇÕES

Art. 5º O capital do banco será de cinco mil contos de réis, divididos em acções (50.000) de cem mil réis cada uma, das quaes o Estado poderá subscrever 40.000, applicando para esse fim o producto do imposto de 1 % sobre o valor official da exportação de todos os productos agricolas, conforme o disposto no art. 3º da lei já citada de 5 de setembro de 1902.

§ 1º Subscripto o capital integralmente (como preceitua a lei das sociedades anonymas), as chamadas serão feitas pela directoria, de accordo com o Governo do Estado; devendo os accionistas entrar com 10 % no acto de assignar os presentes estatutos.

§ 2º As acções serão nominativas.

§ 3º Ao accionista que não acudir á chamada no prazo marcado, a directoria designará novo prazo, e, si neste ainda não se realizar a entrada, serão declaradas em commisso as acções, perdendo o accionista as entradas, que reverterão para o fundo de reserva, podendo ser as acções reemettidas.

Art. 6º O banco só poderá emprestar, qualquer que seja a fórma do emprestimo, a profissionaes da agricultura ou industrias connexas, nos termos do art. 8º, e para a movimentação e desenvolvimento da agricultura ou industria.

A directoria verificará a profissão do mutuario, sendo ella responsavel, pessoal e solidariamente, pela importancia do emprestimo, no caso de não ser observada a exigencia legal, isto é, provando-se que o mutuario não era profissional da agricultura no momento de contrahir o emprestimo.

§ 1º Verificando-se que o mutuario não empregou o emprestimo na movimentação ou desenvolvimento de sua industria, será considerado vencido o debito para todos os effeitos, pelo que esta clausula será expressamente estabelecida no documento creditorio.

§ 2º Os emprestimos hypothecarios não poderão exceder á importancia de cem contos de réis, e os de penhor agricola sobre bens moveis ou semoventes, machinismos e instrumentos da lavoura e fructos pendentes á de trinta contos de réis.

§ 3º Os emprestimos hypothecarios de mais de cincoenta contos de réis deverão ser garantidos por bens immoveis, cujo valor seja, pelo menos, correspondente ao triplo da importancia dos emprestimos.

§ 4º O prazo dos emprestimos hypothecarios não poderá exceder de 33 annos e o dos emprestimos sob penhor, a que se refere o § 2º, será no maximo de tres annos.

§ 5º Nos emprestimos hypothecarios o banco entregará ao mutuario nunca menos de 20 % em moeda legal e o mais em letras hypothecarias de sua emissão.

§ 6º A taxa dos juros dos emprestimos hypothecarios não poderá exceder de 8 % ao anno, pagaveis por semestres vencidos, e a amortização será a que fôr estipulada no contracto, de accordo com o prazo do emprestimo.

A taxa dos juros dos emprestimos sob penhor e caução não excederá de 9 %.

Si decorrido o segundo semestre, o devedor de juros ou amortizações do semestre anterior não fôr executado, a directoria fica responsavel pessoal e solidariamente pelo emprestimo.

§ 7º O banco, além dos juros, cobrará, por uma só vez, uma commissão nunca superior a 1 % sobre a importancia total do emprestimo.

§ 8º Os emprestimos do penhor agricola sobre bens moveis ou semoventes, machinismos, instrumentos de lavoura, fructos pendentes e productos armazenados na propria fazenda do mutuario, a que se refere a lei de 5 de setembro de 1902, não poderão ser feitos sem garantia de um ou mais lavradores idoneos, ou outra fiança idonea.

Não sendo observada a exigencia da garantia, a directoria é responsavel pessoal e solidariamente pelo debito, si o mutuario desviar ou dispuzer dos objectos penhorados e não cumprir os compromissos contrahidos na época estipulada.

§ 9º Nos emprestimos hypothecarios os mutuarios declararão na proposta que fizerem ao banco o valor dos bens dados á hypotheca, mas só prevalecerá o que fôr fixado pelo representante do banco.

Art. 7º Os emprestimos só poderão ser realizados mediante as seguintes garantias:

1ª) De primeira hipotheca de propriedades agricolas, inclusive fazendas de criação em effectiva cultura de explorar e de predios urbanos, não excedendo a importancia mutuada de 50 % do valor dos bens dados em garantia.

2ª) De penhor agricola:

a) sobre bens moveis ou semoventes, machinismos e instrumentos de lavoura e fructos pendentes;

b) sobre fructos armazenados em trapiches ou entrepostos commerciaes até 60 % do seu valor.

3ª) De caução:

a) de titulos da divida publica federal ou estadual, das letras hypothecarias do proprio banco, com abatimento de 10 % sobre o valor da cotação;

b) de debentures de sociedade anonyma que goze de garantia de juros ou subvenção da União ou do Estado da Bahia, e de mercadorias com desconto de 20 % no valor dos bilhetes, baseado no preço corrente destes.

4ª) Sob a fórma de conta corrente, garantida por hypotheca, penhor ou caução.

Art. 8º Nos contractos de hypotheca o banco poderá incluir a clausula do vencimento da divida e consequente direito de seu reembolso antes do vencimento, si, no prazo de 30 dias, o mutuario não denunciar as deteriorações que o immovel tenha soffrido, as faltas que lhe diminuam o valor, perturbem a sua posse ou tornem litigioso o direito de propriedade.

CAPITULO III

LETRAS HYPOTHECARIAS

Art. 9º O banco, para effectividade dos emprestimos hypothecarios, emittirá letras hypothecarias de 100$ cada uma, na razão do quintuplo do capital realizado, podendo a emissão ser elevada, ao decuplo com autorização prévia do Governo do Estado.

A emissão far-se-ha por series de mil, só podendo ser emittida a serie subsequente depois de esgotada a anterior, e com autorização do Governo.

Art. 10. As letras vencerão o juro do 7 % ao anno, pago semestralmente, e serão resgatadas de accôrdo com o decreto n. 370, de 2 de maio de 1890 e mais legislação em vigor. Poderão ser nominativas ou ao portador.

Paragrapho unico. O pagamento dos juros das letras hypothecarias será feito semestralmente, em janeiro e julho, e o resgate em fevereiro de cada anno, incinerando-se as resgatadas.

Art. 11. Os juros dos emprestimos hypothecarios serão pagos em dinheiro.

A amortização vencida ou os pagamentos antecipados do capital poderão effectuar-se indistinctamente em dinheiro ou em letras hypothecarias ao par.

CAPITULO IV

DIVIDENDO E FUNDO DE RESERVA

Art. 12. Os lucros liquidos, cuja apuração a directoria fará semestralmente e mediante balanço provisorio approvado pelo conselho fiscal e pelo fiscal do Governo, serão divididos proporcionalmente ao capital realizado, deduzindo-se antes da somma total 5 % para o fundo de reserva.

Paragrapho unico. O dividendo que tocar ao Estado será levado ao fundo de reserva, na fórma do art. 3º, § 2º, da lei de 5 de setembro de 1902.

Art. 13. Quando o dividendo do banco attingir a 10 %, o excedente do lucro liquido será assim distribuido:

a) 2/5 para o fundo de reserva;

b) 1/10 para commissão da administração até a importancia de seus vencimentos no maximo;

c) o restante será dividido proporcionalmente pelos seus devedores hypothecarios e de penhor agricola, creditando-se a quantia respectiva ás suas contas.

Art. 14. O fundo de reserva do banco será constituido:

a) do 5 % dos lucros liquidos;

b) do dividendo correspondente ao capital subscripto pelo Estado;

c) de 2/5 do excedente aos lucros liquidos, relativos ás acções do banco, quando o dividendo attingir a 10 %.

Art. 15. O fundo de reserva, á medida que se fôr apurando, irá sendo empregado em titulos da divida publica federal ou do Estado da Bahia, ou em letras hypothecarias do banco.

Paragrapho unico. Logo que o fundo de reserva attingir a 20 % do capital social, com as garantias a que se refere o art. 7, n. 3, lettra a, o excedente poderá ser empregado em operações de emprestimo que offereçam garantias de facil e prompta liquidação.

CAPITULO V

DIRECÇÃO

Art. 16. O banco será administrado por uma directoria de tres membros eleitos pelo accionistas em assembléa geral. Os eleitos escolherão dentre si o presidente, o secretario e o director-caixa. O presidente será substituido successivamente pelo secretario e pelo director-caixa, os quaes se substiturão reciprocamente.

Art. 17. Os directores serão retribuidos com o honorario annual de doze contos de réis para o presidente e oito contos de réis a cada um dos outros, sendo o pagamento mensal.

Art. 18. A eleição far-se-ha por escrutinio secreto e maioria absoluta de votos dos accionistas que possuirem dez acções, pelo menos, não sendo elegiveis os que não forem votantes.

Art. 19. O mandato da directoria durará tres annos, renovando-se annualmente o terço, e os directores não assumirão a administração do banco sem préviamente caucionarem a responsabilidade de sua gestão com cem acções integralizadas, proprias ou não, que serão inalienaveis emquanto não forem approvadas as contas de sua administração, ou com dez contos de réis representados por dinheiro, apolices da divida publica federal ou do Estado, que tambem serão levantadas depois da mencionada approvação.

Na primeira eleição, porém, o mandato do director-caixa será apenas de um anno e o de secretario do dous annos.

Art. 20. A directoria reunir-se-ha uma vez por semana, pelo menos, lavrando-se acta circumstanciada de tudo; cumprindo ao fiscal do Governo assistir ás reuniões de accordo com o art. 18 da lei de 5 de setembro de 1902, e assignar a acta, impugnando qualquer operação contraria aos fins do instituto e levando os factos ao conhecimento do Governo.

Haverá sessão extraordinaria sempre que o interesse social o exigir.

No impedimento temporario de qualquer dos directores, excedente de trinta dias, a substituição provisoria será feita pelo presidente, que convidará os supplentes na ordem da votação.

Havendo vaga por morte, renuncia ou abandono do logar, abandono que se presumirá pelo facto de não comparecer o director a duas reuniões successivas sem causa participada e motivo justificado, a substituição far-se-ha do mesmo modo, devendo a vaga ser definitivamente preenchida na primeira sessão ordinaria da assembléa geral.

Art. 21. Nos limites da lei e dos presentes estatutos, a directoria exercerá o seu mandato com plenos poderes, cabendo-lhe tambem o direito de crear, nomear e demittir empregados e marcar-lhes os vencimentos e gratificações com prévia audiencia do fiscal do Governo, devendo exigir fiança quando julgar conveniente.

Art. 22. Compete ao presidente:

1º, representar officialmente o banco em Juizo ou fóra delle em todas as suas relações, podendo constituir mandatarios;

2º, presidir as sessões da directoria, de accordo com os estatutos, e dirigir todos os negocios e transacções do banco;

3º, marcar reuniões extraordinarias da directoria e convocar extraordinariamente a assembléa geral sempre que entender necessario;

4º, assignar os balanços, inventarios, contractos, titulos representativos das acções, saques, letras, endossos, creditos, letras hypothecarias e quaesquer titulos de responsabilidade do banco.

§ 1º Compete ao director-secretario: redigir as actas das sessões da directoria, ter a seu cargo os respetivos livros e assignar com o presidente os titulos a que se refere o n. 4 do art. 22.

§ 2º Compete ao director-caixa ter sob sua guarda immediata o cofre do banco, todas os seus valores em moeda legal ou titulos de credito e documentos relativos ás operações da associação.

CAPITULO VI

ASSEMBLÉA GERAL

Art. 23. A assembléa geral se compõe dos accionistas em numero legal, cujas acções estiverem inscriptas no registro do banco com trinta dias de antecedencia.

Art. 24. A assembléa geral reunir-se-ha ordinariamente, uma vez por anno, durante o mez de março, e extraordinariamente todas as vezes que fôr convocada pelo presidente da directoria, o qual, em ambos os casos designará no convite o dia e a hora da reunião.

A convocação extraordinaria tambem poderá ser feita pelos outros dous directores ou por um grupo de cinco accionistas.

Art. 25. Para a assembléa geral poder deliberar deverão comparecer accionistas que representem, pelo menos, o quarto do capital social, salvos os casos do art. 6º do decreto n. 164, de 17 de janeiro de 1890, nos quaes será necessaria a presença de accionistas que representem dous terços do capital.

Art. 26. As convocações serão feitas por annuncios publicados na gazeta official e em outra das de maior circulação desta cidade do Salvador, com antecedencia de 15 dias.

Não comparecendo numero legal de accionistas no dia designado, far-se-ha nova convocação com antecedencia de oito dias, declarando-se que a assembléa deliberará qualquer que seja a somma do capital representado.

Si, porém, a assembléa geral fôr convocada para os casos do art. 6º do decreto n. 164, de 17 de janeiro de 1890, e não comparecerem accionistas que representem dous terços do capital no dia marcado pela segunda vez, haverá terceira convocação com antecedencia de cinco dias, procedendo-se na fórma do § 4º do art. 15 do mesmo decreto.

Art. 27. As reuniões da assembléa serão presididas por um presidente eleito annualmente, e, na sua falta ou impedimento, pelo accionista que a assembléa designar, servindo de secretarias dous accionistas que o presidente nomear.

Art. 28. Os votos serão assim expressados:

Um voto por cada dez acções.

Nenhum accionista poderá ter mais de 500 votos, qualquer que seja o numero de acções que possua.

Art. 29. Os accionistas poderão fazer-se representar por procuração passada a outros accionistas do banco, devendo o instrumento do mandato ser apresentado, tres dias antes da reunião da assembléa, ao presidente do banco, salvo o Estado, que será representado pelo secretario do Thesouro ou qualquer funccionario publico por este designado.

As votações serão symbolicas ou por acções inscriptas e de accordo com o art. 28, quando dez accionistas presentes o requererem.

Art. 30. As discussões serão resumidas, fallando cada orador vinte minutos e não podendo cada accionista falar mais de duas vezes.

Art. 31. O balanço e mais documentos a que se refere o art. 147 do regulamento approvado pelo decreto de 4 de julho de 1891 ficarão na secretaria do banco á disposição dos accionistas para serem examinados desde trinta dias antes da reunião convocada para a sua discussão e approvação.

Art. 32. Compete á assembléa geral:

1º, discutir e julgar as contas annuaes;

2º, nomear os membros da directoria e do conselho fiscal, preencher as vagas existentes e destituir os administradores que desmerecerem de sua confiança por violação provada dos estatutos;

3º, resolver sobre todas as questões de interesse da sociedade, para cujo exame houver sido convocada na fórma dos estatutos;

4º, reformar os estatutos de conformidade com a proposta que fôr apresentada.

CAPITULO VII

CONSELHO FISCAL

Art. 33. Além do fiscal do Governo, de que trata a lei de 5 de setembro de 1902, no art. 18, haverá um conselho fiscal composto de tres accionistas e tres supplentes, eleitos todos dentre os que possuirem 50 acções pelo menos.

Art. 34. As funcções do conselho, que serão gratuitas, emquanto não fôr resolvido o contrario pela assembléa geral, consistem em examinar os livros e as operações do banco, emittir parecer sobre ellas e dar consultas á directoria sobre os assumptos que por esta lhe forem submettidos, de accôrdo com os arts. 118 a 127 do decreto n. 434, de 4 de julho de 1894.

Art. 35. O banco depositará trimestralmente no Thesouro do Estado a importancia que fôr marcada, para a remuneração do fiscal, nas instrucções que o Governo expedir sobre as attribuições e obrigações do mesmo.

CAPITULO VIII

DISPOSIÇÕES GERAES

Art. 36. Serão supplentes dos directores e dos membros do conselho fiscal os immediatos em votos, decidindo a sorte em caso de empate.

Art. 37. Os casos omissos nestes estatutos serão regidos pelas leis federaes e estaduaes relativas á materia.

Bahia, 25 de fevereiro de 1905. – O incorporador, Joaquim Ignacio Tosta.

CLBR Vol. 02 Ano 1905 Págs. 836-1 a 836-5 Tabelas.