DECRETO N. 8.249 – DE 22 DE SETEMBRO DE 1910

Crea a Bolsa de Corretores (mercadorias e navios)

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, de accôrdo com o disposto no art. 2º, n. 3, letra b, do decreto. n. 1.606, de 29 de dezembro de 1906,

decreta:

Artigo unico. Fica creada a Bolsa de Corretores (mercadorias e navios) de accôrdo com o regulamento que com este baixa, assignado pelo ministro de Estado dos Negocios da Agricultura, Industria e Commercio.

Rio de Janeiro, 22 de setembro de 1910, 89º da Independencia e 22º da Republica.

Nilo PEÇANHA.

Rodolpho Nogueira da Rocha Miranda.

Regulamento da Bolsa de Corretores (mercadorias e navios) a que se refere o decreto n. 8.249, desta data

DA ORGANIZAÇÃO DA BOLSA

Art. 1º. A Bolsa de Corretores é o lugar destinado á reunião collectiva dos corretores de mercadorias e de navios e funccionará no edificio que for designado pelo Ministerio da Agricultura, Industria e Commercio.

Art. 2º. Só aos corretores de mercadorias e de navios, e aos seus prepostos será permittido o ingresso no local que for determinado para serem apregoadas as offertas e realizadas as operações de compra e venda, engajamentos, fretes e outras, sem prejuizo, porém, do espaço reservado ao publico.

Art. 3º. Os trabalhos da Bolsa poderão ser realizados no maximo duas vezes por dia, cabendo á Junta dos Corretores determinar préviamente as horas respectivas.

Art. 4º. Os corretores de mercadorias deverão comparecer ou fazer-se representar pelo preposto que os substituir em seus impedimentos aos trabalhos da Bolsa.

Paragrapho unico. A falta de comparecimento de qualquer corretor ou de seu preposto não impedirá o funccionamento da Bolsa, mas o sujeitará á multa de 500$, e ao dobro na reincidencia.

DAS OPERAÇÕES

Art. 5º. Para as negociações em Bolsa faz-se preciso que a Junta dos Corretores determine préviamente a designação das mercadorias, fixando:

a) – o nome pelo qual deve ser apregoada e registrada;

b) – os typos que constituem as differenciações das qualidades;

c) – a quantidade que deve formar a unidade do contracto, entendendo-se por lote o multiplo desta unidade.

Paragrapho unico. As operações sobre mercadorias, cuja designação não tiver sido fixada pela Junta dos Corretores, poderão ser effectuadas desde que antes de iniciados os trabalhos seja pedido ao syndico por um corretor a sua inscripção.

Art. 6º. A Junta dos Corretores organizará a tabella de designação de mercadorias negociaveis, que annualmente será por ella revista.

§ 1º Por occasião de cada safra serão fixados os typos admittidos como base de negociações.

§ 2º. As designações de mercadorias não comprehendidas nas tabellas serão fixadas pela Junta, mediante requerimento dos interessados.

Art. 7º. A Junta dos Corretores promoverá nos Estados do Brazil a organização de typos officiaes dos productos commerciaes de cada região, susceptiveis de exportação, e a remessa das respectivas amostras, afim de facilitar as operações da Bolsa.

Art. 8º. De todas as mercadorias, cuja designação for fixada pela Junta dos Corretores para os effeitos de negociação e registro em Bolsa, serão archivadas duas amostras, uma no Museu Commercial do Rio de Janeiro e outra na Secretaria da Junta dos Corretores, para servirem de padrão.

§ 1º. As amostras que servirem de base a vendas de mercadorias em Bolsa deverão ser apresentadas no local em que a mesma funccionar, uma hora antes de serem iniciados os respectivos trabalhos, sendo em seguida archivadas na fórma deste artigo.

§ 2º. As amostras archivadas na Junta dos Corretores, que forem substituidas por outras de outra safra, serão recolhidas ao Museu Commercial, com a indicação da época a que pertenciam.

Art. 9º. As offertas e negociações em Bolsa serão apregoadas dependendo o inicio, suspensão e terminação dos trabalhos de signal dado pelo syndico da Junta de Corretores.

Art. 10. O corretor, ao apregoar a negociação de que foi encarregado, deverá fazel-o com inteira clareza quanto ás condições do contracto, mencionando si é com direitos pagos ou não, quando a mercadoria for estrangeira, condições cif ou nas condições do mercado.

Paragrapho unico. Consideram-se condições do mercado as praxes que vigorarem na praça do Rio de Janeiro na occasião em que for a operação realizada, emquanto essas praxes não forem definitivamente fixadas pela Junta dos Corretores.

Art. 11. No prégão deve ser indicado o numero de unidade de que se compõe o lote da mercadoria offerecida, podendo ser fraccionado, se assim convier aos committentes.

Art. 12. Acceito por qualquer corretor a offerta nas condições propostas, será tida como fechada a transação.

Art. 13. Os corretores e seus prepostos poderão operar «fóra da Bolsa», devendo, porém registrar em Bolsa as operações effectuadas mediante memorandum entregue ao syndico da Junta dos Corretores, antes de iniciados os trabalhos.

Paragrapho unico. As operações realizadas «fóra da Bolsa», mas durante os trabalhos desta, ou depois delles terminados, serão registrados na Bolsa seguinte immediata.

Art. 14. Os corretores devem guardar segredo sobre o nome dos committentes para com terceiro.

Art. 15. Ultimada a negociação em Bolsa, ou fóra della, pelo fechamento da transacção (art. 12), os corretores trocarão entre si documentos em fórma de memorandum, por elles assignados, com a especificação do nome das pessoas que nella intervierem, a designação minuciosa (nome, typo e quantidade) das mercadorias vendidas, preço, prazo e condições de entrega e de pagamento e todas e quaesquer circumstancias occurrentes que possam servir para futuros esclarecimentos. (Cod. Comm. art. 48.)

§ 1º. Uma outra via do memorandum, deverá ser entregue immediatamente para os effeitos legaes ao syndico da Junta dos Corretores.

§ 2º. Os corretores entregarão aos seus committentes contractos de compra e venda, registrando-os préviamente em seus livros.

§ 3º. Os memoranda e os contractos deverão mencionar a circumstancia de ter sido a operação effectuada na Bolsa ou fóra della.

§ 4º. Os contractos de compra e venda de operações realizadas serão lavrados pelo corrector que representar o committente vendedor, devendo fazer menção do nome do corretor que representar o committente comprador.

Art. 16. Nas operações effectuadas em Bolsa ou nella registradas não poderão apresentar-se individualmente como compradores e vendedores de qualquer mercadoria dous socios da mesma firma.

§ 1º. Chegando ao conhecimento do syndicato da Junta dos Corretores que dous corretores se mancommunaram com o mesmo committente para simular operações, serão os mesmos multados de 500$ a 1:000$, a arbritrio do syndico e considerada a operação nulla para todos os effeitos. Ao committente será vedado realizar novas operações emquanto não indemnizar dos prejuizos que possa ter causado com essa irregularidade, ficando além disso impedido de negociar em Bolsa durante tres mezes.

Art. 17. As operações effectuadas em Bolsa, ou nella registradas (art. 13), serão inscriptas juntamente em quadro especial, exposto ao publico, com a menção da designação da mercadoria, quantidade, preço e prazo.

Art. 18. As ordens dadas ao corretor podem ser por escripto ou verbaes, sendo elle sempre responsavel pela identidade das pessoas que intervierem nos contractos celebrados por sua intervenção. (Cod. Com., art. 55).

Art. 19. A incumbencia dada ao corretor para qualquer negociação entende-se finda no mesmo dia, salvo convenção em contrario.

Art. 20. O corretor não perderá o direito á sua corretagem pela falta de cumprimento por alguma das partes contractantes, do contracto de compra e venda registrado em Bolsa.

§ 1º. O committente que entregar ao corretor conhecimentos, notas de generos para vender ou o incumbir de quaesquer outros negocios em tempo determinado, não poderá realizar os mesmos negocios por intervenção de outro corretor sem ter decisão do primeiro com quem tratou, sob pena de pagar a este a corretagem correspondente como si a operação fosse por intervenção delle effectuada e ultimada.

§ 2º. O mesmo terá lugar quando qualquer committente, tendo recebido de um corretor a nota de desempenho de qualquer commissão de que o houver encarregado, deixar de ultimar o negocio por sua intervenção, por não lhe agradarem as condições e vier a realizal-o particularmente ou por intervenção de outro corretor, com as mesmas condições, dentro dos tres primeiros dias seguintes; e provando-se que houve dolo para fraudar o corretor, será o committente obrigado ao pagamento do decuplo da corretagem que seria devida.

Art. 21. A requerimento do corretor ou de seus committentes será affixado na Bolsa e na Secretaria da Junta dos Corretores o nome do committente que se negar a cumprir o contracto de compra e venda celebrado por sua autorização, affixando-se tambem o resumo da operação.

Paragrapho unico. Emquanto não for liquidado o contracto, não poderá o committente realizar, na Bolsa ou fóra della (art. 13), novas operações, nem aos corretores, por si ou seus prepostos, será licito executar quaesquer outras ordens deste committente, salvo accôrdo entre as partes em litigio.

Art. 22. Os preços das mercadorias negociadas ou registradas em Bolsa (art. 13) serão inscriptas em livro especial existente na secretaria da Junta dos Corretores e constituirão a base para a cotação offìcial diaria.

Paragrapho unico. Semanalmente, a Junta dos Corretores organizará o boletim dos preços correntes officiaes das mercadorias negociaveis no mercado, tomando por base as cotações officiaes diarias, e na falta destas as notas que os corretores deverão fornecer.

Esses preços serão registrados em livro separado, na secretaria da Junta, devendo uma cópia do boletim ser publicado no Diario Official.

Art. 23. São consideradas operações á vista aquellas cuja ordem para a entrega da mercadoria for passada no mesmo dia da venda, ainda mesmo que os pagamentos sejam effectuadas em prazos convencionados entre os committentes.

DAS LIQUIDAÇÕES

Art. 24. As liquidações das operações das mercadorias, vendidas em Bolsa ou nella registradas, poderão ser realizadas pela effectiva entrega das mercadorias e pagamento do preço nas condições ajustadas ou pelo pagamento da differença entre a cotação do registro do contracto e o do dia anterior da liquidação, nos casos permittidos em lei ou intervindo aprasimento das partes.

Art. 25. No caso da liquidação ser feita por differença, servirá de base para a liquidação o preço fornecido por certidão pela Junta dos Corretores.

Art. 26. Não tendo a Junta dos Corretores registrado em seus livros cotação de qualquer especie de mercadoria, o syndico, a requerimento do interessado, encarregará uma commissão de corretores de mercadorias de fornecel-a, fazendo-a registrar em seu livro de registro de preços correntes, como addendum ás cotações do dia designado, e só depois de registrada se dará certidão.

Art. 27. Para garantia da effectividade da liquidação das operações a prazo sobre mercadorias effectuadas ou registradas em Bolsa poderão os corretores exigir dos committentes garantias reciprocas; esta garantia, quando em dinheiro, será préviamente fixada e depositada em estabelecimento bancario ou particular, a aprasimento das partes.

§ 1º. As margens iniciaes para garantir as negociações a que se refere o presente artigo serão accordadas pelas partes contractantes emquanto não existirem tabellas officiaes.

§ 2º. A Junta dos Corretores poderá, de accôrdo com os corretores e negociantes, estabelecer uma tabella official que será affixada na sala em que funccionar a Bolsa, com as margens iniciaes que deverão ser depositadas para garantir a operação a prazo.

Art. 28. As garantias para a effectividade da liquidação deverão ser mencionadas no contracto do corretor, e a certidão de deposito, quando houver, deverá acompanhar o contracto, para protesto por falta de cumprimento.

Art. 29. Dando-se modificação da cotação da mercadoria a prazo, poderão as partes contractantes exigir reciprocamente reforço do deposito.

§ 1º. O pedido de reforço será dirigido por escripto ao syndico da Junta dos Corretores, que mandará immediatamente notificar do mesmo ao corretor da outra parte contractante, para sua execução, dentro do prazo de 24 horas.

§ 2º. O syndico poderá negar o reforço pedido ao vendedor si este comprovar satisfactoriamente achar-se em estado de entregar em tempo a mercadoria vendida, não poderá, porém, autorizal-o si o vendedor offerecer a ordem para data convencionada de entrega da mercadoria vendida, ou uma certidão do deposito da mesma.

§ 3º. Nesta ultima hypothese, certidão de deposito só terá effeito liberatorio si for verificada a identidade da mercadoria depositada.

Art. 30. Exigido do committente reforço por intermedio do corretor e não satisfeito immediatamente o seu pagamento, considera-se o contracto vencido.

Art. 31. Si as partes contractantes accordarem na prorogação do prazo da entrega, será esta prorogação apregoada em Bolsa, tendo o corretor direito á percepção de nova corretagem.

Art. 32. A falta da liquidação da operação no prazo convencionado autoriza o protesto do contracto do corretor, como medida assecuratoria da prestação de perdas e damnos e dá direito á entrega da quantia depositada á outra parte contractante.

Art. 33. Si a differença entre o preço da operação vencida, for superior ou inferior ao da cotação da vespera do vencimento do contracto ou da cotação anterior mais proxima, provada por certidão da Junta dos Corretores, a liquidação se fará com o pagamento da differença verificada.

Art. 34. Si a quantia depositada for inferior á differença verificada, será a outra parte contractante indemnizada do restante.

DA ENTREGA

Art. 35. A entrega das mercadorias vendidas será feita por meio de uma ordem assignada pelo vendedor, da qual deverão constar todos os caracteristicos, designação, quantidade, peso, marca, logar de deposito, etc. (Cod. Comm., art. 199, Assento de 17 de agosto de 1857).

Art. 36. A ordem de entrega será passada no mesmo dia das operações á vista, e com antecedencia de 48 horas da data do vencimento, nas operações a prazo, e enviada ao corretor da outra parte contractante, com um aviso para o fim de proceder á competente verificação.

Art. 37. Suscitada qualquer duvida sobre a conferencia total ou parcial da mercadoria a entregar, os interessados poderão recorrer por escripto ao syndico da Junta dos Corretores, que nomeará uma commissão, composta de dois peritos escolhidos a prazimento das partes, presidida por um corretor por elle designado, a qual procederá á verificação.

Paragrapho unico. O laudo da commissão deverá ser entregue ao syndico e registrado na secretaria da Junta, em livro especial.

Art. 38. Verificada pela commissão, a que se refere o artigo anterior, a não conformidade, parcial ou total, da mercadoria a entregar, e não effectuando o vendedor a substituição até o dia do vencimento, ou 24 horas depois da data do registro do laudo dos peritos, o vendedor perderá o direito á quantia depositada, e responderá pelos prejuizos, perdas e damnos á outra parte contractante. (Cod. Comm., art. 206).

Art. 39. Os defeitos descobertos pelo comprador, depois da entrega effectiva da mercadoria, serão apurados segundo as disposições geraes do direito (Cod. Comm., arts. 210 e seguintes), podendo sempre os interessados recorrer de commum accôrdo á verificação por meio de uma commissão de arbitragem nomeada na fórma do art. 36.

Art. 40. As arbitragens, verificações e duvidas que se suscitarem sobre entrega de mercadorias que forem objecto de operações registradas em Bolsa serão resolvidas pela confrontação com os typos officiaes archivados, na conformidade do art. 8º.

DISPOSIÇÕES GERAES

Art. 41. A Junta dos Corretores, por uma commissão nomeada pelo syndico, poderá fornecer attestados de qualidade e da classificação de qualquer especie de mercadoria, desde que sejam requisitados por algum interessado.

§ 1º. O possuidor da mercadoria a classificar por typo ou por qualidade entregará ao syndico, além do requerimento em que solicita os referidos trabalhos, os emolumentos taxados na respectiva tabella.

§ 2º. A classificação por typo será feita pela confrontação das amostras apresentadas pelo possuidor da mercadoria, com as que se acharem archivadas, devendo das mercadorias classificadas ficar archivadas amostras na conformidade do art. 8º.

§ 3º. Os laudos da commissão serão registrados em livro especial na secretaria da Junta dos Corretores.

§ 4º. Os emolumentos a cobrar por esses serviços farão parte da tabella annexa ao regimento interno da Junta dos Corretores.

Art. 42. As vendas de mercadorias por intermedio do corretor, com autorização judicial, só poderão ser realizadas em Bolsa, sendo para isso affixado aviso no local em que a mesma funccionar, e annunciadas pela impressa com a devida antecedencia. Funccionará o corretor designado pelo juiz a quem estiver affecto o processo, e estas operações terão preferencia nos trabalhos do dia em que tiverem de ser realizadas.

Art. 43. As vendas que tiverem de ser effectuadas por intermedio de corretor, em virtude do que dispõe os arts. 10, § 1º, 23, § 1º, do regulamento dos armazens geraes, approvado pelo decreto n. 1.102, de 21 de novembro de 1903, só poderão ser realizadas em Bolsa.

Art. 44. Nas vendas judiciaes ou nas a que se refere o artigo antecedente não serão admittidas reclamações sobre qualidade; os compradores deverão examinar a mercadoria no local onde se achar depositada, incluindo os corretores em seus contractos a clausula de ter sido a mesma examinada e acceita por seus committentes.

Art. 45. Organizado algum estabelecimento sob a fórma de sociedade anonyma, com o fim de garantir as liquidações a prazo de operações realizadas ou registradas em Bolsa, os corretores poderão com elle transigir, de fórma a ficarem garantidas as liquidações de seus contractos; com autorização de seus committentes deverá o corretor fornecer a esse estabelecimento uma certidão de contracto para o devido registro da operação.

Art. 46. Os documentos particulares relativos a operações de compra e venda de qualquer especie de mercadoria ficam, sob pena de nullidade, sujeitos, ás exigencias do decreto n. 79, de 23 de agosto de 1892

Art. 47. Os casos omissos e as modificações que se tornarem necessarias para a boa execução deste regulamento serão levados ao conhecimento do ministro, da Agricultura, Industria e Commercio, para as devidas providencias. Nos casos urgentes decidirá o syndico da Junta dos Corretores, o qual deverá communicar immediatamente ao mesmo ministro a sua resolução,

Art. 48. Revogam-se as disposições em contrario.

Rio de Janeiro, 22 de setembro de 1910. – Rodolpho Miranda.