DECRETO N. 803 - DE 4 DE OUTUBRO DE 1890
Proroga por mais dous mezes os prazos estipulados nos decretos ns. 219 de 25 de fevereiro e 457 de 7 de junho do corrente anno.
O Generalissimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, attendendo ao que requereu o Barão de Muniz de Aragão, concessionario por decreto n. 219 de 25 de fevereiro do corrente anno de um engenho central de assucar e alcool de canna no municipio da cidade da Barra de Sergipe do Conde, denominado Maracangalha, de sua propriedade, no Estado da Bahia, e prorogado por decreto n. 457 de 7 de junho ultimo, resolve prorogar por mais dous mezes os prazos constantes do mencionado decreto.
Francisco Glicerio, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, o faça executar.
Palacio do Governo Provisorio, 4 de outubro de 1890, 2º da Republica.
Manoel Deodoro DA FONSECA.
Francisco Glicerio.
Generalissimo - A representação dirigida ao Governo Provisorio, em 29 de setembro, pelos mais autorizados orgãos da industria nacional nesta praça, corresponde inteiramente ás opiniões deste Ministerio no tocante a uma questão, que interessa no mais alto gráo as finanças da Republica, e que devemos resolver antes de ultimada a nossa missão organizadora: a cobrança dos direitos de importação em ouro.
Depois do primeiro passo, que demos nesse caminho, e cujo defeito foi o da timidez, aliás explicavel e justa no ensaio inicial, entrou este Ministerio no pensamento de alargar a medida, levando-a talvez ao seu extremo limite, e offerecendo, ao mesmo tempo, ao contribuinte uma compensação consideravel e benefica: a abolição dos 5% addicionaes.
Sob esse intuito mandámos proceder no Thesouro, em principios do mez passado, a estudos e calculos, em que primitivamente se tomava por base a elevação da porcentagem metallica, nas taxas de entrada, a 60%.
E eis os dados, que a esse respeito nos ministrou aquella repartição, em 20 do mez transacto:
«A renda dos direitos de importação para o consumo subiu, no 1º semestre de 1890, a Rs. 51.569:288$231, incluida a grande arrecadação do mez de junho, que só ella se elevou a 11.960:964$824.
«Tomando-se o termo medio da cobrança dos mezes de janeiro a maio (Rs. 39.608:323$407), ou 7.921:664$681, ter-se-ha, para o semestre, com aquelle augmento de arrecadação, 47.529:988$088; e, dobrando-se essa quantia, para orçar o rendimento de todo o exercicio, achar-se-ha a somma de 95.059:976$176.
«Poder-se-ha, pois, calcular, como fez a exposição que acompanhou o decreto de 10 de maio ultimo, em 95.000:000$ o producto dos direitos de importação.
«Os seus sessenta por cento serão 57. 000:000$, que em ouro valerão £ 6.411.500. O decreto de 10 de maio autorizou a cobrança de 20%, ou Rs. 19.000:000$. O excesso será de Rs. 38.000:000$, ou £ 4.275.000.
«A differença, que tem de pesar sobre as mercadorias, será a seguinte:
| COM O CAMBIO A | ||||
| 22 | 23 | 24 | 25 | 26 |
A importancia de £ 4.275.000 vale, em réis.. | 46.636:364$ | 44.608:696$ | 42.750:000$ | 41.040:000$ | 39.461:539$ |
Com o cambio a 27....... | 38.000:000$ | 38.000:000$ | 38.000:000$ | 38.000:000$ | 38.000:000$ |
Differença....................... | 8.636:364$ | 6.608:696$ | 4.750:000$ | 3.040:000$ | 1.461:539$ |
«Os 5% addicionaes poderão dar 5.500 a 6.000:000$000.
«Assim, logo que o cambio chegar a 24, principiará a favorecer o consumidor.
«A importancia de £ 6.412.500, da taxa ora cobrada (20%), e da que se augmentar (40%), para substituir os 5% addicionaes, chegará não só para o pagamento da divida interna fundada, como para as despezas no exterior. O Thesouro, desse modo habilitado não terá de recorrer ao mercado, afim de obter cambiaes.»
Em presença desses elementos, sob a influencia das reflexões que elles nos suscitaram, não tardámos em chegar á convicção de que a reforma seria sempre imperfeita nos seus resultados, e alienaria em parte as adhesões a que tem direito, si não a levassemos á sua absoluta plenitude, estabelecendo a cobrança total dos direitos de importação em ouro.
O CAMBIO E A INDUSTRIA
Nessas disposições, sobre as quaes já nos manifestaramos no seio do gabinete, veiu confirmar-nos a attitude assumida agora pela classe industrial, attitude que revela um progresso notavel na sua educação economica e na consciencia dos seus verdadeiros interesses. Mostra-se assim dissipada, no seio della, a falsa preocupação antiga de que a elevação do cambio desfavorece o trabalho nacional. Ao lado deste preconceito, que se desvanece pela acção natural da evidencia das leis scientificas, a que elle se oppõe, não será muito lisonjearmo-nos com a esperança de que a classe dos importadores chegue tamhem a uma intuição igualmente justa dos seus interesses comprehendendo as vantagens que lhe vem trazer esta fecundissima innovação fiscal.
E' ampla e concludente a demonstração adduzida pelos industriaes brazileiros em apoio da providencia que solicitam nesse documento precioso, do qual não podemos resistir á tentação de extrahir, e apropriar ao nosso intento, estes topicos, cheios de profunda verdade e irrefragavel intelligencia pratica do assumpto:
«Ao passo que os direitos de exportação se pagam de accordo com uma pauta variavel, conforme o preço do mercado, no qual entra como factor importante a variação do cambio, os direitos de importação são sempre os mesmos, e em papel, qualquer que o cambio seja. Isso equivale a cobrar o Estado os direitos de exportação em ouro e os de importação em papel.
«Em um paiz de circulação fiduciaria, com o regimen de curso forçado do papel-moeda com todas as suas desastrosas consequencias, - do fallacioso systema de imposição aduaneira, a que alludimos, resulta que o direito percebido das mercadorias estrangeiras varia constantemente, acompanhando as irregularissimas oscillações do cambio. Não ha como calcular seguramente o preço manufacturas importadas, para firmar em bases solidas emprezas que concorram com ellas ao mercado.
«Como crearem-se grandes e verdadeiras industrias nacionaes permanentes, nessa trepidação de valores?
«Supponhamos um artigo, que, calculado pelo valor official, paga 4$444. Ao cambio de 27d, importa este valor, em papel, em 50% de £ 1. Ao cambio de 18d, apenas paga o mesmo artigo 38,5% da £.
«Quanto mais baixo é o cambio, menor imposto pagam as mercadorias importadas.
«Essa consideração é da maior importancia; porque a industria nacional não póde supprir o «deficit» resultante da diminuição da exportação, visto como, nesse caso, a depreciação do papel produz uma diminuição nos direitos protectores.
«A seguinte tabella demonstra o nosso asserto, e dispensa largos commentarios:
Cambio | £, valor em réis | Quanto de ouro por 50% em papel | |
27 | 8.888 | 50% |
|
26 | 9.230 | 48,50% |
|
25 | 9.600 | 46,7 % |
|
24 | 10.000 | 44,44% |
|
23 | 10.430 | 42,60% |
|
22 | 10.900 | 40,50% |
|
21 | 11.430 | 38,80% |
|
20 | 12.000 | 37,50% |
|
19 | 12.630 | 35,00% |
|
18 | 13.330 | 33,50% |
|
17 | 14.124 | 32,00% |
|
16 | 15.000 | 29,50% |
|
15 | 16.000 | 27,50% |
|
14 | 17.140 | 26,00% |
|
13 | 18.450 | 24,00% |
|
12 | 20.000 | 22,22% |
|
«Quando ha baixa de cambio, é excellente negocio mandar vir do estrangeiro mercadorias, para se ganhar com a differença de moeda, desde que se possa remetter o valor das facturas a melhor cambio. O consumidor paga sempre pelo cambio mais desfavoravel.
«Ora, podendo-se comprar papel depreciado para o pagamento do imposto de importação, reduzindo-se esse a 35%, por exemplo (19d), em vez de 50%, do valor da mercadoria, a industria nacional fica sempre em peiores condições de competencia.
«Nem se supponha que ella acharia compensação no augmento de preço dos artefactos estrangeiros, causado pela alça do ouro.
«Isto não é exacto:
«1º, porque o preço das mercadorias compõe-se de dous factores quasi iguaes: o custo no mercado productor e o valor dos direitos de exportação; e só uma parte acompanha a alta da moeda;
«2º, porque a baixa do cambio augmenta o custo da vida e, portanto gastos da producção paralelamente ao custo das mercadorias no mercado productor; e, pois, a concurrencia só se poderia manter no mesmo pé de igualdade, si o segundo factor (direitos de importação) não ficasse estacionario;
«3º, porque não ha regra nas leis determinantes das oscillações de cambio, entrando nellas, em grande escala, a especulação e o jogo;
«4º, porque as depressões e elevações do cambio são frequentissimas; fazendo-se, portanto, muitas vezes a importação de mercadorias a cambio baixo e a venda a cambio mais alto.
«O negociante importador compra o papel depreciado, para pagar menos direitos, e só remette o valor das mercadorias a cambio alto, ganhando a differença á custa do consumidor e ás vezes tambem á custa do fabricante, de que é committente. Esse jogo só póde aproveitar a essa parte do commercio, que funcciona, recebendo á consignação, e vendendo quando e quanto lhe apraz, em detrimento do fabricante nacional, que ha de produzir sempre na mesma quantidade, não podendo diminuir, e augmentar a producção conforme as oscillações do cambio.
«Por não attender a esse mecanismo commercial, é que a industria nacional tem-se illudido sempre, apezar da eloquencia dos factos, suppondo, por um paralogismo especioso, que a baixa do cambio é para ella uma condição de viabilidade.
«A industria nacional nada tem ganho com a baixa do cambio. Para isso fôra necessario que o custo das mercadorias, nos mercados productores, fosse augmentado parallelamente com o dos direitos de importação, isto é, que o imposto fosse pago na mesma moeda, em que ellas são pagas no estrangeiro.
«Nessa hypothese a industria nacional seria uma compensação á baixa do cambio: ella suppriria parte da importação, concorrendo efficazmente para fazer cessar a baixa, diminuindo a exportação da moeda, que vem cobrir a deficiencia na exportação de productos.
«Essa é a sua honrosa funcção nos desequilibrios financeiros.
«Seu interesse é harmonico com o do Estado, não só politica, como tambem economicamente.
«O pagamento dos direitos de importação em ouro ha de dar-lhe as condições de prosperidade, que lhe teem faltado, e tornar evidente a sua collaboração com as outras classes sociaes no progresso do paiz.
«A importação de um paiz como o Brazil deve sempre reger-se automaticamente pela sua exportação. Ora, a cobrança dos direitos de importação em papel depreciavel falsifica o regulador commercial da compensação, ou, como outr'ora se dizia, perturba o equilibrio da balança do commercio.
«Quando a exportação diminue, conviria abater-se o estimulo para as importações, em proporção equivalente. Isto é o que deveria acontecer como effeito de uma lei natural: a necessidade da exportação de moeda, para cobrir o deficit, impõe o freio á importação. Entre nós, porém, a depreciação do papel, em que se adquire metade do valor das mercadorias estrangeiras (os direitos aduaneiros), poupando parte da moeda real, é um incentivo ao importador para entradas de generos do exterior além dos limites convenientes.
«Accresce então o interesse da especulação, o jogo, as remessas de moeda, logo que o cambio se eleva para pagamentos adiados, e, portanto, nova baixa.
«Todas essas perturbações financeiras, todas essas dissonancias economicas são a consequencia da dualidade monetaria, ouro e papel, com que se salda a importação.
«Para firmar a legitima industria nacional;
«Para fazer cessar as oscillações do cambio e o curso forçado do papel moeda;
«Para supprimir a voracissima verba orçamentaria das differenças de cambio;
«Para constituir uma base solida ás operações commerciaes, e estabelecer a proporção razoavel entre a importação e a exportação:
«E' necessario fazer pagar em ouro os direitos de consumo.
«Ao receio de diminuição na renda das Alfandegas póde responder-se que o desfalque representará exactamente o agio do ouro, parcella ficticia no algarismo da receita.
«São, porém, taes as vantagens da medida, que se póde esperar com segurança antes augmento que diminuição na renda.
«Supponhamos, todavia, que se dá a reducção: a prosperidade do paiz, estimulada pelo desenvolvimento de outras fontes de renda, a supprira.
«A industria nacional, assim fomentada, poderá tributar-se de modo a compensar a differença.»
Ao mesmo tempo, nos chega ás mãos uma representação de importadores de primeira ordem, que apoia a mesma idéa nestes termos:
«Os abaixo assignados, negociantes importadores da praça do Rio de Janeiro, informados da representação que os industriaes brazileiros vos dirigiram solicitando a decretação da cobrança dos impostos de consumo em ouro, vêm manifestar-vos sua opinião sobre esse assumpto, suppondo que ella vos possa servir de esclarecimento e ao mesmo tempo indicando-vos uma compensação que parece devida ao commercio.
«Não desconhecem os abaixo assignados as vantagens resultantes, para o paiz, de um acto administrativo, que concorrerá para a elevação e fixidez do cambio, que facultará ao Governo os meios de menos oneroso pagamento de seus compromissos, de estabelecer mais certa e conveniente proporcionalidade entre a exportação e a importação, e de auxiliar o desenvolvimento da industria nacional.
«Reconhecem tambem que a cobrança do imposto integralmente em ouro simplifica as operações de pagamento e calculo dos direitos, especialmente si for adoptado qualquer meio, que isso facilite, e torna menos aleatorio o commercio de importação. Sob este ponto de vista a medida solicitada é melhor do que a cobrança parte em ouro e parte em papel, contra a qual se pronunciaram muitos commerciantes.»
O CAMBIO E O COMMERCIO
A acção constante e perniciosa da instabilidade do cambio sobre os interesses do commercio pertence ao numero dos phenomenos mais evidentes, palpaveis e comesinhos sem nossa vida social. Não haveria, pois, que insistir nesse facto notorio e trivial, si não fôra a conveniencia de mostrar que nelle reside o maior de todos os males, o mais duro de todos os tributos impostos á essa classe, e que, portanto, qualquer sacrificio, qualquer onus, como o do pagamento das taxas de importação em ouro, a que recorramos, para atalhar essa depauperação chronica de um dos elementos substanciaes no organismo economico da nação, constituirá, relativamente, um beneficio certo e precioso.
«As altas e baixas imprevistas no cambio», escrevia, ha mais de meio seculo, um economista inglez, que observou com summo cuidado o regimen economico deste paiz (STURZ: A Review, Financial, Statistical, and Commercial of the Empire of Brasil and its resources. London, 1837) «são extremamente vexatorias e damninhas ao commercio, com especialidade nos mercados, como o do Brazil, onde a venda de artigos importados se realiza a longos creditos, e a compra de productos exportaveis se effectua a dinheiro. Um negociante, que recebe uma consignação de mercadorias a vender, facturadas, por exemplo, a £ 1.000, quando o cambio se achava a 30d por mil réis, taxa-lhes o custo em 8:000$, e dando 15% aos direitos, 10% ás despezas, 10% ao lucro, negocia o lote por 11:000$. Mas, ao cabo de seis mezes, descendo o cambio a 22d, vem a reconhecer que os 8:800$, que tem de remetter ao seu correspondente, produziram apenas £ 806 13$ 4d, trazendo ao consignador um prejuizo de quasi 25%, em vez do lucro de 10%, que elle prefixara. Si o carregamento foi enviado ao importador á sua conta, e o amigo, ao embarcal-o, sacou contra elle ao cambio do dia do embarque, 30d, cumprir-lhe-ha pagar, como custo desses generos, 8:000$. Mas, quando arrecadar a importancia das vendas, estando então o cambio a 22d, já não lhe será possivel importar o mesmo supprimento por menos de 10:454$545.
«Com a exportação succederá o inverso. Um commerciante, que emprega 7:000$ em productos, e os despacha para a Europa, calcula (supponhamos que se trata de algodão) vendel-o a 8d a libra, e apura £ 1.000, que, embolsadas a 30d, renderiam 8:800$. Mas baixando, nesse meio tempo, o cambio, recebe a 22d, liquidando assim 12:000$, ou um lucro de 40, em vez de 25%, na especulação. Com esse resultado poderia comprar quasi o dobro da primeira quantidade de algodão, si os preços persistissem. Mas é o que, segundo toda a probabilidade, não se dará; visto como, de uma parte, os vendedores, ou, da outra, os compradores acudiriam a regular os preços pelo cambio, occorrendo, pois, uma fluctuação constante e grande nos preços de todos os artigos de importação e exportação, com grave detrimento para o commercio.»
Si considerarmos agora, com os quadros historicos do cambio deante dos olhos, que as suas taxas, variando, numa incerteza incessante, de 14 a 27d, nunca se mantiveram estaveis durante seis mezes, de 1837 a 1889, teremos de chegar á conclusão de que excede a propria phantasia humana a importancia dos prejuizos causados ao commercio e, portanto, ao capital nacional, no decurso de meio seculo.
Um investigador curioso e habil destes factos, estudando os effeitos da baixa do cambio sobre as despezas da nossa população, estimadas modicamente em 1 milhão de contos de réis annuaes ao par computava ha alguns mezes (Jornal do Commercio, 1 de junho de 1890), as perdas geraes da população contribuinte, resultantes da baixa do cambio, nesta demonstração:
26 | 7/8 | 0,5%............................................................................................................. | 5,000:000$000 |
| 3/4 | 0,9%............................................................................................................. | 9,000:000$000 |
| 5/8 | 1,4%............................................................................................................. | 14,000:000$000 |
| 4/2 | 1,9%............................................................................................................. | 19,000:000$000 |
| 3/8 | 2,4%............................................................................................................. | 24,000:000$000 |
| 1/4 | 2,9%............................................................................................................. | 29,000:000$000 |
| 1/8 | 3,3%............................................................................................................. | 33,000:000$000 |
26 |
| 3,8%............................................................................................................. | 38,000:000$000 |
25 | 7/8 | 4,3%............................................................................................................. | 43,000:000$000 |
| 3/4 | 4,9%............................................................................................................. | 49,000:000$000 |
| 5/8 | 5,4%............................................................................................................. | 54,000:000$000 |
| 1/2 | 5,8%............................................................................................................. | 58,000:000$000 |
| 3/8 | 6,4%............................................................................................................. | 64,000:000$000 |
| 1/4 | 6,9%............................................................................................................. | 69,000:000$000 |
| 1/8 | 7,5%............................................................................................................. | 76,000:000$000 |
25 |
| 8 %............................................................................................................. | 80,000:000$000 |
24 | 7/8 | 8,5%............................................................................................................. | 85,000:000$000 |
| 3/4 | 9 %............................................................................................................. | 90,000:000$000 |
| 5/8 | 9,6%............................................................................................................. | 96,000:000$000 |
24 | 1/2 | 10,2%........................................................................................................... | 102,000:000$000 |
| 3/8 | 10,8%........................................................................................................... | 108,000:000$000 |
| 1/4 | 11,3%........................................................................................................... | 113,000:000$000 |
| 1/8 | 11,9%........................................................................................................... | 119,000:000$000 |
24 |
| 12,5%........................................................................................................... | 125,000:000$000 |
23 | 7/8 | 13,1%........................................................................................................... | 131,000:000$000 |
| 3/4 | 13,7%........................................................................................................... | 137,000:000$000 |
| 5/8 | 14,3%........................................................................................................... | 143,000:000$000 |
| 1/2 | 44,9%........................................................................................................... | 149,000:000$000 |
| 3/8 | 15,5%........................................................................................................... | 155,000:000$000 |
| 1/4 | 16,1%........................................................................................................... | 161,000:000$000 |
| 1/8 | 16,7%........................................................................................................... | 167,000:000$000 |
23 |
| 17,4%........................................................................................................... | 174,000:000$000 |
22 | 7/8 | 18 %........................................................................................................... | 180,000:000$000 |
| 3/4 | 18,6%........................................................................................................... | 186,000:000$000 |
| 5/8 | 19,3%........................................................................................................... | 193,000:000$000 |
| 1/2 | 20 %........................................................................................................... | 200,000:000$000 |
| 3/8 | 20,6%........................................................................................................... | 206,000:000$000 |
| 1/4 | 21,3%........................................................................................................... | 213,000:000$000 |
| 1/8 | 22 %........................................................................................................... | 220,000:000$000 |
22 |
| 22,7%........................................................................................................... | 227,000:000$000 |
21 | 7/8 | 23,4%........................................................................................................... | 234,000:000$000 |
| 3/4 | 24,1%........................................................................................................... | 241,000:000$000 |
| 5/8 | 24/8%........................................................................................................... | 248,000:000$000 |
| 1/2 | 25,5%........................................................................................................... | 255,000:000$000 |
| 3/8 | 26,3%........................................................................................................... | 263,000:000$000 |
| 1/4 | 27 %........................................................................................................... | 270,000:000$000 |
| 1/8 | 27,8%........................................................................................................... | 278,000:000$000 |
21 |
| 28,5%........................................................................................................... | 285,000:000$000 |
20 | 7/8 | 29,3%........................................................................................................... | 293,000:000$000 |
| 3/4 | 30 %........................................................................................................... | 300,000:000$000 |
| 3/8 | 30,9%........................................................................................................... | 309,000:000$000 |
| 1/2 | 31,7%........................................................................................................... | 317,000:000$000 |
| 3/8 | 32,5%........................................................................................................... | 325,000:000$000 |
| 1/4 | 33,3%........................................................................................................... | 333,000:000$000 |
| 1/8 | 34,2%........................................................................................................... | 342,000:000$000 |
20 |
| 35 %........................................................................................................... | 350,000:000$000 |
Essa tabella mostra-nos, com o cambio a 22, um prejuizo annual de 227.000:000$000; o que representa uma reducção maior de 20%: a) para os negociantes, nos lucros de suas operações, b) para os consumidores, no consumo, c) para o Estado, nos direitos de entrada. E, si o cambio descesse a 20d esse prejuizo avultaria a 30%.
Si agora encararmos essa influencia funesta no tocante á fortuna publica em geral, os resultados são fabulosos. Calculando, como já se fez plausivelmente (Jornal do Commercio, 20 de abril de 1890), em 10.000.000:000$ o capital nacional, chegaremos aos dados seguintes:
16 de dezembro de 1889. Ao par: 10.000.000 contos de réis.
24 de dezembro de 1889. 26 ds. Perda: 3,8%, ou 380.000 contos.
23 de janeiro de 1899. 25 d. Perda: 8%, ou 800.000 contos.
8 de março. 23 d. Perda: 17,4%, ou 1.740.000 contos.
22 de março. 22 d. Perda: 22,7%, ou 2.270.000 contos.
15 de abril. 21 d. Perda: 28,5%, ou 2.820.000 contos.
Contra esses prejuizos, cuja enormidade a imaginação se recusa a acceitar, quaes são as compensações? Apenas, de um lado, a satisfação dessa parte limitada e menos escrupulosa do commercio, que vive da especulação, explorando o mercado, e tozando o rebanho dos consumidores; do outro, a ganancia deshonesta dos grupos interessados na agiotagem da bolsa.
O negocio á consignação, ou os fortes especuladores commerciaes, que não pagam sinão a longos prazos, calculados segundo a experiencia desse jogo, esses locupletam-se por igual com a alta e a baixa, pagando aos seus committentes estrangeiros a cambio elevado, no momento opportuno, e fazendo-se pagar ao infimo cambio pelos consumidores nacionaes. O cambio baixo serve então de pretexto para a elevação dos preços no mercado interno, e o cambio alto para ensejo á liquidação das contas do importador no mercado estrangeiro. Para esses todo o mal é bem. Todas as situações os locupletam.
Mas o commercio em geral, o pequeno commercio, o commercio retalhador em nada absolutamente aproveitam na combinação; porque tem de retalhar na razão directa do preço por que comprou nas casas importadoras.
Nem o proprio commercio de importação póde encontrar vantagem solida e animadora nesse regimen. Esse regimen empobrece o consumidor, reduzindo, portanto, a energia, a actividade, os habitos civilizadores da população brazileira, e amaninhando assim o terreno, onde o commercio ha de lavrar o seu futuro. Esse regimen dá ás especulações commerciaes uma indole aleatoria, que tende a substituir, no commercio, as virtudes e as leis profissionaes pelas corrupções e artificios do jogo. Esse regimen, emfim, impossibilita as grandes operações regulares e seguras, subtrahindo aos calculos do negociante o seu elemento fundamental: a estabilidade no valor do instrumento geral das transacções.
O CAMBIO E O CONSUMIDOR
O consumidor: eis, em definitiva, o productor da lã tosquiada pelos caprichos do cambio.
Duas vezes e por dous modos é elle victima desse mal: como contribuinte e como comprador de productos no mercado.
Como contribuinte, paga as differenças de cambio, no orçamento, com o serviço da nossa divida e a satisfação das nossas despezas no exterior. Essas differenças, cuja importancia se elevava, em 1877, a 5.455:000$, sobem já, no exercicio actual, a Rs. 4.526:808$650.
Como freguez no mercado interior, carrega não só com o excesso effectivo representado pelo agio do ouro no momento da importação, mas tambem com a margem addicional accrescentada pelo importador na espectativa de oscillações possiveis. «Quando as taxas fluctuam bruscamente para a baixa, o commercio é obrigado a augmentar os preços, prevendo a mais forte depreciação durante o prazo dos pagamentos a effectuar para as vendas a credito. De maneira que uma differença de 20% exige uma previsão de 40% de baixa.»
Na qualidade de pretexto á especulação, essa anomalia é de uma elasticidade indefinida, servindo-lhe, até, para encarecer os generos de producção indigena, em cujo custo não entram factores dependentes de transacções internacionaes.
Em consequencia da acção multipla, que exerce assim na economia do paiz essa perturbação chronica nas funcções da moeda e nas operações a que ella serve, a situação do consumidor é cada vez mais desfavoravel, e cada vez mais pingue a dos que o exploram como anima vilis.
A todas essas circumstancias concurrentes contra o consumidor accresce que, si as baixas do cambio o oneram, as altas não o alliviam; de sorte que as addições ao preço das mercadorias vão-se sobrepondo successivamente, sem que nunca uma reducção venha attenual-as. Prende-se esse phenomeno economico a uma relação de causalidade natural, observada tambem noutros paizes e formulada por economistas modernos: a lei do excesso das baixas e altas em desproporção com a offerta e a procura.
Todos quantos adquirem mercadorias importadas, num paiz onde tudo se importa, sabem que o custo dos artigos de commercio cresce com as depressões do cambio, para nunca mais se reduzir, por mais que elle se eleve. De sorte que a oscillação do cambio não altera sinão sempre para peior os encargos do consumidor.
CAUSA IMAGINARIA
Tem sido uso, entre os que consciente ou inconscientemente vivem, sob a Republica, a promover os interesses de certas especulações apparatosas legadas ao paiz pela senilidade precoce da monarchia, animarem a preoccupação que vê no excesso do meio circulante, na pretensa exuberancia da emissão entre nós a origem das oscillações do cambio.
A esta fallacia respondeu, ha muito, o sr. Affonso Celso, no seu discurso de 18 de março de 1879 á camara dos deputados:
«A prova», dizia elle, «de que a nossa circulação fiduciaria não influe, nesta praça, para a quéda do cambio, fornecem-n'a tres factos altamente significativos.
«Os annos de 1859 e 1860 marcam a epoca de maior expansão do credito entre nós. Foi então que a emissão do papel-moeda teve mais brusco e mais consideravel augmento.
«Desappareceu a moeda metllica; emittira o Thesouro; diversos bancos emittiam, e tambem as suas caixas filiaes.
«Os 51.000:000$, que tinhamos em circulação, subiram rapidamente a 90.000:000$. Entretanto, o cambio nunca desceu de 23, e subiu a 27 ds.
«Quinze annos mais tarde o cambio estava entre 23 e 25 ds., deu-se, nesta praça, uma crise monetaria; os bancos sentiam-se ameaçados, e o Governo entendeu dever ir em seu auxilio. Foi autorizada uma emissão de 25.000:000$. E que aconteceu?
«O cambio, longe de baixar, subiu a 28, e foi além, chegando a 28% 3/8, á proporção que o papel ia-se introduzindo na circulação. E, ao contrario, quando o Governo tratou de recolher esta nova emissão, foi descendo a 24.
«Ainda agora mesmo, por occasião do decreto promulgado pelo meu illustre antecessor» (esse decreto autorizara a emissão de 40.000:000$), «não houve nenhuma baixa de cambio. Pelo contrario, houve alta.»
Logo, concluia o sr. A. Celso, «o papel-moeda não influe para a baixa do cambio».
A experiencia do periodo republicano não contraria, antes corrobora esta conclusão.
Tem-se argumentado, é certo, contra a nossa gestão financeira, attribuindo aos decretos de 17 de janeiro a baixa do cambio, que se lhes seguiu. Já é, porém, tempo de rasgar o véo, sob que se abriga a má fé dessa arguição. Os que a promoveram, são precisamente os que mais lhe conhecem a gratuidade.
O cambio estava a descer no momento da revolução; porque não subira sinão por effeito de successivos emprestimos externos, e, concluida a absorpção destes, devia volver ao seu nivel natural. E com a revolução, por effeito inevitavel de todas as revoluções, o cambio teria descido immediatamente, não se póde calcular até onde, si os responsaveis pelos destinos della, na sua conjuctura mais critica, o deixassem entregue ao declive dos factos.
Que devia fazer o Governo Provisorio? A queda, no meio da commoção revolucionaria, seria violenta, seria progressiva, e seria irreprimivel, uma vez começada.
Consequencia forçosa desse phenomeno, o terror invadiria o mercado, e os prejuizos resultantes para o commercio e para o Thesouro assumiriam proporções incalculaveis. O Governo republicano faltaria, pois, a deveres elementares, si recuasse, numa crise revolucionaria, para salvar interesses supremos da Nação e do Estado, ante um escrupulo, que nunca deteve, em occasiões ordinarias, os governos regulares. Não podiamos ser insensiveis a essa necessidade, e cedemos a ella. Releva dizel-o, com a convicção do dever cumprido, para não envolver na obscuridade da hypocrisia, usada no antigo regimen, o cumprimento de um dictame imposto pela salvação publica aos homens da revolução, e para consignar o facto, não como um precedente, um aresto, um exemplo, mas, pelo contrario, como a mais solemne advertencia contra o uso desse arbitrio, quando o não legitimar a imposição soberana do caso de vida ou morte, que, na especie, o dictou.
Mais tarde, para calumniar as reformas financeiras da Republica se disse que ellas despenharam o cambio. Mas as testemunhas mais bem informadas e directas da influencia utilizada, até ao fim de 1889, em favor da alta, são precisamente aquelles, em beneficio de cujos interesses se promoveu essa reacção diffamatoria contra os actos de 17 de janeiro.
Transpostas as primeiras semanas da revolução, firmada a confiança publica na situação republicana, afastado o perigo de que a quéda do cambio pudesse determinar o panico no mercado, cessou a interferencia official, e o cambio, entregue a si mesmo, deslizou para a baixa, Nada teve, pois, com essa occurrencia a reforma de 17 de janeiro; em nada contribuiu para ella o receio da emissão annunciada. Pelo contrario, quando o decreto n. 253, de 8 de março, veiu reaugmentar a circulação bancaria, reduzida pelo decreto n. 194, de 31 de janeiro, concedendo 100.000:000$ de emissão ao Banco do Brazil e ao Banco Nacional, o cambio não se resentiu, sinão para subir no dia immediato.
Em seguida a essa tivemos, ainda este anno, outra lição igual com a nova emissão concedida ao Banco dos Estados Unidos do Brazil. Publicado o decreto, que elevou de cincoenta a cem mil contos a circulação desse estabelecimento, o cambio, em vez de decahir, subiu de 20 1/2 a 21, 21 1/2, 22, 22 1/8, em que ora se acha firme e tendendo a ascender.
Quererá isto dizer que a superabundancia do papel não produza a sua depreciação? Não. Quer dizer simplesmente que não ha, nem havia superabundancia de papel. Havia, e ha deficiencia delle. Essa deficiencia embaraçava a circulação das transacções no mercado; e as emissões, em tal caso, promovendo o movimento circulatorio, difficultado pela falta de meio circulante, favorecem as operações do cambio internacional, em vez de tolhel-as. Dahi a alta do cambio em seguida ás nossas emissões e, ás vezes, a sua baixa em seguida ao recolhimento do papel.
CAUSAS REAES
Si considerarmos os dados officiaes ácerca da importação e da exportação de productos, quanto ao ultimo triennio, de que ha informações (1886-1888), encontraremos, no relatorio apresentado ás Camaras pelo Ministro da Fazenda em 1889, estes algarismos:
Comparação da importação com a exportação realizadas nos seguintes exercicios
1886 | 1887 | 1888 | TOTAL | |
Importação.......................... | 201.526:356$ | 310.850:217$ | 260.998:859$ | 773.375:432$ |
Exportação.......................... | 191.393:987$ | 365.592:152$ | 212.592:272$ | 769.578:411$ |
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Differença de exportação.... | 10.132:369$ | 54.741:935$ | 48.403:587$ | 3.787:021$ |
para menos | para mais | para menos | Resumo: differença para mais |
Em 1887, portanto, a exportação avantajou-se á importação em 54.447:935$000. E, todavia, o cambio, nesse anno, se manteve sempre baixo, entre 21 26/32 e 23 6/32, tomadas as medidas mensaes. No anno subsequente, pelo contrario, durante o qual a importação excedeu á exportação em 48.406:587$, o cambio subiu constantemente, de 24 1/16, em janeiro, a 27 1/16 em dezembro. Por outro lado, no anno de 1886, em que o defict da exportação para com a importação foi apenas de 10.132:369$, o cambio manteve-se entre 17 26/32 em janeiro e 22 10/32, em dezembro. O cambio e a exportação, nesses tres annos, andaram, portanto, sempre em razão inversa um do outro.
Addicionada a exportação e, por sua vez, a importação no triennio inteiro, verificaremos que elle se liquidou com a differença de 4.000:000$, a qual, apezar de pouco notavel, deveria, si essa fosse a causa geratriz das differenças de cambio, corresponder a uma taxa pouco elevada, quando, pelo contrario, no termo de 1888 ella estava acima do par (27 2/32).
Como explicar, pois, essa divergencia apparente entre o curso do cambio e a proporção entre a importação e a exportação de productos?
Pelo concurso de outros dous elementos capitaes: a abstenção do Governo no mercado cambiario e a introducção de capitaes estrangeiros por associações particulares.
Por mais que os factores espontaneos creados pelas relações commerciaes se compensem mutuamente, os nossos encargos no estrangeiro interpoem-lhes constantemente a sua acção perturbadora, favorecendo o agio do ouro. E' o que poderiamos evidenciar com algarismos, si conviesse demorarmo-nos aqui em refazer a historia das entradas do Thesouro no mercado do cambio desde 1875 até 1887. O decennio de depreciação constante do cambio internacional, que vae de 1876 a 1887, liga-se absolutamente á procura de letras pelo Governo na praça para occorrer ás necessidades do nosso credito no exterior.
No começo deste anno, induzido pelas nossas informações officiaes, avaliavamos em 162.000:000$ a nossa importação de productos e em 152.000:000$ a nossa exportação. Dados particulares, porém, colhidos nos quadros do movimento das principaes Alfandegas deste e do outro continente, offerecem-nos o resultado seguinte:
| MEDIA DE 1886 - 1887 | |||
| IMPORTAÇÃO | EXPORTAÇÃO | ||
| contos | contos | ||
Estados Unidos.................................................. | 90.000 |
| 14.000 |
|
Allemanha.......................................................... | 45.000 |
| 8.000 |
|
Inglaterra............................................................ | 39.000 |
| 52.000 |
|
Austria................................................................ | 20.000 |
| 1.000 |
|
França................................................................ | 17.000 |
| 20.000 |
|
Belgica............................................................... | 8.000 |
| 5.000 |
|
Republica Argentina.......................................... | 4.000 |
| 5.000 |
|
Portugal............................................................. | 4.000 |
| 9.000 |
|
Uruguay............................................................. | 3.000 |
| 5.000 |
|
Chile................................................................... | 1.000 |
| -- |
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| 231.000 | contos | 119.000 | contos |
A origem, de onde colhemos estas notas, leva-nos a ver, nos algarismos que ellas reunem, ao menos uma approximação da verdade, já que exactidão absoluta, nem elles a pretendem, nem seria possivel em assumpto desta natureza. E, a ser assim, teriamos de concluir que a nossa exportação sobreleva grandemente a nossa importação, estabelecendo-se entre a primeira e a segunda a razão de 231:119. Como quer que seja, porém, esses elementos devem aconselhar-nos a desconfiar da hypothese, em que mais ou menos se está entre nós, de que a producção estrangeira introduzida no paiz excede consideravel e constantemente a producção nacional absorvida pelo estrangeiro.
Mas o saldo favoravel ao paiz escoa-se em grande proporção, para o exterior, ou por lá se fixa, graças a um facto pouco levado em conta na apreciação deste assumpto, mas da maior relevancia na interpretação das anomalias do nosso cambio. Ninguem ignora que o commercio, especialmente o grande commercio, das nossas praças mais importantes reside, na sua maior parte, para não dizermos na sua quasi totalidade, em mãos de estrangeiros. Esses accumuladores de riqueza reservam-n'a, em boa parte, para a patria, onde concentram as suas aspirações, e para onde retiram o capital adquirido, ou a renda, que até hoje não foi convenientemente taxada, ao menos para salvarmos a beneficio do paiz uma quota modica dessas fortunas amontoadas á custa delle. Essa tendencia constitue um factor permanente de depauperação nacional, invertendo contra nós a proporção real entre o activo e o passivo das nossas relações commerciaes com o estrangeiro.
Ora, não se póde negar que esse facto, de natureza constante, si por um lado actua como influencia depressiva nos phenomenos do cambio, de outro lado se entretem pela volubilidade delle. O continuo oscillar do cambio não é compativel com a tranquillidade do capital accumulado, que naturalmente, sob a influencia dessa perenne ameaça, estará sempre á espreita de monções favoraveis, para recolher a abrigo seguro as suas reservas.
A expansão da industria brazileira tem de representar contra essa influencia desfavoravel um papel da maior importancia, assegurando ao paiz a conservação dos capitaes desenvolvidos pela exploração da sua natureza e da actividade dos seus habitantes. Ao mesmo tempo, devemos acreditar que o espirito cosmopolita das instituições republicanas, abrindo ao estrangeiro communhão plena em todos os nossos interesses assim sociaes como politicos, produzirá uma reacção progressiva e salutar contra esse esgoto da nossa riqueza commercial pelo commercio estrangeiro.
O CORRECTIVO
Emquanto o meio commercial não tiver estabilidade pela segurança dos valores internacionaes, não se poderá operar entre nós a producção de verdadeiras industrias brazileiras, em vem das creações ephemeras, que temos, baseadas em differenças de cambio e tarifas.
Emquanto o Governo entrar periodicamente no mercado, para buscar nelle os meios de satisfazer as nossas necessidades no exterior, o cambio não poderá obedecer ás leis naturaes, que o regulam, e exprimir normalmente as relações exactas entre a importação e a exportação.
Emquanto a especulação não tiver um freio, que lhe reprima os arrojos, moderando essa usura sem escrupulos, que enche de absurdos e surprezas o commercio do cambio entre nós, não haverá regra nem experiencia capazes de moralizar essas relações, e permittir o desenvolvimento racional das grandes industrias, que a opulencia dos nossos recursos naturaes e as qualidades intellectuaes da nossa população nos promettem.
A esse triplice mal vem trazer remedio consideravel a cobrança total dos direitos de importação em ouro.
O papel-moeda inconversivel expelle, segundo a lei de Gresham, a moeda metallica; pois o principio se applica ás relações entre as moedas de varios generos, que circulem simultaneamente: ouro e prata, prata e cobre, ou ouro e papel. Ora, a nossa circulação assenta, e não póde deixar de assentar em papel inconvertivel. Um dos meios mais capazes de neutralizar a tendencia centrifuga do ouro para o exterior será, portanto, o pagamento dos impostos aduaneiros em ouro. Esse systema constituirá uma força compensadora contra o nosso vicioso meio circulante, estabelecendo como que uma contracorrente opposta á derivação da moeda metallica pelas liquidações nas trocas internacionaes.
Si considerarmos na especulação, nem sempre rigorosamente mercantil, ou antes ordinariamente deshonesta, nos seus intuitos, nos seus manejos, cujo trabalho pernicioso se occupa em levar ao extremo os effeitos economicos do principio, segundo o qual os valores sobem, ou descem além, ou aquem do nivel, em que se deviam deter pela acção da offerta e da procura, acabaremos convencendo-nos de que o melhor, o mais pratico, o mais certo dos correctivos contra a influencia dessas causas nas perturbações do cambio será o que hoje vos propomos, que irá fixar a relação real dos valores internacionaes, mantendo constantemente uma forte somma de ouro no paiz.
A existencia desse cabedal metallico, assim retido no mercado nacional, virá a ser, não só um centro, um nucleo de attracção e absorpção para maiores quantidades de ouro, como um fixador do cambio pela sua simples força statica, para nos exprimirmos segundo a phrase de alguns economistas.
Não esqueçamos a funcção maravilhosa, que ha de necessariamente exercer como equilibrador automatico das relações commerciaes entre o paiz e o estrangeiro, regulando compensadoramente as transacções, tornando-lhes segura a liquidação, normalizando a vida e o movimento mercantil internacional. O importador propende naturalmente a exaggerar a importação, quando as necessidades do cambio e o pagamento dos direitos aduaneiros em papel o habilitam a desfructar as vantagens das altas, e carregar ao consumidor todo o gravame das baixas. Ora, a consequencia forçosa do excesso na importação é o escoamento da moeda metallica para o estrangeiro e, como resultado inevitavel, a depressão do cambio. Mas esse incentivo ao abuso desapparecerá, desde que a avaliação dos direitos de entrada em ouro imponha á especulação mercantil o freio do seu proprio interesse.
E' principio economico rudimentar que as relações da permuta, em suas diversas phases e multiplices manifestações, se hão de realizar na mesma moeda, isto é, no mesmo typo monetario, de principio a fim. A moeda é um denominador commum entre os valores, um medium de permuta e um estalão de valor, ou regulador geral dos valores. Si, pois, no curso das transacções, desde o inicio até á liquidação, a medida do valor muda, e varia, dá-se nisso uma perturbação, que acarretará prejuizos, mais ou menos graves conforme a natureza da variação e o seu gráo.
Nas relações da permuta internacional, ou no intercambio das nações que manteem commercio reciproco, o ouro representa a função maxima de moeda estalão commum. Todas as transacções da America, e, pois do Brazil com a Europa e com as outras nações se liquidam em ouro. Ora, o imposto, qualquer que seja a formula adoptada para a sua definição, troca de serviços, premio de seguro, ou simples contribuição, é um elemento no valor dos generos, uma das componentes do preço das cousas, e, por consequencia, em ultima analyse, ha de pagar-se, isto é, liquidar-se, em ouro, sempre que a mercadoria provier do estrangeiro.
Emquanto não se inventar um systema pratico de moeda internacional, os direitos aduaneiros terão de saldar-se em ouro, isto é, ao preço do ouro nos mercados importadores, sob pena de perpetuar-se uma origem de irregularidades incessantes na permuta internacional e incalculaveis damnos para o consumidor no commercio interno. A excentricidade de um systema economico, em que as transacções principiam na Europa a ouro, e acabam aqui em papel, explica de sobra as anomalias mais absurdas.
Esse regimen singular crêa, para os importadores, uma situação interessada na depreciação da fortuna publica, tornando-lhes os tributos tanto mais leves, quanto mais baixo o cambio, isto é, quanto mais onerado o Estado e mais prejudicados os consumidores. A' medida que o cambio declina, menos tributada vae sendo a importação, porque paga o imposto em papel depreciado, e mais tributado o consumo, porque se lhe faz o calculo dos preços na razão do valor do ouro. O mesmo facto produz a incongruencia palmar e injustissima destes dous effeitos contradictorios: reducção de onus para o importador, e, por conseguinte, melhoria na sua renda; aggravação de encargos, isto é, encarecimento da subsistencia, para o consumidor. De modo que o primeiro lucra duas vezes: na mitigação das taxas e na carestia dos preços; enquanto o segundo perde tambem duplamente: no augmento da sua despeza particular e na diminuição da receita nacional.
Com esta anormalidade podem folgar os especuladores da importação, os onzeneiros desse ramo da industria mercantil, os que jogam com o producto estrangeiro no regimen inconveniente das compras a longo credito, os consignatarios da industria européa, interessados nos lucros e immunes á responsabilidade dos prejuizos na venda interior. Mas o commercio importador na sua generalidade, esclarecido, honesto, previdente, não póde sentir-se bem numa condição que o põe em antagonismo com a massa geral do povo, que o força a exaggerar os preços, de sobreaviso contra os vaivens do cambio, e que, afinal, a despeito de todas as prevenções, não o abriga de contratempos serios nas vicissitudes incalculaveis do imprevisto, em um regimen, que o entretem, e o multiplica.
Abolindo-o, o Estado não repudia, como se tem dito, o meio circulante nacional, sanccionando-lhe a depreciação. Pelo contrario, contribue, na medida do possivel, para o valorizar, desarmando os que negociam em aviltal-o. E' uma immoralidade annuir em que o descredito da moeda nacional se converta em objecto de exploração corrente; e, si esse descredito sobrecarrega o contribuinte no custo dos gerenos de consumo, não é sinão consequencia rigorosa de tal facto ajustar as relações entre o fisco e o commercio pelo mesmo valor monetario que rege as deste com a sua clientela.
Acabemos de banir o erro financeiro, que nos traz subjugados á especulação européa. Ella é a grande mestra, a manipuladora provecta nos mysterios do cambio, cuja complexidade de elementos deixa sempre aberta a porta aos pretextos da habilidade industriada nas grandes explorações.
Não nos embarace o receio de diminuir a exportação. Esse máo agouro, já o vimos enunciar-se, e falhar a proposito da porcentagem de 20% em ouro, estabelecida pelo decreto de 10 de maio.
Prognosticou-se que essa medida afugentaria immediatamente a importação. Mas os factos desmentiram completamente o vaticinio. Eis a receita das nossas Alfandegas nos Estados, faltando apenas a de duas, que viriam corroborar ainda mais as nossas conclusões, si já lhes conhecessemos completa a estatistica:
TERCEIRO TRIMESTRE JULHO A SETEMBRO | 1889 | 1890 |
Bahia..................................................................................................... | 1.960:129$999 | 2.386:728$565 |
Espirito Santo........................................................................................ | 69:634$818 | 89:407$932 |
Santa Catharina.................................................................................... | 203:338$099 | 156:497$276 |
Maceió................................................................................................... | 159:817$038 | 231:174$453 |
Paranaguá............................................................................................. | 132:605$077 | 150:471$895 |
Aracajú.................................................................................................. | 14:869$128 | 27:569$420 |
Rio Grande............................................................................................ | 501:639$686 | 570:461$493 |
Porto Alegre.......................................................................................... | 576:771$001 | 1.375:537$238 |
Maranhão.............................................................................................. | 542:932$336 | 538:825$641 |
Ceará..................................................................................................... | 517:023$360 | 612:947$852 |
Uruguayana........................................................................................... | 88:657$527 | 77:295$75 |
Rio Grande do Norte............................................................................. | 52:817$139 | 245:347$907 |
Pernambuco.......................................................................................... | 2.179:054$725 | 2.074:101$672 |
Santos................................................................................................... | 3.837:054$718 | 4.217:262$246 |
Pará....................................................................................................... | 1.721:554$677 | 2.317:401$417 |
Rio de Janeiro....................................................................................... | 14.532:615$035 | 11.883:049$464 |
Parahyba............................................................................................... | 88:288$780 | 67:267$922 |
| 27.178:803$151 | 27.021:318$149 |
A esta somma de 27.021:318$149 cumpre addicionar a de cerca de 5.000:000$ pertencentes sem duvida nenhuma ao trimestre de julho a setembro, e que entraram por antecipação em junho, afim de evitar a cobrança em ouro aprazada para se iniciar no mez immediato. Aggregadas essas duas importancias, excede em cerca de 5.000:000$ o terceiro trimestre de 1890 ao terceiro de 1889. Desprezada essa parcella addicional, equilibra-se a receita nos dous annos. Mas como, no actual, a receita do trimestre, ao começar, já se achava desfalcada, pela antecipação, nessa quantia, a consequencia é que essa quantia representa exactamente a vantagem da renda em 1890 sobre a renda em 1889. Devemos concluir, portanto, que a arrecadação do trimestre no segundo anno excedeu precisamente a do mesmo trimestre no primeiro nessa differença.
Prova irrefragavel desse facto offerece-nos a alfandega desta capital, onde só no ultimo dia de junho (um domingo) a receita ascendeu a 1.642:000$000, e a receita total desse mez se elevou a 6.600:000$000 contra 2.800:000$000 no de julho. Nesta Alfandega, si compararmos o trimestre de junho a julho, em 1889, com o correspondente em 1890, acharemos sommas quasi iguaes: 9.569:032$827 contra 9.460:926$317. E, si, cotejando, nessa estação fiscal, o terceiro trimestre de 1890 com o terceiro de 1889, achamos a favor deste uma vantagem de 2.600:000$000; por outro lado, acareando os tres primeiros quarteis de 1889 com os correlativos em 1890, encontraremos para este uma superioridade de 700:000$000. Accrescimo equivalente apuraremos nas outras Alfandegas, si lhes applicarmos identico processo.
Renda da Alfandega do Rio de Janeiro nos mezes de janeiro a setembro de 1889 e de 1890
MEZES | 1889 | 1890 |
Janeiro................................................................................................... | 5.361:119$213 | 5.594:123$558 |
Fevereiro............................................................................................... | 5.285:162$356 | 5.009:290$223 |
Março.................................................................................................... | 4.579:468$193 | 5.768:657$827 |
Abril....................................................................................................... | 4.881:759$172 | 5.159:643$136 |
Maio....................................................................................................... | 5.380:378$839 | 5.066:354$713 |
Junho..................................................................................................... | 4.464:777$455 | 6.606:500$181 |
Julho...................................................................................................... | 5.104:255$372 | 2.854:426$136 |
Agosto................................................................................................... | 4.955:497$364 | 4.466:486$552 |
Setembro............................................................................................... | 4.472:862$299 | 4.562:136$776 |
Total............................................................... | 44.485:280$263 | 45.177:619$102 |
Podemos, porém, desprezar todas essas considerações; porquanto, ainda não imputada ao trimestre subsequente a junho a antecipação a que alludimos, sempre se verifica o augmento, claro e incontestavel. De facto, os 20% cobrados em metal exprimem um accrescimo, correspondente ao agio do ouro, que se eleva a 1.080:852$000, os quaes sommados aos 27.021:318$000 perfazem 28.102:170$, valor em papel da renda cobrada no trimestre de julho a setembro deste anno. Ora, essa addição excede á do trimestre correspondente no anno de 1889 em 923:367$000.
A importação não ha de diminuir, não póde diminuir; porque não está nas mãos dos interesses da especulação reduzir o consumo de um paiz aquem das suas necessidades naturaes. Quando a nossa população avulta a olhos vistos; quando a immigração nos afflue, trazendo-nos, em pouco tempo, não menos de um milhão de immigrantes; quando o trabalho se opulenta com o concurso dos elementos que a escravidão esterilizava; quando as instituições generosas da liberdade republicana principiam a exercer sobre o estrangeiro a seducção natural dos seus beneficios; quando a producção nacional augmenta em proporções palpaveis, e a riqueza, o credito, a confiança borbotam com uma vitalidade inaudita nas transacções do nosso mercado, e os mercados europeus se nos estão franqueando com uma inesperada avidez de sympathias, - a importação não póde atrazar-se em obediencia ao medo, ao capricho, ou á cobiça descontente de alguns grupos de especuladores menos intelligentes, ou menos escrupulosos. Aos cegos, aos velhos, aos rotineiros, ao avarentos succederão, no logar que elles desoccuparem, as gerações fortes, novas, audazes, preparadas para fecundar a éra que se inaugura, sob auspicios tão grandes.
Do nosso magnifico desenvolvimento sob a Republica nos está dando signal inequivoco a expansão das rendas internas, criterio seguro da felicidade e riqueza da população. Em todos os Estados se assignala, mais ou menos notavel, esse phenomeno. Mas na capital a eloquencia delle é maravilhosa. Assim, só nesta cidade, a renda interna federal, durante os primeiros nove mezes do anno corrente, excede em 2.508:361$112 a dos nove mezes correspondentes no anno passado.
Numero de predios inscriptos nos exercicios de 1889 e 1890, e renda geral arrecadada nos mezes de janeiro a setembro dos referidos exercicios
EXERCICIOS | N. DE PREDIOS | PREDIOS VAZIOS | RENDA DE JANEIRO A SETEMBRO |
1889 | 34.657 | 1.163 | 8.119:235$358 |
1890 | 36.418 | 786 | 10.627:596$470 |
Como receiar, pois, que a importancia diminua, quando tudo cresce prodigiosamente no paiz?
A estabilidade desta medida, que, uma vez adoptada, nunca mais cahirá, atalaiada, como ha de ficar, pelos grandes interesses do Estado, do productor, do operario, do consumidor, será, pelo contrario, a garantia mais forte de um amplo desenvolvimento na importação: importação de ouro e de industriaes, attrahidos pela novidade auspiciosa de um regimen que vem habilitar a industria interior a medir as suas forças com a estrangeira, calculando e apparelhando com segurança os seus recursos.
De envolta com esses beneficios, a providencia que ora vos aconselhamos será, pelos seus resultados immediatos, um grande portico para as maiores conquistas financeiras: a conversão da nossa divida, o pagamento total dos seus juros em ouro, a circulação metallica, naturalmente preparada pela estabilidade de um amplo deposito de ouro no seio do paiz. A conversão da nossa divida interna em titulos de juro inferior é uma das reformas, que, adoptado este acto, primeiro se imporão aos cuidados da administração republicana, si esta continuar a velar pelos creditos do Estado e pelos interesses da nação.
«Nós estabelecemos os juros da divida publica em ouro», dizia, ha vinte annos, no senado americano, um dos seus mais celebres financeiros, «e a cobrança da renda em ouro, para evitar os extremos excessos do papel-moeda inconversivel. Desejavamos assentar o edificio inteiro das nossas finanças sobre o alicerce da moeda metallica, e ter continuamente em mira, como ultimo termo da nossa politica, a volta aos pagamentos em especie. Estou certo de que, si não fosse essa disposição no acto legislativo de 25 de fevereiro de 1862, todo o nosso systema financeiro teria naufragado em 1864. Não havia outra cousa, para o ancorar á terra, a não ser a arrecadação dos direitos em ouro e o pagamento dos juros das nossas apolices em ouro.
«Si os juros das nossas apolices não se satisfizessem em ouro durante a guerra, de crer é que, na terrivel depreciação de 1864, o nosso papel-moeda fosse varrido, e o povo repudiasse o meio circulante legal. Foi tal a depreciação, que eram necessarios $ 286 do nosso papel-moeda, para comprar $ 100 em ouro. A simples cobrança dos direitos de importação em ouro e o pagamento dos juros da divida federal na mesma especie bastaram, pois, para preservar da ruina a nossa circulação fiduciaria. Não fôra isso, e o balão do papel-moeda teria arrebentado, como rebentou sob nossos antepassados, na guerra da independencia, como rebentou na revolução franceza, como rebentou na Confederação do Sul, onde veiu a acabar pela completa destruição do credito publico, que aliás chegara a sobrepujar o nosso no mercado britannico.» (SHERMAN: Selected speeches and reports on Finance and Taxation, p. 241-2.)
Por que não aproveitarmos a lição dos Estados Unidos? Haverá exemplo mais eloquente, affinidades mais claras, applicação mais adequada?
Não nos achamos na situação da Republica Argentina. Não ha, em nossas finanças, elemento nenhum, que nos arraste a crises semelhantes. A nossa circulação fiduciaria é ainda, e será, mesmo depois de effectuada toda a emissão dos nossos bancos, muito inferior ás exigencias da nossa população, por mais modicamente que as avaliemos. Augmentámos a nossa receita, extinguindo o contrabando na fronteira, e imprimindo maior severidade ao serviço da arrecadação. Salvámos ao Thesouro uma despeza de 40.000:000$, já consignados pelo socialismo de Estado do Imperio aos bancos protegidos, sob o rotulo de auxilios á lavoura. Não conhecemos as especulações fabulosas sobre o valor da terra, artificialmente exaggerado, que arruinaram as operações hypothecarias no seio dos nossos vizinhos. O mecanismo administrativo que preside ás emissões entre nós, não permitte os abusos da clandestinidade, que introduziram na circulação argentina 264.000:000$ de papel fraudulento. Não temos, emfim, os bancos de Estado, a cujo respeito o Sr. Leroy Beaulieu, encarando agora a questão pela sua face real, dizia, ha pouco: «O que levou a Republica Argentina aos crueis apuros, que ainda não ousa encarar face a face, são os bancos de Estado, isto é, bancos em que entram como accionistas as provincias e o Estado, que se administram por empregados publicos, vivem submettidos a todas as influencias governativas, e não obedecem a freio de especie nenhuma.» (L' E' conomiste Français, 9 de agosto de 1890, pag. 162.)
Mas aquelles, cuja paixão politica pretende assemelhar a nossa situação á dos nossos vizinhos, não poderão contestar a excellencia do remedio e a autoridade do medico, si appellarmos, em favor do nosso projecto, para a lição desse economista, invocado, ainda ha alguns mezes, como o oraculo da sciencia financeira, contra os primeiros actos da nossa administração. Consultado, em abril deste anno, sobre a crise argentina, respondeu o Sr. Beaulieu:
«Creio ser indispensavel tornar os direitos de Alfandega pagaveis total ou parcialmente em ouro. Certamente quem recebe a mercadoria, isto é, a Republica Argentina, é que tem de pagar os gastos da entrega; mas não ha outro remedio. Só assim haverá dinheiro metallico, que tanto lhes falta, e se limitarão as importações, obtendo-se dest'arte o equilibrio do cambio internacional.»
Não se trata, portanto, de uma medida de favor a certa classe, de uma reforma proteccionista, mas de uma reforma de moralização economica e protecção geral a todos os interesses do paiz, desde os do operario até aos do Thesouro, e de um acto da mais alta previdencia em segurança do nosso futuro.
OPINIÃO MAGISTRAL
A commissão parlamentar de inquerito agricola, commercial e industrial, cujos estudos se prolongaram por tres annos (1863 a 66), manifesta-se, no seu relatorio (pags. 15 - 18), com a maior energia de convicção e a mais notavel excellencia de motivos, em favor desta idéa.
«Nosso paiz é uma feitoria colonial», dizia ella. «Sem industrias manufactureiras, é exportador só de productos da lavoura e de materias primas, que recebe depois, em productos fabricados, pelo duplo do seu valor. E' exportador de moeda, não só porque tem de pagar juros de grande divida externa e de capitaes estrangeiros empregados aqui, como tambem porque suppre as grandes despezas dos nossos compatriotas que vivem na Europa, ou por lá passeiam, exhibindo sua ociosidade (absenteismo), nenhuma compensação nos vindo desses factos porque os estrangeiros não procuram o Brazil, para consumir suas rendas: ao contrario, por dolorosa experiencia sabemos quanto nos custa o seu capital empregado aqui.
«Um paiz nestas circumstancias nunca deverá importar mais do que exporta. Para elle é rigorosa a velha theoria da balança commercial, em que peze aos nossos economistas, mais embebidos nas theorias dos livros europeus do que observadores dos factos.
«O socialismo do governo, explorando industrias em competencia com os particulares, sem a responsabilidade pelos insuccessos, que é o correctivo dos desastrados, nem preoccupações dos resultados, empregando capitaes do povo, absorvendo depositos, empenhando o presente, e hypothecando o futuro, influe perniciosamente na situação economica do paiz.
«Sua entrada intempestiva no mercado, como tomador de cambiaes, fóra das previsões e sem proporções exactas com as necessidades da praça, é um elemento de perturbações, cujo valor é tão obvio que nos dispensamos de encaral-o.
«O curso forçado do papel-moeda, cuja emissão depende de circumstancias que não se podem prever, receiando-se sempre um augmento repentino, meio circulante que exclue a moeda real, sem ter a espontanea elasticidade della, e que é necessario ao regulador commercial, por si só é um perigo e um descredito. Vamos apontar um dos grandes inconvenientes desse regimen, e que não tem sido assignalado devidamente.
«As mercadorias importadas custam ao consumidor o preço do commercio, com as despezas de transporte e mais o valor dos direitos aduaneiros. A primeira parcella está sujeita á differença do cambio, porque é paga em moeda real; a segunda é paga em papel-moeda. Si o cambio se deprime, a primeira parcella cresce, mas a segunda diminue na mesma proporção. Assim, quanto mais baixo é o cambio, menos direitos pagam as mercadorias, relativamente ao seu custo. E, sendo o valor dos direitos cerca de 50%, é consideravel essa differença. Exemplifiquemos:
«A mercadoria A custa £ 1 e paga de direitos 4$444 em papel ou 50% ao cambio de 27d. Si o cambio desce a 18d, a mesma mercadoria custa 13:333$, e paga 4$444 ou 33,33%, quando devia pagar 6$666, para ser taxada por 50%.
«Uma grande margem para especulação offerece essa circumstancia: convem ao importador pagar os direitos a cambio baixo, e sacar a importancia das vendas a cambio mais elevado. Effectivamente o importador da Europa adeanta a importancia dos direitos; si o cambio é baixo, compra o papel depreciado para esse pagamento; e, desde que uma alta tende a manifestar-se, exporta-se daqui o dinheiro, contrariando-se logo a tendencia para a elevação do cambio. O unico correctivo para tal inconveniente seria a concurrencia da industria nacional. Essa, infelizmente, é quasi nulla, de sorte que o consumidor é sempre a victima da especulação, e as oscillações do cambio, dependentes do commercio de importação e por elle creadas, constituem uma trepidação que assusta o commercio nacional.
«Ha um verdadeiro circulo pathologico: as depressões do cambio não desanimam a importação na medida natural, isto é, quando não convem a importação, quando a exportação é deficiente, subsiste um estimulo para importar, por causa da diminuição do valor real dos direitos aduaneiros. Dahi resulta a necessidade de cambiaes para pagamento do excesso de mercadorias importadas e, portanto, nova baixa de cambio. E, como o Governo precisa fatalmente de fazer pagamento, no estrangeiro, recebendo em papel, e pagando em ouro (a verba de differenças de cambio avulta de dia em dia no orçamento da despeza), a sua concurrencia no mercado, quando fôra conveniente a abstenção dos tomadores, é uma calamidade para o commercio.
«O custo das mercadorias importadas deve regular o consumo; mas para isso é necessario que esse custo esteja em proporção exacta com as circumstancias economicas. A differença que assignalamos perturba tal proporção, além de crear um meio, em que medra a especulação.
«Accresce que os direitos de exportação são cobrados por uma porcentagem sobre o valor do mercado, que é em grande parte regulada pelas differenças de cambio. Quando a importação é inconveniente, o Thesouro a favorece recebendo sempre a mesma somma em papel depreciado, e associa-se á compensação do productor, que recebe maior somma no mesmo papel. Isto equivale a receber os direitos de importação em papel e os de exportação em ouro.
«Acreditamos que essa anomalia é uma das causas do defeito do nosso regulador automatico.
«O meio de obviar a elle parece-nos ser a cobrança dos direitos aduaneiros ao cambio par. Isso feito, a importação obedeceria exactamente á capacidade do mercado, e se restringiria em proporção exacta com os meios do pagamento. As oscillações do cambio se reduziriam a curvas regulares e determinaveis, principalmente si o Governo se empenhar seriamente no proposito de equilibrar os orçamentos, sem contrahir emprestimos, para saldar despezas ordinarias, e sem emprehender melhoramentos de utilidade illusoria.
«Applicando o excesso de direitos assim percebidos na substituição do papel-moeda, ou exigindo o pagamento em ouro, o curso forçado cessaria desde logo.»
Firmam esse parecer, entre outros, os Srs. Dr. Felicio dos Santos, Barão do Guahy e Manuel José Soares.
ONUS DOS DIREITOS EM OURO
Em quanto poderemos orçar esse gravame, correspondente á differença entre a depreciação do papel e o valor do metal?
O encargo actual, calculando-se em 20.000:000$ os 20% hoje cobrados em moeda metallica, isto é, suppondo elevada a 100.000:000$ a importancia total dos direitos de importação, avalia-se assim:
Cambio | Differença | Augmento de direitos a pagar | |
26 7/8 | 0,5%.............................................................................................................. | 100:000$000 | |
3/4 | 0,9%.............................................................................................................. | 180:000$000 | |
5/8 | 1,4%.............................................................................................................. | 280:000$000 | |
1/2 | 1,9%.............................................................................................................. | 380:000$000 | |
3/8 | 2,4%.............................................................................................................. | 480:000$000 | |
1/4 | 2,9%.............................................................................................................. | 580:000$000 | |
1/8 | 3,3%.............................................................................................................. | 660:000$000 | |
26 | 3,8%.............................................................................................................. | 760:000$000 | |
25 7/8 | 4,3%.............................................................................................................. | 860:000$000 | |
3/4 | 4,9%.............................................................................................................. | 980:000$000 | |
5/8 | 5,4%.............................................................................................................. | 1.080:000$000 | |
1/2 | 5,8%.............................................................................................................. | 1.160:000$000 | |
3/8 | 6,4%.............................................................................................................. | 1.280:000$000 | |
1/4 | 6,9%.............................................................................................................. | 1.380:000$000 | |
1/8 | 7,5%.............................................................................................................. | 1.500:000$000 | |
25 | 8,0%.............................................................................................................. | 1.600:000$000 | |
24 7/8 | 8,5%.............................................................................................................. | 1.700:000$000 | |
3/4 | 9,0%.............................................................................................................. | 1.800:000$000 | |
5/8 | 9,6%.............................................................................................................. | 1.920:000$000 | |
1/2 | 10,2%............................................................................................................ | 2.040:000$000 | |
3/8 | 10,8%............................................................................................................ | 2.160:000$000 | |
1/4 | 11,3%............................................................................................................ | 2.260:000$000 | |
1/8 | 11,9%............................................................................................................ | 2.380:000$000 | |
24 | 12,5%............................................................................................................ | 2.500:000$000 | |
23 7/8 | 13,1%............................................................................................................ | 2.610:000$000 | |
3/4 | 13,7%............................................................................................................ | 2.740:000$000 | |
5/8 | 14,3%............................................................................................................ | 2.860:000$000 | |
1/2 | 14,9%............................................................................................................ | 2.980:000$000 | |
3/8 | 15,5%............................................................................................................ | 3.100:000$000 | |
1/4 | 16,1%............................................................................................................ | 3.220:000$000 | |
1/8 | 16,7%............................................................................................................ | 3.340:000$000 | |
23 | 17,4%............................................................................................................ | 3.480:000$000 | |
22 7/8 | 18,0%............................................................................................................ | 3.600:000$000 | |
3/4 | 18,6%............................................................................................................ | 3.720:000$000 | |
5/8 | 19,3%............................................................................................................ | 3.860:000$000 | |
1/2 | 20,0%............................................................................................................ | 4.000:000$000 | |
3/8 | 20,6%............................................................................................................ | 4.120:000$000 | |
1/4 | 21,3%............................................................................................................ | 4.260:000$000 | |
1/8 | 22,0%............................................................................................................ | 4.400:000$000 | |
22 | 22,7%............................................................................................................ | 4.540:000$000 | |
21 7/8 | 23,4%............................................................................................................ | 4.680:000$000 | |
3/4 | 24,1%............................................................................................................ | 4.820:000$000 | |
5/8 | 24,8%............................................................................................................ | 4.960:000$000 | |
1/2 | 25,5%............................................................................................................ | 5.100:000$000 | |
3/8 | 26,3%............................................................................................................ | 5.260:000$000 | |
1/4 | 27,0%............................................................................................................ | 5.400:000$000 | |
1/8 | 27,8%............................................................................................................ | 5.560:000$000 | |
21 | 28,5%............................................................................................................ | 5.700:000$000 | |
Para maior segurança, porém, reduziremos a 90.000:000$ o computo dos direitos de importação. Neste caso a porcentagem actual desce a 18.000:000$. Avaliando em 180.000:000$ o total de importação, teremos a importancia do augmento correspondente aos 20% em ouro demonstrada ( Jornal do Commercio, 14 de junho) neste quadro:
Cambio | Valor importado | Augmento de preço |
26 7/8 | 181.100:000$000 | 0,055% |
3/4 | 181.180:000$000 | 0,1 % |
5/8 | 181.280:000$000 | 0,155% |
1/2 | 181.380:000$000 | 0,211% |
3/8 | 181.480:000$000 | 0,236% |
1/4 | 181.580:000$000 | 0,322% |
1/8 | 181.660:000$000 | 0,366% |
26 | 181.760:000$000 | 0,422% |
25 7/8 | 181.860:000$000 | 0,477% |
3/4 | 181.980:000$000 | 0,544% |
5/8 | 182.080:000$000 | 0,6 % |
1/2 | 182.160:000$000 | 0,644% |
25 3/8 | 182.280:000$000 | 0,711% |
1/4 | 182.380:000$000 | 0,766% |
1/8 | 182.500:000$000 | 0,839% |
25 1/8 | 182.600:000$000 | 0,888% |
24 7/8 | 182.700:000$000 | 0,944% |
3/4 | 182.800:000$000 | 1,0 % |
5/8 | 182.920:000$000 | 1,066% |
1/2 | 183.040:000$000 | 1,133% |
3/8 | 183.160:000$000 | 1,20 % |
1/4 | 183.260:000$000 | 1,255% |
1/8 | 183.380:000$000 | 1,322% |
24 | 183.500:000$000 | 1,39 % |
23 7/8 | 183.610:000$000 | 1,45 % |
3/4 | 183.740:000$000 | 1,522% |
5/8 | 183.860:000$000 | 1,59 % |
1/2 | 183.980:000$000 | 1,655% |
3/8 | 184.100:000$000 | 1,722% |
1/4 | 184.220:000$000 | 1,79 % |
1/8 | 184.340:000$000 | 1,855% |
23 | 184.480:000$000 | 1,933% |
22 7/8 | 184.600:000$000 | 2,0 % |
3/4 | 184.720:000$000 | 2,066% |
5/8 | 184.860:000$000 | 2,144% |
1/2 | 185.000:000$000 | 2,222% |
3/8 | 185.120:000$000 | 2,29 % |
1/4 | 185.260:000$000 | 2,366% |
1/8 | 185.400:000$000 | 2,44 % |
22 | 185.540:000$000 | 2.522% |
21 7/8 | 185.680:000$000 | 2,60 % |
3/4 | 185.820:000$000 | 2,677% |
5/8 | 185.960:000$000 | 2,755% |
1/2 | 186.100:000$000 | 2,833% |
3/8 | 186.260:000$000 | 2,922% |
1/4 | 186.400:000$000 | 3,0 % |
1/8 | 186.560:000$000 | 3,088% |
21 | 186.700:000$000 | 3,166% |
Referendo-nos, porém, á importação, temol-a estimado segundo o seu valor official. Mas este é inferior ao seu valor commercial em uma differença, que, segundo os calculos mais competentes, se leva a 50%. Logo, a porcentagem em ouro não recahe sobre 180.000:000$ (valor aduaneiro), mas sobre 360.000:000$ (valor real). Em consequencia, os 2,366% de augmento, correspondentes ao cambio presente de 22 1/4, sobre uma importação de 185.000:000$, reduzem-se, na realidade, a um accrescimo de 1,183% sobre os 370.000:000$, a que se eleva, calculada a depreciação do papel, o valor mercantil da importação.
Si, portanto, elevarmos os direitos em ouro de 20% a 100%, teremos promovido, no imposto, um accrescimo de 1,183% X 5 = 5,915%.
Não chega, pois, a 6% sobre o preço da mercadorias a quota de encargos, que a cobrança total dos direitos em ouro lhes occasiona.
Mas, por outro lado, o decreto que ora vos propomos, supprime o imposto addicional de 5% sobre a importação, imposto cuja renda, em 1889, montou em 5.364:625$276, subindo já a 3.148:751$ no primeiro semestre deste anno, e que, calculado, não sobre o valor official, mas sobre o valor real della, importa, por sua vez, em 2,5%. Abatida esta differença para menos, daquella differença para mais, chegaremos á evidencia de que o gravame resultante desta medida sobre o preço dos generos de consumo vem a cifrar-se apenas em 2,415%, ou, digamos, 2 1/2%.
De outra parte, porém, este novo regimen, estabelecendo, ao cabo de algum tempo, a paridade do cambio, virá eliminar do orçamento da despeza a verba das differenças de cambio, que importam ordinariamente em quatro a cinco mil contos. E, como esse desembolso sae igualmente da algibeira do contribuinte (o consumidor), o accrescimo apparente daquelles 2,5% elimina-se talvez do todo, deixando provavelmente ainda margem favoravel ás classes tributadas.
Mas, ainda quando tal compensação se não désse, e o encargo addicional fosse realmente (ao cambio vigente) do 2 1/2, ou mesmo de 6%, não é de presumir que augmentasse sensivelmente o custo das mercadorias. Os preços, com effeito, entre nós, graças á ausencia de uma industria nacional, que servisse de correctivo ao arbitrio da especulação importadora, subiram até onde podiam subir. Horacio Say, escrevendo sobre o commercio e as finanças do Brazil nos primeiros quinze annos da nossa emancipação, mostrava que, de 1826 a 1830, o preço das mercadorias não encarecera em proporção do aviltamento do papel brazileiro. (Histoire des Relations Commerciales entre la France et le Brésill. Paris, 1839. Pag. 304.) Mas, depois que passaram esses tempos de modestia na especulação, o custo dos generos cresceu sempre por addições superpostas, sensibilissimo ás baixas do cambio e insensivel ás altas. Afinal chegámos a uma hyperexaggeração de preços, nos artefactos importados, que o commercio não poderá transpôr sem prejuizo dos seus proprios interesses.
O pagamento, pois, dos direitos de importação em ouro nada influirá, no momento de sua fixação, sobre a subsistencia do comsumidor. Ao revez disso, com o correr do tempo, o deposito metallico dahi resultante, deposito orçado hoje em 90.000:000$, mas que não cessará de crescer, levará o cambio ao par, determinando, pela persistencia de seus effeitos, a descensão gradual dos preços, para a qual cooperará, por sua vez, a expansão da industria brazileira, produzindo-se então os resultados parallelos da elevação do cambio e da baixa no custo das mercadorias.
Todas estas reflexões, entretanto, alludem ao estado actual do cambio. Logo que este, pela firmeza do novo regimen aduaneiro, começar a subir, a sua ascensão será estavel, progressiva, rapida; e, apenas elle attinja a taxa de 25d, a abolição do addicional, por si só, terá compensado inteiramente, no calculo do valor das mercadorias, o accrescimo proveniente da cobrança total dos direitos em ouro.
E, logo que o cambio attingir a 27d, não haverá só compensação: haverá, para o contribuinte, lucro igual ao producto da contribuição addicional ora abolida, producto que, avaliado segundo a receita do primeiro semestre deste anno (3.148:751$000), importaria em 6.295:502$000 annualmente.
Subscrevendo, portanto, o projecto de decreto annexo, tereis, Generalissimo, prestado ao paiz um dos maiores serviços reclamados pelas suas finanças.
4 de outubro de 1890. - Ruy Barbosa.