DECRETO N. 5979 – DE 18 DE ABRIL DE 1906
Approva as clausulas para o contracto das obras de melhoramento da barra do Rio Grande do Sul e das do porto da cidade do Rio Grande.
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, usando da autorização constante do art. 15, n. XXI, da lei n. 1453, de 30 de dezembro de 1905,
decreta:
Artigo unico. Ficam approvadas as clausulas que com este baixam assignadas pelo Ministro de Estado da Industria, Viação e Obras Publicas para o contracto que tem de ser celebrado com o engenheiro Elmer Lawrence Corthell para a execução das obras de melhoramento da barra do Rio Grande do Sul e das do porto da cidade do Rio Grande.
Rio de Janeiro, 18 de abril de 1906, 18º da Republica.
FRANCISCO DE PAULA RODRIGUES ALVES.
Lauro Severiano Müller.
Clausulas a que se refere o decreto n. 5979, desta data
I
O engenheiro Elmer Lawrence Corthell obriga-se, por si ou por companhia que organizar, a executar, sob a fiscalização do Governo, as obras seguintes por sua conta e risco:
a) a construcção, dentro do prazo de seis annos, de um porto maritimo na cidade do Rio Grande, que corresponda a todas as exigencias modernas de um porto de primeira ordem, para o serviço de franca navegação de 10 metros de calado e a sua, exploração pelo prazo deste contracto, de conformidade com as disposições do decreto n. 1746, de 13 de outubro de 1869;
b) a abertura, dentro do prazo de seis annos e manutenção, á sua custa, pelo prazo deste contracto, de um canal maritimo, entre a actual embocadura do Canal do Norte e as aguas profundas do Oceano, que permitta a franca navegação para navios de 10 metros de calado, com aguas em zero da escala de referencia de altitudes, por meio de dous molhes de empedramento, mediante o pagamento em globo de vinte mil apolices do valor de 1:000$, em ouro, cada uma, e de juros de 5 % ao anno, as quaes serão entregues ao contractante á proporção que se forem verificando no canal profundidades crescentes e permanentes, de conformidade com as prescripções adeante estipuladas;
c) a conservação, á sua custa, tanto no porto como no Canal ao Norte, a partir do porto, e no canal maritimo até as aguas profundas do oceano, durante o prazo deste contracto, da profundidade necessaria para a franca navegação de 10 metros de calado com aguas em zero da escala de referencia acima mencionada;
d) a construcção e conservação á sua custa de dous pharoletes, um em cada extremidade dos molhes e bem assim o balisamento illuminativo para toda navegação, desde a entrada do canal maritimo na barra, até dentro do porto do Rio Grande.
II
As obras para abertura do canal maritimo, ligando a parte funda do Canal do Norte com a do Oceano, constarão, de accordo com a feição do projecto geral indicado na planta n. I annexa a este contracto, e sem prejuizo do disposto na clausula IV, do seguinte:
1º, dous molhes, um em cada lado da embocadura do Canal do Norte, enraizados em terra firme e avançando no Oceano até o fundo necessario para estabelecer e manter, durante o prazo deste contracto, um canal navegavel para navios de 10 metros de calado;
2º, o revestimento das margens do Canal do Norte, na proporção necessaria a manter o mesmo canal;
3º, fazer e conservar na costa léste da embocadura do Canal do Norte as plantações necessarias para evitar que as areias, vindas pela costa, se lancem no canal maritimo.
IIl
Os molhes serão constituidos por um empedramento assentado directamente sobre a areia consolidada no fundo do mar, ou por intermedio de colchões-fachina, como entender o contractante.
No orçamento que serviu de base a este contracto foi contemplada a quantidade de materiaes necessaria para que os moldes possam ter as dimensões precisas para resistirem ao mar, inclusive pesados blocos de concreto para revestimento de taludes e cabeços.
Em conformidade, porém, com a clausula IV, o contractante não fica adstricto á especificação de detalhes de projecto a não serem as que se referem ao material de que devem ser constituidos os molhes e as demais prescripções deste contracto.
IV
O contractante terá inteira, liberdade profissional na confecção dos projectos e planos, na direcção e methodo, locação, meios de construcção e em tudo que for concernente á technica dos trabalhos contractados, não cabendo ao Governo responsabilidade alguma por qualquer prejuizo ou damno que, porventura, soffra o contractante com a execução das obras. O contractante providenciará para que as obras a executar não embaracem desnecessariamente navegação actual.
V
O contractante obriga-se a principiar os trabalhos para abertura da barra e para construcção ao porto do Rio Grande dentro do prazo de quinze mezes, a contar da data da assignatura deste contracto, e a terminar ambos esses trabalhos dentro de seis annos contados da mesma data.
VI
O plano de referencia para todas as profundidades e altitudes mencionadas neste contracto é o que foi estabelecido pelo engenheiro Honorio Bicalho e passa pelo zero da escala de referencia, mencionada nas clausulas deste contracto. Este plano, a que estão referidas todas as plantas e observações, até agora feitas, bem como os marcos de referencia existentes em varios logares em terra, tanto em uma como em outra margem do Canal do Norte, não poderá ser mudado por nenhuma das partes contractantes.
VII
O contractante garante o estabelecimento de um canal maritimo, que permitta a franca, navegação de navios de 10 metros de calado entre o Oceano e o Canal do Norte, até o porto do Rio Grande, o qual se manterá permanentemente em taes condições, pela acção dos molhes, e, nestes termos, contracta a execução das obras, que considera necessarias para tal fim, pelo preço, em globo, de vinte mil apolices da divida brazileira, em ouro, no valor de 1:000$ cada uma e juros de 5 % a pagar por semestres vencidos, em 30 de junho e 31 de dezembro de cada anno. O pagamento do preço total de vinte mil apolices será feito parcelladamente nas condições seguintes:
1ª, seis mil apolices quando estiver estabelecido um canal para franca navegação de seis metros de calado;
2ª, quatro mil apolices quando estiver estabelecido um canal para sete metros de calado;
3ª, duas mil apolices quando estiver estabelecido um canal para oito metros de calado;
4ª, duas mil apolices para o canal com nove metros;
5ª, seis mil apolices finalmente, quando estiver estabelecido um canal definitivo para franca navegação de 10 metros de calado, das quaes duas mil apolices ficarão retidas pelo Governo em caução, de accordo com o disposto na clausula XI.
VIII
O estabelecimento do canal maritimo, para a franca navegação de um dos calados, mencionados na clausula anterior, será sempre verificado pela commissão fiscal do Governo, quando o contractante requisite este exame, o qual deverá ser feito trinta dias, pelo menos, depois de qualquer dragagem accessoria (clausula XIV) que, porventura, tenho, sido feita nos bancos ou em qualquer ponto do canal.
IX
O pagamento de qualquer das prestações, a que se refere a clausula VII, só será feito sessenta dias depois da verificação do que trata a clausula anterior, caso o canal se tenha mantido, durante todo este periodo, com profundidades nunca menores do que as estipuladas na clausula VII. Si, porém, este facto não se tiver dado, o pagamento correspondente será adiado para ser feito sessenta dias depois de ter sido restabelecida e mantida durante este tempo a profundidade anteriormente reconhecida e assim successivamente, até que as condições de navegabilidade, para o calado correspondente a cada um dos pagamentos parciaes, se tenha tornado permanente.
X
As apolices poderão ser entregues em qualquer mez, descontando-se, por occasião dos pagamentos, os juros dos mezes decorridos desde o começo do semestre correspondente até a data da entrega dos titulos.
XI
Das vinte mil apolices, que constituem o preço em globo da abertura da barra, ficarão em deposito no Thesouro Federal duas mil para garantia da conservação, prolongamento de molhes e reparações da mesma barra e, principalmente, da manutenção da profundidade prescripta para a franca navegação de 10 metros de calado com aguas em zero da escala de referencia desde o porto do Rio Grande até as aguas profundas do Oceano. Deste deposito serão entregues mil apolices dez annos depois de ter sido feito o pagamento da quinta e ultima prestação, estipulada na clausula VII e as outras mil apolices restantes no fim de vinte annos, contados da mesma data.
O Governo pagará ao contractante os juros vencidos das apolices que, de accordo-com esta clausula, fiquem em seu poder para caução:
1º, o contractante obriga-se a integrar este deposito para as duas mil apolices nos primeiros dez annos do prazo e para mil apolices nos dez annos seguintes, sempre que for elle desfalcado por qualquer despeza feita pelo Governo de accordo com este contracto, por conta do contractantes e que este se tenha recusado a pagar. Essa integração será feita dentro do prazo de trinta dias, contados da respectiva intimação, sob pena de ficar o contractante constituido em mora ipso jure e obrigado por isso ao pagamento do juro de 9 % ao anno, cabendo ao Governo o direito de cobrar executivamente a importancia do desfalque e correspondentes juros nos termos do art. 52, lettras b e c, parte V do decreto n. 3084, de 5 de novembro de 1898;
2º, fica entendido que, si este deposito tiver sido desfalcado por despezas feitas pelo Governo por conta do contractante, de accordo com as clausulas deste contracto, só lhe serão entregues os saldos que houver no fim de cada um dos dous prazos acima marcados.
XII
Os prazos de dez e vinte annos, a que se refere a clausula antecedente, ficarão accrescidos pelo tempo durante o qual o canal desde o porto até o Oceano tenha estado, em qualquer ponto, fóra das condições de franca navegabilidade estabelecidas na clausula VII.
XIII
Como a profundidade normal deve ser obtida e mantida, pela acção directa dos molhes, toda a vez que, durante os prazos a que se referem as clausulas XI e XII, deixar de existir no canal em qualquer ponto entre o Oceano e o Canal do Norte, por tres mezes consecutivos, profundidade sufficiente para a franca navegação de 10 metros de calado com aguas em zero da escala de referencia, o contractante deverá avançar com os molhes no Oceano, quanto for sendo necessario até a curva actual de nove metros. Si não iniciar este avançamento dentro do prazo de tres mezes, contados da data da respectiva intimação do Governo, ou si não der aos trabalhos o necessario andamento, a juizo do mesmo Governo, poderá este lançar mão do deposito de que trata a clausula XI e fazer por si ou por outrem o referido avançamento.
No caso de ser insufficiente aquelle deposito e o contractante se negue a continuar as obras do avançamento acima referido, o Governo terá o direito de cobrar executivamente do mesmo contractante a importancia precisa para esse fim, nos termos do decreto n. 3084, a que allude a clausula XI deste contracto.
XIV
Fica entendido que ao contractante será licito fazer, como accessorio, dragagem em cada um dos seguintes casos:
a) para antecipar, durante o periodo da construcção, a abertura do canal com as profundidades de agua estabelecidas na clausula VII;
b) para retirar em qualquer tempo materiaes resistentes que não possam ser removidos pela acção natural das correntes;
c) para rectificar ou melhorar o alinhamento do canal navegavel desde o cabeço dos molhes até o porto do Rio Grande;
d) para apressar a remoção das areias que porventura sejam levadas para dentro do canal maritimo por effeito dos temporaes;
e) para a conservação dos canaes maritimo, do Norte e do porto do Rio Grande.
XV
O Governo cederá gratuitamente ao contractante, para serem utilizadas nas obras da barra, todas as installações de sua propriedade existentes nas margens do Canal do Norte e nas pedreiras de Itapuam, taes como: casas, trapiches, linhas ferreas, guindastes, abastecimentos de agua, linhas telephonicas e seus apparelhos, vagões e vagonetes e os materiaes em deposito naquelles logares utilizaveis para as referidas obras, e bem assim o material fluctuante, exceptuado tudo que pertencer ao serviço de dragagem e conservação do porto actual do Rio Grande e ao da fiscalização da barra.
XVI
As obras para o estabelecimento do porto da cidade do Rio Grande comprehendem:
1º A abertura de um canal de accesso, ligando o Canal do Norte ao porto na lagôa da Mangueira, como se acha indicado na alludida planta geral annexa a este contracto, sob n. 1, que permitta franca navegação a navios de 10 metros de calado com aguas em zero da escala de referencia, tendo 130 metros de largura minima. Lateralmente e contiguo a este canal será, aberto um outro com 50 metros de largura e tres metros de profundidade minima para transito das pequenas embarcações.
2º A abertura do canal para o porto, na região sul immediata á cidade do Rio Grande, por meio de dragagem, com 1.500 metros de comprimento, 230 metros de largura e 10 metros e 40 centimetros de profundidade minima, e contiguo a este um outro com 220 metros de largura e dous metros de profundidade minima, para, o transito de pequenas embarcações e futuro alargamento do porto.
O porto, como está indicado na planta geral acima referida, comprehenderá duas secções: a primeira com os 1.500 metros de comprimento acima mencionados e a segunda secção com 1.000 metros de comprimento, que será feita, em prolongamento na primeira, quando as necessidades do commercio e da navegação o exigirem.
3º A construcção de um caes, marginando o canal acima mencionado, por meio de uma muralha de alvenaria de pedra ou de concreto, com 1.500 metros de comprimento, correspondente á primeira secção acima referida e tendo o capeamento sittuado a dous metros e 60 centimetros acima do zero da escala de referencia. Este caes será, munido de postes de amarração, equidistantes de 25 metros no minimo, argolões para o mesmo fim no paramento do caes, cabrestantes, escadas de ferro para marinheiros, plataformas com escadas de pedra para desembarque de passageiros, rampa para carga e descarga de madeiras, illuminação electrica, abastecimento de agua para supprimento dos navios, tudo, emfim, que constitue o apparelhamento moderno de um porto de primeira ordem.
4º O terrapleno por trás da muralha do caes será feito até a altitude do capeamento, com areias provenientes da dragagem ou com terras trazidas de outra parte.
Este terrapleno terá a largura de 60 metros e será destinado á construcção dos armazens e demais accessorios para o serviço do caes e para uma rua publica.
5º A construcção de 11 armazens ao longo do caes para agazalho e deposito das mercadorias, com todas as disposições e accessorios modernos para o conveniente arejamento e illuminação e, bem assim, para a facilidade e rapidez no movimento das mercadorias, quer para recebel-as dos navios, quer para entregal-as a vehiculos urbanos ou a vagões das vias ferreas.
6º O estabelecimento de embarcadouro apropriado para gado, deposito frigorifico e deposito para carvão convenientemente situado.
7º A installação de guindastes electricos, fixos e moveis, de diversas capacidades para todos os serviços do caes, armazens, depositos, linhas ferreas para o serviço do mesmo caes, dos armazens, dos depositos frigorificos, de carvão, de madeiras e do embarcadouro de gado, e bem assim ramaes ligando estas linhas ás das vias ferreas que vierem ter á cidade.
8º A construcção de uma rua, com 20 metros no minimo de largura, calçada com parallelipipedos de pedra ou asphalto, nos terrenos do porto em prolongamento da rua Coronel Sampaio, de sorte a estabelecer a communicação entre esta rua e o porto, e bem assim a abertura de outras ruas que liguem o caes á cidade, de accordo com as necessidades do trafego do porto e ouvida a Municipalidade.
9º A construcção de ambos os lados do canal de accesso e no porto, em frente ao caos, de muros de protecção dos canaes dragados, fixando os respectivos taludes onde for preciso.
10. O estabelecimento de um balisamento illuminado á noite, que possa garantir a segurança do movimento, quer da grande, quer da pequenas navegação e, com o mesmo fim, a installação de signaes sonoros para avisos nas occasiões de cerração.
11. A construcção de um deposito para inflammaveis e explosivos em local sufficientemente afastado do porto e da cidade, que for julgado conveniente e com accesso por via ferrea ou maritima.
12. O calçamento com parallelipipedos de pedra ou com asphalto de toda a área de serviço do caes, dos armazens, depositos e demais accessorios do porto.
13. O estabelecimento de um dique fluctuante ou fixo para a navegação a que se destina o porto, realizando-se esta obra depois de terminada a construcção da primeira secção do porto, de accordo com o Governo.
14. O estabelecimento de um local adequado para paradeiro das pequenas embarcações do trafego do porto e do interior do Estado, de sorte que não sejam estorvadas pelas grandes.
XVII
O contractante estará apparelhado financeira e technicamente para receber e tomar a seu cargo as obras e serviços da barra e do porto até quatro mezes depois de assignado este contracto, e no prazo de oito mezes contados da mesma data sujeitará á approvação do Governo os estudos definitivos e os projectos geral e parciaes, acompanhados dos respectivos orçamentos e especificações para todas as obras a executar e serviços a estabelecer, tudo de accordo com a clausula antecedente.
§ 1º Por accordo entre o Governo e o contractante poderão ser feitas modificações nas obras, apparelhamento e disposições de serviços do caes, determinados pela anterior approvação dos planos.
§ 2º Si, depois da entrega dos planos e mais documentos mencionados nesta, clausula, decorrer o prazo de noventa dias, sem que o Governo tenha communicado ao contractante qualquer resolução a respeito, serão considerados approvados os mesmos planos e orçamentos.
§ 3º Si de qualquer das modificações a que se refere o § 1º resultar perda de obra ou de trabalhos feitos, o respectivo custo será incluido na medição das obras realizadas no semestre correspondente. Igualmente, si tal modificação acarretar augmento de obras ou de trabalhos, que exija maior tempo para sua realização, será isso levado em conta no prazo para a conclusão de todas as obras.
§ 4º Os planos orçamentos de cada secção serão discriminados separadamente, servindo de base para os estudos definitivos o projecto junto com as especificações e os preços de unidades mencionados na tabella que o acompanha.
XVIII
O contractante deverá começar as obras do porto, constantes da clausula XVI, dentro do prazo de quinze mezes, contados da data deste contracto, e concluir as que constituem a primeira secção do caes com 1.500 metros de comprimento dentro do prazo de seis annos, contados da mesma data. As obras da segunda secção, com 1.000 metros de comprimento, só serão iniciadas quando as necessidades do commercio ou da navegação o exigirem e serão então realizadas em um prazo de tempo regulado por aquellas necessidades, mas nunca inferior ao da primeira secção.
§ 1º Depois de começados os trabalhos, seu andamento deverá ser tal que o valor das obras feitas em cada semestre, nos dous primeiros annos, corresponda approximadamente á vigesima parte do orçamento approvado e, nos annos seguintes, a decima parte do mesmo orçamento.
O contractante obriga-se tambem a, fazer as obras de tal maneira que deva supprir no proximo meio anno a deficiencia havida nos primeiros seis mezes, si a houver.
§ 2º Si as obras, depois de começadas, forem suspensas por mais de tres mezes sem justo motivo, a juizo do Governo, ficará incurso o contractante na pena de multa, de conformidade com a clausula L.
§ 3º O contractante fica igualmente sujeito á multa de dez contos de réis, ouro, por mez de demora na terminação das obras até tres mezes; findo este prazo poderá, o Governo marcar novo prazo para conclusão das obras, e, terminado este novo prazo, fica o contractante incurso no disposto na clausula LIV.
XIX
Si, findo o prazo marcado para o começo das obras, tanto para a abertura da barra como para o porto, não houver o contractante dado principio regular aos trabalhos, considerar-se-ha rescindido de pleno direito este contracto, restituindo o contractante ao Governo todas as installações, machinismos e materiaes de construcção e bem assim o material fluctuante que, pela clausula XV, lhe é concedido gratuitamente para ser utilizado nas obras.
Igualmente ficarão pertencendo ao Governo, sem indemnização alguma ao contractante, quaesquer installações, machinismos ou materiaes de qualquer especie, que existam no Rio Grande do Sul, de sua propriedade.
XX
Em igualdade de condições o contractante empregará, de preferencia, pessoal e material nacionaes, inclusive carvão de pedra.
Do material que possuir durante a construcção cederá ao Governo, pelo mesmo preço que houver custado, a quantidade de que precisar para as obras federaes no Estado do Rio Grande do Sul, sem prejuizo das obras a seu cargo.
Paragrapho unico. Todos os materiaes de construcção serão de boa qualidade e apropriados ás obras. Para a sua verificação serão fornecidas amostras ao engenheiro fiscal quando este as requisitar e nenhum material julgado improprio ás obras pelo engenheiro fiscal será utilizado, havendo todavia appellação de sua decisão para o Ministro da Industria, Viação e Obras Publicas. O contractante obriga-se a retirar da obra os materiaes que assim não forem julgados em condições de emprego.
XXI
O contractante terá uso e goso, de accordo com as disposições do decreto n. 1746 de 13 de outubro de 1869, de todas as obras do porto do Rio Grande, a que se refere este contracto, até 31 de dezembro de 1973. No caso de ser construida a segunda secção especificada na clausula XVI, este prazo será prorogado até 31 de dezembro de 1995.
Findo o prazo que assim fica estabelecido, todas as obras do porto do Rio Grande que fazem o objecto deste contracto reverterão para o dominio da União, sem indemnização alguma, inclusive terrenos, bemfeitorias e todo o material fixo, rodante e fluctuante.
XXII
Durante o prazo do contracto o contratante terá o uso-fructo dos terrenos de marinhas que forem necessarios ás obras e suas dependencias e que ainda não estiverem aforados, bem como dos desapropriados o aterrados.
De accordo com o Governo, o contractante poderá arrendar ou vender os terrenos accrescidos que não forem necessarios aos fins deste contracto, fazendo o producto do arrendamento ou da venda parte da renda bruta de que trata, a clausula XVIII.
O arrendamento ou a venda só poderá ter lugar depois de approvado pelo Governo o plano do arrendamento dos terrenos accrescidos, ouvida, a Municipalidade, e reservados os que forem necessarios para edifícios publicos federaes, do Estado ou do municipio.
XXIII
O contractante terá o direito de desapropriar, por utilidade publica, e nos termos da legislação em vigor, os terrenos, predios e bemfeitorias que forem necessarios para a realização das mesmas obras, e bem assim para, captação da agua potavel necessaria, para os serviços do porto, quando a Municipalidade não a possa fornecer.
XXIV
O capital a empregar nas obras do porto do Rio Grande, a que se refere a clausula XVI, é orçado em ouro, 33.712:721$140, sendo:
Para a primeira secção........................................................................................................ | 19.659:827$620 |
Para a segunda secção....................................................................................................... | 11.052:893$120 |
Para um dique..................................................................................................................... | 3.000:000$000 |
Os calculos dos preços do orçamento que este acompanham são baseados no cambio de quatorze dinheiros por mil réis.
Para as despezas no exterior, ou em ouro, esses preços serão invariaveis, mas variação proporcionalmente ao cambio medio do semestre para as despezas em papel moeda, sendo para, menos quando o cambio for inferior aquella taxado quatorze dinheiros e para mais quando for superior.
A parte variável não poderá exceder de trinta e cinco por cento (35%) e será, verificada, na avaliação semestral do capital empregado nas obras.
O Governo terá o direito de exigir obras até o valor acima orçado, o qual poderá, entretanto, ser augmentado, á vista dos projectos definitivos e por accordo entre o contratante e o Governo.
O capital definitivo da empreza será o que afinal resultar de todas as importancias semestralmente reconhecidas como empregadas effectivamente nas obras e as provenientes de outras despezas realmente feitas de accordo com este contracto, aplicando-se ás quantidades de obra executadas os respectivos preços, que figurarem nos orçamentos approvados pelo Governo.
Esses preços poderão ser modificados pelo Governo, do accordo com o contractante, em qualquer época, tendo em vista, as condições dos mercados estrangeiros e do Estado do Rio Grande do Sul.
Uma vez fixado, na fórma indicada, o capital do contracto, em moeda nacional, ouro, não sofrerá alteração alguma.
XXV
As obras realizadas durante cada semestre para o porto serão medidas, avaliadas e descriptas pelo chefe da commissão fiscal, de conformidade com as prescripções deste contracto e, uma vez fixado pelo Governo o capital correspondente a esse semestre, não soffrerá mais alteração alguma.
Fica enterrado que o valor das obras construidas no semestre e abandonadas ou alteradas por accordo com o Governo, durante a execução dos trabalhos, de conformidade com o § 3º da clausula, XVII, será incluido na conta de medição do respectivo semestre.
§ 1º Os semestres terminarão sempre em 30 de junho e 31 de dezembro de cada anno.
§ 2º O Governo expedirá as convenientes instrucções para as medições semestraes e tomadas de contas.
§ 3º Na conta do semestre em que forem iniciados os trabalhos, além do valor das obras feitas nesse semestre incluída a quantia de 1.638:318$970, ouro, correspondente á, importancia das despezas technicas administrativas para installações de serviços o outras, que sob esta mesma rubrica se acham consignadas no orçamento approvado, sujeita á rectificação que resultar da liquidação, na fórma deste contracto, do capital empregado nas obras.
XXVI
O contractante deverá formar o fundo de amortização por meio de quotas deduzidas de seus lucros, calculadas de modo a reproduzir o capital empregado no fim do prazo do contracto.
A formação deste fundo de amortização principiará, no mais tardar, a partir de 1 da janeiro de 1922.
XXVII
O contractante entrará para o Thesouro Nacional, por semestres adeantados, com a importancia de 45:000$ para o pagamento da fiscalização do presente contracto e terá o direito, durante a execução das obras, de requisitar da commissão fiscal do Governo copias das plantas por ella levantadas e de quaesquer documentos relativos ao avançamento dos trabalhos e ás modificações por estes determinadas quando taes documentos não tenham caracter reservado. Esta importancia será paga em moeda nacional corrente e durante o prazo da construção das obras marcado na clausula V, sendo reduzida a 45:000$ por anno durante o prazo restante do contracto.
XXVIII
Durante o prazo deste contracto o contractante é obrigado a fazer â sua custa, a conservação e todos os reparos de que carecerem as obras, não só do porto do Rio Grande e canal de accesso, como tambem da barra o Canal do Norte, mantendo-as todas em perfeito estado de conservação e nas condições prescritas nas clausulas I, VII e XVI.
Si, intimado a fazer qualquer obra de conservação ou reparo, que se tenha torna-lo necessária, deixar o contractante de cumprir a ordem no prazo que lhe tiver sido marcado, poderá o Governo mandar executar o trabalho por outrem e por conta do mesmo contractante; e, si este se recusar a pagar as respectivas despezas, o Governo mandará descontar a sua importância de qualquer pagamento que tenha de fazer ao contractante, ou, na falta deste recurso, respectivamente da caução a que se refere a clausula, XLIX ou nos termos da clausula XI.
XXIX
Para remuneração e amortização do capital empregado nas obras, para o pagamento das despezas de custeio e conservação das mesmas obras e da fiscalização, por parte do Governo, nos termos deste contraem, o contractante poderá, perceber as seguintes taxas, em papel:
a) por dia e por metro linear de caes occupado por navio a vapor ou outro motor moderno, $700 pela atracação do navio;
b) por dia o por metro linear de caes occupado por navio não a vapor ou outro motor moderno, $500 pela atracação do navio;
c) por kilogramma de mercadorias embarcadas ou desembarcadas, $002,5 pela utilização locaes e conservação porto;
d) por capatazias e armazenagem, as taxas que forem cobradas nas Alfandegas, de conformidade com as leis e regulamentos em vigor.
XXX
São isentos de taxas, relativas á atracação, os botes, escalares e outras embarcações miudas de qualquer sistema, empregadas no movimento exclusivo de passageiros e bagagens e as pertencentes aos navios em carga e descarga no caes do contractante.
XXXI
Os armazens constituídos pelo contractante gosarão de todos os favores, vantagens e onus conferidos por lei aos armazens alfandegados e entrepostos da União.
XXXII
Serão embarcadas e desembarcadas gratuitamente estabelecimentos do contractante quaesquer sommas de dinheiro pertencentes á União ou ao Estado do Rio Grande do Sul, e bem assim as malas do Correio, a bagagem dos passageiros civis ou militares, os petrechos bellicos, os immigrantes e suas bagagens, correndo por conta do contractante o transporte destas ultimas de bordo para os vagões das vias ferreas que vierem ter ao caes.
XXXIII
O contractante deverá facilitar por todos os meios as serviços da União e do Estado do Rio Grande do Sul, dando-lhes preferencia para uso de seus apparelhos o do caes, sendo esses serviços indemnizados.
No caso, porém, de movimento de tropas federaes ou estadoaes, poderão estas utilizar-se do caos e mais estabelecimentos do contractante para embarque e desembarque, sem ficarem sujeitas ao pagamento de taxa alguma.
XXXIV
Os navios que entrarem na barra para fins commerciaes pagarão a taxa de barra.
Paragrapho unico. Exceptuam-se os que se destinarem exclusivamente ao porto do Rio Grande, em cujas taxas se reputam comprehendidas, neste caso, as de barra.
As taxas de porto serão as indicadas na clausula XXIX, observado o seguinte:
a) para os navios que se destinarem exclusivamente ao porto do Rio Grande, reputam-se comprehendidas, a beneficio do contractante, nas taxas de porto, as de barra, cuja conservação incumbe ao mesmo contractante;
b) a baldeação de mercadorias no interior da barra só será permittida junto ao caes á custa dos interessados, sujeita á fiscalização do contractante e do fisco, mediante pagamento de 50% da taxa de utilização do caes.
XXXV
O contractante poderá fazer todos os serviços referentes a este contracto, ou qualquer dellas, por preços inferiores aos das tarifas aprovadas pelo Governo, mas de modo geral e sem excepção a favor de ou contra quem quer que seja.
Qualquer baixa de preços faz-se-ha effectiva com o consentimento do Governo e depois de publicada, por annuncios affixados nos estabelecimentos do contractante e incertos nos principal jornaes do Estado.
Si o contractante fizer serviço por preços inferiores aos das tarifas approvadas, sem preencher todas estas condições, o Governo poderá mandar applicar as reducções feitas ás tarifas dos mesmos serviços, e os preços assim reduzidos não poderão mais ser elevados.
XXXVI
Qualquer trecho do caes, provisorio ou definitivo, só poderá ser entregue ao trafego mediante autorização do Governo.
Logo que forem iniciadas as obras, nos termos da clausula XVIII, e durante o periodo da construção em que não haja trecho algum de caes em tráfego provisorio ou definitivo, será cobrada, da taxa de 2 % ouro, sobre o valor total da importação pela barra, a parto necessaria para produzir 6%, ao anno do capital que for sendo semestralmente verificado como empregado nas obras.
Para o primeiro semestre de construcção, inteiro ou friccionaria, o capital será o de que trata o § 3º da clausula XXV, accrescido do valor das obras realizadas neste primeiro semestre.
Logo que seja inaugurado qualquer trecho do caes serão cobradas as taxas de que trata a clausula XXIX.
Caso no fim de cada anno se verifique que, com a applicação de paes taxas, a renda bruta total arrecadada é inferior a 6/60 do capital empregado nas obras, diminuido da competente amortização, o Governo permittirá, ou um augmento das mesmas taxas tal que possa produzir esse valor no anno seguinte, ou, quando essa elevação não convenha ou seja insufficiente, a cobrança da parte da taxa de 2%, ouro, sobre o valor total da importação pela barra que possa produzir identico resultado. O mesmo procedimento será mantido depois do inaugurarias as obras definitivamente.
Todos estes calculos serão feitos sobre a renda bruta e valor total da importação do anno proximamente findo, não cabendo ao Governo nenhuma responsabilidade para o contractante, e vice-versa, caso esse augmento de taxa sobre a importação produza resultado inferior ou superior ao necessario no anno de sua applicação.
XXXVII
O serviço de carga e descarga, uma vez começado, ficara sujeito á fiscalização da Alfandega, que para esse fim dará ao contractante as precisas instruções.
Além disso, fica o contractante sujeito a todos os regulamentos e instrucções que o Ministerio da fazenda expedir para a guarda, conservação, recebimento e entrega das mercadorias nos armazene das Alfandegas.
XXXVIII
Para todos os effeitos deste contracto, depois da inauguração do serviço de qualquer trecho de caes, previsoria ou definitivamente, serão considerados:
Renda bruta, a somma de todas as rendas originarias ou extraordinarias, eventuaes ou complementares;
Renda liquida, os 60% da renda bruta;
Despeza de custeio, os 40% da renda bruta.
As despezas de custeio comprehendem todas despezas necessarias para, os serviços e para a conservação não só do porto e suas dependencias, como das obras da barra, nos termos deste contracto, as geraes o de administração e se da fiscalização a que se refere a clausula XXVII, e tambem a quantia annualmente precisa para a amortização. Serão dellas excluidas as que provierem de accidentes oriundos de defeitos por má execução de obra, as quaes correrão por conta do contractante, não sendo incluídas em nenhuma, das contas de capital ou custeio.
Paragrapho unico. Durante o periodo da construcção, sem trecho algum do caes em exploração, a remuneração do capital empregado nas obras, de accordo com a clausula XXV, será feita nos termos da primeira parte da clausula XXXVI, estando as despezas de fiscalização e administração comprehendidas na verba, a que se refere o § 3º da clausula XXV.
XXXIX
Para determinação da renda, bruta, semestralmente e extraordinariamente, sempre que for necessario e o requisitar a commissão fiscal, serão, a esta ou ao representante do Thesouro Nacional designado pelo Ministro da Fazenda, apresentados pelo contractante os balancetes e mais documentos concernentes á receita e á despeza.
XL
Logo que uma parte de caes estiver prompta com os armazens correspondentes, apparelhos para, carga, e descarga, ligação com a cidade e demais condições para ser utilizada, o contractante poderá, obtida a autorização do Governo, installar nesta parte o serviço do trafego, cobrando as taxas estabelecidas na clausula XXIX.
XLI
Toda a área do caes e armazens e depositos será defendida com uma alta e forte grade de ferro, assentada sobre uma base de alvenaria ou concreto, para garantia de segurança, e guarda das mercadorias.
XLII
Si o Governo permittir livre transito pelo porto para mercadorias destinadas a outros paizes, expedirá para tal fim regulamento especial, mantendo os interesses do fisco, como tambem os do contractante, no que diz respeito ao serviço do carga, descarga, capatazias e armazenagem.
XLIII
Poderá o contractante estabelecer um serviço de reboques cobrando taxas que constarão das tabellas approvadas pelo Governo.
Além das taxas referidas, o contractante terá a faculdade de perceber outra taxas em remuneração dos demais serviços prestados em seus estabelecimentos, taes como: o do carregamento ou descarregamento de vehiculos das linhas ferreas, de emissão de warrants, estadia dos navios aos diques e estaleiros, etc., precedendo sempre approvação do Governo para cobrança das taxas.
XLIV
Será, permittido ao contractante construir pequenos ramaes ferreos ou desvios para ligar as linhas do porto com as das vias ferreas do Rio Grande, mediante accordo a que chegar com as respectivas companhias para trafego mutuo, dependente de approvação do Governo.
Tambem lhe será permittido construir ramaes para facilitar o transporte da pedra e outros materiaes dos respectivos logares de producção, ficando igualmente sujeito a prévia combinação com as companhias para qualquer ligação com as estradas alludidas.
Toda e qualquer iniciativa a esse respeito ficará dependente da approvação do Governo.
XLV
Para todas as operações que, por força do contracto, devam ser feitas em ouro, regulará o cambio de 27 dinheiros por mil réis.
O producto das taxas que são fixadoras em papel deve ser convertido em ouro, pela média do cambio á vista da praça do Rio de Janeiro durante o mez em que tiverem sido cobradas.
O producto das taxas fixadas em ouro, embora pagas em papel, será, computado sempre em ouro.
XLVI
O contractante obriga-se a ter na Republica um representante com plenos e illimitados poderes, para tratar e resolver definitivamente, perante o administrativo ou judiciario brazileiros, quaesquer questões que com elle se suscitem no paiz, podendo o dito representante ser demandado e receber citação inicial e outras em que, por direito, se exija citação pessoal.
XLVII
As questões entre o Governo e o contractante, relativas ao serviço deste, e as que disserem respeito á inteligencia de clausulas deste contracto, serão submettidos pelo chefe da commissão fiscal, no prazo de quinze dias, ao Ministro da Industria, Viação e Obras Publicas, que as resolverá com promptidão.
Si o contractante não se conformar com a resolução deste, seguir-se-ha, em ultima instancia, o arbitramento, escolhendo cada parte um arbitro dentro do prazo de dez dias; não chegando estes a accordo, a questão será resolvida, por um terceiro arbitro escolhido dentro de dez dias, de commum accordo; na falta deste accordo cada uma das partes contractantes, dentro de dez dias, apresentará dous outros arbitros, e dentre os quatro a sorte designará o desempatador, que resolvera a questão no prazo de tres dias.
Fica entendido que as questões previstas ou resolvidas em clausulas deste contracto, como as de multa, rescisão e outras, não são comprehendidas na presente clausula.
XLVIII
Quaesquer outras questões que porventura se possam suscitar na execução deste contracto, quer sejam administrativas, quer judiciaes, serão decididas pelos tribunaes brazileiros, em conformidade com as leis da Republica.
XLIX
Independentemente do deposito a que se refere a clausula XI, o qual serve de garantia especial para o cumprimento da obrigação que o contractante assume em relação ás condições da abertura da barra, fará elle no Thesouro Nacional, antes da assignatura deste contracto, uma caução de 40:000$000 para garantia da fiel execução de todas as obrigações que assume por este contracto.
§ 1º Esta caução será reforçada todos os annos com uma quota igual a 1/4% da renda bruta anual que o contractante depositará no Thesouro Nacional até trinta dias depois da approvação da tomada de contas respectiva, em moeda corrente ou apolices federais, até completar a importancia de 100:000$000.
§ 2º A caução e seus reforços responderão pelas multas, pelo, pagamento das despezas de fiscalização de que trata a clausula XXVII, e quaesquer despezas que o Governo faça por conta do contractante, em virtude deste contracto, deduzindo-se della o valor das multas ou despezas, caso o contractante intimação a pagal-as, não o faça dentro do prazo que lhe tiver sido marcado na mesma intimação.
§ 3º Uma vez desfalcada a caução e seus reforços de qualquer quantia, por efeito da applicação do disposto no paragrapho anterior, é o contractante obrigado a integral-a dentro do prazo de quinze dias da respectiva intimação, ficando sujeito ao disposto no § 1º da clausula XI para a integração alli alludida.
L
Pela inobservância de qualquer das clausulas deste contracto, para que não seja estabelecida penalidade especial, fica o contractante sujeito a multas até o maximo de 5:0000 em ouro e no dobro pelas reincidencias, impostas pelo chefe da commissão fiscal, com recurso para o Ministro da Industria, Viação e Obras Publicas.
Si estas multas não forem pagas pelo contractante dentro do prazo de quinze dias, após decisão do Ministro, no caso de ser usado o recurso acima estabelecido, contados da data da respectiva intimação, será o seu valor descontado de qualquer pagamento que elle tenha a haver do Governo, ou da caução.
LI
Durante o prazo do contracto o contractante gosará da isenção do direitos de importação, de conformidade com as disposições das leis em vigor, para todo o material que for destinado á construcção o conservarão da obras da barra e do porto do Rio Grande.
Paragrapho unico. Fica entendido que, sendo federaes os serviços de que trata este contracto, são elles isentos de impostos estadoaes e municipaes, na, fórma da Constituição.
LII
Em 1 de janeiro de 1974 ou em 1 de janeiro de 1996, segundo as hypotheses da clausula XI, reverterão para o dominio da União, sem indemnização alguma, todas as obras do porto do Rio Grande, executadas em virtude do presente contracto, e serão entregues, tambem sem indemnização alguma, as obras da abertura da barra e dos melhoramentos do Canal do Norte, todas ellas em perfeito estado de conservação.
Essas obras, quer as do porto, quer as da barra e Canal do Norte, comprehendem todos os terrenos cedidos pelo Governo, de marinhas ou os outros, aterrados, e os desapropriados pelo contractante; os immoveis de qualquer natureza e bemfeitorias construidos ou feitos nos mesmos terrenos, installações, machinismos, apparelhos de qualquer natureza e demais material fixo, rodante ou fluctuante.
LIII
O Governo poderá resgatar todas as obras em qualquer tempo, a partir do 1 de janeiro de 1923.
O preço de resgate será fixado de conformidade com o disposto no § 9º do art. 1º da lei n. 1746, de 13 de outubro de 1860, deduzida a amortização feita nos termos do § 4º do art. 1º da mesma lei.
Fica entendida que a presente clausula só é applicavel aos casos ordinarios e que não abriga o direito de desapropriação por utilidade publica em qualquer época, na fórma da lei.
Paragrapho unico. Uma vez resgatadas pelo Governo as obras do porto, cessarão para o contractante as responsabilidades que por este contracto lhe cabem da conservação das mesmas obras e das da barra, sendo-lhe restituidos os saldos existentes das respectivas cauções.
LIV
A rescisão deste contracto poderá ser declarada de pleno direito, por decreto do Governo, sem dependencia de interpellação ou acção judicial, si for excedido qualquer dos prazos marcados nas clausulas V, XVII e XVIII.
LV
Verificada a rescisão do contracto nos termos da clausula antecedente, perderá o contractante, em favor da União, a caução e seus reforços a que se referem as clausulas XI e XLIX.
Quanto ás obras feitas no novo porto do Rio Grande, que ficarão de inteira propriedade da União, o Governo pagará por ellas ao contractante 50% do valor que, para as mesmas, houver sido fixado, nos termos das clausulas XXIV e XXV, deduzida a amortização respectiva.
Este pagamento poderá, ser feito em apolices federaes, ouro, e, além do mesmo, não terá o contractante direito a nenhuma outra indemnização sob qualquer titulo.
LVI
Serão considerados propriedades da União os mineraes, fosseis e quaesquer outros objectos de valor artístico, scientifico ou intrínseco, que forem encontrados nas escavações ou dragagens.
LVII
Todos os prazos estabelecidos neste contracto ficarão interrompidas por qualquer motivo de força maior, no qual se comprehende a greve geral dos operarios.
LVIII
Si os estudos definitivos assim o aconselharem, o contractante, em vez de abrir um novo porto na lagôa da Mangueira, como propoz, poderá substituil-o pelo melhoramento nos mesmos termos, do actual porto do Rio Grade, mantidas, porém, todas as prescripções aqui estipuladas para o porto a estabelecer, do Rio Grande, e as demais obrigações constantes deste contracto.
LIX
O contractante facilitará á Municipalidade do Rio Grande a realização dos melhoramentos urbanos que dependam de aterros e de outros recursos ou auxilios do mesmo genero, que lhe possa prestar sem prejuizo das obras que por este contracta.
LX
Será creada uma caixa especial para o porto do Rio Grande, que ficará a cargo da respectiva commissão fiscal, e por cujo intermedio serão pagas ao contractante, dentro de trinta dias depois de approvada pelo Governo a conta de cada semestre, nos termos das clausulas XXIV e XXV, as sommas a que elle tiver direito de conformidade com a clausula XXXVI.
A essa caixa especial serão recolhidos o producto da taxa até 2 % sobre a importancia que tiver sido fixada pelo Governo e bem assim o de qualquer outra taxa relativa á entrada da barra que lhe competir e que for estabelecida pelo mesmo Governo, ficando, porém, entendido que para a remuneração do capital empregado nas obras até o maximo de 6 % ao anno, de accordo com a clausula XXXVI já acima citada, o contractante só terá direito ao que tiverem produzido em cada anno as fontes de receita da caixa especial, acima mencionada.
LXI
Fica entendido que os direitos e obrigações attribuidos ao contractante neste contracto passarão, sem modificação alguma, para a empreza ou companhia que elle organizar para os fins deste contracto.
Si a companhia for estrangeira, não poderá funccionar nesta Republica sem prévia permissão do Governo e terá aqui representante com plenos e illimitados poderes para tratar e resolver definitivamente perante o administrativo ou o judiciario brazileiros, quaesquer questões que com ella se suscitarem no paiz, podendo o dito representante ser demandado e receber citação inicial e outras, em que por direito se exija citação pessoal, condição a que igualmente ficará sujeito o contractante si executar directamente o contracto.
LXII
O fôro para todas as questões judiciarias entre o Governo e o contractante, seja este autor ou réo, será o federal.
LXIII
O contractante obriga-se a dirigir pessoalmente as obras a que se refere o presente contracto, podento ter substituto acceito pelo Governo.
LXIV
Ao contractante caberá o direito exclusivo da exploração de serviços de portos e a execução de trabalhos e obras a isso destinadas dentro dos limites aqui designados e que são: toda a zona banhada pelo Canal do Norte desde o Baixio da Setia, este inclusive, até a entrada do mesmo Canal no Oceano, comprehendendo todas as suas enseadas e o actual porto da cidade do Rio Grande, bem como vinte kilometros de costa maritima ao sul e ao norte da embocadura do referido canal da Norte.
Paragrapho unico. Durante o mesmo prazo o contractante, igualmente, terá direito de preferencia, em igualdade de condições, para a construcção, uso e goso de obras congeneres em qualquer ponto da bacia hydrographica da Lagôa dos Patos cuja concessão depende do Governo da União.
LXV
O sello proporcional deste contracto deverá ser pago sobre as importancias que forem sendo apuradas e fixadas para a formação do capital de accordo com as regras estabelecidas na clausula XXV.
A falta de regularidade no pagamento desse imposto aos cofres publicos federaes, suspenderá os effeitos do despacho pelo qual tenha sido mandado incluir no capital a importancia das obras executadas e approvadas em cada semestre.
Por assim haverem accordado e ter sido pago pelo contractante, além da caução de quarenta contos (40:000$), a que se refere a clausula, XLIX deste contracto, como já ficou dito na mesma clausula, o sello de um conto duzentos e sessenta e cinco mil réis (1:265$), relativo ao prazo deste contracto, conforme provou com o recibo passado no Thesouro Federal, em 11 de setembro de 1906, passado no verso da respectiva guia, que fica archivada nesta Secretaria de Estado, mandou o Sr. Ministro lavrar o presente contracto, que depois de ler e achar conforme, assigna com o cidadão Candido Gaffrée, procurador e representante do engenheiro Elmer Lawrence Corthell, contractante da execução das obras de melhoramento da barra do Rio Grande do Sul e das do porto da cidade do Rio Grande, com as testemunhas José Carlos de Carvalho e Elpidio Azambuja de Oliva Maya e commigo, Arthur Azevedo, que o escrevi.
Sobre estampilhas no valor total de cento e quarenta mil e seiscentos, estava o seguinte: Rio de Janeiro, 12 de setembro de 1906.
LAURO SEVERIANO MÜLLER.
CANDIDO GAFFRÉE.
JOSÉ CARLOS DE CARVALHO.
ELPIDIO AZAMBUJA DE OLIVA MAYA.
ARTHUR AZEVEDO.
Tabella de preços, em ouro, para as obras do porto do Rio Grande a que se refere o contracto desta data
1. | Pedra partida, junto da obra, 1m3 ....................................................................................... | 4$560 |
2. | Pedra britada para concreto, 1m3 ....................................................................................... | 5$650 |
3. | Areia grossa de agua doce, lavada, 1m3 ............................................................................ | 3$120 |
4. | Cal de pedra, apagada, 1m3 ............................................................................................... | 18$500 |
5. | Cal de marisco, apagada, 1m3 ............................................................................................ | 15$300 |
6. | Cimento (1.420 peso especifico), 1m3 ................................................................................ | 55$000 |
7. | Um milheiro de tijolos de 1ª qualidade, 0,22m x x 0.105m x 0,07m ..................................... | 28$000 |
8. | Um milheiro de telhas nacionaes de 1ª qualidade, 0,54 x 0,24 (romanas) ....................... | 70$000 |
9. | Ferro fundido, em obra assentada no respectivo logar, 1 kg ............................................ | $260 |
10. | Ferro forjado, idem idem idem, 1 kg .................................................................................. | $360 |
11. | Trilhos de aço, idem idem idem, 1.000 kgs ....................................................................... | 58$000 |
12. | Accessorios para trilhos, idem idem idem, 1.000 kgs ........................................................ | 68$000 |
13. | Assentamento de linha ferrea com lastro commum, 1m1 ................................................... | 2$000 |
14. | Calha de cobre n. 16, para esgoto de telhados, 0,20m de bocca, 1m1 ............................... | 3$600 |
15. | Conductor de cobre n. 16, idem idem idem, 0,12m de diametro, 1m1 ................................. | 3$600 |
16. | Alvenaria de pedra secca, inclusive andaime, etc., na obra, 1m3 ...................................... | 12$000 |
17. | Pedra para capeamento, granito, lavrado em tres faces, assentado, 1m3 ......................... | 61$000 |
18. | Excavação em terreno arenoso sem escoramento, 1m3 .................................................... | $500 |
19. | Argamassa de 1 de cimento para 3 de areia, 1m3 .............................................................. | 27$500 |
20. | Argamassa de 1 de cimento para 2 de areia, 1m3 .............................................................. | 33$960 |
21. | Argamassa de 2 de cimento para 3 de areia, 1m3 .............................................................. | 38$510 |
22. | Argamassa de 1 de cal para 3 de areia, 1m3 ...................................................................... | 14$260 |
23. | Argamassa de 1 de cal para 2 de areia, 1m3 ...................................................................... | 16$170 |
24. | Alvenaria de pedra com argamassa de 1 de cimento para 3 de areia, 1m3 ....................... | 20$240 |
25. | Alvenaria de pedra com argamassa de 1 de cimento para 2 de areia, 1m3 ....................... | 21$600 |
26. | Alvenaria de tijolo com argamassa de 1 de cimento para 2 de areia, 1m3 ......................... | 31$700 |
27. | Alvenaria de tijolo com argamassa de 1 de cimento para 3 de areia, 1m3 ......................... | 31$300 |
28. | Concreto (450 kgs.) de argamassa para 0,9m3 de pedra e argamassa do 1:3,1m3 ............ | 30$000 |
29. | Emboço e reboco com argamassa de 1 de cimento para 2 de areia, 0,02m de espessura, 1m2 ................................................................................................................... | 7$500 |
30. | Emboço e reboco com argamassa de 1 de cal para 3 de areia, 0,02 de espessura, 1m2 . | 4$200 |
31. | Rejuntamento com argamassa de 1 de cimento para 2 de areia, 1m2 ............................... | 1$220 |
32. | Pintura a oleo, por metro quadrado e por cada mão ......................................................... | $380 |
33. | Um dormente de madeira de lei posto na linha, 1,7 x 0,2 x 0,12 ...................................... | 2$300 |
34. | Madeira de lei do Rio Grande, em peças grossas, 0,3 x 0,3 até 7,5m – 1m3 ...................... | 31$000 |
35. | Madeira de lei do Rio Grande, em peças finas, serradas, de comprimento até 5,5m – 1m3 | 50$000 |
36. | Pedreiro, por dia ................................................................................................................ | 5$000 |
37. | Servente, por dia ............................................................................................................... | 2$820 |
38. | Trabalhador commum, por dia ........................................................................................... | 2$500 |
39. | Carpinteiro, por dia ............................................................................................................ | 5$000 |
40. | Ajudante do carpinteiro, por dia ......................................................................................... | 3$750 |
41. | Madeira de pinho do Rio Grande, em peças grossas, 0,3 x 0,3 até 7,5m – 1m3 ................ | 27$000 |
42. | Madeira de pinho do Rio Grande, em peças finas até 5,5m de comprimento, 1m3 ............ | 31$000 |
43. | Um metro cubico de aterro com materiaes provenientes da dragagem, medida no perfil da obra prompta ................................................................................................................ | $390 |
44. | Um metro cubico de aterro com materiaes não provenientes da dragagem, medida no perfil da obra prompta ........................................................................................................ | 1$200 |
45. | Um metro cubico de dragagem calculado pelo perfil de serviço prompto ......................... | $520 |
Rio de Janeiro, 18 de abril de 1906.– Lauro Severiano Müller.
Exposição
Senhor Presidente da Republica – Sujeitando á vossa consideração o decreto referente ao importante melhoramento da barra do Rio Grande do Sul e estabelecimento do respectivo porto, tenho a honra do apresentar-vos com a presente exposição os motivos que justificam semelhante acto.
O porto do Rio Grande é o unico que existe no littoral sul do Brazil, situado a quasi meia distancia entre o Cabo de Santa Martha e Montevidéo.
Aberto em uma encosta arenosa de formação alluviana, baixa, sem pontos que possam servir de marcos á navegação, em uma região onde os ventos são variaveis e violentos e frequentes as tempestades, torna-se indispensavel que o accesso e transposição daquella barra sejam francos e seguros, em qualquer occasião e com qualquer tempo.
O Canal do Norte, que serve de escoadouro a quasi toda a bacia hydrographica do extremo sul do Estado do Rio Grande do Sul, tem um regimen e possança bastante poderosos para manter-se com grandes profundidades, offerecendo, na sua parte mais estreita, uma altura de 20m de agua.
Não obstante, devido á constituição da costa, e ás causas que a teem formado e, ainda mais, á circumstancia especialissima de ser aquella uma região sem o regimen regular de marés, em geral com amplitude insignificante, o delta oceanico daquelle poderoso canal avolumou-se e estendeu-se por vasta superficie, variando de situação e de relevo com bastante frequencia, sob a acção energica, dos phenomenos meteorologicos, alli notavelmente violentos e inconstantes.
Resulta de taes circumstancias que a entrada desta barra só é possivel para navios de calado limitado e com a intervenção de um serviço de praticagem continuo, para indicar, a cada momento, a situação do inconstante canal maritimo.
O Estado do Rio Grande do Sul, pela amenidade de seu clima e uberdade de seu solo, está, sem duvida, talhado para auspicioso futuro, desde que a remuneração do trabalho possa offerecer garantias e tornar-se incentivo para maior corrente immigratoria do braço europeu, que alli já tanto contribue para sua prosperidade.
A industria pastoril em nenhuma outra parte encontrará mais adequadas condições de topographia, e hydrographia: a producção dos cereaes e forragens, a cultura da vinha, de fructos e todas as lavouras dos climas temperados alli podem prosperar e só por si representar uma immensa riqueza.
Todo este desenvolvimento, porém, está essencialmente ligado ao problema da barra, onde a natureza collocou um poderoso obice que ao nosso patriotismo compete remover.
Aquella parte do Brazil acha-se quasi sitiada no meio da sua riqueza: pouco vale relativamente produzir além das necessidades do consumo proprio; as difficuldades da exportação e a elevação de fretes dellas consequente, consomem os lucros que deveriam caber ao productor.
Assim, sem dispor de uma franca sahida pelo mar, parte daquelle Estado encontra naturalmente mais facilidades commerciaes com as Republicas visinhas do que com o proprio Brazil e procura supprir-se pelas fronteiras do Uruguay e Republica Argentina, com serio prejuizo para as rendas da União, por ser impraticavel rigorosa, vigilancia que impeça em absoluto o contrabando.
O quadro aqui ligeiramente esboçado é de longa data bem conhecido dos poderes publicos, que directamente, lhe reconheceram o sombrio dolorido por occasião das nossas guerras, que se prolongaram mais do que seria necessario e nos custaram mais pesados sacrificios de sangue e capitaes, pelas duras difficuldades nas nossas relações com o extremo sul.
As exigencias do commercio e da politica nacional de ha muito reclamam providencias sobre o melhoramento da barra daquelle Estado, e já em 1855 encarregava, o Governo ao tenente-coronel Ricardo Jose Gomes Jardim, e, em 1861, aos engenheiros Neate e Gabaglia de procederem aos necessarios estudos para a organização de um projecto.
Mais tarde, em 1875, era igualmente contractado o provecto engenheiro Sir John Hawkshaw para, entre outros, examinar o problema do Rio Grande, estudando tambem a possibilidade do estabelecimento de um porto nas «Torres», então mal lembrado com uma solução substitutiva á do Canal do Norte.
Estas providencias, instigadas pelas difficuldades e exigencias sempre crescentes do commercio, que cada dia se via mais anniquilado pela falta de relações maritimas, não produziram resultados, por falta de confiança em projectos que não se baseavam em estudos methodicos e completos.
Finalmente, em 1881, a situação tornou-se verdadeiramante calamitosa.
A barra se obstruira por fórma tal, que só navios de dous metros de calado, no maximo, poderiam transpol-a e isto mesmo após dias de espera, ancorados ou bordejando fóra da barra, sujeitos aos perigos e contingencias das bruscas variações de tempo e temerosos cataclysmos, de que, como doloroso exemplo foi victima o Rio Apa, que desappareceu por completo com toda a sua tripulação e grande numero de passageiros, depois de ter estado, por longas horas, era frente da barra, sem poder investil-a!
Em principio de 1882 era encarregado o engenheiro norte-americano W. Milnor Roberts de emittir sua valiosa opinião sobre o grande problema; mas, infelizmente, este provecto profissional, que tão grandes serviços prestou ao Brazil, aqui falleceu antes de ter podido examinar pessoalmente as condições da barra.
Neste mesmo anno, sob a premencia da desoladora situação do commercio rio-grandense, que se via então forçado a servir-se, quasi que exclusivamente, do porto do Montevidéo, dando logar ao mais desabrido contrabando, deliberou o Governo commissionar o capitão de mar e guerra Basilio Antonio de Siqueira, Barbedo para tentar abrir aquella barra por meio da dynamite!
Por essa mesma época occuparam-se com a solução do problema diversos profissionaes e, notoriamente, os engenheiros brazileiros Henrique Hargreaves e Alfredo Lisboa, precedidos em 1880 pelo engenheiro francez Carlos Fray, a convite do industrial rio-grandense Joaquim de Carvalho Bastos, que empenhava nesta questão os seus maiores esforços e grande iniciativa.
Todos estes trabalhos, porém, tornaram-se estereis por que lhes faltava a base de estudos methodicos e systematicos, que gerassem confiança no acerto de solução definitiva e de onde se originava o notorio desencontro de opiniões.
Em face do antagonismo dos projectos, até então apresentados, o Senador conselheiro Henrique de Avila, então Ministro da Agricultura, resolveu nomear uma commissão regular para o estudo completo do problema e a organização de um projecto definitivo, confiando a sua direcção, por decreto de 13 de janeiro de 1883, ao notavel engenheiro Honorio Bicalho, naquella época director geral da Secretaria de Obras Publicas daquelle Ministerio, o qual teve a fortuna de se ver cercado de um grupo de esforçados auxiliares, entre os quaes se destacavam os engenheiros Domingos Sergio de Saboia e Silva e Ernesto de Otero.
Foi aquella data que fixou o luminoso marco que tem servido de orientação segura para a resolução do problema.
Já a 15 de outubro do mesmo anno apresentava o chefe da commissão ao Sr. conselheiro Affonso Penna, então Ministro da Agricultura, o relatorio minucioso dos importantissimos trabalhos de estudo a que procedera, acompanhado de um projecto para o melhoramento da barra e respectivo orçamento.
Não obstante a sua reconhecida competencia, não quiz aquelle profissional assumir sosinho a responsabilidade technica pela realização de um emprehendimento de tal magnitude e aconselhou ao Governo que, sobre o seu projecto, fosse ouvido algum engenheiro europeu ou norte-americano, de indiscutivel competencia na especialidade, indicando os nomes do engenheiro Caland, chefe das obras hydraulicas da Hollanda, e o engenheiro capitão Eads, que, com tão proficiente acerto, levara a cabo as obras de melhoramento da barra do Mississipi.
Adoptando este alvitre e a convite do Governo, veio ao Brazil o primeiro indicado, que, depois de ter examinado todos os estudos e elementos systematicamente coordenados e reconhecido as condições da barra por demorada inspecção pessoal, apresentou seu relatorio em 15 de novembro de 1885, declarando que o projecto de H. Bicalho era o unico scientificamente estudado e baseado em principios válidos, propondo, porém, uma modificação no traçado dos molhes, com intuito economico.
Realmente, nos dous annos decorridos, entre a terminação dos estudos e a vista do engenheiro Caland, os bancos haviam soffrido extraordinarios movimentos e deslocações taes, que aconselhavam as modificações indicadas por este notavel profissional, que mantinha, no emtanto, os mesmos principios e modo de construcção das obras indicadas pela commissão brazileira.
Entre os dous projectos não ha divergencia nos principios technicos em que ambos se basearam; apenas os traçados dos molhes em cada um delles estavam mais de accordo com a situação accidental dos bancos, por occasião de estudo de seus autores, sendo certo que, qualquer que seja a feição adoptada, terá provavelmente de soffrer alterações eventuaes, á proporção que o desenvolvimento dos molhes e o seu effeito reconhecido as for aconselhando no decurso da construcção.
Apezar de tão lisonjeiro julgamento, que veio afastar qualquer indecisão sobre a efficacia do projectado melhoramento, dous annos se escoaram sem que fosse resolvida a sua realização, até que, em 1887, o Governo, de accordo com o paragrapho unico do art. 7º da lei n. 3314, de 16 de outubro de 1886, decidiu-se a chamar concurrencia publica para execução do projecto Bicalho-Caland.
Não se tendo apresentado propostas acceitaveis, foi renovada a mencionada autorização no § 2º do art. 7º da lei n. 3349, de 20 de outubro de 1887, e propagada a concurrencia por mais cinco mezes.
Das propostas apresentadas em 1888, a que melhores condições offerecia era a de uma sociedade franceza, embora, em muitos pontos, se afastasse dos termos do edital da concurrencia.
Por essa occasião o engenheiro Lewis Haupt apresentos ao Governo um projecto de sua lavra para o melhoramento da barra, baseando-se, porém, em uma theoria de sua creação, até então ainda não posta em pratica em porto algum.
Em 1889, proclamada a Republica, o Governo Provisorio prestou immediata attenção a este emprehendimento, verdadeiramente nacional por mais de um motivo, e pelo decreto n. 160, de 15 de janeiro de 1890, sendo então Ministro da Industria, o engenheiro Demetrio Ribeiro, foi autorizada a execução das obras de melhoramento daquella barra, pelo projecto estabelecido, e determinada a abertura dos creditos precisos.
A 13 de outubro desse anno, sendo Ministro da Industria o general F. Glycerio, foi celebrado contracto com a sociedade franceza, acima referida, a qual em janeiro de 1891 fazia a inauguração das obras.
Os abalos e commoções sociaes por que passava naquella época a familia brazileira parecem ter intimidado ou actuada de modo ameaçador sobre o espirito da sociedade contractante, de sorte que, em vez de iniciar, de facto, as obras e dar-lhes o necessario andamento, procurou crear difficuldades e delongas, exigindo a principio modificações inadmissiveis no seu contracto e, depois, aproveitando-se deste, para pedir fortes indemnizações, com o pretexto da guerra civil.
Entre aquellas modificações salientava-se a que se referia aos pagamentos que a sociedade pretendia deverem ser em ouro ao cambio do dia.
Submettida a questão a arbitramento, na fórma do contracto, serviram de arbitros os Drs. Annibal Falcão e Ferreira Vianna, funccionando este por parte da sociedade.
Não havendo accordo entre elles, o arbitro desempatador, Dr. Alberto Torres, por um laudo notavel, contrariando a pretenção da contractante, poz termo ás delongas de que ella se utilisava, e não se subordinando a sociedade ás obrigações que assumira, teve o seu contracto rescindido, por acto de 23 de outubro de 1893.
Uma outra questão, por ella levantada no terreno technico, referia-se a modificações no projecto Bicalho-Caland, no intuito de tornar a sua realização mais facil e mais lucrativa para a empreza contractante, augmentando, porém, os onus do Governo.
Para resolver este objecto, o Ministro reuniu em conferencia, no dia 2 de outubro de 1891, os engenheiros E. Sawyer, director technico da sociedade, e o notavel profissional Waldorp, seu engenheiro consultor, e, ouvindo as opiniões por elles verbalmente emittidas, resolveu manter o projecto primitivo, apenas com as alterações propostas pela propria commissão do Governo, no sentido de tornar ambos os molhes rectilineos, com alinhamentos menos divergentes, e, bem assim, restringir os colchões de fachina, a uma só camada, reforçando a estacada de madeira, para permittir que a sua plataforma fosse elevada a 4m,20 acima das aguas baixas.
Finalmente, em 1894, ficou a commissão encarregada de executar administrativamente as obras, de conformidade com as verbas, que fossem annualmente votadas, devendo adeantar sobretudo o revestimento das margens do Canal do Norte, para fixação do seu thalweg, por ser este o accessorio preliminar e indispensavel para a efficacia do projecto e não sobrarem recursos para a realização simultanea de outros trabalhos.
Em 1898 foi começada a construcção do molhe de léste com muito pouco progresso, porquanto as verbas votadas nas leis annuas continuavam a ser insufficientes, mesmo para as installações em mar e terra indispensaveis ao andamento regular.
Até o anno findo, o molhe, que deve ter cêrca de 4.500 metros de extensão total, achava-se apenas com 950 metros construidos.
E' claro qae, com semelhante processo, a conclusão de um melhoramento de tão vital interresse nacional seria protelada por longos annos, e a este mal se viria juntar um consideravel augmento do custo das obras.
Tal é, entretanto, a situação actual de um emprehendimento que energicamente reclama dos poderes publicos providencias promptas e immediatas, as quaes já foram lembradas ao Congresso na Mensagem Presidencial de 1904.
Como um dos beneficos resultados do comparecimento do Brazil no certamen industrial de S. Luiz, um grupo de fortes capitalistas e industriaes da America do Norte, animado pelos esclarecimentos fornecidos pelo Sr. capitão de fragata José Carlos de Carvalho, um dos nossos commissarios naquella exposição, resolveu visitar este paiz e exminar pessoalmente suas condições de riqueza, que, naquella exposição, se desvendaram com verdadeira surpreza para os estrangeiros.
Deste grupo fazia parte o distincto engenheiro Dr. E. L. Corthell, que, como ajudante do capitão Eads, trabalhou no melhoramento da barra do Mississipi, onde conseguiu distinguir-se e grangear grande nomeada, como especialista desse genero de trabalhos, conceito este que mais se firmou com as obras de Tampico, por elle projectadas e levadas a effeito com grande successo.
Esta visita, que se estendeu desde o Pará até ao extremo sul do Brazil, permittiu a esse illustre profissional verificar não só os poderosos elementos de prosperidade e riqueza de que dispõe o Estado do Rio Grande do Sul, como tambem a causa que impede o seu desenvolvimento e progresso industrial.
Assim, depois de ter examinado a barra do Canal do Norte e o valiosissimo repertorio de plantas, observações, dados e mais estudos, methodicamente colligidos e registrados, durante cêrca de 20 annos de trabalho, pela Commissão de Melhoramentos daquella barra, resolveu propôr ao Governo a organização de uma empreza que tomasse a seu cargo:
1º, a abertura, naquella barra, de um canal maritimo com 10m de profundidade nas aguas baixas, e conserval-o nestas condições durante o prazo de 20 annos;
2º, o estabelecimento de um porto aperfeiçoado na cidade do Rio Grande e sua exploração industrial pelo prazo de 70 annos.
Este ultimo objecto será realizado com capitaes americanos em sociedade industrial, que terá como fonte de renda, para remuneração e amortização dos capitaes empregados, os recursos e favores estabelecidos pela legislação em vigor, referente ao serviço de portos.
O primeiro emprehendimento, porém, a abertura da barra do Canal do Norte, terá de ser feito por conta do Governo Mediante um preço em globo previamente determinado e que será pago, segundo exigi e foi acceito parcelladamente, á medida que se for reconhecendo a efficacia das obras de melhoramento o obtidas, no canal maritimo, alturas de agua, crescentes até 10 metros, á proporção que se for desenvolvendo a construcção dos molhes, e como effeito exclusivamente destes.
O projecto, para este fim apresentado pelo Sr. Dr. Corthell, consiste em dous molhes que, partindo do littoral, com alinhamentos convergentes, seguem depois parallelamente até á curva de proximamente nove metros de profundidade, em aguas baixas, na direcção do eixo do Canal do Norte, ao desembocar no Oceano.
A largura entre eixos, na parte de alinhamentos parallelos, é de 850 metros.
O systema de construcção será o commummente empregado em obras desta especie revestindo-se do fundo do mar com colchões de fachina, sobre os quaes será, lançado o empedramento de grandes pedras que constitue o molhe, cujos taludes e cabeços serão protegidos com pesados blocos de concreto, onde forem necessarios.
Faz tambem parte do plano a indispensavel fixação do thalweg do Canal do Norte, por meio do revestimento de suas margens com fachina e bem assim o plantio do «Tamarix» nas dunas do litoral oceanico, para impedir o movimento das areias, sob a acção dos ventos.
Quer para este trabalho, quer para o estabelecimento do porto da cidade do Rio Grande, terão de ser fixados pelo Governo, de accordo com o proponente, os orçamentos das obras e as condições da concessão e contractos, de conformidade com as autorizações legislativas.
Pelo lado technico, não se póde ter qualquer duvida sobre o bom exito do projecto apresentado pelo Sr. Dr. Corthell, para abertura da barra, porquanto é elle apenas uma outra feição do projecto brazileiro, que já mereceu a completa adhesão de profissionaes notaveis e autoridades nesta especie de trabalhos como os engenheiros P. Caland e T. Waldorp.
Ambos estes projectos baseam-se nos mesmos principios scientificos, já sanccionados pela pratica em grande numero de applicações felizes, principalmente na Europa, e nos Estados Unidos da America do Norte.
E' possivel que, fazendo as obras administrativamente, alguma economia se pudesse conseguir na realização desse melhoramento, pelo menos da parte que representa o lucro a que tem, sem duvida, direito a empreza, constructora.
Entretanto, a prudencia e o attento estudo desta questão parecem aconselhar, como mais acertado, um outro alvitre.
De facto, obras desta natureza, estão sujeitas, como é bem sabido, a eventualidades taes que não permittem absoluta confiança em orçamentos, sinão com porcentagem de inacceitavel exaggero.
A acção demolidora do mar, que póde, durante a construcção, arruinar em momentos o trabalho de longos dias, os accidentes de varias especies e as despezas imprevistas, podem attingir valores muito importantes.
Sem duvida, a empreza que se proponha a realizar a obra por meio de uma empreitada em globo, tambem levará, em conta estas circumstancias, mas, admittindo-se, em seus orçamentos, uma porcentagem razoavel para occorrer ás eventualidades ordinarias nos trabalhos deste genero, conseguir-se-ha fixar um maximo para as despezas do Estado, o qual não poderá ser excedido, correndo por conta da mesma empreza as despezas extraordinarias que não tenham podido ser previstas, mas que, no emtanto são sempre possiveis.
Si, conjunctamente com esta medida, se conseguir que essa mesma empreza, assuma inteira responsabilidade pelo bom exito do melhoramento e só tenha direito a pagamentos depois de verificados os effeitos da obra realizada, ficará fixado e desde logo conhecido o encargo real, que tem de ser supportado pelo Governo, e removido o perigo das surprezas de accrescimos, que poderiam, de outro modo, apresentar-se em circumstancias que acarretassem serias difficuldades para serem satisfeitas.
Por outro lado: nas obras hydraulicas desta especie a rapidez da construcção é questão de maior relevancia. A luta que ellas, ainda não consolidadas, teem de travar, desde logo, com o mar, a continuidade e a violencia com que as aguas actuam sobretudo nos cabaços ou extremidades dos molhes que, no periodo da construcção, representam os pontos fracos, causam sempre prejuizos que podem tomar grandes proporções, si o ponto atacado permanecer estacionario algum tempo, exposto á acção destruidora.
E', portanto, indispensavel que taes obras sejam executadas com o maximo impulso e actividade possiveis, daqui decorrendo, parallelamente, a necessidade do promptos e fartos recursos pecuniarios para custeal-as em qualquer momento na proporção necessaria.
O processo até hoje seguido e de que, em outra parte, já foi feito menção, não póde de fórma alguma ser mantido, pois delle resulta um notavel accrescimo de trabalbo perdido, o adiamento por longos annos da conclusão do melhoramento e um augmento inadmissivel para o seu custeio.
Não é com a sujeição das verbas, relativamente pequenas, votadas nas leis annuas, restringindo o andamento das obras e expondo-as a tão poderosas causas de destruição, que se poderá levar a bom termo um emprehendimento de tal magnitude.
Para executal-as por administração seria, pois, preciso que o Governo tratasse de procurar nos mercados estrangeiros os recursos necessarios, por meio de um emprestimo, cujo serviço começaria desde logo a pesar sobre o Thesouro em sua totalidade.
Sem duvida a situação actual do nosso credito não impediria esta operação em condições acceitaveis, mas parece mais acertado não recorrer a semelhante medida desde que um outro alvitre mais conveniente e vantajoso póde ser adoptado.
Com effeito, o accordo a que o Governo chegou com o Sr. Corthell é preferivel não só sob o ponto de vista financeiro como pela confiança que deve merecer, com effeito, a responsabilidade profissional desse notavel engenheiro.
Os pagamentos, que serão feitos parcelladamente no decurso de seis annos, prazo pedido para a construcção das obras, representarão outros tantos emprestimos ao par com tomadores certos sem as eventualidades de lançamentos.
Ao lado desta vantagem, outra de grande valia é que os encargos de taes emprestimos só começarão a pesar sobre o Thesouro na proporção de sua utilização para pagamento de obras sobre cuja efficacia não póde já então haver mais duvida alguma.
Assim ao onus assumido corresponderá, immediatamente um beneficio reproductivo que poderá desde logo fazer folgadamente face aos encargos que acarretou.
O capital necessario para as obras de melhoramento da barra do Rio Grande com 10 metros de profundidade nas aguas baixas é, no maximo, de 28.000:000$, ao cambio de 16 d. por 1$.
Admittindo o juro de 5% e para amortização de 1 1/2 %, o que corresponde a um prazo de cerca de 30 1/2 annos, este emprehendimento custará annualmente ao Governo, em papel, ao dito cambio:
Juros de 5 %.............................................................................................................. | 1.400:000$000 |
Amortização 1 1/2...................................................................................................... | 420:000$000 |
Total................................................................................................... | 1.820:000$000 |
Vejamos de onde podem provir recursos para fazerem face a este encargo.
Desde o tempo do Imperio este problema merecia a attenção dos Poderes Publicos, e, em nossa legislação já, existem disposições que convem reviver, adaptando-as ás condições da actualidade e ao regimen que for julgado melhor para a realização do grande emprehendimento.
Posteriormente por esforços da representação do Estado do Rio Grande o Congresso Nacional na lei da receita de 1899 deu ao Governo a seguinte autorização que ainda está em vigor:
«Cobrar dos navios que se utilizarem dos portos em que forem executadas á custa da União obras tendentes ao melhoramento das respectivas entradas e ancoradouros, a taxa de um a cinco réis por kilogramma de mercadoria que for por elles carregada ou descarregada, segundo o seu valor, destino ou procedencia.
O producto desta taxa, que será tambem proporcionada ás necessidades do serviço, constituirá para cada porto um fundo especial, destinado exclusivamente ao respectivo melhoramento.
Paragrapho unico. Para accelerar a execução das obras referidas, poderá o Governo acceitar donativos ou mesmo auxilios a titulo oneroso offerecidos pelos Estados, municipios, ou associações interessadas no melhoramento, comtanto que os encargos resultantes de taes auxilios não excedam ao producto da taxa indicada.
Por esta disposição ficou o Governo autorizado, não só a cobrar taxas, quer pela importação, quer pela exportação, como tambem a organizar uma tabella para esse imposto, tendo por limite, maximo e minimo, um a cinco réis por kilogramma de mercadoria, e graduado pelo valor da mesma mercadoria, seu destino e procedencia.
Ora, esta graduação já se acha feita e com a importantissima circumstancia de o ter sido, de accordo com o principal interessado, o commercio daquelle Estado.
Com effeito, quando em 1886 a questão deste melhoramento assumiu o caracter de um problema nacional da mais urgente solução, os Poderes Publicos curaram dos meios e recursos para a sua immediata realização.
Por essa occasião, o plano economico e financeiro desse emprehendimento foi estudado e largamente discutido, quer no Parlamento, quer pelo Executivo, consultando os interessados.
O commercio e a imprensa do Rio Grande tomaram parte com grande, interesse no debate, salientando-se a Associação Commercial da cidade do Rio Grande, que, por memorias aos representantes daquella então Provincia, mensagens ao Governo e ao Parlamento, como consta de seu relatorio de 1889, traduziu as aspirações e os desejos daquella fracção da familia brazileira.
São dignos de louvor o zelo, a dedicação e os grandes esforços empregados por aquella distincta associação, que reuniu os precisos dados estatisticos, grande cópia de informações e todos os elementos para o calculo e estabelecimento de taxas que, sem onerar em excesso o commercio, bastassem para o serviço de juros e amortização do capital necessario á realização de um melhoramento de que estava dependendo a vida do commercio, da lavoura e das industrias daquella região.
Foi, de accordo com esse trabalho, que a lei n. 3314, de 16 de outubro de 1886, no art. 7º, paragrapho unico, autorizou a construcção das obras da barra, estabelecendo as taxas para o serviço do capital empregado.
Na redacção final, porém, desta lei, foi commettido um equivoco, de que resultava uma duplicata de taxas.
Por essa razão, no anno seguinte, foi renovada a autorização pelo art. 7º, § 2º, da lei n. 3349, de 20 de outubro de 1887, corrigindo-se aquelle equivoco, devendo essa autorização ser interpretada nos termos seguintes: «Fica o Governo autorizado a contractar com alguma empreza, precedendo concurrencia publica, a construcção das obras de melhoramento da barra do Rio Grande do Sul, de conformidade com os estudos e planos do engenheiro Honorio Bicalho, modificado pelo engenheiro P. Caland.
1º Ao contracto que celebrar o Governo com a empreza que para tal fim se venha a organizar, serão applicadas as disposições do decreto n. 1746, de 13 de outubro de 1869.
2º Para o pagamento dos juros, á razão de 6 % anualmente, e amortização do capital empregado nas referidas obras, fica o Governo autorizado a cobrar as taxas seguintes:
Sobre o movimento commercial com o exterior, directo, em transito ou por cabotagem: em navio de vela 1$680 por tonelada de peso de carga e 1.44 % sobre o valor official das mercadorias; em vapor 2$520 por tonelada de peso de carga e 2,16 % sobre o valor official das mercadorias.
Sobre o movimento commercial inter-provincial: – em navio de vela 1$120 por tonelada de peso de carga, e 0,96 % sobre o valor official das mercadorias; em vapor 1$680 por tonelada de peso de carga e 1,44 % sobre o valor official das mercadorias.
3º Fica o Governo autorizado a cobrar, desde que tenham começo as obras definitivas, uma parte dessas taxas, para attender ao pagamento dos juros do capital que for sendo empregado annualmente na execução das mesmas obras, e as despezas de administração ou de fiscalização, augmentando-se gradativamente a importancia das mesmas taxas até o referido maximo.
4º Logo que seja amortizado o capital empregado, a cobrança, das taxas será reduzida á quantia strictamente necessaria para a conservação das obras.
O Governo poderá estabelecer em favor das emprezas que se organizarem para melhoramento dos portos do Imperio, além das vantagens a que se refere a lei a. 1746, de 13 de outubro de 1869, uma taxa nunca maior de 2 %, em referencia ao valor da importação, e de 1 % do da exportação de cada um dos ditos portos. As taxas destinadas aquelle serviço serão arrecadadas directamente pelo Estado e calculadas de maneira que não excedam o necessario para o juro correspondente ao capital das emprezas, á razão de 6 % ao anno, e para respectiva amortização no maximo prazo de 40 annos. Si o Governo julgar mais conveniente effectuar os referidos melhoramentos por conta do Estado, poderá applicar o producto das mencionadas taxas às obrigações que neste sentido contrahir.»
Vejamos quanto poderá produzir a applicação destas taxas.
O movimento de importação do Estado, calculado pela Repartição de Estatistica Commercial, tomando por base o valor das facturas consulares, foi o seguinte no ultimo triennio:
IMPORTAÇÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PORTOS E PONTOS DO ESTADO | MIL REIS PAPEL | |||||
1902 | 1903 | 1904 | ||||
| 16:623$158 | 15:146$829 | 15:917$539 | |||
Pelotas........................................................................ | 2:335$389 | 3:625$367 | 3:582$194 | |||
Porto Alegre................................................................ | 8:654$423 | 11:424$491 | 12:926$425 | |||
Jaguarão..................................................................... | 238$909 | 551$075 | 12$337 | |||
Uruguayana................................................................ | 1:426$049 | 1:297$817 | 1:838$137 | |||
Itaqui........................................................................... | 21$766 | 53$948 | 90$209 | |||
S. Borja....................................................................... | 26$111 | 45$409 | 64$539 | |||
Diversos...................................................................... | 1:453$263 | 2:520$319 | 1:257$412 | |||
Total................................................ | 30:779$068 | 34:692$255 | 35:688$792 | |||
|
|
|
| |||
Média do cambio de 1902.......................................................................... |
11 55/64 £ = 20$344 | |||||
» » » » 1903 .......................................................................... | 11 61/64 £ = 20$078 | |||||
» » » » 1904........................................................................... | 12 1/8 £ = 19$794 | |||||
Serviço de Estatistica Commercial.– Alvaro de Souza Alves, director interino.
Póde-se, portanto, admittir que o valor total da importação do Estado é, no minimo e para o cambio de 11 63/64, de 33.720:038$000.
Para determinar com exactidão a tonelagem de mercadorias correspondente a este valor e, bem assim, a quantidade transportada por navios a vapor e á vela, faltam-nos os precisos dados de estatistica; podemos, porém, fazer a avaliação por uma estimativa que não ficará, muito longe da realidade.
Pelos mappas da Repartição de Estatistica Commercial se reconhece que, no ultimo triennio, o numero de navios o a respectiva tonelagem de registro, entrados no porto da cidade do Rio Grande, foi o seguinte:
ou em média por anno:
Navegação a vapor................................................................................................................ | 257.815 |
Idem á vela............................................................................................................................. | 25.012 |
Total..................................................................................... | 282.827 |
Além dos navios que vão ao porto da cidade do Rio Grande, directamente ou em transito, ha outros que, sem fazerem esta escala, vão a Porto Alegre e Pelotas com carvão, sal e outras mercadorias.
Não levaremos em conta a tonelagem destes nem o da importação pelas fronteiras.
Igualmente, si por um lado a tonelagem do registro, que é a considerada nos mappas da Estatistica Commercial, é inferior á tonelagem de carga, por outro lado, os navios que atravessam a barra, sobretudo os vapores, não levam a carga completa.
Portanto, suppondo que estas differenças para mais o para menos se equilibram, podemos admittir, sem nos afastarmos demasiado da realidade, que a tonelagem média de registro que acabamos de deduzir representa a tonelagem da importação.
Dos algarismos acima se verifica tambem que a rolação da importação á vela e a vapor é respectivamenta de 9 % e 91 % da importação total.
Com estes elementos, podemos orçar qual seria com o movimento actual da importação do Estado o producto da renda com as taxas determinadas na lei n. 3349, de 20 de outubro de 1887:
Taxas pelo peso:
a vapor – 257.815 X 2$520 ................................................................................................. | 649:693$800 |
á vela – 25.012 X 1$680...................................................................................................... | 42:060$150 |
Taxas ad valorem:
a vapor – 33.720:038 X 91 % X 2,16%................................................................................ | 662.801$054 |
á vela – 33.720:038$ X 9 % X 1,34 % ................................................................................ | 43:701$163 |
Total............................................................................................ | 1.398:216$177 |
Tal seria a renda annual minima a recolher-se pelo serviço da barra: a esta renda directa se terá de apontar um a outra do muito maior importancia como adeante mostraremos.
Antes disto, porém, devemos observar que, para verificar si este emprehendimento vem trazer novos encargos aos cofres publicos, devemos levar em conta não só a renda propria que se terá de arrecadar, como tambem as despezas que o Governo actualmente faz e deixará de fazer depois da realização do melhoramento.
Com effeito, ha muitos annos se dispendem avultadas sommas annualmente com aquella barra.
Deixando de lado as despezas da praticagem, que correm por conta de outro Ministerio e que não poderão ser supprimidas de todo, só pelo Ministerio das Obras Publicas alli se tem gasto no ultimo decennio as sommas seguintes:
Anno de 1895..................................................................................... | 801:200$000 |
» » 1896........................................................................................ | 801:200$000 |
» » 1897........................................................................................ | 1.000:000$000 |
» » 1898........................................................................................ | 562:985$000 |
» » 1899........................................................................................ | 548:725$000 |
» » 1900........................................................................................ | 534:712$000 |
» » 1901........................................................................................ | 787:242$000 |
» » 1902........................................................................................ | 787:342$000 |
» » 1903....................................................................................... | 787:242$000 |
» » 1904....................................................................................... | 500:240$000 |
Somma....................................................................... | 7. 110:788$000 |
Ou média por anno............................................................................................................. | 711:079$000 |
Portanto, para o cotejo dos encargos, teremos: |
|
Renda a recolher................................................................................ | 1.398:216$000 |
Despeza que já se faz........................................................................ | 711:079$000 |
Somma................................................................... | 2.109:295$000 |
que, comparada com a verba de........................................................................................ | 1.820:000$000 |
para o serviço de juros e amortizações do capital empregado nas obras, mostra que estas não acarretavam qualquer augmento de encargos para o Thesouro Federal.
Agora, para mostrar que semelhante emprehendimento de verdadeiro interesse nacional, em vez de trazer novos encargos para o erario, pelo contrario, augmenta as rendas publicas, ao meamo tempo que promove a riqueza e prosperidade daquella região, vamos examinar o que resultou para as Alfandegas de Santos e de Manáos, do aperfeiçoamento dos serviços dos respectivos portos:
Em Santos, antes da inauguração dos novos cáes, a Alfandega arrecadou de direitos de importação:
No anno de 1888....................................................................................................... | 7.387:998$ |
» » 1889........................................................................................................ | 8.656$516$ |
» » 1890........................................................................................................ | 9.371:572$ |
» » 1891........................................................................................................ | 11.755:641$ |
Somma............................................................................................................ | 37.171:727$ |
Arrecadação media................................................................................................... | 9.292:932$ |
Inaugurados os serviços do caes, em 1 de fevereiro de 1892, a Alfandega passou a recolher:
Em 1892..................................................................................................... | 22.079:105$ |
Em 1893..................................................................................................... | 25.152:582$ |
Em 1894..................................................................................................... | 24.298:681$ |
Em 1895..................................................................................................... | 38.995:299$ |
Somma......................................................................................... | 110.525:667$ |
Arrecadação média por anno.................................................................... | 27.628:917$ |
Da mesma fórma em Manáos, antes do serviço do novo caes, a Alfandega recolhia:
Em 1900.................. | 7.543.396$ |
Em 1901.......................................................................................................... | 5.548:710$ |
Em 1902.......................................................................................................... | 6.508:156$ |
Em 1903 até 30 de abril................................................................................ | 2.601:284$ |
Somma...................................................................................... | 22.196:546$ |
Arrecadação média por anno....................................................................... | 6.635:559$ |
Depois de installados, em 1 de maio, os serviços dos cáes, essa arrecadação passou a: | |
em 1903, de 1 de maio a 31 de dezembro.................................................. | 6.368:862$ |
em 1904....................................................................................................... | 10.422:451 |
Somma ................................................................................................ | 16.791:313$ |
Arrecadação média por anno....................................................................... | 10.115:243$ |
Isto é, depois de inaugurados os serviços das emprezas de melhoramentos dos respectivos portos, a Alfandega de Santos passou a arrecadar quasi o triplo do que anteriormente recolhia e a Alfandega de Manáos mais 57 % do que recebia antes do apparelhamento do porto.
Ora, não tendo havido circumstancias especiaes que motivassem semelhantes accrescimos, pois que as tonelagens não manifestaram augmentos correspondentes nos dous periodos, só se póde explicar o phenomeno pela mais rigorosa applicação das tarifas aduaneiras que passou a ser fiscalizada tambem pelas emprezas cujos interesses e rendas estão na dependencia das mesmas tarifas, para alguma das suas taxas.
Este mesmo facto, portanto, dar-se ha tambem para, o porto do Rio Grande, que naturalmente se apparelhará com os aperfeiçoamentos modernos, sendo seus serviços entregues á industria particular, que contribuirá para melhor fiscalização aduaneira.
As rendas dos impostos de importação pelas Alfandegas do Rio Grande e de Porto Alegre, sommadas, teem produzido, no ultimo quatriennio apurado, o seguinte
| Ouro | Papel | |
Anno de 1901................................................................. | 2.094:201$ | 10.515.555$ | |
» » 1902................................................................. | 2,758:058$ | 13.145:186$ | |
» » 1903................................................................. | 2.842:326$ | 14.611:847$ | |
» » 1904................................................................. | 3.139:760$ |
| 16.161:579$ |
Somma................................................................. | 10.834:345$ |
| 54.434:167$ |
Médias.............................................................................. | 2.708:586$ |
| 13.608:542$ |
Admittindo que o accrescimo, devido a melhor applicação das tarifas, não dá o mesmo resultado obtido em Santos, mas sómente o que se conseguiu em Manáos, teremos, sem augmento no volume da importação, um augmento annual para as rendas publicas approximadamente de 1.350:000$ curo, 7.000:000$ papel.
A este importante accrescimo de renda se deve ainda juntar o augmento, tanto ou mais avultado, proveniente do natural desenvolvimento do commercio, da lavoura e da industria, que, sem duvida alguma, se verificará com a abertura e franca navegação daquella barra, por navios de maior calado.
Realizando-se as obras por empreitada e estabelecendo-se no respectivo contracto que os pagamentos só serão feitos gradativamente, a proporção que forem sendo verificadas no Canal Maritimo profundidades crescentes de aguas de seis metros para cima, os encargos para o Governo começarão na mesma occasião em que se tornar possivel um incremento de rendas pelas facilidades crescentes da navegação.
Portanto, mesmo no periodo da construcção não terá o Thesouro de ficar mais sobrecarregado do que o é hoje com aquella barra, porquanto para os juros das primeiras prestações bastará o que o Governo alli emprega annualmente.
Em resumo:
O melhoramento da barra do Rio Grande do Sul não virá trazer para o Thesouro encargos superiores aos que tem actualmente; pelo contrario, ao mesmo tempo que promove a prosperidade e a riqueza do extremo sul do Brazil, fará entrar annualmente para os cofres publicos mais alguns milhares de contos, não só por uma melhor arrecadação do impostos, como, principalmente, por um grande incremento de importação, consequente do desenvolvimento das transacções commerciaes daquelle Estado.
Rio de Janeiro, 18 de abril de 1906.– Lauro Severiano Müller.