DECRETO N. 11.492 – DE 17 DE FEVEREIRO DE 1915

Approva o regulamento para a venda de mercadorias mediante sorteios (clubs) e respectiva fiscalização

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, usando da attribuição que lhe confere o art. 48, n. I, da Constituição da Republica, resolve que na execução do art. 36 da lei n. 2.321, de 30 de dezembro de 1910, e art. 1º, n. 35 da lei n. 2.919, de 31 de dezembro de 1914, se observe o regulamento, que a este acompanha, para a venda de mercadorias mediante sorteios (clubs) e respectiva fiscalização.

Rio de Janeiro, 17 de fevereiro de 1915, 94º da Independencia e 27º da Republica.

WENCESLAU BRAZ P. GOMES.

Sabino Barroso.

Regulamento para a venda de mercadorias mediante sorteios, a que se refere o decreto n. 11.492, desta data

CAPITULO I

DAS VENDAS POR SORTEIO, SUAS CONDIÇÕES

Art. 1º Só é permittida a venda mediante sorteio (clubs) de mercadorias, bens moveis, immoveis e quaesquer outras cousas aos estabelecimentos commerciaes que se habilitarem de accôrdo com o presente regulamento.

Art. 2º O pedido de autorização será feito em requerimento dirigido ao ministro da Fazenda, no Districto Federal e Estado do Rio de Janeiro, e aos delegados fiscaes nos outros Estados, acompanhado dos seguintes documentos:

a) certidão da Junta Commercial, da qual conste ser o capital realizado effectivamente do estabelecimento de 100:000$ no minimo, quando se tratar de club de immoveis, e de 50:000$ no minimo, quando se tratar dos de outra especie;

b) prova de quitação de impostos federaes, estadoaes e municipaes;

c) contracto social ou estatutos quando não se tratar de commerciante individual;

d) planos do club e modelos de recibos e escripturação.

Art. 3º O requerimento será informado: na Capital Federal por um fiscal designado pelo Superintendente dos fiscaes de clubs, adiante indicado, e submettido á apreciação do ministro da Fazenda, com parecer do mesmo superintendente; nos Estados pelo delegado fiscal, que ouvirá sempre um fiscal de club, quando houver, e na sua falta um agente fiscal de impostos de consumo.

Paragrapho unico. Na informação dada sobre tal requerimento ter-se-ha em vista:

I – a idoneidade dos requerentes;

II – si a organização dos planos tem condições de viabilidade;

III – si o capital social é sufficiente para garantir todas as operações e fornecimentos aos prestamistas.

Art. 4º Despachado o requerimento, será expedida uma carta patente, depois que for recolhida a quota semestral adiantada de 1:000$ e assignado o termo de fiel depositario das quantias que o estabelecimento receber para serem applicadas ao fim determinado nos planos pactuados pelas partes, com expressa declaração por parte do pretendente de sujeitar-se ás multas e demais disposições do presente regulamento. Este termo será assignado na Procuradoria Geral da Fazenda Publica quanto aos estabelecimentos situados no Districto Federal e Estado do Rio de Janeiro e nas Delegacias Fiscaes respectivas quanto aos demais Estados.

§ 1º Os semestres para o fim indicado neste artigo terminarão sempre em 30 de junho e 31 de dezembro de cada anno, sendo pago todo o semestre dentro do qual for expedida a carta patente e dentro dos primeiros quinze dias.

§ 2º A carta patente será expedida pelo ministro da Fazenda no Districto Federal e Estado do Rio de Janeiro e pelos delegados fiscaes nos demais Estados, e só autoriza o funccionamento do estabelecimento na séde de sua constituição.

Fóra de tal séde só serão admittidos agentes angariadores uma vez que registrem no Ministerio da Fazenda, na Delegacia Fiscal, ou, onde esta não existir, na repartição arrecadadora federal, a autorização que lhes for conferida pela casa matriz.

Si, entretanto, for constituida filial autonoma, com planos e sorteios proprios, será necessaria a expedição de carta patente para cada uma de taes agencias, mediante o processo acima determinado.

Art. 5º Os estabelecimentos só farão funccionar seus clubs:

I – depois de concedida a autorização, designando o fiscal, de accôrdo com os proprietarios e as conveniencias do serviço, os dias de sorteio, que serão annunciados pela imprensa, onde houver;

II – depois de pago adiantadamente, antes de cada sorteio, o imposto de 2 % sobre o valor nominal dos premios a se distribuirem no mesmo sorteio.

Paragrapho unico. Este imposto será recolhido á repartição arrecadadora competente da localidade em que se realizar o sorteio, mediante guia visada pelo fiscal, conforme o modelo annexo ao presente regulamento.

O fiscal não permittirá, sob pena de responsabilidade pessoal, a realização do sorteio antes de exhibido o talão de tal pagamento, o qual só terá valor depois de visado pelo mesmo fiscal.

Art. 6º Realizado o primeiro sorteio de um club, os demais se effectuarão nas épocas prefixadas, qualquer que seja o numero de socios ou prestamistas omissos nos pagamentos.

Art. 7º Os direitos dos prestamistas faltosos em tres prestações successivas poderão ser declarados caducos pelo estabelecimento em seu beneficio.

Art. 8º Os clubs terão sorteios proprios extrahidos com a presença do fiscal, ou se servirão dos sorteios das loterias autorizadas; em um e outro caso o resultado do sorteio será affixado em lista na séde do estabelecimento e publicado pela imprensa, onde houver, com a assignatura do fiscal e do representante legal do estabelecimento.

Art. 9º E’ vedado expressamente converter-se em moeda ou em titulo de credito representativo da mesma, a mercadoria do club.

Art. 10. Não será admittido a concorrer á extracção quem não se tiver préviamente inscripto no livro do club.

Art. 11. Não se admittirá extracção do club sem a effectiva entrega dos objectos préviamente estipulados. No caso de ser sorteado qualquer numero não tomado pelos prestamistas ou já caduco, o imposto de 2 %, atraz referido, será considerado como tendo recahido em numero que beneficiou o estabelecimento.

Art. 12. No caso de pretender o estabelecimento não continuar a explorar a concessão, será, mediante requerimento seu, cancellada a carta patente e dada baixa no termo de deposito, informando o fiscal respectivo que nenhuma responsabilidade pesa mais sobre o concessionario e depois que o superintendente ou o delegado publicar edital por espaço de oito dias convidando os interessados a apresentar quaesquer reclamações e estas não apparecerem.

CAPITULO II

DA ESCRIPTURAÇÃO

Art. 13. Os clubs terão um livro de inscripção aberto, encerrado e rubricado pelo fiscal, em todas as suas folhas e escripturado na fórma dos livros commerciaes, não sujeito, porém, a sello.

Art. 14. Esse livro mencionará:

1º – os planos do club, o estabelecimento a que pertence;

2º – o nome e naturalidade de seus proprietarios;

3º – o numero de ordem ou letra do club e o das inscripções em ordem arithmetica;

4º – o nome, domicilio e profissão do prestamista, em seguida ao numero escolhido;

5º – a importancia de cada prestação;

6º – a especificação minuciosa do objecto do club, dando-se o quilate dos metaes e pedras preciosas, a marca da fabrica, sua denominação no commercio, etc.;

7º – o preço por extenso da coisa a vender e o processo, dia, hora e logar do sorteio;

8º – finalmente, todas as condições ou vantagens em que as partes convenham.

Art. 15. No livro das inscripções haverá uma columna’ em que se averbarão os sorteios amortizados ou satisfeitos pela entrega da mercadoria.

Art. 16. As cautelas ou recibos fornecidos aos prestamistas conterão em substancia as indicações do livro das inscripções.

CAPITULO III

DA FISCALIZAÇÃO

Art. 17. A fiscalização dos clubs será exercida pelos fiscaes que forem nomeados pelo ministro da Fazenda, em numero sufficiente para bem exercel-a.

§ 1º Taes funccionarios serão nomeados em commissão e serão demissiveis a livre arbitrio do mesmo ministro.

§ 2º Os fiscaes tomarão posse de seus cargos prestando compromisso legal: perante o superintendente os da Capital Federal e Estado do Rio de Janeiro, e perante os respectivos delegados fiscaes os dos demais Estados.

Art. 18. Será designado um dos fiscaes da Capital Federal e Estado do Rio de Janeiro para superintender e dirigir o serviço nas respectivas circumscripções, ficando a elle sujeitos directamente os demais fiscaes.

Paragrapho unico. Nos Estados ficarão os fiscaes subordinados directamente aos delegados fiscaes que poderão fazer inspeccionar seu serviço pelos chefes das repartições arrecadadoras, em cuja circumscripção servirem.

Art. 19. Cabe ao superintendente:

a) dirigir e fiscalizar directamente o serviço, velando pela fiel execução deste regulamento;

b) distribuir pelos fiscaes os clubs, reservando para si os que entender;

c) registrar em livro proprio as cartas patentes e os nomes dos agentes angariadores, de clubs com séde em outros Estados;

d) informar quaesquer papeis relativos ao serviço, quer da Capital, quer dos Estados;

e) lavrar ou fazer lavrar autos de apprehensão e infracção;

f) julgar os autos lavrados pelos fiscaes da Capital Federal e Estado do Rio de Janeiro.

Paragrapho unico. Quando o auto for lavrado pelo superintendente será julgado pelo ministro da Fazenda;

g) apresentar ao ministro da Fazenda até fim de fevereiro relatorio dos trabalhos e occurrencias mais importantes do anno precedente, lembrando quaesquer medidas tendentes a melhorar a fiscalização;

h) representar ao ministro da Fazenda contra os fiscaes, podendo advertil-os, reprehendel-os e suspendel-os pelo prazo maximo de 15 dias.

Art. 20. Compete aos fiscaes:

a) informar sobre a idoneidade dos que requererem autorização para terem clubs de mercadorias;

b) visar as guias para o recolhimento de importancias que devam pagar os clubs, annotando em livro especial depois de realizado;

c) registrar no mesmo livro as occurrencias mais importantes que interessarem a fiscalização;

d) fazer a apprehensão de cautelas, apparelhos, instrumentos, utensilios, moveis ou decorações de clubs que funccionarem em contravenção ás disposições deste regulamento, lavrando os autos de apprehensão e multa;

e) lavrar autos de infracção e multa contra qualquer club já autorisado, que transgrida as disposições legaes, e velar pela execução do presente regulamento;

f) requisitar o auxilio da policia, quando se fizer preciso, nos casos das lettras d e e;

g) assistir aos sorteios que não correrem pelas loterias autorizadas;

h) dirigir e regular o processo dos sorteios, tendo sempre em vista a brevidade da operação e a garantia dos interessados;

i) communicar ao superintendente ou á Delegacia Fiscal e á autoridade policial, quando destes dependerem as providencias, todas as infracções deste regulamento;

j) suggerir alvitres e solicitar providencias para correctivo de abusos, ou a bem da execução da lei;

k) visitar, sempre que for preciso, os estabelecimentos sob sua fiscalização, examinando si possuem o livro prescripto, devidamente escripturado, as cautellas, se cumprem em summa as disposições deste regulamento.

Si houver motivo para suspeitar da veracidade da escripta especial, o agente fiscal recorrerá á escripta geral do estabelecimento, e si esta lhe for recusada, levará o facto ao conhecimento do superintendente ou do delegado fiscal, afim de ser requisitada do juizo competente a exhibição da mesma escripta;

l) apresentar até fim de janeiro de cada anno um relatorio sobre os serviços ao superintendente ou ao delegado fiscal;

m) fiscalizar o pagamento de todos os impostos e contribuições devidos, federaes, estaduaes ou municipaes, exigindo os respectivos recibos para annotal-os no livro competente;

n) resolver as reclamações que lhes forem dirigidas, dentro de sua competencia, e encaminhar as demais ao conhecimento da autoridade que lhes for superior;

o) fiscalizar os agentes e angariadores de clubs, com séde em outras localidades, verificando si se limitam a fornecer objectos sorteados pelas casas matrizes ou se teem sorteio proprio.

Art. 21. Nos Estados os autos serão julgados pelo respectivo dellegado fiscal.

Art. 22. Os vencimentos dos fiscaes constarão das quotas que forem recolhidas pelos clubs, em cada Estado, depois de deduzidos 10 % para o Thesouro.

§ 1º A Capital Federal e o Estado do Rio de Janeiro formarão uma circumscripção e das quotas se descontará, além dos 10 % acima referidos, a quantia necessaria para a compra de objectos de expediente para o gabinete do superintendente e que for préviamente marcada pelo ministro da Fazenda.

§ 2º Feitos estes descontos, a importancia liquida será igualmente rateada por todos os fiscaes do Estado, qualquer que seja o seu numero.

Na Capital e Estado do Rio de Janeiro se observará a mesma regra, fazendo-se, porém, o rateio de fórma que o vencimento do superintendente seja superior em mais 50 % ao dos fiscaes.

§ 3º As contas de expediente serão processadas e pagas pelo Thesouro Nacional.

Art. 23. A fiscalização tambem será eventualmente exercida pelos fiscaes de consumo e chefes das repartições arrecadadoras.

CAPITULO IV

DO AUTO E DAS PENAS

Art. 24. As contravenções do presente regulamento serão punidas mediante processo administrativo que terá por base o auto.

Art. 25. O auto deverá ser escripto com a precisa clareza, mencionando o logar, dia e hora em que se verificar a infracção, bem como a disposição infringida e os objectos apprehendidos, sendo firmado, sempre que for possivel, por duas testemunhas que tenham presenciado a diligencia.

Art. 26. Taes autos serão presentes ao superintendente, na Capital Federal e Estado do Rio de Janeiro, e aos delegados fiscaes, nos Estados, os quaes darão vista dos mesmos ás partes interessadas dentro da repartição, pelo prazo de oito dias, para produzirem sua defesa.

Paragrapho unico. A intimação para tal fim será feita pessoalmente se for encontrado o autoado, ou pelos jornaes no caso negativo.

Art. 27. Decorrido aquelle prazo e não comparecendo a parte, subirá o auto ao julgamento adiante mencionado.

Art. 28. Apresentada a defesa, terá della vista o funccionario ou pessoa autoante pelo prazo de tres dias, depois dos quaes irá a julgamento.

Art. 29. Os autos serão julgados: os lavrados na Capital Federal e Estado do Rio de Janeiro pelo superintendente e nas outras localidades pelos delegados fiscaes respectivos.

Paragrapho unico. Os que forem lavrados pelo superintendente serão julgados directamente pelo ministro da Fazenda.

Art. 30. Além das penalidades em que possam incorrer pela infracção do Codigo Penal os que explorarem clubs ou rifas não autorizadas, ficarão sujeitos ás seguintes penas:

a) os que explorarem clubs não devidamente autorizados, á multa de 1:000$ e na reincidencia á de 2:000$000;

b) os que já tiverem obtido autorização, mas deixarem de recolher as contribuições legaes, multa de 500$ a 2:000$, além da importancia devida e suspensão do funccionamento emquanto não as satisfizer;

c) os que, embora já autorizados a funccionar, difficultarem ou impedirem a fiscalização ou effectuarem extracção á revelia do fiscal, multa de 500$ a 1:000$ e na reincidencia o dobro e cassação da carta patente;

d) os que não fizerem a entrega ou transmissão da coisa sorteada, á vista da respectiva cautela, multa de 500$ a 2:000$, podendo na reincidencia ser cassada a carta patente;

e) os que infringirem qualquer outra disposição deste regulamento, multa de 200$ a 1:000$, podendo tambem ser cassada a carta patente, no caso de revelarem os que a explorarem o proposito repetido de não cumprirem o mesmo regulamento.

Art. 31. Metade das multas, julgadas procedentes e effectivamente arrecadadas, será adjudicada a quem lavrar o auto. No caso de ser necessario recorrer á cobrança judiciaria, descontar-se-ão da parte do autoante a metade das custas e porcentagens legaes.

CAPITULO V

DOS RECURSOS

Art. 32. Das decisões e penas impostas pelo superintendente e delegados fiscaes haverá recurso para o ministro da Fazenda.

Art. 33. O recurso será voluntario ou ex-officio. O primeiro será interposto no prazo de 15 dias, depois da intimação, e só será encaminhado, no caso de multa, com prévio deposito desta. O segundo terá logar no caso de ser julgado improcedente o auto e será interposto no proprio despacho em que for proferida a decisão.

CAPITULO VI

DISPOSIÇÕES GERAES

Art. 34. A autoridade policial competente, á requisição do fiscal, prestará o auxilio preciso para a effectividade das diligencias legaes ordenadas.

Art. 35. Antes de rehabilitados, os commerciantes fallidos não poderão obter autorização para ter club de mercadoria. Declarada a fallencia, será immediatamente cassada a autorização.

Art. 36. Fica marcado o prazo de 15 dias na Capital Federal para que devidamente se habilitem os clubs de immoveis ou outros não comprehendidos no decreto n. 8.598, de 8 de março de 1911, e nos Estados o de 30 dias, depois de entrar o presente regulamento em vigor.

Art. 37. Revogam-se as disposições em contrario.

Rio de Janeiro, 17 de fevereiro de 1915.– Sabino Barroso.

GUIA

                                                                                                                                             Visto.

                                                                                                                                             O Fiscal,

...............................

F................................................................, explorador do club.......................................................... para a venda de............................................conforme carta patente n........................................................... de ................ de ........................................ de .............................., vae á Recebedoria do Districto Federal (ou Alfandega, Collectoria ou Delegacia Fiscal) pagar o imposto de 2 % sobre a quantia de .........................., valor dos premios a serem sorteados no dia .................... do corrente mez e anno.

Rio de Janeiro, ............. de .............................. de .................

(Assignatura) ...............................................