DECRETO N. 8.598 – DE 8 DE MARÇO DE 1911
Dá regulamento para a venda de mercadorias mediante sorteios (clubs) e respectiva fiscalização
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, usando da attribuição que lhe confere o art. 48, n. 1, da Constituição da Republica, resolve approvar o regulamento, que a este acompanha, para venda de mercadorias mediante sorteios, de que trata o art. 36 da lei n. 2.321, de 30 de dezembro de 1910, e respectiva fiscalização.
Rio de Janeiro, 8 de março de 1911, 90º da Independencia e 23º da Republica.
HERMES R. DA FONSECA.
Francisco Antonio de Salles.
Regulamento para a venda de mercadorias mediante sorteio, a que se refere o decreto n. 8.598, desta data
CAPITULO I
DAS VENDAS POR SORTEIO – SUAS CONDIÇÕES
Art. 1º Constitue jogo prohibido, sujeito ás penas civis e criminaes estatuidas, a loteria ou rifa não autorizada por lei.
Paragrapho unico. Tal se considera, entre outros jogos, a venda de objectos, mercadorias, direitos ou bens de qualquer especie por meio da sorte, qualquer que seja a fórma de sorteio.
Art. 2º A venda de artigos de commercio mediante sorteio, conhecida geralmente pela denominação de club de mercadorias, sómente será permittida na vigencia do prazo das loterias autorizadas a estabelecimentos commerciaes, satisfeitas as exigencias da lei e precedendo autorização, nesta capital e no Estado do Rio de Janeiro, do ministro da Fazenda, e nos demais Estados, dos delegados fiscaes, de cuja decisão denegatoria haverá recurso voluntario para aquelle ministro.
Art. 3º O pedido da autorização será feito em requerimento acompanhado de certidão da Junta Commercial competente, mostrando ser o capital realizado do estabelecimento superior a cincoenta contos de réis, e de documento que prove achar-se o mesmo quite para com a Fazenda Publica – Federal, Estadoal e Municipal.
Art. 4º No requerimento indicar-se-hão a situação e ramo de negocio do estabelecimento, bem como o nome de quem, com residencia effectiva na séde do mesmo estabelecimento, deva assignar por este o termo de deposito adeante exigido, offerecendo-se os planos do club, dos quaes conste sua importancia total.
Art. 5º A autorização constará de uma carta patente, que não será expedida sem que se recolha á repartição fiscal do logar a quota semestral adeantada de um conto de réis, prescripta pelo art. 36 da lei n. 2.321, de 30 de dezembro de 1910, e seja assignado o termo de fiel depositario das quantias que o estabelecimento receber para serem applicadas ao fim determinado nos planos e pactuado pelas partes, com expressa declaração por parte do pretendente de sujeitar-se ás multas e demais disposições do presente regulamento.
Paragrapho unico. Esse termo será assignado perante a Procuradoria Geral da Fazenda Publica, quanto aos clubs organizados no Districto Federal e no Estado do Rio de Janeiro, e nas respectivas Delegacias Fiscaes quanto aos que o foram nos Estados. Quando organizados os clubs no interior dos Estados, o termo poderá ser lavrado e assignado, em documento avulso, perante o fiscal ou funccionario federal designado, que o remetterá, para ser registrado e archivado, á repartição que competir outorgar autorização para funccionar.
Art. 6º Pelas emprezas, companhias, firmas sociaes ou outras pessoas juridicas assignará quem tenha qualidade para represental-as, afim de que responda, individualmente, pelas imposições restrictivas da liberdade, sem prejuizo da responsabilidade patrimonial das representadas.
Art. 7º Os estabelecimentos não farão funccionar clubs antes de concedida a autorização, assignando-lhes fiscal, de accôrdo com os proprietarios e as conveniencias do serviço, os dias do sorteio, que serão annunciados pela imprensa, onde houver.
Art. 8º Realizado o primeiro sorteio de um club, os demais se effectuarão nas épocas prefixadas; qualquer que seja o numero de socios ou prestamistas omissos nos pagamentos.
Art. 9º Os direitos dos prestamistas faltosos em tres prestações successivas poderão ser declarados pelo estabelecimento caducos em seu beneficio.
Art. 10. Os clubs terão sorteios proprios extrahidos com a presença do fiscal ou se servirão dos sorteios das loterias autorizadas; em um ou outro caso o resultado do sorteio será affixado em lista na séde do estabelecimento e publicado pela imprensa, onde houver, com a assignatura do fiscal e do depositario como representante do estabelecimento ou seu proprietario.
Art. 11. E’ vedado, expressamente, converter-se em moeda a mercadoria do club, por parte do estabelecimento que o mantenha, seus socios ou prepostos, pena de cassar-se a autorização e reputar-se a operação loteria ou rifa não autorizada e sujeita ás respectivas comminações.
CAPITULO II
DA ESCRIPTURAÇÃO
Art. 12. Os clubs terão seu livro de inscripção aberto, encerrado e rubricado pelo fiscal ou por quem fôr devidamente designado, em todas as suas folhas, e escripturado na fórma dos livros commerciaes.
Art. 13. Esse livro mencionara:
1º, os planos do club e o estabelecimento a que pertença;
2º, o nome e naturalidade de seus proprietarios e do depositario de que trata este regulamento;
3º, o numero de ordem ou lettra do club e o das inscripções em ordem arithmetica;
4º, o nome, domicilio e profissão do prestamista em seguida ao numero escolhido;
5º, a importancia de cada prestação;
6º, a especificação minuciosa do objecto do club, dando-se o quilate dos metaes e pedras preciosas, a marca da fabrica, sua denominação no commercio, etc.;
7º, o preço por extenso da cousa a vender e o processo, dia, hora e logar do sorteio;
8º, finalmente todas as condições ou vantagens em que as partes convenham.
Art. 14. No livro das inscripções haverá, uma columna em que se averbarão os sorteios amortizados ou satisfeitos pela entrega da mercadoria.
Art. 15. As cautelas ou recibos fornecidos aos prestamistas conterão em substancias as indicações do livro das inscripções.
CAPITULO III
DA FISCALIZAÇÃO
Art. 16. A fiscalização dos clubs será exercida por fiscaes, cujo numero fixará, tendo em vista os clubs existentes, o ministro da Fazenda, que será as nomeações precisas em commissão.
§ 1º Nos Estados haverá um ou mais fiscaes, que exercerão a fiscalização dos clubs nas circumscripções que forem estabelecidas para facilidade desse serviço.
§ 2º Fóra da séde dos fiscaes exercerá as attribuições respectivas, que não devam ser adiadas a bem dos interessados, o funccionario federal que fôr designado pelo ministro da Fazenda.
Art. 17. Os vencimentos dos fiscaes serão marcados ou modificados, para mais ou para menos, pelo ministro da Fazenda, de accôrdo com o serviço e as forças da verba destinada á fiscalização.
Art. 18. Os fiscaes prestarão o compromisso legal antes de entrarem em exercicio de suas funcções e serão demissiveis ad nutum.
Art. 19. Além das attribuições que já ficarão anteriormente estabelecidas, compete ao fiscal:
a) informar sobre a idoneidade dos que requererem autorização para ter clubs de mercadorias;
b) dar guia para o recolhimento de importancias relativas a clubs, annotando-o em livro especial após realizado;
c) registrar no mesmo livro as occurrencias mais importantes que interessarem á fiscalização;
d) fazer apprehensão de cautelas, apparelhos, instrumentos, utensilios, moveis ou decorações de clubs que funccionem em contravenção ás disposições deste regulamento, lavrando ou fazendo lavrar os autos de apprehensão e multa;
e) assistir aos sorteios que não correrem pelas loterias autorizadas;
f) dirigir e regular o processo dos sorteios, tendo sempre em vista a brevidade da operação e a garantia dos interessados;
g) communicar ao ministro da Fazenda ou á Delegacia Fiscal e á autoridade policial, quando destes dependerem as providencias, todas as infracções deste regulamento;
h) suggerir alvitres e solicitar providencias para correctivo de abusos ou a bem da execução da lei;
i) visitar, sempre que fôr preciso, os estabelecimentos sob sua fiscalização, examinando – si possuem o livro prescripto, devidamente escripturado, as cautelas; si cumprem, em summa, as disposições deste regulamento;
j) fiscalizar o pagamento semestral da quota de fiscalização; bem como, no Districto Federal, o pagamento annual do imposto de industrias e profissões, exigindo os respectivos recibos para annotal-os no livro competente.
CAPITULO IV
DAS PENAS
Art. 20. Incorrerão na multa fiscal de 200§ a 500$ os clubs de mercadorias omissos ou demorados em cada publicação que devam fazer, ou que infrinjam alguma disposição legal a que não esteja imposta pena especial, e na multa de 500$ a 2:000$ os que não effectuarem a entrega do objecto do sorteio á vista da respectiva cautela.
Art. 21. Além das multas fiscaes que ficam prescriptas e sem prejuizo das multas e penas criminaes que no caso caibam poderá cassar-se ou negar-se a autorização para funccionamento de clubs de mercadorias.
Art. 22. A autoridade policial compotente, á requisição do fiscal, prestará o auxilio preciso para effectividade das diligencias legaes ordenadas.
Art. 23. Metade das multas, julgadas procedentes e effectivamente arrecadadas, será adjudicada ao fiscal e dividida em partes iguaes entre elle e os denunciantes da infracção, si o existirem.
CAPITULO V
DOS RECURSOS
Art. 24. Das decisões e penas impostas pelo fiscal haverá recurso, nesta Capital e no Estado do Rio de Janeiro – para o ministro da Fazenda, e nos demais Estados – para os delegados fiscaes, de cuja decisão poderá, ainda, recorrer se para o mesmo ministro.
Art. 25. Os recursos serão interposto dentro do prazo de quinze dias depois da effectiva sciencia da decisão proferida ou de sua publicação no jornal que faça as publicações officiaes da Fazenda; serão convenientemente instruidos e informados, tendo effeito suspensivo.
CAPITULO VI
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 26. No que forem applicaveis, vigorarão a respeito de clubs de mercadorias todas as disposições referentes á fiscalização das loterias.
Art. 27. Antes de rehabilitados, os commerciantes fallidos não poderão obter autorização para terem clubs de mercadorias; declarada a fallencia, será immediatamente cassada a autorização.
Art. 28. Fica marcado o prazo de quinze dias nesta Capital para que devidamente se habilitem os commerciaes que tenham clubs de mercadorias estabelecidos, e nos Estados e de trinta dias depois de publicado este regulamento no respectivo jornal official.
Art. 29. Revogam-se as disposições em contrario.
Rio de Janeiro, 8 de março de 1911. – Francisco Antonio de Salles.