DECRETO N. 436 A – DE 4 DE JULHO DE 1891

Concede privilegio, sem garantia de juros, para construcção de uma via-ferrea entre a estação do Commercio, da estrada de ferro Rio das Flores, e S. Francisco Xavier, com um ramal para a estação de Sapopemba, da Estrada de Ferro Central do Brazil.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, attendendo ao que requereu o bacharel João Candido Murtinho, concede, ao mesmo, privilegio sem garantia de juros, que jámais poderá ser solicitada em relação a esta concessão, para, por si ou por companhia que organizar, construir, usar e gozar, por sessenta annos, uma via-ferrea que, partindo da estação do Commercio, da estrada de ferro Rio das Flores, vá a S. Francisco Xavier, com um ramal que, do ponto que o Governo julgar mais conveniente, á vista dos estudos, se dirija á estação de Sapopemba, da Estrada de Ferro Central do Brazil, mediante as condições constantes das clausulas que com este baixam assignadas pelo Barão de Lucena, Ministro de Estados dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, que assim fará executar.

Capital Federal, 4 de julho de 1891, 3º da Republica.

Manoel deodoro da fonseca.

Barão de Lucena.

clausulas a que se refere o decreto n. 436 a desta data

I

E’ concedido ao bacharel João Candido Murtinho privilegio sem garantia de juros, que jámais poderá ser solicitada em relação a esta concessão, para, por si ou por companhia que organizar, construir, usar e gozar por 60 annos uma via-ferrea que, partindo da estação do Commercio, da estrada de ferro Rio das Flores, vá a S. Francisco Xavier, com ramal que, do ponto que o Governo julgar mais conveniente á vista dos estudos, se dirija á estação de Sapopemba, da Estrada de Ferro Central do Brazil.

II

Além do privilegio o Governo concede:

1º Direito de desapropriar, na fórma do decreto n. 816 de 10 de julho de 1855, os terrenos de dominio particular, predios, bemfeitorias que forem precisos para o leito da estrada, estações, armazens e outras dependencias especificadas nos estudos definitivos;

2º Isenção de direitos de importação, na fórma do decreto n. 7959 de 29 de dezembro de 1880, sobre os trilhos, machinas, instrumentos e mais objectos destinados á construcção.

Esta isenção se fará effectiva, de accordo com a legislação vigente;

3º Durante o tempo da concessão o Governo não concederá outras estradas de ferro dentro de uma zona de 10 kilometros para cada lado do eixo da estrada, salvo direitos de terceiros.

O Governo reserva-se o direito de conceder outras estradas que, tendo o mesmo ponto de partida e direcções diversas, possam approximar-se e até cruzar a linha concedida, comtanto que, dentro da referida zona, não recebam generos ou passageiros.

III

Os trabalhos terão começo dentro do prazo de um anno e terminarão no de cinco, a contar ambos da data da assignatura do respectivo contracto, sob pena de caducidade.

Fica entendido que, sempre que o traçado tiver de atravessar a zona que interesse ao serviço do abastecimento de agua ou a que comprehenda os mananciaes necessarios ao mesmo abastecimento, não poderão as obras da estrada de ferro ser executadas sinão de accordo prévio com a Inspecção das Obras Publicas da Capital Federal.

IV

Para garantia do que preceitua a clausula precedente depositará o concessionario no Thesouro Federal, em moeda corrente, a quantia de 10:000$ em caução, a qual reverterá em beneficio da União si os trabalhos deixarem de ser não só iniciados, mas ainda concluidos dentro dos prazos respectivamente fixados para tal fim.

V

Na execução dos mesmos trabalhos serão observadas as prescripções estabelecidas nos regulamentos vigentes, para o que remetterá o concessionario, com a precisa antecedencia, á Secretaria da Agricultura as plantas e todos os detalhes de cada secção, á medida que forem sendo realizados os respectivos estudos.

VI

O Governo terá o direito de resgatar a estrada em qualquer tempo que julgar conveniente.

O preço do resgate será regulado, em falta de accordo, pelo termo médio do rendimento liquido do ultimo quinquennio e tendo-se em consideração a importancia das obras, material e dependencias no estado em que estiverem então, si o resgate se effectuar depois desse periodo.

Si, porém, o resgate tiver de se effectuar antes do primeiro quinquennio, em falta de accordo, a indemnização será baseada no capital effectivamente empregado na estrada, accrescido da renda que for conhecida em relação ao anno em que se realizar o resgate.

A importancia do resgate poderá ser paga em titulos da divida publica.

Fica entendido que a presente clausula só é applicavel aos casos ordinarios e que não abroga o direito de desapropriação por utilidade publica que tem o Estado.

VII

A companhia obriga-se a transportar gratuitamente:

1º Os colonos e immigrantes, suas bagagens, ferramentas, utensilios e intrumentos aratorios;

2º As sementes e as plantas enviadas pelo Governo ou pelos Governadores dos Estados para serem gratuitamente distribuidas pelos lavradores;

3º As malas do Correio e seus conductores, o pessoal encarregado por parte do Governo do serviço da linha telegraphica e o respectivo material, bem como quaesquer sommas de dinheiro pertencentes ao Thesouro Federal ou aos Estados, sendo os transportes effectuados em carro especialmente adaptado para esse fim;

4º Os funccionarios publicos quando viajarem para desempenho de suas respectivas funcções.

Serão transportadas com abatimento de 50 % sobre os preços das tarifas:

1º As autoridades, escoltas policiaes e respectiva bagagem, quando forem em diligencia;

2º Munições de guerra e qualquer numero de soldados do Exercito e da Guarda Nacional ou da Policia com seus officiaes, respectiva bagagem, quando mandados a serviço do Governo a qualquer parte da linha, dada a ordem para tal fim pelo mesmo Governo, pelo Governador do Estado ou outras autoridades que para isso forem autorizadas;

3º Todos os generos de qualquer natureza que sejam pelo Governo ou pelo Governador do Estado enviados para attender aos soccorros publicos exigidos pela secca, inundação, peste, guerra ou outra calamidade publica.

Todos os mais passageiros e cargas do Governo Federal ou do Estado, não especificados acima, serão transportados com abatimento de 15 %.

Terão tambem abatimento de quinze por cento os transportes de materiaes que se destinarem á construcção e custeio dos ramaes e prolongamento da propria estrada e os destinados ás obras municipaes dos municipios servidos pela estrada.

Sempre que o Governo exigir, em circumstancias extraordinarias, a companhia porá ás suas ordens todos os meios de transporte de que dispuzer.

Neste caso, si o Governo o preferir, pagará á companhia o que for convencionado pelo uso da estrada e todo o seu material, não excedendo o valor da renda média, de periodo identico nos ultimos tres annos.

VIII

A fiscalização da estrada e do serviço será incumbida a um engenheiro fiscal nomeado pelo Governo Federal e pago pela companhia, que para esse fim entrará para os cofres publicos no começo de cada semestre a vencer com a quantia equivalente, que for previamente fixada pelo mesmo Governo.

IX

No caso de desaccordo entre o Governo e a companhia sobre a intelligencia das clausulas do respectivo contracto, esta será decidida em ultima instancia e sem mais recurso pelo Ministro da Agricultura.

X

Com excepção do que se acha estabelecido no § 1º da clausula 1ª do decreto n. 7959 de 29 de dezembro de 1880, e em tudo quanto não estiver aqui estipulado, regulará no que for applicavel á presente concessão o que se contém nas demais clausulas que acompanham o supradito decreto.

XI

Findo o prazo do privilegio reverterá para o Estado, sem indemnização de especie alguma, a estrada com todo o seu material e dependencias.

Capital Federal, 4 de julho de 1891. – B. de Lucena.