DECRETO N. 906 - DE 18 DE OUTUBRO DE 1890

Concede garantia de juros de 6% ao anno ao capital que for empregado na construcção do prolongamento da Estrada de Ferro e Minas de S. Jeronymo.

O Generalissimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, attendendo ao que requereu a Companhia de Estrada de Ferro e Minas de S. Jeronymo, e considerando que o privilegio concedido á mesma companhia pelo decreto n. 600 de 24 de julho do corrente anno para a construcção, uso e gozo do prolongamento de sua linha principal até á Serra do Herval, com um ramal a entroncar-se na Estrada de Ferro de Bagé a Cacequi, consulta aos mais momentosos interesses do paiz, visto promover em um Estado limitrophe a extracção e circulação do ferro e do carvão de pedra, que são reputados materiaes de guerra; considerando mais, que os favores concedidos na clausula primeira, do supracitado decreto são em parte illusorios, visto que na zona atravessada pelo prolongamento da estrada de que se trata, os terrenos são de dominio privado, em grande extensão, e os que existiam devolutos foram, em sua maxima parte, apropriados pelo Governo, para a fundação das colonias Barão do Triumpho e D. Marianna Pimentel, não existindo a faxa de um kilometro para cada lado da estrada, concedida á companhia pelo numero seis da já citada clausula primeira; considerando ainda, que essa estrada na parte comprehendida entre os mesmos nucleos coloniaes e um porto ribeirinho do Jacuhy é de exclusiva utilidade para o Governo, por manter as communicações dessas colonias com a capital do Estado do Rio Grande do Sul; considerando, finalmente, que a mesma companhia, já pela acquisição que tem feito de territorios para colonisar, já pelo contracto celebrado com o Ministerio dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas em 26 de agosto de 1889 para a fundação de nucleos coloniaes naquelles mesmos territorios, entrou no regimen creado pelo decreto n. 526 de 26 de junho ultimo, para merecer os favores concedidos no mesmo decreto, sendo o onus da garantia de juros compensado pela facil e immediata collocação dos colonos, durante a construcção da estrada, o que allivia a enorme despeza feita com trabalhos o mais das vezes inventados nas mesmas colonias, afim de facilitar a alimentação dos immigrantes antes de suas colheitas; por todos esses motivos:

Resolve conceder á supramencionada companhia a garantia de juros de 6% ao anno, durante 30 annos, sobre o capital que for empregado na construcção do prolongamento de sua linha principal, na extensão maxima de 200 kilometros e á razão de trinta contos (30:000$) por kilometro, mediante as clausulas annexas ao decreto n. 600 de 24 de julho ultimo, e as que com o presente baixam assignadas pelo General Francisco Glicerio, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, que assim o faça executar.

Sala das sessões do Governo Provisorio, 18 de outubro de 1890, 2º da Republica.

MANOEL DEODORO DA FONSECA.

Francisco Glicerio.

Clausulas a que se refere o decreto n. 906 desta data

I

O Governo concede á Companhia Estrada de Ferro e Minas de S. Jeronymo garantia de juros de 6% ao anno, durante 30 annos, sobre o capital que for empregado na construcção do prolongamento de sua linha principal na extensão maxima de 200 kilometros e á razão de 30:000$ por kilometro, no maximo, mediante as clausulas do decreto n. 600 de 24 de julho ultimo.

II

Além dos planos e mais desenhos de caracter geral, que a companhia é obrigada a submetter a approvação do Governo, sujeitará esta á approvação do fiscal por parte do Governo os de detalhe necessarios para a construcção das obras de arte, taes como: pontes, viaductos, pontilhões, boeiros, tunneis, e os de qualquer edificio da estrada de ferro, um mez antes de dar-se começo á obra, e si, findo este prazo, a companhia não tiver solução do fiscal, quer approvando-os, quer exigindo modificações, serão elles considerados approvados.

No caso de serem exigidas modificações pelo fiscal do Governo, a companhia será obrigada a fazel-as, e, si as não fizer, será deduzida do capital garantido a somma gasta na obra executada sem a modificação exigida.

III

Si alguma alteração for feita em um, ou em maior numero dos ditos planos, desenhos, documentos e requisitos já approvados pelo Governo, sem consentimento deste, a companhia perderá o direito á garantia de juros sobre o capital que se tiver despendido na obra executada, segundo os planos, desenhos, documentos e mais requisitos assim alterados.

Si, porém, a alteração for feita com approvação do Governo e della resultar economia na execução da abra construida, segundo a dita alteração, a metade da somma resultante desta economia será deduzida do capital garantido.

IV

A garantia de juros far-se-ha effectiva, livre de quaesquer impostos, em semestres vencidos nos dias 30 de junho e 31 de dezembro de cada anno e pagos dentro do terceiro mez depois de findo o semestre, durante o prazo de 30 annos, pela seguinte fórma:

§ 1º Emquanto durar a construcção das obras, os juros de 6% serão pagos sobre as garantias que tiverem sido autorizadas pelo Governo e recolhidas a um estabelecimento bancario, para serem empregadas á medida que forem necessarias.

As chamadas limitar-se-hão ás quantias exigidas pela construcção das obras em cada anno.

Para esse fim a companhia apresentará ao Governo, dous mezes antes do começo das obras, o seu respectivo orçamento, que será fundado sobre as mesmas bases em que se fundou o orçamento geral que regulou a garantia de juros sobre o capital fixo.

Decorrido que seja o primeiro anno da entrada das chamadas, cessarão os juros até a conclusão das obras que deviam ser executadas nesse anno.

Constituidas que forem ellas, continuará o pagamento dos juros.

§ 2º Os juros pagos pelo estabelecimento bancario sobre as quantias depositadas serão creditados á garantia do Governo e bem assim quaesquer rendas eventuaes cobradas pela companhia, como sejam: taxas de transferencias de acções, etc.

§ 3º Nos capitaes levantados durante a construcção não será incluido o custo do material rodante, nem o de machinas e apparelhos de qualquer natureza necessarios ao seu reparo e conservação, o qual só será lançado em conta corrente para garantia dos juros, seis mezes antes de serem o dito material, machinas e apparelhos acima referidos empregados no trafego da estrada.

§ 4º Entregue a estrada ou parte desta ao transito publico; os juros correspondentes ao respectivo capital serão pagos em presença dos balanços e liquidação da receita e despeza do custeio da estrada, exhibidos pela companhia e devidamente examinados pelos agentes do Governo.

V

Si os capitaes forem levantados em paiz estrangeiro, vigorará a taxa de 27 por 1$000.

VI

A construcção das obras não será interrompida e, si o for por mais de tres mezes, caducarão o privilegio, a garantia e mais favores concedidos, salvo caso de força maior, julgado tal pelo Governo e sómente por elle.

Si no prazo fixado na clausula terceira, do decreto n. 600 de 24 de julho do corrente anno, não estiverem concluidos todos os trabalhos de construcção da estrada e esta aberta ao trafego publico, a companhia pagará uma multa de um a dous por cento (1 a 2%) por mez de demora, sobre as quantias despendidas pelo Governo com a garantia de juros até áquella data.

E, si passados 12 mezes, além do prazo acima fixado, não ficarem concluidos todos os trabalhos acima referidos e não estiver a estrada aberta ao trafego publico, ficarão tambem caducos o privilegio, a garantia de juros e mais favores mencionados, salvo caso de força maior, só pelo Governo como tal reconhecido.

VII

As despezas de custeio da estrada comprehendem as que se fizerem com o trafego de passageiros, de mercadorias, com reparos e conservação do material rodante, officinas, estações e todas as dependencias da via ferrea, taes como armazens, officinas, depositos de qualquer natureza, do leito da estrada e todas as obras de arte a ella pertencentes.

VIII

O material a que se refere a clausula XIII do decreto n. 600 de 24 de julho do corrente anno, compor-se-ha de locomotivas, alimentadores (tender) de carros de 1ª e 2ª classes para passageiros, de carros especiaes para o serviço do Correio, vagões de mercadorias, inclusive de gado, lastro, freio, e, finalmente, de carros para conducção de ferro, madeira, etc., nas condições do orçamento approvado.

O material de que trata a presente clausula será indicado no orçamento definitivo, e será construido com os melhoramentos e commodidades que o progresso houver introduzido no serviço de transportes por estradas de ferro, e segundo o typo que for adoptado de accordo com o Governo, de modo a poder circular indistinctamente em toda a estrada pertencente á companhia.

O Governo poderá prohibir o emprego do material que não preencha estas condições.

A companhia deverá fornecer o trem rodante proporcionalmente á extensão de cada uma das secções em que se dividir a estrada, e que, a juizo do Governo, deve ser aberta ao transito publico; e si nesta secção o trafego exigir, a juizo do fiscal por parte do Governo, maior numero de locomotivas, carros de passageiros e vagões que proporcionalmente a ella cabiam, a companhia será obrigada, dentro de seis mezes depois de reconhecida aquella necessidade por parte do Governo e della sciente, a augmentar o numero de locomotivas, carros de passageiros, vagões e mais material exigido pelo fiscal por parte do Governo, comtanto que tal augmento fique dentro dos limites estabelecidos no primeiro periodo desta clausula.

A companhia incorrerá na multa de dous a cinco contos de réis por mez de demora, além dos seis mezes que lhe são concedidos para o augmento do trem rodante acima referido.

E, si passados seis mezes mais além dos fixados para o augmento, este não tiver sido feito, o Governo fornecerá o dito augmento de material por conta da companhia.

IX

A companhia obriga-se ainda:

1º A exhibir, sempre que lhe forem exigidos, os livros de receita e despeza do custeio da estrada e seu movimento, e prestar todos os esclarecimentos e informações que lhe forem reclamados pelo Governo em relação ao trafego da mesma estrada ou pelo Governador do Estado, pelos fiscaes por parte do mesmo Governo ou por quaesquer agentes deste, competentemente autorizados, e bem assim a entregar semestralmente aos supraditos fiscaes, ou ao mencionado Governador, um relatorio circumstanciado do estado dos trabalhos em construcção e da estatistica do trafego, abrangendo as despezas de custeio convenientemente especificadas e o peso, volume, natureza e qualidades das mercadorias, que transportar, com declaração das distancias médias por ellas percorridas, da receita de cada uma das estações, e da estatistica de passageiros devidamente classificados;

2º A acceitar, como definitiva e sem recurso, a decisão do Governo sobre as questões que se suscitarem relativamente ao uso reciproco da estrada de que se trata ou de outra, ficando entendido que qualquer accordo que celebrar não prejudicará o direito do Governo ao exame das estipulações que effectuar e á modificação destas, si entender que são offensivas aos interesses do Estado;

3º A submetter á approvação do Governo, antes do começo do trafego, o quadro de seus empregados e a tabella dos respectivos vencimentos, dependendo igualmente qualquer alteração posterior de autorização e approvação do mesmo Governo.

X

O contracto deverá ser assignado dentro do prazo de sessenta (60), dias, contados da publicação das presentes clausulas, sob pena de caducar a concessão.

Capital Federal, 18 de outubro de 1890. - Francisco Glicerio.