DECRETO N. 7.669 - DE 18 DE NOVEMBRO DE 1909

Autoriza o contracto de arrendamento da Rede de Viação Cearense e bem assim a construcção de algumas das estradas de ferro que a constituem.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, tendo em vista as autorizações conferidas nos ns. XI e XXIV, Iettra d, do art. 16 da lei n. 2.050, de 31 de dezembro de 1908, e outrosim o que requereram Novis & Port Saboya Albuquerque & Comp., actuaes arrendatarios das estradas de ferro de Baturité e Sobral, no Estado do Ceará, no sentido de serem os respectivos contractos transferidos á South American Ralway, Construction Company Limited, que para esse fim apresentou uma proposta,

decreta:

Artigo unico. Fica o ministro de Estado da Viação e Obras Publicas autorizado, a contractar com a South American Railway, Construction Company, Limited, o arrendamento; de diversas estradas de ferro, constituindo a rede de viação cearense, bem como a construcção de alguns prolongamentos e ramaes das mesmas estradas, mediante as clausulas que com este baixam assignadas pelo referido ministro.

Rio de Janeiro, 18 de novembro de 1909, 88º da Independencia e 21º da Republica.

NILO PEÇANHA.

Francisco Sá.

Clausulas a que se refere o decreto n. 7.669 desta data

I

O contracto tem como objecto:

1º O arrendamento da rede de viação ferrea cearense, constituida pelas seguintes linhas:

a) a Estrada de Ferro de Baturité, actualmente em trafego até a estação de Miguel Calmon, comprehendendo os ramaes da Alfandega e de Maranguape;

b) a Estrada de Ferro de Sobral igualmente em trafego;

c) o prolongamento desta estrada a partir da cidade de Ipú até a villa de Cratheus, á medida que fôr sendo construido pelos respectivos contractantes e recebido pelo Governo na fórma do contracto a que se refere o decreto n. 6.734, de 14 de novembro de 1907;

d) o prolongamento, os ramaes e a ligação mencionadas no numero seguinte.

2º A construcção e conclusão de construcção:

a) do prolongamento da Estrada de Ferro de Baturité, a partir do seu actual ponto terminal na estação Miguel Calmon até a povoação de Macapá;

b) dos ramaes de Icó e de Crato da mesma estrada;

c) do prolongamento da Estrada de Ferro de Sobral, entre as proximidades da villa de Crateús e a cidade de Therezina;

d) de uma linha ferrea que, partindo de Fortaleza ou outro ponto mais conveniente e passando pela Uruburetama, estabeleça a ligação das estradas de ferro de Baturité e Sobral.

3º Fornecimento de material necessario para o completo estabelecimento das referidas estradas de ferro.

§ 1º Sómente depois de concluida a construcção da linha de Miguel Calmon ao Crato, será iniciada a de prolongamento do ponto de bifurcação daquella confluencia do Riacho dos Portos com o rio Salgado ou nas immediações desta para Macapá.

§ 2º A companhia poderá prolongar, á sua custa, o ramal da Alfandega até o porto de Mucuripe e estabelecer ahi uma ponte de embarque sob as condições que opportunamente forem estabelecidas pelo Governo.

II

A rêde de viação ferrea de que trata a clausula precedente, incluindo as estações, officinas, depositos e mais edificios, dependencias e bemfeitorias, e todo o material fixo e rodante assim como o material em serviço do almoxarifado, preciso para os differentes misteres de trafego, e devendo corresponder ás necessidades de um trimestre, reverterão para o domínio da União sem indemnização alguma, findo o prazo de arrendamento em 31 de dezembro de 1970.

III

O preço do arrendamento constará:

I. Das seguintes contribuições sobre a renda bruta em papel moeda:

a) 5% da renda bruta até 2:500$ por kilometro;

b) 10% do excesso da renda bruta, de 2:500$ a 4:000$ por kilometro;

c) 15% do excesso da renda bruta de 4:000$ 4:500$ por kilometro;

d) 20% do excesso da renda bruta de 4:500$ a 5:000$ por kilometro;

e) 25% do excesso da renda bruta sobre 5:000$ por kilometro.

II. Da contribuição de 20% da renda liquida que exceder a 1.000:000$, papel, por anno.

IV

Para os effeitos do contracto de arrendamento são considerados:

I. Como capital:

Uma somma inicial devidamente justificada pela companhia e approvada pelo Governo e as quantias autorizadas pelo Governo para serem levadas a esta conta, na qual nenhuma quantia poderá ser incluida sem que preceda approvação do Governo e represente despeza por elle previamente autorizada.

II. Como renda bruta:

A somma de todas as rendas ordinarias, extraordinarias e eventuaes arrecadadas pela companhia.

III. Como despezas de custeio:

Todas as que forem relativas ao trafego das estradas de ferro, á conservação ordinaria e extraordinaria das linhas, edificios e suas dependencias, á renovação do material fixo e rodante, ás resultantes de accidentes na estrada, roubos, incendios, seguro e de todos os casos de força maior; ás de administração na Europa, approvados pelo Governo, e ás de fiscalização por parte deste.

IV. Como renda liquida:

A differença entre a renda bruta e as despezas de custeio, augmentadas das contribuições pagas pela companhia como preço de arrendamento, nos termos da clausula precedente.

Determinar-se-ha a extensão das estradas de ferro arrendadas, para o effeito de fixar a renda bruta média kilometrica, computando-se apenas a distancia real de centro de estação inicial a centro de estação terminal, sem levar em conta os desvios nem as linhas duplas.

V

A tomada de contas para pagamento das contribuições de que trata a clausula III será feita por processo identico ao que vigorar para pagamento da garantia de juros.

§ 1º No primeiro semestre de cada anno a renda bruta arrecadada será considerada provisoriamente como a metade da renda bruta annual.

§ 2º A liquidação definitiva das contribuições devidas á Fazenda Nacional pelo arrendamento das estradas de ferro far-se-ha na tomada de contas do segundo semestre de cada anno, de accôrdo com a renda bruta de todo o anno.

§ 3º Concluidas as tomadas de contas semestraes, a companhia recolherá ao Federal, no prazo de 10 dias, as contribuições de arrendamento que tiverem sido apuradas.

VI

A companhia receberá as estradas de ferro e todas as suas dependencias por inventario, ao qual serão sempre accrescentados o material rodante e obras novas levadas á conta de capital, e deduzido o material imprestavel que for substituido, a juizo do Governo, lavrando-se termo da entrega, do qual constará o competente recibo.

Findo o arrendamento, a companhia entregará as estradas de ferro por esse inventario com as modificações que houver soffrido durante o prazo do contracto. Servirá o mesmo inventario para os casos de encampação do contracto de arrendamento e de occupação temporada pelo Governo.

VII

O Governo poderá occupar temporariamente, na sua totalidade ou em parte, a rede de viação ferrea, objecto deste contracto, mediante indemnização não superior á média da renda liquida dos periodos correspondentes no quinquennio precedente á occupação ou nos annos anteriores, caso não haja ainda decorrido um quinquennio; ou á medida da renda liquida nos mezes anterior, caso não haja ainda decorrido um anno.

VII

O Governo poderá fazer a encampação do contracto depois de 31 de dezembro de 1940.

A indemnização corresponderá, neste caso, a 25% da renda liquida média annual verificada no ultimo quinquennio, multiplicada pelo numero de annos que faltarem para a terminação do arrendamento, e mais o capital fixado nos termos da clausula IV, deduzida delle a competente amortização, calculada pela fórmula.

A = a 

sendo A o capital primitivo, a a dotação annual da amortização e n o numero de annos do contracto e a taxa de amortização.

Fica entendido que a presente clausula só é applicavel aos casos ordinarios que não abroga o direito de desapropriação por utilidade publica que tem o Estado.

IX

O trafego das estradas não poderá ser interrompido, salvo caso de força maior, comprehendidas nestes as greves de operarios das estradas por mais de 15 dias e as determinações do Governo.

X

A companhia obriga-se a admittir e manter trafego mutuo com as empresas de viação ferrea e fluvial e, bem assim, com a Repartição Geral dos Telegraphos, na fórma das leis e dos regulamentos em vigor e de conformidade com as normas adoptadas na Estrada de Ferro Central do Brazil; e a estabelecer percurso mutuo com as estradas de ferro, a que for applicavel, conforme as disposições adoptadas nas Estradas de Ferro de Santos a Jundiahy e Paulista, submettendo os respectivos accôrdos á approvação do Governo.

XI

O Governo conserva-se o direito de fazer executar pela companhia ou por conta delta, durante o prazo do arrendamento, as alterações e novas obras, cuja necessidade a experiencia haja indicado, em relação á segurança publica e policia das estradas de ferro ou ao trafego.

XII

A companhia fica obrigada a augmentar o material rodante, em qualquer época, desde que este se torne insufficiente para attender ao desenvolvimento do trafego.

XlII

Todas as indemnizações e despezas motivadas pela construcção, conservação, trafego e reparação das estradas de ferro correrão, exclusivamente, sem excepção, por conta da companhia.

XIV

A companhia obriga-se a cumprir as disposições do regulamento de 26 de abril de 1857, e bem assim quaesquer outras da mesma natureza que forem adoptadas para segurança e policia das estradas de ferro, uma vez que não contrariem as presentes clausulas.

XV

A companhia é obrigada a conservar com cuidado e durante todo o tempo de arrendamento, e a manter em estado de preencherem perfeitamente o seu destino, tanto as estradas de ferro e suas dependencias como o material rodante, sob pena de multa ou de ser a conservação feita pelo Governo, á custa da companhia.

No caso de interrupção de trafego, excedente de 30 dias consecutivos, por motivo não justificado, o Governo terá o direito de impôr uma multa por dia de interrupção igual á renda liquida do mesmo dia no anno anterior, e restabelecerá o trafego, correndo as despezas por conta da companhia.

XVI

A companhia deverá apresentar estudos para os trabalhos de açudagem e irrigação, que forem determinados pelo Governo na zona privilegiada de que trata a clausula seguinte, tendo preferencia em igualdade de condições com outros concurrentes para a execução das obras respectivas, cujos estudos por ella feitos tenham sido approvados.

XVII

Durante o tempo do arrendamento, o Governo não concederá nenhuma estrada de ferro dentro de uma zona de 20 kilometros para cada lado do eixo das estradas arrendadas e na mesma direcção destas.

O Governo, porém, reserva-se o direito, de conceder outros estradas de ferro, que tendo direcções diversas, embora partindo dos mesmos pontos daquella de que se trata, possam approximar-se destas e até cruzal-as, comtanto que dentro das respectivas zonas não recebam generos ou passageiros.

XVIII

O Governo poderá fazer, depois de ouvida a companhia, concessão de ramaes para uso particular, partindo das estações ou de qualquer ponto das linhas arrendadas, sem que a companhia tenha o direito a qualquer indemnização, salvo si houver augmento eventual de despeza de conservação.

Todas as obras definitivas ou provisorias, necessarias para obter neste caso a segurança do trafego, serão feitas sem onus para a companhia.

XIX

As tarifas serão préviamente approvadas pelo Governo e não excederão aos preços usuaes a tempo de sua organização. Serão revistas pelo menos de tres em tres annos a contar da data da approvação, si o Governo assim o determinar, tendo principalmente em vista favorecer a producção nacional.

As tarifas iniciaes serão as que forem approvadas pelo Governo e serão as mesmas para toda a rede, com applicação de uma tabella differencial, segundo as distancias.

XX

Pelos preços fixados nessas tarifas, a companhia será obrigada a transportar constantemente, com cuidado, exactidão e presteza, as mercadorias de qualquer natureza, os passageiros e suas bagagens, os animaes domesticos e outros, e os valores que lhes forem confiados.

XXI

Não poderá a companhia arrendataria por si, agentes, empregados ou interpostas pessoas exercer commercio ou fazer exploração industrial de quaesquer productos transportados pelas estradas arrendadas, sob pena de caducidade deste contracto.

XXII

A companhia poderá fazer todos os transportes por preços inferiores aos das tarifas approvadas pelo Governo, mas, de modo geral e sem excepção, quer em prejuizo, quer em favor de quem quer seja. Estas baixas de preço se farão effectivas com o consentimento do Governo, sendo o publico avisado por meio de annuncios affixados nas estações e insertos nos jornaes.

Si a companhia fizer transporte por preço inferior aos das tarifas, sem aquelle prévio consentimento, o Governo poderá applicar a mesma redução a todos os transportes de igual categoria, isto é, pertencentes a mesma classe da tarifa, e os preços assim reduzidos não tornarão a ser elevados, como no caso de prévio consentimento do Governo, sem autorização expressa deste, avisando-se o publico com um mez pelo menos de antecedencia.

As reducções concedidas a indigentes não poderão dar logar á applicação deste artigo.

XXIII

Não haverá transporte gratuito nas linhas da rêde arrendada sinão para o pessoal em serviço e para objecto de serviço, para os materiaes destinados á conservação das linhas, officinas e mais dependencias, e á construcção dos prolongamentos e ramaes, para as malas do Correio e seus conductores, e para o pessoal, encarregado pelo Governo, do serviço de linha telegraphica, respectivo material.

XXIV

O combustivel usado nas locomotivas das estradas será o carvão de pedra. As novas locomotivas só serão acceitas, si tiverem as caldeiras apropriadas para esse combustível; as existentes soffrerão as modificações necessarias para o mesmo fim.

XXV

Sempre que o Governo entender, extraordinariamente, mandará inspeccionar o estado das linhas, suas dependencias e material rodante.

O representante do Governo será acompanhado pelo da arrendataria, e estes escolherão desde logo um desempatador, decidindo da sorte entre os dois nomes indicados, um pelo representante do Governo e  outro pelo da arrendataria, caso não cheguem a um accôrdo. Desta inspecção se lavrará um termo, consignando-se os serviços a fazer afim de assegurar a boa conservação das estradas e regularidade do trafego, bem como fixando os prazos em que elles devem ser executados.

A arrendataria fica obrigada a dar cumprimento ao que lhe for determinado neste termo e nos prazos estatuídos. Não o fazendo será multada e novos prazos serão marcados pelo Governo.

Si dentro desses novos prazos, a companhia não der cumprimento ao que houver sido determinado, o Governo mandará executar á custa da companhia, descontando o despendido da caução de que trata a primeira parte da clausula LIV.

XXVI

A companhia obriga-se:

1º, a exhibir, sempre que lhe for exigido, os livros de receita e despeza do custeio das estradas e seu movimento, a prestar todos os esclarecimentos e informações que lhe forem reclamados pelo Governo em relação ao trafego das mesmas estradas, pela Repartição Federal de Fiscalização das Estradas de Ferro, ou quaesquer funccionarios della, competentemente autorizados e, bem assim, a entregar semestralmente áquella repartição o relatorio circumstanciado dos trabalhos em construcção e da estatística dó trafego, abrangendo as despezas do custeio, convenientemente especificadas, e o peso, volume, natureza e qualidade das mercadorias que transportar, com declaração das distancias médias por ellas percorridas; da receita de cada uma das estações e da estatistica de passageiros, sendo estes devidamente classificados, podendo o Governo, quando entender conveniente, indicar modelo para as informações que a companhia tem de lhe prestar regularmente.

2º, acceitar como definitiva e sem recursos a decisão do Governo sobre as questões que se suscitarem relativamente ao uso reciproco das estradas de ferro, que lhe pertencerem, ou a outra empreza, ficando entendido que qualquer accôrdo que celebrar não prejudicará o direito do Governo ao exame das respectivas estipulações, e a modificações destas, si entender que são offensivas ao interesse da União;

3º, a submetter á approvação do Governo, no prazo de tres mezes contados da assignatura do contracto, o quadro dos seus empregados e a tabella dos respectivos vencimentos, dependendo igualmente qualquer alteração posterior de autorização e approvação do mesmo Governo.

XXVII

Logo que a renda liquida exceder de 12%, o Governo terá o direito de exigir a reducção das tarifas de transporte.

Estas reducções se effectuarão principalmente em tarifas differenciaes para os grandes percursos e nas tarifas dos generos destinados á exportação.

XXVIII

Na época fixada para a terminação da concessão, as estradas de ferro e suas dependencias deverão achar-se em bom estado de conservação.

Si no ultimo quinquennio da concessão das estradas, esta fôr descurada, o Governo terá o direito de aplicar a receita naquelle serviço.

XXIX

Pela construcção das linhas ferreas, o fornecimento de material de que tratam os ns. 2 e 3 da clausula 1ª, o Governo pagará á companhia em titulos de 5% juros, ouro, ao anno, recebidos por ella ao par, a importancia que fôr fixada nos estudos definitivos, approvados pelo mesmo Governo, de accôrdo com a extensão fixada por este, não podendo exceder de 33:000$, ouro, o preço maximo hilometrico.

XXX

A companhia poderá negociar, desde que seja a isso autorizada pelo Governo, a totalidade ou parte dos titulos correspondentes ás estradas de ferro a construir, depositando á disposição do Governo em bancos da praça de Londres, de Paris e no Banco do Brazil, nesta praça, 90% do valor nominal dos titulos neste caso deverão os pagamentos lhe ser feitos em dinheiro, nas mesmas condições de que teriam de ser em apolices, deduzindo, porém, 10% das respectivas contas.

Os juros pagos pelo Governo sobre os titulos emitttidos por antecipação serão debitados á companhia, sendo, porém, levados a seu credito os juros pagos pelos bancos sobre os depositos effectuados, na fórma do disposto na clausula V do decreto n. 6.944, de 7 de maio de 1908.

XXXI

No preço maximo kilometrico estabelecido na clausula XXIX comprehendem-se não só a linha ferrea propriamente dita, como tambem todas as obras de arte definitivas, estações e desvios, dependencias, officinas, depositos, linhas telegraphicas, cercas, material para a installação do trafego e bem assim o material rodante, tudo de accôrdo com os estudos definitivos e especificações que serão submettidos pela companhia á approvação do Governo.

A approvação dos estudos definitivos e especificações terá logar por decreto.

XXXII

E' concedido á companhia:

a) o direito de desapropriar por utilidade publica, na fórma das leis em vigor, os terrenos e bemfeitorias necessarios á construcção das estradas;

b) isenção dos direitos de importação para o material destinado á construcção das estradas e ao respectivo custeio, durante o prazo do arrendamento.

Sendo federaes os serviços a cargo da companhia está ella isenta do pagamento de impostos estaduaes e municipaes.

XXXIII

Os estudos definitivos estradas a construir poderão ser apresentados por secções de extensão não inferior-a 50 kilometros e serão considerados approvados pelo Governo, si, dentro de 30 dias da data da entrega dos resumos, a repartição Federal incumbida da fiscalização por parte do Governo nada houver deliberado a respeito.

XXXIV

A companhia obriga-se:

1º, a apresentar os estudos da primeira secção no prazo de quatro mezes e os de todas as linhas a construir no de 10 mezes, contados ambos esses prazos da data da assignatura do contracto;

2º, a iniciar a construcção da 1ª secção até 30 dias depois da approvação dos estudos;

3º, a dar aos trabalhos de construcção o precisa impulso para que, dentro do prazo de dous annos contados da assignatura do contracto, fiquem concluidos e entregues ao trafego, com o material correspondente, os primeiros 120 kilometros, devendo, outrosim, em cada anno que decorrer, além desse prazo, ser entregue ao trafego nas mesmas condições trechos successivos de 120 kilometros;

Paragrapho unico. A inauguração da estação de lguatú terá logar dentro de seis mezes, contados da assignatura do contracto e na linha de ligação a de S. Francisco no prazo de um anno e a de toda linha no de dous annos, contados da mesma data;

4º, a construir, no prazo de nove mezes da assignatura do contracto, uma estação no ramal de Alfandega, na Estrada de Ferro de Baturité, junto ao ponto de desembarque no porto de Fortaleza, em terreno nivelado e calçado a parallelepipedos;

5º, a atacar os trabalhos de construcção da linha de Crateus e Therezina dessas duas extremidades.

XXXV

Os estudos definitivos de cada secção constarão dos seguintes documentos:

1º Planta geral da linha e um perfil longitudinal com indicação dos pontos obrigados de passagem.

O traçado será indicado por uma linha vermelha e continua sobre a planta geral, na escala de 14.000, com indicação dos raios de curvatura e a configuração do terreno, representada por meio de curvas de nivel equidistantes de tres metros, e bem assim em uma zona de 80 metros pelo menos para cada lado, os campos, mattas, terrenos pedregosos, e sempre que for possivel, as divisas das propriedades particulares, as terras devolutas e as minas.

Nessa planta serão indicadas as distancias kiIometricas contadas do ponto de partida das estradas de ferro, a extensão dos alinhamentos rectos e bem assim a origem, a extremidade, o desenvolvimento, o raio e sentido das curvas.

O perfil longitudinal será feito na escala de 1/400 para as alturas e de 1/400 Para as distancias horizontaes, mostrando respectivamente por linhas pretas e vermelhas o terreno natural e as plataformas dos córtes e aterros.

Indicará por meio de tres linhas horizontaes, traçadas abaixo do plano de comparação

I. As distancias kilometricas, contadas a partir da origem das estradas de ferro;

II. A extensão e indicação das rampas e contra-rampas e a extensão dos patamares;

III. A extensão dos alinhamentos rectos, o desenvolvimento e raio das curvas.

No perfil longitudinal e na planta será indicada a posição das estações, paradas, obras de arte e vias de communicação transversaes.

2º Perfis transversaes na escala de 1/200 em numero suficiente para o calculo do movimento de terras.

3º Projecto de todas as obras de arte, necessarias para o estabelecimento da estrada, suas estações e dependencias, e abastecimento de agua ás locomotivas, incluindo os typos geraes que forem adoptados.

Estes projectos se comporão de projecções horizontaes e verticaes e de secções transversaes e longitudinaes, na escala de 1/200.

4º As plantas de todas as propriedades que for necessario adquirir por meio de desapropriação.

5º Relação das pontes, viaductos, pontilhões e boeiros, com as principaes dimensões, posição na linha, systema de construcção e quantidade de obra.

6º Tabella da quantidade das excavações necessarias para executar-se o projecto, com indicação da classificação provavel e tambem a das distancias médias dos transportes.

7º Tabella dos alinhamentos e dos seus desenvolvimentos, raios das curvas, inclinação e extensão das declividades.

8º Cadernetas authenticas das notas das operações topographicas, geodesicas e astronomicas feitas no terreno.

9º Tabella dos preços compostos e elementares, em que se basear o orçamento.

10. Orçamento da despeza total do estabelecimento da estrada dividido nas seguintes classes:

I. Estudos definitivos e locação da linha.

II. Movimento de terras.

III. Obras de artes correntes.

IV. Obras de artes especiaes.

V. Superstructura das pontes.

VI. Via permanente.

VII. Estações e edificios, orçada cada uma separadamente com os accessorios, officinas e abrigos de machinas e de carros.

VIII. Material rodante, mencionando-se especificadamente o numero de locomotivas e de vehiculos de todas as classes.

IX. Telegrapho electrico.

X. Administração, direccção e conducção dos trabalhos de construção.

XI. Relatorio geral e memoria descriptiva, não sómente dos terrenos atravessados pelo traçado da estrada, mas tambem da zona mais directamente interessada.

Neste relatorio e memoria descriptiva serão expostos com a possivel exactidão a estatistica da população e da producção, o trafego provavel da estrada; o estado, a natureza e a fertilidade dos terrenos, sua aptidão para as diversas culturas, as riquezas mineraes e florestaes, os terrenos devolutos, a possibilidade e conveniencia do estabelecimento de nucleos coloniaes, os caminhos convergentes á estrada de ferro, ou os que convier construir e os pontos mais convenientes para estações.

XXXVI

Procurar-se-ha dar ás curvas o maior raio possivel. O raio minimo será de 150 metros.

As curvas dirigidas em sentidos contrarios deverão ser separadas por uma tangente de 40 metros pelo menos. O trilho será de aço e do peso de 25 kilogrammas por metro corrente.

A declividade maxima será de 1, 8%, limite que só será attingido em casos excepcionaes.

A estrada será dividida em secções de serviço de locomotivas, procurando-se, em cada uma dessas, uniformizar, as condições technicas de modo a effectuar o melhor aproveitamento da força dos motores.

As rampas, contra-rampas e patamares serão ligados por curvas verticaes de raio e desenvolvimento convenientes.

Toda rampa seguida de contra-rampa será separada desta por um patamar de 200 metros pelo menos; nos tunneis e nas curvas de pequeno raio se evitará, o mais possivel, o emprego de fortes declives.

Sobre as grandes pontes e viaductos metallicos, bem como á entrada dessas obras, procurar-se-ha não empregar curva de pequeno raio ou fortes declividades, afim de evitar a producção de vibrações nocivas ás juntas e ás articulações das diversas peças.

As paradas e estações serão de preferencia situadas sobre porção da linha em recta e de nivel.

XXXVII

A estrada será de via singela, mas terá os desvios e linhas auxiliares que forem necessarios para o movimento dos trens.

A distancia entre as faces internas dos trilhos será de 1m,00.

As dimensões do perfil transversal serão sujeitas a approvação do Governo.

As valletas longitudinaes terão as dimensões e declive necessarios para dar prompto escoamento ás aguas.

A inclinação dos taludes, dos córtes e aterros será fixada em vista da altura destes e da natureza do terreno.

XXXVIII

Nos tunneis, como nos viaductos inferiores, deverá haver um intervallo livre nunca menor de 1,50 de cada lado dos trilhos.

Além disto haverá, de distancia em distancia, no interior dos tunneis nichos de abrigo.

As aberturas dos poços de construcção e ventilação dos tunneis serão guarnecidas de um parapeito de alvenaria de dous metros de altura, e não poderão ser feitas nas vias de communicação existentes.

XXVIX

A companhia empregará materiaes de boa qualidade na execução de todas as obras e seguirá sempre as prescripções da arte, de modo que obtenha construcções perfeitamente solidas.

O systema e dimensões das fundações das obras de arte serão fixados por occasião da execução, tendo em attenção a natureza do terreno e as pressões supportadas, por accordo entre a companhia e o Governo.

A companhia será obrigada a ministrar os apparelhos e o pessoal necessarios ás sondagens e fincamento de estacas de ensaios, etc.

XL

A companhia construirá todos os edificios e dependencias necessarios para que o trafego se effectue regularmente e sem perigo para a segurança publica.

As estações conterão sala de espera, bilheteria, accommodações para o agente, armazens para mercadorias, caixa de agua, latrina, mictorio, rampa de carregamento e embarque de animaes, balanças, relogio lampeões, desvios, cruzamentos, chaves, signaes e cerca.

As estações e paradas terão mobilia apropriada.

Os edificios das estações e paradas terão do lado da linha uma plataforma coberta para embarque e desembarque dos passageiros.

As estações e paradas terão dimensões de accôrdo com a sua importancia.

O Governo poderá exigir que a companhia faça nas estações e paradas os augmentos reclamados pelas necessidades da lavoura commercio e industria.

XLI

O trem rodante se comporá de locomotivas, alimentadores (tenders) e carros de primeira e segunda classes para passageiros, de carros especiaes para o serviço do Correio, vagões de mercadorias inclusive os de gado, lastro, freio e, finalmente, de carros para conducção de ferro, madeira etc. indicados no orçamento approvado.

Todo o material será construido com os melhoramentos e commodidades que o progresso houver introduzido no serviço de transportes por estrada de ferro, segundo o typo que for adoptado de accôrdo com o Governo.

O Governo poderá prohibir o emprego de material que não preencha estas condições.

A companhia deverá fornecer o trem rodante proporcionalmente á extensão de cada uma das secções em que se dividir a estrada e que, a juizo do Governo, deva ser aberta ao transito publico, e si nesta secção o trafego exigir, a juizo do fiscal por parte do Governo, maior numero de locomotivas, carros de passageiros e vagões do que proporcionalmente a ellas cabiam, a companhia será obrigada, dentro de seis mezes, depois de reconhecida aquella necessidade por parte do Governo e della sciente, a augmentar o numero de locomotivas, carros de passageiros, vagões e mais material exigido pelo fiscal por parte do Governo, comtanto que tal augmento fique dentro dos limites estabelecidos, no primeiro período desta clausula.

A companhia incorrerá na multa de 2:000$ a 5:000$ por mez de demora além dos seis mezes que lhe são concedidos para augmento do trem rodante acima referido.

E si, passados seis mezes mais além do fixado para o augmento, este não tiver sido feito, o Governo fornecerá o dito augmento de material por conta da companhia.

XLII

A companhia entregará ao Governo sem indemnização alguma, logo que inaugurar o trafego de cada secção das estradas, uma das linhas telegraphicas, que é obrigada a construir, em toda a extensão das estradas, responsabilizando-se ella pela guarda dos fios, postes e apparelhos eletricos pertencentes ao mesmo Governo.

XLIII

E' livre ao Governo em todo o tempo mandar engenheiros de sua confiança acompanhar os estudos e os trabalhos da construcção afim de examinar si são executadas com proficiencia, methodo e precisa actividade.

XLIV

Si durante a execução ou ainda depois da terminação dos trabalhos verificar-se que qualquer obra não foi executada, conforme as regras de arte, o Governo poderá exigir da companhia a sua demolição ou reconstrucção total ou parcial, ou fazel-a por administração á custa da mesma companhia.

XLV

Um anno depois da terminação dos trabalhos, a companhia entregará ao Governo uma planta cadastral de toda a estrada, bem como uma relação das estações e obras de arte e um quadro demonstrativo do custo da mesma estrada

De toda e qualquer alteração ou acquisição ulterior será tambem enviada planta ao Governo.

XLVI

Approvados os estudos definitivos de todas as estradas, será fixado o preço médio kilometrico, de accôrdo com as seguintes subdivisões:

a) trabalhos preliminares;

b) movimento de terras;

c) obras de arte correntes;

d) obras de arte especiaes;

e) via permanente;

f) estações, edificios e installações do trafego;

g) cerca de linhas;

h) linhas e apparelhos telegraphicos;

i) material rodante, cujo total não poderá exceder o fixado na clausula XXIX.

XLVII

Na conformidade do prescripto na clausula anterior serão feitos á companhia pagamentos mensaes dos trabalhos executados, mediante avaliações provisorias effectuadas pela Repartição Federal de Fiscalização das Estradas de Ferro. Antes da approvação dos estudos definitivos de todas as estradas as avaliações provisorias serão feitas, segundo os estudos definitivos dos trechos approvados, respeitado o disposto na clausula XXIX.

Será pago tambem, a titulo provisorio, todo o material importado do estrangeiro pela companhia, depois de descarregado e acceito.

XLVII

Os pagamentos provisorios de que trata a clausula anterior serão feitos por medições lineares pelo eixo da linha de cada um dos serviços especificados na clausula XLVI, de accôrdo com a tabella abaixo, que determina no preço kilometrico da linha as porcentagens que, para a formação desse preço, cabem a cada uma das subdivisões, especificadas na referida clausula:

a) trabalhos preliminares............................................................................................................

5

%

b) movimento de terras...............................................................................................................

4

%

c) obras de arte correntes...........................................................................................................

9

%

d) obras de arte espcciaes..........................................................................................................

6

%

e) via permanente.......................................................................................................................

28

%

f) estações, edificios e installações do trafego...........................................................................

7

%

g) cerca de linha.........................................................................................................................

3

%

h) linhas e apparelhos telegraphicos..........................................................................................

1

%

i) material rodante.......................................................................................................................

7

%

 

XLIX

As differentes linhas a construir ficarão divididas em secções, conforme determinar a Repartição de Fiscalização das Estradas de Ferro. Terminada uma secção, fará essa repartição, no prazo maximo de 60 dias, correr o alinhamento e nivelamento, de fôrma a se levantar o cadastro exacto da linha e se verificar si foram attendidos os limites e condições technicas, fixados neste contracto, e proceder ao exame completo da linha ferrea, via permanente, obras de arte, estações, edificios, linhas telegraphicas, material rodante, etc., afim de ser acceita pelo Governo e effectuado pagamento definitivo. Caso não seja pela fiscalização cumprida no prazo acima estipulado esta disposição, fica entendido que a referida secção se entenderá acceita pelo Governo, sendo effectuado o respectivo pagamento definitivo.

L

A conservação das secções concluidas correrá por conta da companhia, como constructora das obras, até que esteja acceita toda a estrada de ferro e entregue ao trafego provisorio, mediante autorização do Governo, de accôrdo com o horario proposto pela companhia e approvado pelo mesmo Governo.

LI

A constructura das obras não poderá ser interrompida, e, si o for por mais de tres mezes, salvo caso de força maior, a juizo do Governo, caducará de pleno direito, independente de interpellação ou acção judicial, o presente contracto, perdendo a companhia a caução de que trata a clausula LIII.

Paragrapho unico. Fica entendido que a caducidade do contracto relativo á construcção determinará, ipso facto, a do contracto de arrendamento, sendo indemnizada a companhia arrendataria, de accôrdo com a clausula VIII.

LII

Si no prazo marcado na clausula XXXIV para a construcção das estradas de ferro, que fazem o objecto desse contracto, ellas não estiverem terminadas, a companhia pagará pelo excesso de prazo as multas de:

100$ por dia até quatro mezes;

200$ por dia de quatro a oito mezes;

500$ de oito mezes em deante.

LIII

Para garantia da fiel execução do contracto serão mantidas pela companhia as cauções prestadas pelos arrendatarios das, estradas de ferro de Baturité e Sobral, na forma dos respectivos contractos retendo-se além disso, em cada pagamento, 5%, que ficarão igualmente depositados como caução no Thesouro Federal.

Estas cauções não vencerão juros si forem feitas em dinheiro.

LIV

Verificada a fiel execução do contracto de construcção, será entregue á companhia, por occasião do ultimo pagamento definitivo, a caução depositada no Thesouro Federal para garantia do mesmo contracto, com excepção da importancia de 500:000$, em dinheiro ou apolices da divida publica, que continuará detida como garantia da execução do contracto de arrendamento.

LV

A fiscalização das estradas e de todo o serviço a cargo da companhia será incumbida á Repartição Federal de Fiscalização das Estradas de Ferro, ou a quem a todo o tempo o Governo resolver confial-a, devendo a companhia entrar annualmente para o Thesouro Federal com a quantia de 50:000$ por semestres adeantados para as respectivas despezas.

LVI

Ficará a companhia constituida em mora ipso jure, e obrigada por isso ao pagamento do juro de 9 % ao anno, si não pagar dentro de dez dias das tomadas de contas as quotas de arrendamento de que trata a clausula III ou si não pagar, dentro de dez dias do inicio do semestre, a respectiva quota de fiscalização estipulada na clausula precedente, ou si não pagar dentro de dez dias da entrega da guia de recolhimento as multas que lhe forem impostas de accôrdo com o contracto celebrado nos termos deste decreto.

LVII

Pela inobservancia de qualquer das presentes clausulas para a qual não se tenha comminado pena especial, poderá o Governo impor multa de 500$ até 10:000$ e o dobro nas reincidencias.

LVIII

A renda bruta da companhia e as cauções de que trata a clausula LIV respondem pelo pagamento das contribuições e multas estipuladas no contracto.

No caso de atrazo, o pagamento das contribuições e multas será cobrado exclusivamente nos termos do art. 52, lettras b e c, parte V, do decreto n. 3034, de 5 de novembro de 1898.

LIX

Si, decorridos os prazos fixados no contracto, não quizer o Governo prorogal-os, poderá de pleno direito declarar caduco o mesmo contracto, independente de interpellação ou acção judicial, perdendo a companhia a respectiva caução.

LX

A companhia não poderá transferir o contracto de construcção de arrendamento ou parte delle, sem prévia autorização do Governo, sob pena de caducidade, na fórma da clausula precedente; sendo-lhe, porém, facultativo organizar uma companhia em Londres para o fim de exploração da rede constante do presente contracto.

A essa companhia será applicada o disposto na clausula LXII.

LXI

No caso de desaccôrdo entre o Governo e a companhia sobre a intelligencia das presentes clausulas, será esta decidida por arbitros nomeados um pelo Governo e outro pela companhia.

LXII

A companhia, organizada de accôrdo com as leis e regulamentos em vigor, terá representantes e domicilio legal na Republica.

As duvidas ou questões que se suscitarem entre ella e o Governo, ou entre ella e os particulares, extranhos á intelligencia das presentes clausulas, serão resolvidas de accôrdo com a legislação brazileira e pelos tribunaes brazileiros.

LXIII

A companhia terá preferencia para a construcção de seus prolongamentos e ramaes, em igualdade de condições com outros concorrentes, durante o prazo do contracto.

LXIV

Ficam substituidas pelas condições constantes das clausulas precedentes as do contracto de arrendamento da Estrada de Ferro de Sobral, celebrado em 25 de setembro de 1897, e as do contracto analogo relativo á Estrada de Ferro de Baturité, á que se refere o decreto n. 2.836, de 17 de março de 1898.

LXV

O presente decreto ficará sem effeito si dentro de 30 dias contados da sua publicação deixar de ser assignado pela companhia o respectivo termo de contracto,

Rio de Janeiro, 18 de novembro de 1909.- Francisco Sá.