DECRETO N. 909 - DE 23 DE OUTUBRO DE 1890
Concede ao engenheiro Aarão Reis, ou á companhia que organizar, privilegio, garantia de juros e mais favores para a construcção de uma estrada ferro ligando a navegação do rio Itapecurá ás dos rios Tocantins e Araguaya, e autorização para a construcção das obras de melhoramento do porto da capital do Estado do Maranhão
O Generalissimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil. constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, attendendo ao que requereu o engenheiro Aarão Reis, resolve conceder-lhe, ou á companhia que organizar, privilegio por 60 annos com garantia de juros de 6 % ao anno, durante 30 annos, sobre o capital que for empregado até ao maximo correspondente a 30:000$ por kilometro, cessão gratuita de terrenos devolutos e isenção de direitos de importação, para a construcção, uso e gozo de uma estrada de ferro que, partindo da cidade de Caxias, á margem do rio Itapecurú e passando por Pedreiras, Grajahú e Porto Franco, no Estado do Maranhão, e Boa Vista, no de Goyaz, termine no ponto mais conveniente á margem direita do rio Araguaya, acima da correnteza de S. Miguel; e, bem assim, autorização para a construcção, uso e goso de conformidade com a lei n. 1746 de 13 de outubro de 1869 e art. 7º da lei n. 3314 de 16 de outubro de 1886, das obras de melhoramento do porto da capital do Estado do Maranhão, observadas, além das clausulas que baixaram com o decreto n. 862 de 16 de outubro corrente, as que com este baixam assignadas pelo General Francisco Glicerio, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, que assim o faça executar.
Sala das sessões do Governo Provisorio, 23 de outubro de 1890, 2º da Republica.
Manoel Deodoro da Fonseca.
Francisco Glicerio.
Clausulas a que se refere o decreto n. 909 desta data
I
O Governo concede ao engenheiro Aarão Reis, ou á companhia que organizar, privilegio por 60 annos, com garantia de juros de 6 % ao anno, durante 60 annos, sobre o capital que for empregado até ao maximo correspondente a 30:000$ por kilometro, cessão gratuita de terrenos devolutos e isenção de direitos de importação, para a construcção, uso e gozo de uma estrada de ferro que, partindo da cidade de Caxias, á margem do rio Itapecurú e passando pela villa das Pedreiras, cidade de Grajahú e villa de Porto Franco, no Estado do Maranhão e villa da Boa Vista no de Goyaz, termine no ponto mais conveniente, á margem direita do rio Araguaya, acima da correnteza de S. Miguel; e, bem assim, autorização para a construcção, uso e gozo das obras de melhoramento do porto da capital do Estado do Maranhão, inclusive aterros, arruamentos, armazens, alpendres, pontes, edificios destinados ao commercio, vias-ferreas e mais accessorios que forem necessarios para a regularidade e aperfeiçoamento dos serviços do porto e do commercio, com os onus e vantagens da lei n. 1746 de 13 de outubro de 1869 e os do art. 7º, paragrapho unico, da lei n. 3314 de 16 de outubro de 1886.
II
Quanto a construcção, uso e gozo da estrada de ferro de Caxias a S. Miguel no Araguaya, prevalecerão para todos os effeitos da presente concessão as clausulas que baixaram com o decreto n. 862 de 16 de outubro do corrente, quer se refiram a favores, privilegios, garantia de juros, terrenos devolutos, isenção de direitos e prazos estipulados, quer ao modo de execução das obras e mais onus impostos ao concessionario. Taes clausulas farão parte integrante do contracto que, em virtude da presente concessão, for firmado pelo concessionario com o Governo.
III
Dentro de um anno, contado da assignatura do contracto, procederá o concessionario aos estudos definitivos das obras necessarias do melhoramento, tanto do actual ancoradouro no estuario dos rios Anil e Bacanga, como da enseada do Itaqui; e os submetterá á escolha e approvação do Governo, que poderá optar por um ou pelo outro desses dous projectos de melhoramento do porto da capital do Estado do Maranhão.
IV
Quer o Governo opte pela execução das obras de melhoramento do actual ancoradouro, em cujos estudos definitivos o concessionario attenderá tanto quanto possivel ás indicações dos engenheiros A. Rebouças, J. Hawkshaw e M. Roberts, quer opte pelas do melhoramento da enseada do Itaqui e sua ligação por via-ferrea ao actual centro commercial, - as clausulas da presente concessão se applicarão por inteiro ás obras que tiverem de ser executadas de accordo com o projecto definitivo approvado pelo Governo.
V
Nas obras de melhoramento do porto da capital do Estado do Maranhão se incluirão, qualquer que seja o projecto definitivamente approvado, as necessarias á conclusão do canal do Arapapahy; e, bem assim, as relativas á conclusão do dique das Mercês, si, após os estudos definitivos feitos no actual ancoradouro, julgar o Governo conveniente a conclusão desse dique.
Nos estudos definitivos das obras de melhoramento da enseada do Itaqui serão incluidos os de uma estrada de ferro, ligando essa enseada ao actual centro commercial da cidade, estrada cuja construcção, uso e gozo farão parte integrante da presente concessão, caso seja preferida pelo Governo a execução das obras de melhoramento da referida enseada.
VI
Apresentados os estudos e orçamento definitivo das obras a executar, terá o Governo noventa dias para resolver sobre a preferencia e approvar definitivamente um ou outro dos dous projectos estudados; e, findo esse prazo sem decisão do Governo, será considerado approvado o projecto que o concessionario apresentar como preferivel.
Caso o Governo exija no projecto preferivel alguma modificação que só possa ser effectuada mediante prévio estudo no local das obras, fixará novo prazo razoavel para que o concessionario o possa realizar.
As obras deverão ser iniciadas dentro do prazo de seis mezes contados da data da approvação dos estudos definitivos. Uma vez encetadas, não poderão ser interrompidas, salvo casos de força maior reconhecida pelo Governo; e, si a interrupção prolongar-se, sem annuencia formal do Governo, por mais de tres mezes consecutivos, importará a caducidade da presente concessão.
Para a conclusão de todas as obras fica fixado o prazo maximo de cinco annos, contados da data da inauguração dos trabalhos da companhia, descontadas apenas as interrupções consentidas pelo Governo.
VII
Durante o prazo da concessão, o concessionario será obrigado a proceder á sua custa ás reparações que forem necessarias e a manter as obras em perfeito estado de conservação e de funccionamento, ficando ao Governo o direito de, na falta de cumprimento desta clausula, fazer executar por conta do concessionario os trabalhos indispensaveis.
VIII
Para pagamento das despezas com a fiscalização por parte do Governo, dos juros do capital empregado nas obras á razão de 6 % ao anno, da quota necessaria para a amortização do mesmo capital no prazo da concessão e, finalmente, das despezas de conservação, custeio e demais serviços a cargo do concessionario, o Governo arrecadará, por conta deste, o producto das taxas autorizadas pelo paragrapho unico do art. 7º da lei n. 3314 de 16 de outubro de 1886 e § 5º do art. 1º da lei n. 1746 de 13 de outubro de 1869, das quaes as primeiras não poderão exceder de 2 % sobre o valor da importação e 1 % sobre o da exportação, e as ultimas, dos preços que vigorarem nas Alfandegas da Republica.
A esse producto será addicionada, caso as obras sejam executadas em Itaqui, a importancia das taxas dos transportes effectuados na via ferrea do concessionario, segundo tarifa approvada opportunamente.
IX
Os juros de 6 % ao anno, a que se refere a clausula precedente, serão calculados semestralmente sobre o capital que se verificar ter sido empregado nas obras, de conformidade com os estudos e orçamento definitivo que tiverem sido approvados.
X
As taxas mencionadas na clausula VIII serão cobradas proporcionalmente á importancia das obras realizadas e execução dos serviços correspondentes a cargo do concessionario. O calculo para a fixação dessa porcentagem será baseado, semestralmente, durante a construcção das obras, na importancia do capital que o concessionario for sendo obrigado a applicar á execução progressiva dellas.
XI
Fica expressamente entendido que a responsabilidade do Estado pelos pagamentos devidos ao concessionario, na fórma estabelecida pelas clausulas precedentes, depende do producto das taxas indicadas, não podendo, em caso de deficit, ser reclamada do Governo mais do que a entrega de tal producto, depois de deduzidas as despezas de fiscalização, de arrecadação das taxas e as que houverem resultado de obras executadas de accordo com o final da clausula VII.
As tarifas approvadas serão revistas de cinco em cinco annos, mas a reducção geral das taxas só poderá ter logar quando o producto arrecadado for superior ao indispensavel para a satisfação dos compromissos especificados na clausula VIII.
XII
As taxas de transito pelo Canal do Arapapahy, e, bem assim, as de estadia no dique, caso este seja concluido, serão cobradas directamente pelo concessionario, de accordo com as tarifas que forem approvadas pelo Governo.
XIII
O concessionario terá o uso e gozo, pelo prazo da presente concessão, dos terrenos accrescidos que poderá arruar, edificar ou arrendar, cedendo porém ao Governo as áreas que forem necessarias para edificios publicos.
XIV
Si o Governo entender preferivel poderá, durante a construcção das obras de melhoramento definitivo do porto, encarregar o concessionario de effectuar os trabalhos da conservação do actual ancoradouro, ora executados administrativamente. Nesse caso o concessionario ficará, mediante a indemnização que for ajustada com todo o material desse serviço pertencente ao Estado, e o Governo lhe pagará, por trimestre vencido, a quantia annual de 150:000$, ficando o concessionario obrigado a manter em boas condições o serviço de conservação actualmente feito, adquirindo as novas dragas, lanchas e batelões que se fizerem mister.
Concluidas as obras de melhoramento do porto, cessará o pagamento dessa subvenção provisoria para o actual serviço da conservação do porto.
XV
Si ao Governo convier, o concessionario se encarregará da conclusão do caes da Sagração e respectivo aterro, ficando com o uso e gozo, pelo prazo da presente concessão, dos terrenos accrescidos, que poderá arruar e edificar ou arrendar, conservando junto do caes e ao longo de seu desenvolvimento total uma avenida arborisada de 30 metros de largura.
XVI
Serão feitos gratuitamente os serviços de embarque, desembarque e transporte de immigrantes, e carga e descarga das respectivas bagagens, bem como o das malas do Correio e quaesquer sommas de dinheiro pertencente ao Estado. Será livre o transito pelo canal das embarcações de guerra brazileiras que por ahi precisem passar, e pelas que entrarem no dique pagará o Estado apenas 80 % das taxas approvadas.
Serão isentas do pagamento das taxas da lei n. 1746 de 13 de outubro de 1869 as embarcações miudas empregadas no movimento de passageiros e bagagens dentro do porto.
XVII
O concessionario terá o direito de desapropriar, na fórma do decreto n. 1664 de 27 de outubro de 1855, as propriedades e bemfeitorias pertencentes a particulares, que se acharem em terrenos necessarios á construcção das obras.
XVIII
Os armazens construidos pelo concessionario gozarão de todas as vantagens e favores concedidos por lei aos armazens alfandegados e entrepostos, e poderá o concessionario emittir titulos de garantia de mercadorias depositadas nos mesmos, sujeitando-se ao regulamento que for expedido para tal fim.
XIX
O Governo poderá incumbir ao concessionario o serviço das capatazias e armazens da Alfandega, expedindo os regulamentos e instrucções necessarias.
XX
O concessionario terá o uso e gozo das obras de melhoramento do porto da capital do Estado do Maranhão, ás quaes refere-se a presente concessão, pelo prazo de 40 annos, contados da data da inauguração official dos trabalhos da construcção.
Findo esse prazo reverterão para o Estado, sem indemnização alguma, as obras, terrenos e bemfeitorias, bem como todo o material fixo e rodante do concessionario.
XXI
O Governo poderá resgatar as obras e os estabelecimentos e dependencias pertencentes ao concessionario, em qualquer tempo, depois de decorridos os dez primeiros annos da conclusão das obras. O preço do resgate será fixado de modo que, reduzido a apolices da divida publica, produza renda equivalente a 6 % sobre todo o capital effectivamente empregado, deduzindo-se, porém, a importancia que já houver sido amortizada.
XXII
O concessionario fica sujeito, em tudo que lhe for applicavel, aos regulamentos approvados pelos decretos n. 1930 de 26 de abril de 1857 e n. 5837 de 26 de dezembro de 1874.
Si as obras forem executadas por empreza estrangeira, terá esta representante legal no Brazil com plenos poderes para tratar directamente com o Governo e com os particulares.
As questões que se suscitarem entre o Governo e o concessionario serão decididas por arbitramento, na fórma do § 13 do art. 1º da lei n. 1746.
XXIII
Pela inobservancia das clausulas da presente concessão poderão ser impostas ao concessionario multas desde 100$ até 5:000$, as quaes poderão ser deduzidas das importancias dos pagamentos devidos ao concessionario.
Caducará a mesma concessão si forem excedidos, sem annuencia do Governo, os prazos marcados nas clausulas III e VI.
XXIV
Para garantia da fiel execução do contracto, o concessionario fará, antes da assignatura delle, uma caução de 20:000$ no Thesouro Nacional.
XXV
Ficará sem effeito a presente concessão si o concessionario deixar de assignar o respectivo contracto dentro do prazo de 60 dias contados da data da publicação destas clausulas no Diario Official.
Rio de Janeiro, 23 de outubro de 1890. - Francisco Glicerio.