DECRETO N. 7.917 – DE 24 DE MARÇO DE 1910
Crêa o Registro e Archivo Geral de Marcas para animaes
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, em execução da lei n. 1.606, de 29 de dezembro de 1906,
decreta:
Art. 1º E creado o Registro e Archivo Geral de Marcas para animaes de raça bovina, cavallar e muar, de accôrdo com o regulamento que com este baixa, assignado pelo Ministro do Estado dos Negocios da Agricultura, Industria e Commercio.
Art. 2º Revogam-se as disposições em contrario.
Rio de Janeiro, 24 de março de 1910, 89º da Independencia e 22º da Republica.
Nilo Peçanha.
Rodolpho Nogueira da Rocha Miranda.
Regulamento a que se refere o decreto n. 7.917, de 24 de março de 1910
Art. 1º E' creado no Ministerio da Agricultura, Industria e Commercio o registro e archivo geral de marcas para os animaes de raça bovina, cavallar e muar, o qual ficará a cargo da 2ª secção da Directoria Geral da Agricultura e Industria Animal.
Art. 2º O registro de que trata o artigo anterior comprehenderá:
a) o numero de ordem das marcas;
b) o numero que representa cada marca;
c) a data do registro da marca;
d) o nome do proprietario da marca, do Estado, do municipio e do districto onde estiver situada a propriedade;
e) O desenho em miniatura de cada marca.
Art. 3º As collectorias federaes terão, com exposição, quadros com desenhos de marcas, de tamanho natural, para serem escolhidos polos interessados.
Art. 4º As requisições de marcas serão feitas ás collectorias, em impressos por ellas fornecidos aos pretendentes e serão remettidas ao ministerio.
Art. 5º Os titulos de propriedade das marcas escolhidas, inclusive os desenhos das mesmas, em tamanho natural, serão expedidos pelo ministro á vista das requisições a que allude o artigo anterior, enviadas pelas collectorias, com a informação de haver pago o pretendente a importancia da propriedade da marca e do registro na collectoria.
Art. 6º O proprietario da marca pagará ao collector pela propriedade da mesma 30$; pelo registro na collectoria, 2$, e 1$ pelo registro que deverá ser feito no archivo geral do ministerio.
Art. 7º O collector, ao entregar o titulo de propriedade, referido no art. 5º, deverá escrever debaixo de cada marca, consignada nos quadros respectivos, existentes nas collectorias, o nome do seu proprietario com a letra bem legivel.
Art. 8º A marca do systema adoptado constitue propriedade de quem a houver adquirido directamente do Governo, ou indirectamente pelos meios legaes de transmissão.
Art. 9º Todo aquelle que adquirir por compra, herança, troca ou doação ou, outro qualquer meio, uma marca do systema adoptado deverá communicar o occorrido á collectoria, no prazo de 90 dias, apresentando o titulo de propriedade da marca e o respectivo documento de acquisição, para que seja feito o competente registro na fórma do art. 5º.
Art. 10. O dono do gado maior, a que se refere o presente registro, póde usar outras marcas ou signaes quando proprietario de uma marca registrada, si assim lhe convier, sendo, porém, a marca, registrada a unica que justifica a propriedade.
Art. 11. Os ferros das marcas não poderão exceder os desenhos em tamanho natural referido no art. 5º.
Art. 12. Aquelle que fabricar marca do systema official sem que lhe seja apresentado o titulo de propriedade incorrerá na multa de 100$ ou na do dobro nas reincidencias.
Art. 13. Será permittida a contra marca:
a) quando o comprador e vendedor forem criadores e vizinhos;
b) quando um rodeio de criação fôr parcellado entre vizinhos e criadores.
Art. 14. A marca só poderá ser feita na perna, no braço, no pescoço ou cabeça do animal do lado esquerdo.
Art. 15. A transmissão de propriedade semovente assignalada com marca registrada de accôrdo com o presente regulamento, far-se-ha por meio de certificados talonarios, de numeração progressiva.
Paragrapho unico. Estes certificados serão feitos em cadernetas de 10 certificados, em cada uma, remettidas ás collectorias que as venderão aos proprietarios de marcas registradas, si as pretenderem, pelo preço de 1$ cada uma.
Art. 16. Os compradores de animaes adquiridos directamente dos criadores poderão apresentar os certificados ás collectorias para que ellas verifiquem si estes e as marcas nelle desenhadas pertencem effectivamente aos vendedores, lançando neste caso seu visto.
Art. 17. Os proprietarios de animaes adquiridos de conformidade com os arts. 15 e 16, quando os transferirem a terceiros, deverão fazer no verso do certificado a respectiva transferencia, podendo o comprador apresentar os certificados á collectoria para que lance nelles regularmente o seu visto.
Paragrapho unico. Quando só venderem parte dos animaes constantes de um certificado, os vendedores passarão um novo certificado ao comprador, no qual mencionarão o numero e a origem do certificado primitivo de que foram retirados os animaes vendidos, devendo a novo ter o visto da autoridade competente, que declarará no mesmo documento ser o numero valido sómente para os animaes restantes.
Art. 18. Para os casos a que se refere o paragrapho unico do art. 17 existirão nas collectorias certificados avulsos que serão vendidos a 200 réis cada um.
Art. 19. Além do registro da marca, as collectorias farão o registro das cadernetas e dos certificados avulsos que forem vendidos com as necessarias annotações.
I. As cadernetas e certificados avulsos serão remettidos para as collectorias em novembro de cada anno, começando a ser usados em janeiro, não sendo validas as cadernetas de um anno para o outro.
II. As cadernetas, completas e em bom estado, poderão durante o mez de janeiro ser trocadas nas collectorias pelas novamente emittidas.
Art. 20. O Ministerio da Agricultura, Industria, e Commercio enviará annualmente ás collectorias cadernetas de movimento geral de marcas, que serão vendidas por 500 réis e que comprehendem o seguinte:
a) o numero de ordem de cada marca;
b) o numero que representa cada uma das marcas registradas;
c) o nome do proprietario de cada marca, Estado, municipio e districto onde está situada a propriedade e data do registro;
d) a descripção dos signaes e regras para a leitura de qualquer marca.
Art. 21. Os criadores que actualmente tiverem marcas e quizerem registral-as requererão ao Ministerio da Agricultura, por intermedio das collectorias, o respectivo registro, dentro de um anno a contar da publicação do presente regulamento, sendo seus requerimentos acompanhados do desenho da marca em tamanho natural.
Paragrapho unico. Findo o prazo fixado no presente artigo só serão acceitas petições para registro de marcas do systema adoptado pelo Governo.
Art. 22. O collector enviará ao ministerio todos os requerimentos, escrevendo no alto de cada um a data de sua entrada na collectoria.
Art. 23. O registro das marcas será feito na ordem da entrada dos requerimentos nas diversas collectorias, e no caso de duas marcas terem a mesma data de entrada, se obedecerá á ordem alphabetica.
Art. 24. Não será registrada a marca:
a) que derive ou della possa derivar-se uma marca registrada não pertencente a um systema adoptado;
b) que se derive ou della possa derivar-se uma marca do systema adoptado;
c) que seja igual a alguma já registrada.
Art. 25. Ao dono de marca não pertencente ao systema adoptado pelo Governo será dado apenas recibo do seu registro, e não titulo de propriedade da marca.
Art. 26. Verificado que uma marca incorre nas disposições do art. 24, ficará nullo o seu registro, sendo o proprietario notificado e reembolsado da despeza que houver feito com o mesmo registro.
Art. 27. Os criadores que não possuirem marca do systema adoptado, mas que tiverem as suas registradas de conformidade com as exigencias do presente regulamento, deverão tambem, nas suas operações, usar dos certificados ruraes talonarios.
Art. 28. O dono ou portador de animal assignalado com a marca registrada que não possuir certificado que prove a propriedade sobre elle, será obrigado a explicar como adquiriu, sempre que o exija a autoridade competente.
Art. 29. O Governo adoptará, mediante concurrencia publica, o systema de marca a fogo que prehencher as seguintes condições:
a) que cada marca represente um numero differente;
b) que as dimensões da marca em tamanho natural sejam taes que cada uma possa ficar comprehendida dentro de um quadro de no centimetros de lado ou de um rectangulo cujo lado maior não exceda a 10 centimetros;
c) que o numero de marcas que se possa compor dentro do systema comprehenda diversas classes de milhões.
d) que as marcas não tenham sido usadas nos paizes limitrophes;
e) que o systema seja classificado em primeiro logar, a juizo de uma commissão composta de tres membros, nomeada pelo Ministro da Agricultura.
Art. 30. O proprietario do systema de marcas que fôr classificado em primeiro logar receberá do Governo o premio de 30:000$000.
Paragrapho unico. O proprietario do systema de marcas que fôr classificado em segundo logar receberá o premio de 15:000$000.
Art. 31. O ministro expedirá as instrucções necessarias á execução do presente regulamento.
Rio de Janeiro, 24 de março de 1910. – Rodolpho Miranda.
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS
Sr. Presidente da Republica – A primeira condição para o desenvolvimento da industria pastoril está na garantia absoluta da propriedade semovente, por meio de uma regulamentação adaptavel ao nosso paiz, de maneira a garantir plenamente o direito della decorrente.
De ha muito os criadores nacionaes vem reclamando do Governo providencias nesse sentido, e, attendendo a tão justo appello, apresso-me em sujeitar a alta consideração de V. Ex. as medidas que me parecem capazes de resolver tão interessante problema de economia rural.
A solução consiste em adoptar-se, para todo o territorio da Republica, um systema unico de marcas a fogo, baseado na numeração, sem duplicidade de marcas iguaes, e no estabelecimento de certificados ruraes talonarios de numeração progressiva.
E' intuitiva a vantagem de ser adoptado um novo systema de marcas, desde que com elle se possa compor milhões de marcas differentes, simples e nitidas, visto que além de ser mais facil aos interessados conhecer um só systema, desapparecerão as marcas arbitrarias e iguaes, producto da phantasia de cada um.
A vantagem de ser o systema baseado na numeração, isto é, cada marca ser representativa de um numero, e não na theoria de combinações de signaes, é que não precisamos, em um dado momento, estar em presença da marca para conhecer a sua figura, pois sabendo-se as regras do systema, que aliás devem ser simples ella será facilmente reproduzida, isto é, desenhada ou composta, o que não succede com as marcas de systemas formados sobre a theoria das combinações.
Este facto tem capital importancia quando pelos annuncios dos jornaes e até pelo telegrapho houver necessidade de se fazer indicação de uma determinada marca bastando neste caso ser declarado o numero que ella representa.
Accresce que quando se trata de archivar e catalogar um numero elevado de marcas e de conhecer o proprietario de uma marca e vice-versa, é mais facil que as marcas representem numeros que figuras arbitrarias.
Os nossos visinhos do Sul na solução desse problema adoptaram como caracter, diversos systemas de marcas. Hoje, porem, procuram unifical-as, á vista dos serios embaraços que tem trazido a multiplicidade de systemas.
No intuito da unificação, teve lugar em 1898, na Republica Argentina, uma concurrencia sobre systemas de marcas a fogo. Escolhido um delles, não puderam, porém, converter em realidade a unificação desejada, devido a existencia legal de diversos systemas em uso. Entretanto, si a existencia legal de diversos systemas na Argentina tem difficultado o estabelecimento de um unico systema, o mesmo não acontece entre nós porque nada existe feito. Devemos, portanto, approveitar a opportunidade e dar ao problema solução definitiva.
Com a adopção de um unico systema de marcas a fogo e com a creação de certificados talonarios de numeração progressiva, necessarios para transferencia da propriedade semovente facilitar-se-ha a estatistica dos animaes, podendo determinar-se o proprietario, o Estado, o municipio e o campo de onde procederam e bem assim saber-se qual o seu primitivo dono.
Além das vantagens acima mencionadas, que me parecem representar valor indiscutivel, accresce que a regularização da marcação dos animaes irá influir poderosamente na valorização dos couros que depende em grande parte, do tamanho da marca e do lugar em que o animal é marcado.
Attendendo á dificuldade immensa de organizar-se um systema da marcas a fogo que satisfaça todas as condições technicas necessarias e o importancia e belleza do problema que se tem em vista resolver, nutre a convicção de que tal systema de marcas só por concurrencia publica poderá ser obtido, dando o Governo ao seu inventor vantagens correspondentes ao beneficio que trouxer ao paiz.
Terminando, Sr. Presidente, tenho a honra de submetter á esclarecida apreciação de V. Ex. o incluso regulamento com os detalhes necessarios que completam a presente exposição.
Rio de Janeiro, 24 de março de 1910. – Rodolpho Miranda.