DECRETO N. 4.111 – DE 31 DE JULHO DE 1901

Approva o contracto para o resgate da garantia de juros á Estrada de Ferro do Recife ao Limoeiro e arrendamento das Estradas Recife ao S. Francisco, Sul de Pernambuco e tambem das Estradas Conde d’Eu, Natal a Nova Cruz, Central das Alagôas e Paulo Afonso.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, usando das autorizações que lhe conferem as leis ns. 741, de 26 e 746 de 29, ambas de dezembro do 1900, aquella em seu art. 2º n. IV e esta no art. 20, paragrapho unico,

decreta:

Fica approvado o contracto com a Companhia Great Western of Brasil Railway para o resgate da garantia de juros á mesma companhia concedida para construcção, uso e goso da Estrada de Ferro do Recife ao Limoeira, por decretos consolidados pelo de n. 6.746, de 17 de novembro de 1877, e arrendamento das Estradas de Ferro Recife ao S. Francisco e Sul de Pernambuco no Estado deste nome, com o ramal de Glycerio á cidade de União, do de Alagôas e tambem das da Conde d’Eu, no da Parahyba, Natal a Nova Cruz, no Estado do Rio Grande do Norte e Central das Alagôas e Paulo Affonso, no de Alagôas, caso o Governo adquira as ditas Conde d’Eu, Natal a Nova Cruz e Central, mediante as clausulas que com este baixam, assignadas pelo Ministro de Estado da Industria, Viação e Obras Publicas.

Capital Federal, 31 de julho de 1901, 13º da Republica.

M. Ferraz DE CAMPOS SALLES.

Alfredo Maia.

Clausulas a que se refere o decreto n. 4.111, desta data

I

O prazo do arrendamento será de sessenta (60) annos, contados da data do respectivo contracto.

No mesmo dia em que expirar esse prazo expirará igualmente o do uso e goso dos prolongamentos o ramaes que a arrendataria construir durante a vigencia do referido contracto.

II

O arrendamento tem por objecto:

a) A Estrada de Ferro do Recife ao S. Francisco com cento e vinte e quatro mil setecentos trinta e nove (124.739) metros, resgatada pelo Governo, no Estado de Pernambuco;

b) A Estrada de Ferro Sul de Pernambuco, no Estado deste nome, com seu ramal de Glycerio á cidade de União, no Estado de Alagôas, e cento e noventa e tres mil novecentos e oito (193.908) metros de extensão total.

Comprehenderá, outrosim, logo que o Governo Federal as adquira:

c) A Estrada de Ferro Conde d’Eu, no Estado da Parahyba, comprehendido o seu ramal de Alagôa Grande, com cento e sessenta e seis mil (166.000) metros de extensão;

d) A Estrada de Ferro Central das Alagôas, de Maceió á cidade de União, no Estado daquelle nome, comprehendido o seu ramal de « Assembléa », tudo com cento e cincoenta mil (150.000) metros de extensão;

e) A Estrada de Ferro de Paulo Affonso, no Estado das Alagôas, com cento e quinze mil oitocentos cincoenta e tres (115.853) metros de extensão;

A Estrada de Ferro do Natal a Nova Cruz, com cento e vinte e um mil (121.000) metros.

No arrendamento comprehendem-se as linhas em trafego com suas respectivas estações, escriptorios, armazens, depositos e outros mais edificios e dependencias das estradas, assim como o respectivo material fixo e rodante de cada uma.

III

Como preço do arrendamento das estradas Recife ao S. Francisco e Sul de Pernambuco, a Companhia Great Western of Brasil Railway desiste da garantia do juros de que gosa na somma de trinta e nove mil trezentos setenta e cinco libras esterlinas (£ 39.375) por anno, pelo tempo que ainda falta aos trinta (30) annos, em que essa garantia devia vigorar o que expirará em 31 de dezembro de 1910. O Governo Federal reterá essa garantia, que fica cancellada desde a data da entrega, das linhas ora arrendadas, retendo a companhia dessa data em deante os saldos do trafego.

De 1 de janeiro de 1911 em deante, até completar os sessenta annos deste arrendamento, pagará a companhia ao Governo Federal quinze por cento (15 %) da renda bruta da Estrada de Ferro Recife ao S. Francisco e cinco por cento (5 %) das rendas brutas da Estrada de Ferro Sul de Pernambuco.

IV

Caso o Governo adquira as Estradas de Ferro Conde d’Eu, Natal a Nova Cruz, Central das Alagôas com seu ramal de Assembléa, obriga-se a companhia a arrendal-as com a Estrada de Ferro de Paulo Affonso nas mesmas condições destas clausulas, salvo o preço que será: pela Estrada de Ferro Conde d’Eu oito por cento (8 %) da renda bruta, si não exceder esta a mil contos do réis (1.000:000$) e doze por cento (12 %) si exceder até 31 de dezembro de 1910 e doze por cento (12 %) da dita renda de 1911 até a expiração do arrendamento; pela Central das Alagôas com seu ramal de Assembléa doze por cento (12 %) da renda bruta durante os sessenta annos do arrendamento, contados desta data, e pela Paulo Affonso e Natal a Nova Cruz cinco por cento (5 %) da renda bruta desde 1 de janeiro de 1911.

Fica entendido que, si a renda bruta total de qualquer ou de quaesquer das Estradas do Recife ao S. Francisco, Sul de Pernambuco, Conde d’Eu e Natal a Nova Cruz exceder a cinco mil contos de réis (5.000:000$), a companhia ficará pagando ao Governo Federal quinze por cento (15 %) das rendas brutas dessas estradas, mais o ajustado pelas restantes; e, ei a somma total das rendas brutas de todas as estradas arrendadas exceder a seis mil contos de réis (6.000:000$), a companhia ficará pagando então ao Governo Federal quinze por cento (15 %) dessas rendas brutas de todas as estradas.

Fica, outrosim, entendido que a Estrada de Ferro Natal a Nova Cruz entrará neste arrendamento, si o Governo entregar á companhia arrendataria titulos de quatro por cento (4 %) de renda no valor nominal de cento e setenta mil (170.000) libras esterlinas para construcção do trecho entre Nova Cruz e Independencia, o qual ficará concluido e aberto ao trafego vinte e quatro mezes contados da entrega da estrada e dos ditos titulos.

V

As porcentagens a que se referem as clausulas precedentes serão liquidadas á vista da receita bruta do trafego nas linhas arrendadas, obrigando-se a arrendataria a exhibir, sempre que lhe forem exigidos, os livros da respectiva escripturação e os documentos justificativos.

VI

A companhia arrendataria obriga-se a pagar pelo seu valor ao Governo os depositos de carvão, coke e outros materiaes, objectos e sobresalentes pertencentes ás estradas arrendadas e destinados a ser empregados por elles para os fins deste arrendamento, comtanto que estejam em condições de servir e tenham valor apreciavel.

O preço desta compra será, na falta de accordo, determinado por uma avaliação que se fará in situ por duas pessoas, uma que será nomeada pelo Governo Federal e a outra pela companhia, ou, no caso desses avaliadores discordarem entre si, pela avaliação de uma terceira pessoa que será escolhida pelos ditos avaliadores para desempatar, effectuando-se a escolha desse desempatador antes dos avaliadores procederem á avaliação.

As sommas que a companhia arrendataria dever por conta desta avaliação serão satisfeitas dentro de seis (6) mezes depois de effectuada.

VII

A arrendataria fica constituida em mora ipso jure, e obrigada ao juro de nove par cento (9 %) ao anno, si dentro de dez (10) dias depois da tomada de contas semestral, por parte do Governo, não entrar para o Thesouro Nacional com as quantias devidas.

VIII

Governo Federal, precedendo autorização legislativa, poderá, decorridos trinta annos desta data, comprar o interesse da companhia arrendataria nas linhas arrendadas e seus prolongamentos e ramaes por ella construidos, encampando o contracto de arrendamento, mediante indemnização do valor de dez (10) vezes a renda liquida média dos ultimos cinco annos para as linhas arrendadas, e para os ditos prolongamentos e ramaes indemnização do capital effectivamente nelles gasto, mais vinte por cento (20 %) desse gasto.

O Governo Federal reserva-se o direito de em qualquer tempo dar por findo o arrendmento, observadas as regras para desapropriação por utilidade publica. Si a desapropriação se der antes de 31 de dezembro de 1910, a indemnização não será inferior ao valor effectivo da garantia de que a companhia ora desiste.

O Governo Federal terá ainda direito de occupar temporariamente em todo ou em parte as linhas arrendadas, mediante indemnização não superior á média da renda liquida dos periodos correspondentes no quinquenio precedente á occupação. As indemnizações de que trata esta clausula serão pagas em moeda correnta ou em apolices da divida interna, ao juro de cinco por cento (5 %) ao anno.

IX

A arrendataria terá preferencia, em igualdade de condições, para a construcção, uso e goso dos prolongamentos e ramaes que concorrerem para o desenvolvimento e facilidade do trafego, respeitados os direitos adquiridos por concessões anteriores.

Poderá, outrosim, construir novas linhas ou dobrar as linhas por toda a extensão da estrada, nas zonas em que taes obras se tornarem precisas.

§ 1º A construcção, uso e goso dos prolongamentos e ramaes ou novas secções se regerão pelas clausulas IV, V, VI, VII, VIII, IX, X, XI, XVIII, XIV, XV, XVII, XVIII, XIX, 2ª alinea, XX, XXI, XXVIII e XXXIII que acompanharam o decreto n. 862, de 16 de outubro de 1890, sendo, porém, de 25 metros o comprimento minimo do tangente entre curvas oppostas, descontados das rampas os valores correspondentes ás curvaturas para nunca ser realmente excedido o limite maximo da declividade.

§ 2º As demais condições relativas á construcção, uso e goso dos prolongamentos e ramaes serão fixadas por occasião da approvação dos respectivos estudos pelo Governo.

§ 3º Aberto ao trafego qualquer prolongamento, ramal ou nova secção, a linha construida ficará logo incorporada á exploração da estrada de ferro objecto do presente contracto, e subordinada ao seu regimen.

X

A companhia terá o direito de reduzir a bitola da linha do Recife ao S. Francisco a um metro, quando o entender conveniente.

XI

A arrendataria manterá em perfeito estado de conservação as linhas e todas as partes e dependencias das estradas e todo o seu material e augmentará o material rodante conforme as necessidades do serviço.

Findo o prazo do arrendamento entregará ao Governo Federal sem indemnização alguma as linhas e todas as ditas partes e dependencias das estradas que recebeu, assim como o material rodante, em perfeito estado de conservação.

1º A conservação não poderá, sem expressa autorisação do Governo e approvação de planta e perfil submettidos pela arrendataria, alterar condições technicas de qualquer das estradas; e será tal que em qualquer tempo possa o Governo em acto continuo trafegar as estradas por si ou por terceiro.

2º A arrendataria poderá, durante a vigencia do seu contracto, alterar ou supprimir as officinas das linhas arrendadas e remover de uns para outros pontos da sua rêde os machinismos e ferramentas e o material rodante de umas para outras linhas, comtanto que, observadas as disposições deste contracto, reponha tudo no estado e disposições em que os recebeu, si lhe for pelo Governo Federal exigido em qualquer dos casos de encampação ou resolução parcial ou total do arrendamento.

XII

Emquanto durar o arrendamento gosará a arrendataria de isenção de direitos aduaneiros o de expediente para todo o material que importar, tanto para o serviço do trafego como para a construcção das linhas que construir, gosando, outrosim, como contractante que é de serviços federaes, de isenção de impostos federaes, estaduaes e municipaes.

XIII

Emquanto durar o prazo do arrendamento o Governo Federal não poderá autorizar a construcção, por outras emprezas, de linhas ferreas dentro da zona de vinte kilometros das suas linhas e das arrendadas, ficando, porém, entendido que esta restricção não se refere ao direito de outras linhas não contiguas dirigirem-se aos portos do Recife, Natal, Cabedello e

Maceió, ou de atravessarem as linhas da arrendataria sem trafegar, porém, dentro da zona a que esta clausula se refere.

XIV

A companhia apresentará ao Governo o projecto de regulamento das linhas arrendadas. Emquanto não for approvado vigorará o regulamento actual da companhia arrendataria.

As tarifas serão sempre as que se accordarem entre o Governo e a companhia arrendataria, tomadas como base as actualmente em vigor nas linhas da companhia arrendataria, reservado á companhia o direito de reduzir as ditas tarifas, quando o julgar conveniente para o desenvolvimento do trafego, observadas as regras respectivas do regulamento de 26 de abril de 1857, para cada uma das linhas arrendadas.

Poderá a arrendataria usar tarifas moveis com o cambio, variando até cinco por cento (5 %) os preços do transporte por cada um dinheiro abaixo de vinte dinheiros (20 d.) por mil réis (1$000).

Os generos de producção nacional poderão gosar no sentido da exportação de abatimentos por accordo commum entre a companhia e o Governo.

XV

O trafego não poderá ser interrompido em todo ou em parte de qualquer das linhas, salvo o caso de força maior, comprehendida nesta a determinação do Governo.

XVI

Vigorarão nas linhas arrendadas as disposições do regulamento expedido pelo decreto n. 1.930, de 26 de abril de 1857, concernentes á policia e segurança das estradas de ferro o que não forem contrarias ás presentes clausulas, assim como outras para o mesmo fim expedidas e nas mesmas condições, de accordo com este contracto.

Vigorarão, outrosim, todas as disposições relativas á estatistica das estradas de ferro, cujos dados a companhia é obrigada a fornecer e facultar.

XVII

A companhia, arrendataria é obrigada a respeitar e observar o percurso preferido e indicado pelo expedidor para o transporte nas suas linhas.

XVIII

O fôro para todas e quaesquer questões entre a companhia, e o Governo, seja autora ou ré a arrendataria, será o federal

XIX

O Governo Federal e a companhia arrendataria ficam individualmente responsaveis em direito por todas as reclamações, damnos ou litigios que possam surgir por seus proprios e respectivos actos anteriores a esta data; ficando ipso facto deste arrendamento resolvidas entre as partes contractantes quaesquer questões dessa natureza anteriores á igualmente á data das presentes clausulas.

XX

Durante o prazo do arrendamento a arrendataria contribuirá para as despezas de fiscalização, a que fica sujeita por parte do Governo, com a quantia de trinta contos de réis (30:000$) por anno, que entrará para o Thesouro Nacional por quotas semestraes pagas adeantadas.

XXI

A companhia arrendataria não poderá trafegar ou superintender outras linhas de transporte, explorar outros quaesquer serviços, nem fundir-se ou amalgamar-se com outra qualquer companhia, empreza ou pessoa juridica para quaesquer fins industriaes ou commerciaes sem expressa permissão do Governo Federal.

XXII

Nas concessões que á companhia fizer o Governo Federal para prolongamentos ou ramaes das linhas ora arrendadas, fixar-se-hão as alterações que de taes concessões possam provir para o valor das porcentagens de renda ora marcadas, a pagar pela companhia como preço do arrendamento.

Para esses prolongamentos e ramaes gosará a companhia do favor de desapropriação por utilidade publica na fórma das leis em vigor.

XXIII

Será considerado rescindido de pleno direito o presente arrendamento, si a companhia deixar de trafegar qualquer parte ou trecho da estrada, excepto caso de força maior, por mais de quinze (15) dias, ou si não pagar dentro de trinta (30) dias da expiração do semestre correspondente as porcentagens a que se obriga.

Por outras infracções destas clausulas o Governo Federal poderá impor multas na importancia de um até cinco contos de réis (1:000$ até 5:000$).

E, si antes de se declarar a pena da caducidade do contracto consequente deste decreto e clausulas, verificar-se deteriorado o material, as linhas, obras, edificios, machinismos e ferramentas, ou não substituido o material e compromettida a segurança do trafego por falta de conservação, o Governo terá o direito de fazer as reparações necessarias á custa da companhia e de decretar a caducidade do contracto, si, depois de intimada a companhia, se verificar a não satisfação dos seus compromissos.

XXIV

Verificada a rescisão do contracto por motivo da clausula antecedente, a nenhuma indemnização terá direito a arrendataria, que responderá por prejuizos, rendas e damnos.

XXV

A arrendataria obriga-se a manter trafego mutuo com todas as linhas conducentes ás suas ou dellas para outros pontos.

XXVI

A entrega e recebimento das linhas arrendadas serão feitos mediante inventario.

XXVII

A companhia arrendataria tem o direito de entrar em liquidação amigavel para o fim de redistribuir e augmentar o seu capital.

XXVIII

Fica expressamente entendido que até 31 de dezembro de 1910 a quantia de trinta e nove mil trezentas setenta e cinco libras esterlinas (£ 39.375), importancia da garantia de juros á companhia, será applicada do seguinte modo: doze mil libras (£ 12.000) por conta dos saldos liquidos que a arrendataria cessa de devolver ao Governo Federal; dezoito mil libras (£ 18.000) por conta do trafego da Estrada de Ferro Recife ao S. Francisco, e nove mil trezentos setenta e cinco libras (£ 9.375) por conta do trafego da Estrada de Ferro Sul de Pernambuco.

Capital Federal, 31 de julho de 1901. – Alfredo Maia.