decreto n. 109 - de 31 de dezembro de 1889
Approva a reforma dos estatutos da Companhia Hydraulica Porto-Alegrense
O Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação attendendo ao que requereu a Companhia Hydraulica Porto-Alegrense, devidamente representada, resolve approvar a reforma de seus estatutos, votada em assembléa geral dos respectivos accionistas de 12 de abril do corrente anno.
O Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o tenho entendido.
Sala das sessões do Governo Provisorio, 31 de dezembro de 1889, 1º da Republica.
manoel deodoro da Fonseca.
Demetrio Nunes Ribeiro.
Estatutos da Companhia Hydraulica Porto-Alegrense
capitulo I
DA DURAÇÃO E FINS DA COMPANHIA E SEU FUNDO CAPITAL
Art. 1º A Companhia Hydraulica Porto-Alegrense, sociedade anonyma estabelecida nesta capital, continuará a funccionar, conservando o mesmo titulo e a mesma séde, sendo, porém, os estatutos por que se rege modificados pelos presentes.
Art. 2º A duração desta sociedade se prolongará até 22 de setembro de 1898, na fórma do contracto com a provincia, ou, si elle for prorogado, até á ultima prorogação.
Neste ou naquelle caso, se dividirá pelos accionistas o valor da desapropriação, com o fundo de reserva e quaesquer valores que existirem, e só poderá ser dissolvida antes, nos casos previstos pela lei.
Art. 3º O objecto da Companhia Hydraulica Porto-Alegrense continúa a ser o abastecimento de agua potavel a esta cidade, nos termos do contracto que, em virtude da lei provincial n. 466 de 2 de abril de 1861, foi celebrado com a Presidencia aos 7 de setembro do mesmo anno, com as modificações constantes da lei n. 478 de 31 de dezembro de 1861; podendo realizar quaesquer novas obras para augmentar o abastecimento, si for necessario, com as aguas potaveis de outras procedências, dependente de approvação do governo da provincia.
Art. 4º O capital da sociedade é de 650:000$ distribuidos em 6.500 acções de 100$ cada uma, com todas as entradas realizadas, podendo ser elevado si a assembléa geral assim o entender, para melhor execução dos serviços a seu cargo.
Art. 5º A cessão das acções se opera pelo termo de transferencia lavrado no livro do registro de que trata o art. 7º, § 3º, da lei n. 3150 de 4 de novembro de 1882, assignado pelo cedente e cessionario, ou por seus legitimos procuradores, revestidos dos poderes necessarios. No caso de transmissão de acções a titulo de legado, successão, ou por virtude de arrematação ou adjudicação, o termo de transferencia para o nome do legatorio, herdeiro, arrematante ou credor adjudicatario, não poderá ser lavrado sinão á vista do alvará do juiz competente, do formal de partilha, ou de carta de arrematação ou de adjudicação.
CAPITULO II
DA ASSEMBLÉA GERAL
Art. 6º A assembléa geral compõe-se dos accionistas que tiverem suas acções registradas na sociedade dous mezes antes da reunião.
Art. 7º Haverá todos os annos, até ao dia 15 de setembro, uma assembléa geral ordinaria.
Art. 8º A' assembléa geral compete:
§ 1º Examinar e approvar o balanço e contas da directoria, e o relatorio da commissão fiscal.
§ 2º Ordenar os exames e indagações que julgar necessários, para deliberar sobre qualquer assumpto de sua competencia, podendo adiar a reunião, si isso for necessario.
§ 3º Marcar os ordenados do gerente e empregados sobre propostas da directoria.
§ 4º Eleger annualmente o presidente e vice-presidente da assémbléa geral, os directores e seus supplentes, e os membros da commissão fiscal.
§ 5º Vigiar sobre a fiel observancia dos contractos da companhia.
§ 6º Tomar quaesquer deliberações ou medidas uteis á companhia e que não estejam previstas nestes estatutos, observadas as prescripções da lei n. 3150 de 4 de novembro de 1882.
§ 7º Reformar estatutos sob proposta da directoria e commissão fiscal, ou a requerimento de sete ou mais accionistas que representem pelo menos um quinto do capital social.
Art. 9º A directoria deve convocar a assembléa geral ordinaria, com 15 dias de antecedencia, annunciando a convocação pelos jornaes, com indicação do logar, dia e hora da reunião.
Art. 10. Quando a directoria for omissa no cumprimento desse dever, é permittido a qualquer accionista, si a convocação for retardada por mais de dous mezes, requerer ao juiz do commercio autorisação para fazel-a. Nos annuncios para a dita convocação se declarará qual o juiz que a autorisou e a data do despacho.
Art. 11 A convocação extraordinaria da assembléa será sempre motivada e terá logar todas as vezes que a directoria julgar conveniente e bem assim a commissão fiscal, ou quando for requerida por sete ou mais accionistas que representem ao menos o quinto do capital social.
Art. 12. A convocação extraordinaria da assembléa geral será feita com prazo de oito dias e annunciada pela imprensa, com indicação do logar, dia e hora da reunião.
Art. 13. A assembléa geral se julgará constituida, desde que esteja presente um numero de accionistas que represente pelo menos um quarto do capital social.
Si esse numero se não reunir, se fará nova convocação com o prazo de oito dias, declarando-se nos annuncios que a assembléa deliberará qualquer que seja o capital representado pelos accionistas que comparecerem.
Art. 14. Para deliberar sobre a alteração dos estatutos, dissolução e liquidação da sociedade, a assembléa geral carece, para se constituir, da presença de accionistas que representem, pelo menos, dous terços do capital social. Si nem na primeira, nem na segunda reunião comparecer esse numero, se convocará terceira, com a declaração de que a assembléa geral deliberará qualquer que seja o capital representado pelos presentes. Neste caso, a segunda e terceira convocação se farão com um prazo menor de oito dias e além dos annuncios, na terceira convocação, se fará aviso por carta aos accionistas residentes na cidade.
Art. 15. Cada cinco acções dão direito a um voto até ao numero de 50 acções, e dahi para cima só se contará um voto mais a cada 10 acções; todavia nenhum accionista póde ter mais de 20 votos, qualquer que seja o numero de acções que possua.
Os accionistas que possuirem menos de cinco acções, podem discutir, mas não votar.
Art. 16. Para todas as deliberações e votações poderão os accionistas fazer-se representar por procuradores, tambem accionistas, com poderes especiaes.
Art. 17. Nenhum procurador poderá representar mais de um accionista, considerando-se marido e mulher meeiros, como um só accionista.
Art. 18. Os accionistas menores e interdictos podem ser representados por seus tutores ou curadores, as mulheres pelos seus maridos, os filhos menores por seus paes, as heranças indivisas por seus inventariantes, as firmas sociaes por um de seus membros ou representantes, e em geral as corporações ou pessoas juridicas por seus administradores.
Paragrapho unico. Os representantes e procuradores devem comprovar a sua qualidade perante a mesa da assembléa geral.
Art. 19. Os directores e fiscaes não podem votar sobre suas contas e pareceres.
Art. 20. Todas as deliberações serão tomadas pela maioria dos votos presentes.
Art. 21. A assembléa geral elegerá por tres annos um presidente e um vice-presidente, aos quaes compete presidir as sessões nas reuniões ordinarias e extraordinarias. Na falta de ambos, a reunião será presidida pelo maior accionista presente e, em caso de igualdade, pelo mais velho. O presidente designará os dous secretarios. Nem estes nem aquelle poderão ser tirados da direcção ou commissão fiscal.
Art. 22. O presidente dirigirá os trabalhos nas sessões ordinarias e extraordinarias, de accordo com os estylos dos corpos deliberantes, observando e fazendo observar as seguintes regras:
§ 1º Nenhum accionista poderá fallar, sem que haja sobre a mesa um requerimento ou proposição qualquer, sujeito á deliberação e votação da assembléa geral, excepto nos casos de ordem ou de pedido de explicação.
§ 2º Os accionistas só poderão fallar uma vez sobre qualquer assumpto, excepto o autor ou autores da materia em discussão, que poderão fallar duas vezes.
§ 3º As votações serão feitas por escrutinio e por acções, contando-se os votos pelo modo determinado no art. 15 e salvo quando for tão evidente a manifestação symbolica da assembléa, que torne escusada a verificação de votos, mas esta se effectuará sempre que qualquer accionista o requeira.
Art. 23. Nas reuniões extraordinarias só se tratará do assumpto que as tiver motivado, podendo comtudo offerecer indicações para serem apreciadas na primeira reunião.
CAPITULO III
DA DIRECTORIA
Art. 24. A companhia será dirigida por tres directores eleitos em assembléa geral e servirão pelo espaço de tres annos, sendo todos os annos substituidos pelo terço, sahindo sempre o mais antigo.
Nos primeiros dous annos os directores combinarão entre si qual deva sahir, e si algum não resignar voluntariamente, a sorte decidirá. Estes directores são revogaveis e reelegiveis.
Paragrapho unico. A assembléa geral poderá, si julgar conveniente, reduzir a dous o numero dos directores, dos quaes um poderá ser o gerente; determinando o numero de annos que deve durar o exercicio de cada um delles.
Art. 25. No exercicio do seu cargo compete á directoria:
§ 1º Reunir-se uma vez ordinariamente cada mez, e extraordinariamente á requisição de seus membros ou do gerente.
§ 2º Examinar e approvar os balancetes mensaes.
§ 3º Convocar, ordinaria e extraordinariamente, a assembléa geral.
§ 4º Apresentar á assembléa geral em sua reunião ordinaria o balanço da receita e despeza do anno social findo, acompanhado da exposição do estado das obras da companhia, indicando tudo quanto julgar conveniente, e bem assim indicar as reformas que a experiencia mostrar serem necessarias nos presentes estatutos.
§ 5º Nomear o gerente e mais empregados e quem os substitua em seus impedimentos, podendo suspendel-os e demittil-os quando julgar conveniente.
§ 6º Inspeccionar a direcção dos trabalhos.
§ 7º Fazer regulamentos para a boa ordem da administração e fiscalização da venda de agua.
§ 8º Fixar o preço e formular as condições dos contractos de fornecimento de agua, como entender conveniente, sem offensa das clausulas do contracto celebrado com o governo da provincia; devendo, porém, os regulamentos ou condições, que para esse fim organisar, ser previamente submettidos á approvação do mesmo governo.
§ 9º Autorisar o pagamento dos dividendos.
§ 10. Executar e fazer executar, por intermedio do gerente, as disposições dos estatutos e as resoluções da assembléa geral.
§ 11. Nomear annualmente, dentre seus membros, um presidente e um secretario; aquelle dirigirá as discussões e este lerá o expediente e redigirá as actas, que serão assignadas pelos membros presentes.
Art. 26. As decisões da directoria serão tomadas por maioria de votos, podendo cada um de seus membros fazer declarar o seu voto na respectiva acta.
Art. 27. As resoluções e correspondencia serão expedidas em nome da directoria, sendo assignadas pelo presidente e secretario.
Art. 28. Os membros da directoria servirão gratuitamente emquanto a assembléa geral não deliberar arbitrar uma gratificação ou retribuição pelos seus serviços.
capitulo IV
DA COMMISSÃO FISCAL
Art. 29. A commissão fiscal se comporá de tres membros, e a ella compete:
§ 1º Dar á assembléa geral parecer circumstanciado sobre o estado dos negocios da sociedade, tendo por base o inventario, balanço e contas da directoria.
§ 2º Denunciar os erros, faltas e fraudes que descobrir e suggerir as medidas e alvitres que entender a bem da sociedade.
§ 3º Examinar si foram bem executadas as disposições dos estatutos e as deliberações da assembléa geral.
Art. 30. Para o bom desempenho de suas funcções, tem a commissão fiscal, durante o trimestre que precede ás reuniões ordinarias da assembléa geral, o direito de examinar os livros da companhia, seus balanços, inventarios e mais papeis, de verificar o estado da caixa e de exigir da directoria todas as informações que julgar conveniente.
Art. 31. Qualquer deliberação da assembléa geral, tomada sobre a approvação dos balanços e contas, será nulla, si não for precedida do parecer da commissão fiscal.
Art. 32. Quando os membros da commissão fiscal forem impedidos por qualquer motivo, a directoria ou qualquer de seus membros requererá, na fórma da lei, ao presidente da Junta Commercial para que os nomeie.
CAPITULO V
DO GERENTE
Art. 33. Ao gerente compete:
§ 1º Fiscalisar a venda de agua nos chafarizes e celebrar contractos com os que quizerem fornecimento da mesma em seus domicilios particulares.
§ 2º Compellir os concessionarios de pennas ao pagamento de seu debito por todos os meios legitimos, dando conhecimento á directoria das medidas que tiver tomado.
§ 3º Inspeccionar os trabalhos e contractar operarios, ficando dependentes da approvação da directoria os respectivos contractos.
§ 4º Comprar materiaes, precedendo annuncios, si assim o entender a directoria e com ulterior approvação desta.
§ 5º Receber e depositar no Banco da provincia o producto da venda da companhia, não podendo em caso algum conservar em seu poder quantia superior a um conto de réis.
§ 6º Fazer pagamento de todas as despezas e dividendos autorisados, mandando cheques ao Banco.
§ 7º Apresentar á directoria o balanço mensal e annual com os documentos comprobatorios.
§ 8º Fazer escripturar por partidas dobradas as operações da companhia em livros que tenham as formalidades legaes.
§ 9º Mandar lavrar os termos de transferencia e averbar o penhor das acções no livro competente, subscrevendo os respectivos termos.
§10. Manter a correspondencia que lhe for concernente.
§ 11. Dar cumprimento a todas as deliberações da directoria;
§ 12. Depositar, um mez antes da reunião ordinaria da assembléa geral, na secretaria da Junta Commercial, depois de subscriptos pela directoria:
1º Copia do inventario contendo a indicação dos valores sociaes moveis e immoveis, e em synopse as dividas activas e passivas, por classes, segundo a natureza dos titulos.
2º Copia da relação nominal dos accionistas com o numero das acções respectivas e estado do pagamento dellas.
§ 13. Publicar no mesmo prazo, pela imprensa, depois de autorisado pela directoria, a transferencia de acções realizadas durante o anno, o balanço mostrando em resumo a situação da sociedade, o parecer dos fiscaes; e 15 dias depois da reunião da assembléa geral, a acta de suas sessões.
Art. 34. O gerente prestará a fiança de 10:000$ e não poderá accumular a agencia de nenhuma outra empreza, nem exercer o commercio por conta propria ou alheia.
CAPITULO VI
Art. 35. Dos lucros liquidos da companhia, provenientes de operações effectivamente concluidas no respectivo semestre, se deduzirão 5 % para o fundo de reserva, e do restante, si a assembléa geral não resolver por outro modo, se fará o dividendo; ficando entendido que, logo que os lucros liquidos, deduzidos os 5 % estabelecidos para o fundo de reserva, excederem de 18 %, será o excesso dividido em duas partes iguaes entre a companhia e a provincia, nos termos do art. 1º, § 12, da lei n. 478 de 31 de dezembro de 1861.
Art. 36. Os dividendos serão pagos em janeiro e julho de cada anno.
Art. 37. Os dividendos não reclamados em cinco annos prescrevem em favor da companhia. Seis mezes antes de expirar o prazo, se annunciarão os nomes dos donos de taes dividendos que vão cahir em commisso.
Começa-se a contar desta data o prazo de cinco annos, para os dividendos que estão por pagar.
Art. 38. Os directores que distribuirem dividendos não devidos são pessoalmente obrigados a restituir á caixa da companhia as sommas dos mesmos dividendos, e ficam além disso sujeitos ás penas criminaes em que incorrerem.
Art. 39. No caso de insolvabilidade da companhia, os accionistas que houverem recebido dividendos não devidos serão obrigados a restituil-os. Tal obrigação prescreve no fim de cinco annos da data da distribuição desses dividendos.
Art. 40. Teem acção contra os directores pelos prejuizos resultantes da distribuição de dividendos não devidos, a sociedade, os credores no caso de insolvabilidade e os accionistas prejudicados.
CAPITULO VII
DO FUNDO DA RESERVA
Art. 41. O fundo de reserva será formado com 5 % dos lucros liquidos, provenientes de operações effectivamente concluidas durante o semestre, e com o seu proprio rendimento.
Art. 42. O fundo de reserva continuará a ser de preferencia empregado em fundos publicos, geraes, provinciaes e municipaes.
Art. 43. O fundo de reserva é exclusivamente destinado a fazer face aos reparos das obras da companhia.
CAPITULO VIII
DISPOSIÇÕES GERAES
Art. 44. O anno social decorre de 1 de julho a 30 de junho do anno seguinte.
Art. 45. Não podem servir conjunctamente na directoria nem na commissão fiscal:
§ 1º Os ascendentes e descendentes e seus affins;
§ 2º Os irmãos e cunhados durante o cunhadio;
§ 3º Os socios da mesma firma commercial e industrial.
Art. 46. Os membros da directoria não poderão entrar no exercicio, sem caucionar dez acções cada um. Estas acções serão inalienaveis até seis mezes depois que cessar o seu exercicio.
As acções podem ser de terceira pessoa.
Art. 47. A responsabilidade civil e criminal dos directores e fiscaes terá logar nos casos determinados pelo decreto n. 8821 de 30 de dezembro de 1882.
Art. 48. As disposições desse decreto serão applicaveis nos casos omissos nesses estatutos.
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Disposição transitoria - A actual directoria fica autorizada a promover a approvação destes estatutos pelo governo imperial e a praticar as mais formalidades da lei.
(Seguem-se as assignaturas.)