DECRETO N. 7.565 - DE 23 DE SETEMBRO DE 1909
Abre ao Ministerio da Viação e Obras Publicas o credito de 1.000:000$ para execução de medidas contra os effeitos da secca nos Estados do Norte.
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, usando da autorização que lhe confere o n. XXVI do art. 16 da lei n. 2.050, de 31 de dezembro de 1908,
decreta:
Artigo unico. Fica aberto ao Ministerio da Viação e Obras Publicas o credito de 1.000:000$, para a execução das medidas contra os effeitos da secca nos Estados do Norte, especificados no n. XXV do mesmo artigo da referida lei.
Rio de Janeiro, 23 de setembro de 1909, 88º da Independencia e 21º da Republica.
NILO PEÇANHA.
Francisco Sá.
Sr. Presidente da Republica - A frequente renovação das seccas, que devastam uma extensa região do norte do paiz e que ainda neste momento enchem de angustiosas apprehensões o espirito de uma parte de sua população, reclama dos poderes publicos providencias immediatas que acudam ás urgencias presentes e attenuem os effeitos das calamidades futuras.
Si não é licito esperar da acção official, nem dos inexgotaveis recursos da solidariedade humana, a extincção de uma fatalidade climatologica, seria, entretanto, prova de absoluta incapacidade não saber minorar-lhe as deploraveis consequencias, nem aproveitar a experiencia que, nesse sentido, se tem realizado, com proveito, em outros paizes, igualmente desafortunados.
Não póde a Nação ser indiferente ao anniquillamento de forças productoras que, em periodos normaes, em regiões dotadas de maravilhosa fertilidade, trazem avultada contribuição para a riqueza publica e para a elevação dos nossos saldos no commercio internacional. Menos justificavel seria que, ao mesmo passo que se não poupam sacrificios para povoar de colonos estrangeiros o nosso territorio, se deixem inhabilitar pela miseria ou perecer de fome compatriotas nossos, de uma raça laboriosa, paciente e sobria. «Calcula-se, diz em um parecer apresentado ao Club de Engenharia, o Sr engenheiro Raymundo Pereira da Silva, que nestes ultimos 30 annos a zona situada entre os rios Parnahyba e S. Francisco tem perdido mais de 2.000.000 de habitantes mortos de fome e diversas molestias, que esta provoca. Por outro lado, avalia-se em nunca menos de 10.000 o numero de pessoas sacrificadas annualmente, nas florestas do Pará e do Amazonas.
Si addicionarmos o numero dos que emigram para o sul, veremos que anda em mais de 2.500.000 habitantes a perda da população dos Estados do Norte, e isto não levando em conta a decendencia de toda essa gente em tão largo periodo.»
E' certo que, desde o tempo do Imperio, se tem preoccupado o Governo da Nação de acudir a esse grande infortunio, já distribuindo soccorros na hora da crise, já emprehendendo obras que melhorem as condições de resistencia das zonas flagelladas.
Mas, os auxilios da primeira especie, prestados em distribuição de esmolas, não produzem beneficio duradouro, nem impedem abusos prejudiciaes ao Thesouro e ás classes soffredoras, e a execução de obras não se tem feito de modo systematico e permanente, obedecendo a um plano cuja continuidade se impuzesse ás administrações successivas. O Poder Legislativo, é justiça reconhecel-o, tem habilitado o Governo com as autorizações necessarias para organizar o serviço regular de construcção de açudes, poços, barragens submersas, estradas de ferro e outras vias de communicação, e auxilios á iniciativa particular para os emprehendimentos que caibam nas forças desta.
Providencias administrativas foram iniciadas de accôrdo com aquelle pensamento; e para executal-as, organizou-se além da commissão de açudes e irrigação que já existiu, uma superintendencia das obras contra os effeitos das seccas. Mas esta, apezar dos louvaveis intuitos da sua creação, não pôde realizar o proposito do legislador, tendo sido parte do seu pessoal distrahido para commissões estranhas ao serviço, para que fôra creado.
O credito de 2.000:000$, consignado na lei de despeza do exercido de 1908, para as obras contra as seccas, foi dispendido, em sua quasi totalidade, na importancia de 1.999:593$833.
Da verba orçamentaria do actual exercido restava, sómente, findo o primeiro semestre, um saldo não superior a 166:000$000.
Entretanto, desde algum tempo esteve quasi completamente suspensa a construcção de açudes; as estradas de ferro do norte tiveram moroso progresso; o estabelecimento de canaes de irrigação foi inteiramente abandonado; perfuraram-se alguns poços de real utilidade, mas de escasso supprimento para regiões agricolas extensas; cogitou-se de ensaiar a lavoura secca, mas como houvesse morrido, antes de iniciados os trabalhos, o engenheiro a quem aquella commissão fôra dada, não mais se cuidou de executar aquella parte, aliás de resultados incertos, do plano administrativo.
Desde o inicio do seu Governo ordenou V. Ex. que fosse dada inteira execução á lei, construindo-se açudes e poços e imprimindo-se actividade aos trabalhos das estradas de ferro. E isto se está fazendo na medida dos escassos recursos orçamentados que restaram ao actual Governo.
E' premente, porém, a necessidade de dar maior impulso e desenvolvimento áquelle serviço, afim de proporcionar trabalho ás populações que a secca está açoitando dos seus lares, e de dotar de melhoramentos uteis, permanentes, as regiões periodicamente sujeitas á calamidade.
Quanto ás estradas de ferro, estão em andamento, cujo resultado me apressarei a submetter á apreciação de V. Ex. estudos e exames que permittam atacar, com os menores onus possiveis para o Thesouro, a construcção dos prolongamentos, de algumas, nos Estados de Alagoas, Pernambuco, Parahyba, Ceará e Piauhy; e proseguem os trabalhos já contractados das de Bahia, Rio Grande do Norte e Maranhão.
Quanto aos açudes, ha alguns estudados e que podem ser com grande beneficio publico, construidos em Ceará, Rio Grande do Norte e Parahyba.
E' de esperar que o Congresso Nacional, na lei de orçamento para o futuro exercicio, habilite o Governo com os meios necessarios para a realização dessas providencias naquelle periodo.
Mas, para dar, desde já, efficaz impulso ás obras a que me referi, e ás que a urgencia da situação reclamar, está o Poder Executivo autorizado pelo n. XXV, do art. 16 da lei 2.050, de 31 de dezembro de 1908, a tomar as medidas proprias para attenuar tanto quanto possivel, os effeitos das seccas nos Estados do norte, e para estas, além das de que tratam os ns. XLII e XLIII do mesmo artigo a despender até a quantia de 1.000:000$000.
Sendo pensamento de V. Ex. utilizar-se daquella autorização tenho a honra de accôrdo com o exposto, de submetter á approvação de V. Ex. o projecto de decreto que abre o credito consignado na lei.
Rio de Janeiro, 23 de setembro de 1909. - Francisco Sá.