DECRETO N. 7171 – DE 12 DE NOVEMBRO DE 1908
Autoriza o contracto de construcção da Estrada de Ferro de Timbó a Propriá.
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, usando da autorização conferida no decreto legislativo n. 1126, de 15 de dezembro de 1903 e no art. 22, n. VII, da lei n. 1841, de 31 de dezembro de 1907, e tendo em vista, outrosim, o processo da concurrencia aberta por edital de 23 de julho do corrente anno para a construcção da Estrada de Ferro de Timbó a Propriá,
decreta:
Artigo unico. Fica o Ministro da Industria, Viação e Obras Publicas autorizado a contractar com o engenheiro civil Austricliano Honorio de Carvalho a construcção da Estrada de Ferro de Timbó a Propriá, mediante as clausulas que com este baixam, assignadas pelo mesmo Ministro.
Rio de Janeiro, 12 de novembro de 1908, 20º da Republica.
AFFONSO Augusto MOREIRA PENA.
Miguel Calmon du Pin e Almeida.
Clausulas a que se refere o decreto n. 7171 desta data
I
O contractante obriga-se:
1) a construir a Estrada de Ferro de Timbó Propriá desde o logar denominado Barracão, no Estado da Bahia, até Propriá, no de Sergipe, de accôrdo com o perfil definitivo da linha locada segundo os planos approvados pelo decreto n. 6671, de 3 de outubro de 1907; e
2) a fornecer o material que, para esse fim e a juizo do Governo, for necessario importar do estrangeiro.
II
A construcção da estrada (clausula I, 1) comprehende:
a) a roçada, limpa e destocamento da faixa de terra necessaria á estrada e suas dependencias;
b) os trabalhos de terraplenagem, constantes de córte, emprestimo, cava para fundações, valla, valleta, derivação de rio, explanada, desvio e outros semelhantes;
c) as obras de consolidação e as de arte, tanto correntes como especiaes;
d) a montagem da superstructura, metallica ou de madeira, das pontes e viaductos e a do material rodante;
e) o assentamento da via permanente;
f) caminhos de serviço, estivas, abrigos para trabalhadores, cêrcas e os demais trabalhos accessorios, necessarios á execução das obras;
g) o transporte de todo o material até o logar do seu emprego;
h) o assentamento da linha telegraphica;
i) os edificios e dependencias da estrada, que forem indicados pelo Governo.
III
O material a importar (clausula 1, 2) constará do seguinte:
a) superstructura metallica das pontes e viaductos;
b) trilhos e seus accessorios;
c) material rodante;
d) apparelhos e fios telegraphicos e seus accessorios e arame para cêrca;
e) machinas motrizes e operatrizes para as officinas;
f) apparelhos para o abastecimento de agua;
g) tudo o mais que, a juizo do Governo, for necessario para o completo acabamento da construcção, tanto do leito da estrada como dos edificios e das suas dependencias.
IV
A construcção das obras será iniciada dentro de tres mezes, a contar da data da assignatura do contracto.
Para os effeitos da presente clausula e da de n. XXX 1º, só será considerado inicio da construcção o começo effectivo das obras.
V
Uma vez iniciada, não poderá a construcção ser suspensa por mais da 15 dias consecutivos, salvo motivo de força maior, a juizo do Governo.
VI
O contractante obriga-se a concluir todas as obras e a fornecer todo o material dentro de 36 mezes, contados da data do inicio da construcção (clausula IV), salvo força maior, a juizo do Governo, que, neste caso, prorogará o prazo por tempo não excedente de seis mezes e si, finda a prorogação, não estiverem terminadas todas as obras ou não tiver sido fornecido todo o material, impor-lhe-ha a multa de 200$ por dia, até quatro mezes, de 400$ por dia, durante o tempo que exceder de quatro mezes até o oitavo, e de 1:000$ por dia, de oito mezes em diante até um anno.
VII
O Governo reserva-se o direito de, quando julgar conveniente, supprimir obras de arte, alterar os respectivos projectos, adoptar, para pontes, viaductos, edificios e outras obras, o emprego de madeira, de preferencia a qualquer material, e de modificar a propria direcção do eixo da estrada, não cabendo por isso ao contractante direito algum a indemnização.
Caso, porém, seja abandonada por ordem do Governo qualquer obra já iniciada ou concluida, será ella medida definitivamente e o respectivo valor, de accôrdo com os preços da tabella de que trata a clausula XV, creditado ao contractante.
VIII
O material a importar será fornecido dentro do prazo fixado pelo Governo, na quantidade por elle determinada, e de conformidade com as condições que estabelecer.
Os trilhos terão o comprimento minimo de 10 metros, o peso de 25 kilogrammas por metro linear e o perfil em secção recta indicado pelo Governo; serão reunidos por talas cantoneiras de 0m,40 de comprimento com orificios para quatro parafusos, e ligados aos dormentes, nos alinhamentos rectos, por pregação a grampo, e, nas curvas, por tire-fonds.
As superstructuras metallicas para pontes e giradores deverão ser calculadas para as locomotivas mais pesadas, de bitola de um metro, actualmente conhecidas.
As locomotivas para trens de carga deverão ser das de maior poder do tracção, de accôrdo com o perfil dos trilhos.
IX
Só será acceito e empregado nas obras o material que satisfizer ás provas indicadas nas especificações que a respeito forem expedidas pelo Governo.
X
Afim de assegurar a fiel execução do contracto, obriga-se o contractante:
1º, a ter os empregados necessarios á execução das obras, a juizo do Governo; a dispensar, quando por elle lhe for exigido, qualquer empregado que praticar actos contrarios á disciplina e á boa ordem, ou commenter graves erro de officio prejudicial a execução das obras, e a fazer o pagamento dos salarios em épocas regulares e dentro de prazo nunca superior a 60 dias, sob pena de ser feito pelo Governo, que descontará da caução de que trata a clausula XXVI, a respectiva importancia;
2º, a observar fielmente, em tudo que disser respeito á parte technica das obras, as disposições do decreto n. 7959, de 29 de dezembro de 1880, as especifficações para o prolongamento da Estrada de Ferro Central do Brazil approvadas pelas portarias de 22 de dezembro de 1903 e de 25 de julho de 1905, e as condições especiaes que o Governo se reserva o direito de estabelecer para as obras e trabalhos, bem como para o material; e
3º, a submetter-se á fiscalização que o Governo julgar conveniente, de accôrdo com as instrucções que para esse fim expedir.
XI
As obras serão medidas e avaliadas provisoriamente de mez em mez, começando o primeiro no dia em que, de accôrdo com a clausula IV, se der inicio á construcção.
Terminada a construcção de cada trecho e recebido este pelo Governo para ser trafegado (clausula XXVIII), far-se-hão a medição e a avaliação finaes dos trabalhos nelle executados.
XII
Exceptuadas a medição e a avaliação de trabalhos preparatorios, de cava para fundações, de fundação, de obra já encetada ou concluida, que tenha sido abandonada (clausula VII) e, em geral, de trabalhos e obras, cuja medição não possa ser em qualquer tempo refeita ou verificada com segurança e exactidão, as quaes serão definitivas, todas as medições e avaliações mensaes serão sempre provisorias.
XIII
O material importado, acceito pelo Governo (clausula IX), será computado definitivamente na avaliação das obras respectivas, observado o disposto na clausula XIX.
XIV
Tanto nas medições e avaliações provisorias, como nas definitivas, só serão comprehendidos as obras e trabalhos executados de inteiro accôrdo com os projectos approvados, desenhos respectivos e ordens de serviço, e o material acceito.
XV
As obras medidas e o material fornecido serão avaliados applicando-se os preços de unidade constantes da tabella respectiva, que, depois de rubricada pelos contractantes, ficará fazendo parte integrante do contracto, não podendo, porém, o preço a pagar pelo Governo por kilometro de linha inteiramente prompta exceder de 38:500$, salvo si o preço do material rodante e o dos edificios, exigidos pelo Governo e avaliados de accordo com essa tabella, se elevarem – o primeiro – a mais de 3$900 e – o segundo – a mais de 1$100, ambos por metro de linha, ou si o peso das superstructuras metallicas para pontes e pontilhões exceder de 2000 toneladas.
A acquisição e montagem das machinas motrizes e ferramentas, que o Governo julgar necessarias para as officinas de reparação, serão pagas, porém, de accôrdo com o orçamento que o contractante opportunamente apresentar e o Governo approvar.
XVI
Correrão por conta do contractante: a) todos os trabalhos accessorios necessarios á execução das obras, como caminhos de serviço, estivas, abrigos para trabalhadores, armazens e depositos para generos alimenticios e material de construcção, e outros semelhantes, e bem assim o transporte de todo o material proveniente de terraplenagem e de excavação para obras de arte, com excepção apenas dos de terraplenagem consistindo em córte, emprestimo, explanada ou cava para fundações; b) a descarga e o transporte de todo o material até o logar do seu emprego; c) a acquisição de locomotivas e vagões destinados ao transporte de lastro, visto que o custo delles já se acha incluido nos preços de unidade constantes da tabella respectiva (clausula XV).
XVII
Os trabalhos cujos preços não se acham incluidos na tabella de que trata a clausula XV, serão executados pelo contractante e pagos pelos preços adoptados para as empreitadas do prolongamento da Estrada de Ferro Central do Brazil, approvados pela portaria de 22 de dezembro de 1903.
XVIII
As obras e o material, bem como as quantias com que concorrer o contractante para desapropriação e fiscalização (clausula XXXIII) serão pagas em titulos da divida publica, ao par, de juro annual de 5 %, papel, cuja emissão será autorizada opportunamente.
XIX
O pagamento das obras será em prestações, dentro de 30 dias, contados do em que as respectivas medições e avaliações, provisorias ou finaes, depois de expressamente acceitas pela contractante, seu procurador ou preposto (clausula XXII), forem approvadas pelo Governo, o do material a importar (clausula III), dentro de 30 dias, a contar do em que tiver sido acceito pelo Governo, e o das quantias com que concorrer o contractante para desapropriação e fiscalização (clausula XXXIII), por occasião do primeiro pagamento das obras, que se seguir.
XX
De cada pagamento ficarão retidos no Thesouro Federal 2 % para o augmento da caução de que trata a clausula XXVI, podendo a respectiva importancia ser convertida em apolices da divida publica.
XXI
Recebidas todas as obras e o material (clausulas II e III), serão liquidadas as contas com o contractante, em vista da medição e avaliação finaes do ultimo trecho.
XXII
Em tudo que disser respeito á execução do contracto será o Governo representado pelo chefe da commissão encarregada da fiscalização (clausula X, 3º).
O contractante obriga-se a tempo logar dos trabalhos um procurador idoneo, juizo do Governo, e legalmente constituidos, com poderes plenos e especiaes para resolver definitivamente sobre a execução, classificação, medição e avaliação das obras, assim como sobre tudo o mais que for concernente ao contracto, bem como em cada um dos trechos que forem designados pelo Governo, e nunca excedente de 100 kilometros, preposto idoneo, tambem a juizo delle, constituido do mesmo modo que o procurador e com iguaes poderes relativamente ás obras do trecho respectivo.
XXIII
O contracto tanto para a execução das obras como para o fornecimento do material, não poderá ser transferido sem expresso consentimento do Governo, sendo, porém, permittido ao contractante sub-empreitar, independentemente de autorização, a execução de qualquer dellas, mantida, porém, a sua responsabilidade, e sendo elle, por si, seu procurador ou preposto (clausula XXII) o unico admittido a tratar com o Governo.
XXIV
Sendo federaes os serviços a cargo do contractante, está elle isento de impostos estadoaes e muninicpaes e bem assim dos de importação, de accôrdo com as leis e regulamentos aduaneiros em vigor.
XXV
Durante a construcção das obras, gosará o contractante, para o transporte de operarios e do material necessario, a reducção de 50 % sobre os preços da tarifa que vigorar nos trechos em trafego.
XXVI
Para garantia da fiel execução do contracto, prestará o contractante a caução de 50:000$ em papel-moeda, sem direito a juros, ou em titulos da divida publica, a qual será recolhida ao Thesouro Nacional antes da assignatura do contracto e irá sendo augmentada com a importancia de 2 % deduzida de cada um dos pagamentos que lhe forem sendo feitos (clausula XX), obrigando-se a integral-a dentro de 30 dias, contados do da intimação para este fim, todas as vezes que for desfalcada, quer em virtude de multa (clausulas VI e XXXI), ou de pagamento pelo Governo de salarios (clausula X, 1º) ou despezas de conservação e solidez das obras (clausula XXVII), quer por qualquer outro motivo.
XXVII
O contractante será responsavel pela conservação e solidez das obras de terraplanagem durante o prazo de seis mezes, e pela das de arte, tanto correntes, como especiaes, durante o de um anno, ambos a contar da data da medição final (clausula XI), devendo, emquanto não estiverem findos, fazer as reconstrucções e reparos necessarios, a juizo do Governo, sob pena de serem feitas por este e a importancia das despezas descontada da caução (clausula XXVI), ficando apenas isento da obrigação do que disser respeito ao asseio dos edificios existentes nos trechos da estrada recebidos pelo Governo para serem trafegados (clausula XXVIII).
XXVIII
Terminada a construcção de cada trecho da estrada até 50 kilometros de extensão, será elle recebido provisoriamente pelo Governo para ser trafegado, e, definitivamente, depois de findos os prazos de responsabilidade pela sua conservação e solidez (XXVII), lavrando-se, em ambos os casos, termo minuncioso em livro especial, que será aberto, rubricado e encerrado pelo chefe da commissão de fiscalização.
XXIX
Recebidas definitivamente todas as obras (clausula XXVII), e acceito todo o material, será restituida ao contractante a caução (clausula XXVI) ou o saldo respectivo.
XXX
O contracto ficará rescindido de pleno direito, independentemente de interpellação ou acção judicial, e será assim declarado por decreto, perdendo o contractante a caução e o seu reforço (clausulas XXVI e XX) e não tendo direito a indemnização alguma, mas apenas ao pagamento das obras executadas e do material acceito, depois de deduzida a importancia das multas, porventura impostas e ainda não satisfeitas, assim como a dos salarios e a das despezas de conservação e solidez pagas pelo Governo (clausulas X, 1º e XXVII), em cada um dos seguintes casos:
1º Si a construcção não for iniciada dentro do prazo fixado na clausula IV;
2º Si os trabalhos forem suspensos por mais de 15 dias consecutivos, salvo força maior, a juizo do Governo (clausula V);
3º Si forem empregados operarios em numero tão reduzido, que demonstre, a juizo do Governo, desidia do contractante na execução do contracto ou intenção de não cumpril-o;
4º Si, terminado o prazo de um anno, de que trata a clausula VI, não estiverem terminadas todas as obras ou não tiver sido fornecido todo o material;
5º Si não for integrada a caução dentro do prazo fixado na clausula XXVII;
6º Si o contracto for transferido sem expresso consentimento do Governo (clausula XXIII).
XXXI
A infracção de qualquer das clausulas do contracto, para que não haja pena especial, será punida com a de multa, imposta pelo Governo, de 200$ a 2:000$ e do dôbro na reincidencia.
XXXII
A importancia das multas (clausulas VII e XXXI), dos salarios pagos (clausula X, 1º) e das despezas de conservação e solidez das obras (clausula XXVII) além de poder ser descontada da caução, nos temos da clausula XXVI, poderá, a juizo do Governo, ser cobrada executivamente, si não for recolhida á Delegacia do Thesouro Federal na cidade de S. Salvador, do Estado da Bahia, dentro de 30 dias, contados do da intimação para o pagamento.
XXXIII
O contractante concorrerá com a quantia necessaria para a desapropriação dos terrenos e bemfeitorias precisos para a construcção da estrada e suas dependencias, bem como, annualmente, com a de 120:000$, que serão recolhidos á referida delegacia do Thesouro Federal em prestações iguaes e por trimestres adeantados, para as despezas de fiscalização por parte do Governo, devendo ser recolhida a primeira prestação antes do inicio da construcção das obras (clausula IV).
XXXIV
E’ concedido ao contractante o direito de desapropriar por utilidade publica, na fórma da legislação em vigor, os terrenos e bemfeitorias necessarios á construcção da estrada e suas dependencias.
XXXV
O sello proporcional do contracto será pago nas contas do contractante, a que se refere a clausula XIX.
XXXVI
Ficará sem effeito o presente decreto si o respectivo contracto não for assignado dentro de 10 dias, a contar da sua publicação.
Rio de Janeiro, 12 de novembro de 1908. – Miguel Calmon du Pin e Almeida.