DECRETO N. 688 - DE 23 DE AGOSTO DE 1890

Concede autorização a Antonio Pinheiro dos Santos Bastos para organizar a Companhia Nacional de Pesca.

O Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, attendendo ao que requereu Antonio Pinheiro dos Santos Bastos, resolve conceder-lhe autorização para organizar a sociedade anonyma denominada Companhia Nacional de Pesca, com os estatutos e com as clausulas que com este baixam; não podendo, porém, constituir-se definitivamente sem preencher as formalidades exigidas pelo art. 3º do decreto n. 164 de 17 de janeiro ultimo.

O Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o faça executar.

Sala das sessões do Governo Provisorio, 23 de agosto de 1890, 2º da Republica.

MANOEL DEODORO DA Fonseca.

Francisco Glicerio.

Clausulas a que se refere o decreto n. 688 desta data

I

A Companhia Nacional de Pesca é obrigada a respeitar em toda a sua plenitude as concessões feitas para a exploração da industria da pesca e da de venda de peixe, quer vivo, quer secco, salgado ou de qualquer outro modo preparado; bem como outras que para identicos fins o Governo haja de fazer.

II

A mesma companhia, sempre que tiver de adquirir terrenos de marinha, ainda não aforados ou devolutos, deverá requerel-os ás respectivas Intendencias ou Camaras Municrpaes, ou ao Governo, conforme o dominio a que estiverem sujeitos os mesmos terrenos.

Rio de Janeiro, 23 de agosto de 1890. - Francisco Glicerio.

Estatutos da Companhia Nacional de Pesca

CAPITULO I

FUNDAÇÃO, SÉDE, DURAÇÃO E LIQUIDAÇÃO

Art. 1º Fica, pelos presentes estatutos, organizada, com séde e foro nesta capital, uma sociedade anonyma, sob a denominação Companhia Nacional de Pesca, que tem por fim explorar a industria da pesca e da venda de peixe, quer vivo, quer secco, salgado ou de qualquer outro modo preparado.

Art. 2º A companhia durará pelo tempo de 20 annos a contar do dia de sua installação, podendo entretanto ser este prazo prorogado por deliberação da assembléa geral dos accionistas.

Art. 3º A liquidação da companhia só poderá ser determinada e effectuada por qualquer dos motivos previstos no decreto n. 164 de 17 de janeiro do corrente anno, mediante processo legal.

CAPITULO II

Fundo social, acções

Art. 4º O capital da companhia será de 500:000$, divididos em 2.500 acções de 200$ cada uma, podendo ser elevado, de conformidade com as disposições do art. VI do mencionado decreto 164 de 17 de janeiro e por deliberação da assembléa geral dos accionistas.

Art. 5º O capital será realizado em prestações assim determinadas: a primeira de 10% no acto da assignatura dos presentes estatutos; as restantes, a prazos não menos de 30 a 60 dias, e nunca inferior a 10%, mas sempre precedida de annuncios.

Art. 6º O accionista que no prazo prefixado, não tiver realizado sua entrada de capital e não justificar devidamente, a juizo da directoria, o motivo dessa falta, perderá o direito a capital com que já tenha entrado par os cofres sociaes.

§ 1º Acceita pela directoria a justificação do accionista, pagará elle a multa de 2% da respectiva prestação, pela móra de 30 dias, e a de 5% pela de 60 dias, sendo este prazo improrogavel.

§ 2º Esgotado o prazo de 60 dias, sem que o accionista tenha effectuado a entrada do capital, conforme determina o § 1º, cahirão suas acções em commisso e o respectivo producto será levado á conta de fundo de reserva, procedendo-se em seguida á reemissão dellas.

Art. 7º As acções ou cautelas que as representem serão nominativas emquanto não forem integralizadas e só serão transferiveis depois de realizado um quinto de seu valor.

Art. 8º Por fallencia, morte ou impossibilidade physica ou moral de qualquer accionista, antes de se acharem as acções integralizadas, poderá a directoria, depois de ouvir o conselho fiscal, proceder á venda das acções na bolsa, officialmente, ficando o liquido producto á disposição de quem de direito, mas sem vencer juros.

CAPITULO III

FINS DA COMPANHIA

Art. 9º Como o titulo indica, tem a companhia por fim explorar a industria da pesca e a da venda de peixe, quer vivo quer secco, salgado ou de qualquer outro modo preparado para garantir as vantagens sociaes requererá do Governo os onus e favores concedidos pelo regulamento approvado pelo decreto n. 8338 de 17 de outubro de 1881.

CAPITULO IV

ADMINISTRAÇÃO

Art. 10. Será a companhia administrada por uma directoria, composta de tres membros, que escolherão entre si um presidente, um secretario e um gerente, que desde já fica investida de plenos e amplos poderes de gestão, de dar procurações para todos os effeitos, accionar e ser accionada.

Paragrapho unico. Os directores serão elegiveis de cinco em cinco annos e poderão ser re-eleitos.

Art. 11. Só poderá ser eleito director o accionista que possuir, pelo menos, 50 acções, que serão caucionadas á companhia até á primeira prestação de contas depois de ter expirado o seu mandato.

Art. 12. Cada director perceberá mensalmente 500$ e mais semestralmente 1% do dividendo que a companhia distribuir, menos o director-gerente, cuja gratificação semestral será de 3%.

Art. 13. São attribuições da directoria:

I) rever, sempre que julgar conveniente a escripturação;

II) nomear e demittir os empregados da companhia fixar os respectivos ordenados e salarios e exigir fiança dos que por exigencia do cargo sejam obrigados a prestal-a;

III) reunir em sessão, pelo menos, duas vezes mensalmente, lavrando acta das deliberações que forem tomadas;

IV) convocar a assembléa geral ordinaria na epoca prefixada nos presentes estatutos e as extraordinarias, quando forem necessarias ou devidamente requeridas;

V) apresentar á assembléa geral o relatorio annual das transacções da companhia;

VI) fixar o dividendo que houver de ser distribuido;

VII) resolver sobre a acquisição de bens moveis, semoventes e immoveis, e tudo quanto for necessario e adequado ás exigencias da industria da companhia e effectuar as respectivas compras, quer no interior, quer no exterior do paiz;

VIII) determinar a porcentagem destinada ao fundo de reserva.

Art. 14. O director-gerente, sempre de accordo com um dos directores, fica encarregado do desenvolvimento das transacções da companhia e da venda de seus productos.

Art. 15. Os papeis de responsabilidade, de credito, cheques, procurações e todo e qualquer contracto que entenderem interesses da companhia, serão sempre firmados por dous directores, pelo menos.

Art. 16. O director que deixar de exercer seu cargo durante seis mezes seguidos, será considerado resignatario, salvo ausencia combinada.

Paragrapho unico. O director que por qualquer motivo de força maior não puder comparecer durante 30 dias seguidos, será substituido por um membro do conselho fiscal, menos o director-gerente, que deverá ser assiduo e que só poderá ser substituido por um dos outros directores.

Art. 17. Durante o exercicio de seu mandato nenhum director poderá, acceitar igual cargo em empreza ou estabelecimento da mesma especie, importando em resignação do cargo o casa de acceitação, e o director-gerente em negocio de especie alguma.

Art. 18. As attribuições especiaes de cada director serão determinadas em regulamento interno.

Art. 19. Não poderá a directoria contrahir compromissos pessoaes, individuaes ou solidarios pelos contractos e obrigações que realizar no exercicio de seu mandato.

Art. 20. A falta de um director, em virtude de resignação, incompatibilidade ou fallecimento, será preenchida por um accionista, que tenha todas as condições de elegibilidade, á escolha dos demais directores, e ficará no exercicio desse cargo até a primeira assembléa geral ordinaria, em que se procederá á eleição para definitivo exercicio.

Paragrapho unico. O director escolhido, nas condições especiaes acima especificadas, gozará das mesmas vantagens e assumirá as mesmas responsabilidades como si fôra eleito pela assembléa geral, e terminará seu mandato conjunctamente com os outros directores, salvo o caso de ser um outro eleito pela assembléa geral.

CAPITULO V

CONSELHO FISCAL

Art. 21. O conselho fiscal será composto de tres accionistas fiscaes e tres supplentes, eleitos annualmente em assembléa geral ordinaria; aquelles deverão ser possuidores de nunca menos de 20 acções, e estes de qualquer numero dellas.

Art. 22. Compete ao conselho fiscal:

I) dar parecer sobre os negocios e operações da companhia e apresental-o á directoria a tempo de ser incluido no relatorio;

II) dar conselho sobre os negocios da companhia sempre que lhe forem pedidos pela directoria;

III) examinar a caixa, carteira e escripturação da companhia e todos os documentos a ella relativos.

Art. 28. O conselho fiscal poderá ser re-eleito.

§ 1º Os membros do conselho fiscal escolherão entre si um para presidir os seus trabalhos.

§ 2º Os membros effectivos do conselho fiscal serão substituidos pelos supplentes na ordem da votação que tiverem obtido e em caso de haver empate, pelo que maior numero de acções possuir.

§ 3º Os cargos do conselho fiscal não serão remunerados.

CAPITULO VI

FUNDO DE RESERVA, DIVIDENDOS

Art. 24. O fundo de reserva será tirado dos lucros liquidos no fim de cada semestre e nunca será inferior a 10% e mais das acções que tenham cahido em commisso (art. 6º) e dos dividendos que não forem reclamados durante cinco annos.

§ 1º Este fundo é instituido exclusivamente para fazer face a perdas de capital social ou para substituil-o.

§ 2º Deixará de ser feita a deducção de 10%, logo que o fundo de reserva attingir a 50% do capital social.

Art. 25. Depois de feitas as deducções a que se referem os arts. 11 e 24 dos lucros provenientes das operações da companhia, será o excedente distribuido aos accionistas em dividendos, nos mezes de janeiro e julho de cada anno.

§ 1º Logo que o dividendo exceder de 20%, será o excesso levado a fundo de reserva especial, creado para mais tarde occorrer a dividendos que não attingirem áquella taxa.

§ 2º No caso de ser desfalcado o capital por prejuizos, não se distribuirá dividendo emquanto não for este integralmente restabelecido.

CAPITULO VII

ASSEMBLÉAS GERAES

Art. 26. A assembléa geral será composta dos accionistas cujas acções se acharem averbadas no livro respectivo 30 dias antes da data em que ella se verificar.

Art. 27. Presidirá aos trabalhos da assembléa geral um accionista eleito por acclamação e este escolherá os secretarios.

Art. 28. A assembléa geral não poderá constituir-se sinão com a reunião de accionistas que representem, pelo menos, um terço do capital social, salvo o caso previsto pelo art. 15 do decreto n. 164 de 17 de janeiro do corrente anno, que será então quando representado dous terços do capital social, e resolverá sobre qualquer assumpto, menos sobre os que as leis vigentes incumbem ás assembléas geraes extraordinarias resolver.

Art. 29. Não se reunindo numero sufficiente de accionistas, na primeira convocação da assembléa geral, far-se-ha nota convocação e nesta se deliberará com o numero que estiver presente, sendo previamente inserta esta disposição nos annuncios de convocação, menos nos casos previstos pelo citado art. 15 do decreto n. 164 de janeiro ultimo, em que se farão as tres convocações exigidas por esta lei.

Art. 30. Só terá voto o accionista que possuir dez ou mais acções, e a ordem da votação será de um voto para cada grupo de dez acções até ao maximo de 20 votos.

§ 1º O accionista que possuir mais de 200 acções ou que seja portador de uma ou mais procurações, não poderá dispor de mais de 20 votos.

§ 2º O accionista possuidor de menos de 10 acções poderá propor e discutir objecto sujeito á apreciação da assembléa geral, mas não votar, salvo si for procurador do outro.

Art. 31. A assembléa geral se reunirá ordinariamente no mez de setembro de cada anno e extraordinariamente todas as vezes que forem necessarias ou requeridas por sete ou mais accionistas que representem mais da quinta parte do capital e que justifiquem devidamente a sua requisição.

Paragrapho unico. Na assembléa geral ordinaria se tratará da approvação das contas, leitura do relatorio, eleição da directoria e conselho fiscal ou de algum de seus membros, quando for caso disto, na conformidade do art. 20. Nas assembléas geraes extraordinarias o assumpto a discutir e a votar será restrictamente o da convocação.

Art. 32. Todos os accionistas, mesmo os ausentes e os dissidentes, estão sujeitos ás deliberações da assembléa geral, que não alterem as disposições dos presentes estatutos, salvo quando se tratar da reforma destes.

Art. 33. O accionista pode fazer parte da assembléa geral, quer tenha suas acções desembaraçadas, quer as tenha caucionadas em penhor mercantil.

Art. 34. As reuniões da assembléa serão sempre annunciadas com 15 dias de antecedencia, com a declaração do motivo da convocação.

§ 1º Abrirá a sessão o presidente da directoria, que proporá á assembléa um accionista para dirigir os trabalhos (art. 27).

§ 2º Não poderão fazer parte da mesa os membros da directoria e do conselho fiscal, nem votar em assumptos de contas ou de administração.

Art. 35. A assembléa geral tem plenos poderes para resolver todos os negocios, tomar quaesquer decisões, deliberar, approvar e rectificar, modificar ou alterar os estatutos, eleger ou reeleger a directoria o conselho fiscal, menos mudar ou transformar o objecto principal da companhia.

Art. 36. Para a eleição da directoria e conselho fiscal e para todas as outras deliberações, serão admittidos votos por procuração com poderes especiaes, comtanto que não sejam conferidos aos membros da directoria e do conselho fiscal.

Art. 37. A approvação das contas apresentadas pela directoria em assembléa geral, com o parecer do conselho fiscal, importa plena e geral quitação.

CAPITULO VIII

DISPOSIÇÕES GERAES

Art. 38. A companhia fica sujeita ás leis em vigor, no que lhe for applicavel, especialmente o decreto n. 164 de 17 de janeiro do corrente anno, as observará na parte em que forem omissos estes estatutos.

Art. 39. O anno administrativo da companhia principia em 1 de janeiro e termina em 31 de dezembro.

CAPITULO IX

DISPOSIÇÕES TRANSITORIAS

Art. 40. O primeiro semestre social principia por occasião da assembléa de constituição e termina em 31 de dezembro de 1890.

Art. 41. Por derogação ao disposto no art. destes estatutos e na conformidade do art. 10 do decreto n. 164 citado, os accionistas nomeam a primeira administração da companhia, que fica assim constituida:

Directoria

Antonio Pinheiro dos Santos Bastos, negociante.

João Antonio Guimarães Pinto, negociante.

Domingos José de Almeida, proprietario.

Conselho fiscal

Antonio Joaquim de Araujo Torres, capitalista.

Alfredo Braga, capitalista.

José Luiz Ferreira Fontes, negociante.

Supplentes

Francisco Antonio Monteiro, negociante.

Arthur Barbosa, capitalista.

Procopio José dos Reis, negociante.

Rio de Janeiro, 17 de julho de 1890. - Antonio Pinheiro dos Santos Bastos.