DECRETO N

DECRETO N. 8.324 – DE 27 DE OUTUBRO DE 1910

Approva o regulamento para o serviço subvencionado de transportes por automoveis

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, usando da autorização constante do art. 28 § 1º da lei n. 2.221 de 30 de dezembro de 1909 e do art. 22 n. X da lei n. 1.841 de 31 de dezembro de 1907 e tendo em vista a necessidade de facilitar os transportes no paiz,

decreta:

Artigo unico. E’ approvado o regulamento que com este baixa assignado pelo Ministro e Secretario de Estado da Viação e Obras Publicas, para o serviço subvencionado de transporte de passageiros ou mercadorias por meio de automoveis industriaes, ligando dous ou mais Estados da União ou dentro de um só Estado.

Rio de Janeiro, 27 de outubro de 1910, 89º da Independencia e 22º da Republica.

Nilo Peçanha.

Francisco Sá

Regulamento a que se refere o decreto n. 8.324, do 27 de outubro de 1910

CONCESSÃO E CONSTRUCÇÃO DAS ESTRADAS DE RODAGEM PARA AUTOMOVEIS

Art. 1º. A’s emprezas ou particulares, que organizarem o serviço de transporte de passageiros e cargas, por meio de automoveis industriaes; entre dous ou mais Estados da União, ou ainda mesmo dentro de um só Estado, será concedida uma subvenção kilometrica nunca excedente de quatro contos de réis por kilometro de estrada construida, nos termos deste regulamento.

Art. 2º. Para a concessão dessa subvenção kilometrica deverão os pretendentes submetter á approvação do Ministro da Viação e Obras Publicas os projectos e estudos definitivos das estradas que tiverem de construir, organizados de accôrdo com as disposições seguintes:

a) planta geral da estrada de rodagem na escala de 1:4000, em que serão indicadas os raios de curvas e a configuração do terreno por curvas de nivel espaçadas de tres metros, bem como uma zona de 50 metros, pelo menos, de cada lado, os campos, maltas, terrenos pedregosos e, sempre que fôr possivel, a divisa das propriedades particulares.

b) perfil longitudinal na escada de 1:400 para as cotas e de 1:4000 para as distancias das projecções horizontaes;

c) projecto das principaes obras de arte a construir, na escala de 1:200;

d) perfil transversal typo de estrada, indicando a parte a macadamizar, os accostamentos e as valletas;

e) orçamento das excavações, das obras de arte e da macadamização do leito.

Todos estes planos serão acompanhados de cadernetas de campo devidamente authenticadas.

Art. 3º. As curvas terão um raio minimo de 50 metros, que poderá ser reduzido excepcionalmente a 30 metros, nas regiões montanhosas, onde a adapção de raios maiores torne dispendiosa a construcção das estradas.

As que forem reversas serão separadas por alinhamentos rectos de 10 metros de extensão, pelo menos.

As rampas serão, no maximo, de 5 %.

Art. 4º. Antes de resolver sobre propostas apresentadas e submettidas á sua approvação, o Governo poderá mandar proceder a expensas dos pretendentes, ás operações graphicas necessarias ao exame das propostas, podendo modifical-as como julgar conveniente.

Art. 5º. Nos contractos celebrados para construcção e exploração das estradas de que trata este regulamento, serão fixados prazos para começo e terminação das obras constantes dos planos approvados pelo Governo.

Art. 6º. As emprezas ou particulares, que se propuzerem construir estradas de rodagem para transporte de passageiros e cargas, por meio de automoveis industriaes, não terão previlegio de zona; ser-lhes-ha, porém concedido o direito de uzo e gozo dessas estradas pelo tempo que fôr fixado no respectivo contracto, e dos terrenos estrictamente indispensaveis á sua construcção e conservação.

Art. 7º. O concessionario executará todas as obras de arte e fará as que forem indispensaveis para a estrada, não creando obstaculos ou qualquer embaraço ao escoamento das aguas pluviaes, com prejuizo do transito nas vias publicas.

Art. 8º. No cruzamento destes caminhos, ou ruas de povoados, terá o concessionario o direito de alterar a direcção de taes caminhos ou ruas, com o fim de melhorar os cruzamentos precedendo consentimento do Ministro da Viação e Obras Publicas e, quando fôr de direito, dos governos estadual ou municipal.

Art. 9º. Findo o prazo da concessão, que será fixado no respectivo contracto, a não havendo disposição em contrario, reverterão para a União todas as obras e a estrada, sem indemnização alguma.

Neste caso a União poderá entregar a estrada ao uso livre do publico, desde que os Estados ou as Municipalidades tomem o encargo de conserval-a.

Art. 10. O concessionario estabelecerá uma linha telephonica em toda a extensão da estrada, podendo o Governo della utilizar-se em caso de necessidade.

Art. 11. Serão mantidas em perfeito estado de conservação, não só a estrada e suas dependencias, como tambem o material de transporte, de fórma que possam preencher todas as condições de regularidade e sugurança no serviço de transporte.

Art. 12. Todas as despezas e indemnizações, motivadas pela construção, conservação, trafego e reparação da estrada, correrão exclusivamente por conta do concessionario.

Art. 13. O Governo reserva-se o direito de fazer executar pelo concessionario, ou por conta delle, durante o prazo da concessão, as alterações e novas obras, cuja necessidade a experiencia haja indicado em relação á segurança publica, policia e regularidade do trafego.

Art. 14. A subvenção kilometrica, de que trata o art. 1º, sómente se tornará effectiva depois de verificar, por exame e inspecção feita pelo engenheiro fiscal, terem sido observadas as prescripções technicas exigidas por este regulamento.

Os pretendentes fornecerão ao engenheiro o pessoal necesario para serem feitas taes verificações.

Art. 15. O pagamento desta subvenção será feito por extensão concluida entre os pontos inicial e terminal ou por trechos de 50 kilometros construidos e trafegados.

Art. 16. Aos Estados da União ou municipios que organizarem o serviço de transportes de cargas e passageiros, por meio de automoveis industriaes, poderá o Governo Federal conceder a subvenção do art. 1º, observadas todas as prescripções.

Art. 17. A subvenção poderá tambem ser concedida ás emprezas ou particulares que estabeleçam o trafego por automoveis em estrada já existente que possa ser adaptada a esse serviço. Neste caso deverão apresentar ao Governo a planta e o perfil longitudinal da estrada, de modo a provar que ella satisfaz ás condições technicas do art. 3º.

A concessão só poderá ser feita depois de effectuado o exame, a que se refere o art. 14.

MATERIAL RODANTE E MEDIDAS DE SEGURANÇA

Art. 18. Nenhum automovel poderá ser posto em serviço sem prévio exame do engenheiro fiscal, que deverá proceder ás experiencias que julgar convenientes, afim de verificar que não apresenta nenhuma causa de perigo, sendo empregado no trafego da estrada. A infracção deste artigo sujeita o concessionario á penalidade estatuida pelo art. 33.

 Art. 19. Os automoveis terão reservatorios, tubos e quaesquer peças destinadas a conter explosivos, ou inflammaveis, construidos de modo a não deixar escapar, nem cahir materia alguma que possa causar incendio ou explosão, e bem assim:

a) apparelhos dispostos de modo tal, que seu emprego não apresente nenhuma causa de perigo, e não possa causar damnos pelo desprendimento de gazes deleterios:

b) orgãos de manobras bem dispostos de modo que o motorneiro possa accional-os sem deixar de prestar toda a attenção ao caminho que fôr percorrendo;

c) o raio visual para frente do vehiculo deve ser completamente livre e o monometro e outras apparelhos indicadores, que o motorneiro deve sempre ter á vista, devem ser collocados de modo a serem facilmente consultados. Durante a noute serão estes apparelhos bem illuminados;

d) o vehicular deve ser disposto de modo a obedecer facilmente ao apparelho de direcção e a voltar com facilidade nas curvas de pequeno raio e os orgãos de direcção deverão offerecer todas as garantias de perfeita solidez.

Art. 20. Os automoveis devem ser providos de apparelhos aperfeiçoados que façam a inversão do movimento com rapidez, e serão providos de dous systemas de freios distinctos, bem aperfeiçoados e bastante efficazes, de modo a poderem, em dado momento, cada um de per si, supprimir automaticamente a acção propulsora do motor, ou neutralizal-a.

Art. 21. O motorneiro deve estar constantemente senhor da velocidade de seu vehiculo, devendo diminuir a marcha ou mesmo parar o movimento, todas as vezes que o automovel possa ser causa de accidentes. A velocidade deverá ser reduzida o mais possivel nos pontos da estrada, onde, por qualquer obstaculos, não se possa extender á distancia o raio visual, ou quando atravessar caminhos ou ruas de povoados.

Art. 22. A velocidade commercial minima para o transporte de mercadorias será de 6 kilometros por hora e a do transporte de viajantes, de 12 kilometros, devendo os automoveis empregados satisfazer a essas condições de serviços.

Art. 23. A approximação dos automoveis deverá ser annunciada á distancia por uma buzina ou trompa.

Art. 24. Os automoveis, rebocando outros vehiculos não poderão circular sem que satisfaçam as exigencias do art. 17, e cada vehiculo rebocado será provido do mesmo systema de freios, sufficientemente efficazes, susceptiveis de serem accionados, quer pelo mortoneiro, quer pelo garda-freio especial.

Art. 25. O motorneiro ao deixar o vehiculo é obrigado a tomar todas as precauções para evitar accidentes e suprimir o ruido do motor.

Art. 26. O trafego será feito com automoveis e vehiculos, cujo numero será fixado nos contractos que forem celebrados, nos termos deste regulamento e, uma vez inaugurado, não poderá ser interrompido.

TARIFAS DE TRANSPORTE E HORARIOS

Art. 27. A empreza gozará do privilegio de fazer os transportes por automoveis na estrada concedida, mas os preços destes serão fixados em tabellas approvadas pelo Governo Federal, não podendo exceder os dos meios ordinarios de conducção no tempo de organização da mesma tabella.

Art. 28. As tarifas, por esta fórma organizadas, não poderão ser elevadas sem approvação do Governo Federal; serão, porém, revistas, pelo menos, de cinco em cinco annos.

Art. 29. Gozarão de uma reducção de 50 % os transportes concedidos pelo Governo Federal:

A’s autoridades e força federal, em diligencias;

A’s munições de guerra;

Aos colonos e immigrantes, suas bagagens e instrumentos aratorios;

A’s sementes e plantas enviadas pelo Governo Federal;

Aos generos enviados pelo mesmo Governo para attender aos soccorros publicos por qualquer calamidade.

Art. 30. As malas do correio, bem como quaesquer sommas de dinheiro, enviadas pelo Thesouro Nacional, serão transportados gratuitamente.

Art. 31. Pelos preços fixados nessa tarifas, a empreza será obrigada a transportar constantemente, com cuidado, exactidão e presteza, as mercadorias, os passageiros, suas bagagens, os animaes domesticos e os valores que lhe forem confiados.

Art. 32. As emprezas submetterão á approvação do Governo os horarios dos automoveis de passageiros e a sua lotação maxima em passageiros e bagagens.

Os automoveis de mercadorias serão em numero sufficiente para transportar a tonelagem exigida pelas condições da Estrada.

Os concessionarios apresentarão annualmente ao Governo estatisticas completas sobre o movimento de passageiros e mercadorias organizadas de accôrdo com as instrucções do engenheiro fiscal.

PENALIDADES E FISCALIZAÇÃO

Art. 33. Os concessionarios ficarão sujeitos a multa de 200$ a 1:000$ impostas pelo Governo Federal, no caso de ser o trafego suspenso por mais de 30 dias consecutivos.

Art. 34. Si a interrupção do trafego se prolongar por mais de 60 dias, sem motivo justificado, a juizo do Governo Federal, será imposta a pena de caducidade da concessão, revertendo a estrada e todo o material, fixo e rodante, para a União, com indemnização do que o Thesouro Federal houver pago a titulo de subvenção kilometrica.

Art. 35. A fiscalização dos contractos celebrados com emprezas ou particulares, para a construcção e exploração de estradas servidas por automoveis, nos termos deste regulamento, será exercida por engenheiros fiscaes nomeados pelo Governo Federal, sendo aproveitados para esses cargos os fiscaes das estradas de ferro mais proximas.

Art. 36. As emprezas serão obrigadas a observar as disposições do decreto n. 1.930, de 26 de abril de 1857, na parte que fôr applicavel, e bem assim quaesquer outras que forem decretadas para policia e segurança da circulação das estradas servidas por motores aperfeiçoados.

Art. 37. As emprezas ou particulares que tiverem concessões estaduaes para o estabelecimento de transporte por meio de automoveis deverão submetter á approvação do ministro da Viação e Obras Publicas, nos termos deste regulamento, todos os planos da estrada e suas deppendencias, instruindo a petição em que solicitarem a subvenção do art. 1º com copia authentica do contracto e lei estadual que houver autorizado tal concessão.

Art. 38. O Governo Federal terá direito de exigir das emprezas que houverem obtido dos Estados concessões para construcções e explorações, addicionaes ás contrahidas para com as administrações estaduaes que julgar conveniente, nos termos deste regulamento.

Art. 39. São consideradas nas condições de gozar da subvenção kilometrica de que trata o art. 1º, as entradas que directamente servirem de principal communicação entre os centros productores, de qualquer Estado e os mercados do littoral ou marginaes aos rios e lagôas navegaveis ou de outro Estado, e bem assim as que fôrem subsidiarias das estradas de ferro em trafego.

Rio de Janeiro, 27 de outubro de 1910. – Francisco Sá.