DECRETO N. 9.446 – DE 20 DE MARÇO DE 1912
Dispensa, temporariamente, o tempo de embarque para a promoção dos officiaes do Corpo da Armada e classes annexas aos postos immediatamente superiores, até que o Congresso Nacional resolva sobre o assumpto
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil:
Considerando que de ha muito os Poderes Publicos da Nação cogitam da necessidade urgente e inadiavel de rejuvenescer os quadros da Armada, desde a promulgação do decreto n. 108 A, de 30 de dezembro de 1889, instituindo a reforma compulsoria e creando o quadro extraordinario, até a recente lei n. 2.290, de 13 de dezembro de 1910, que facilitou a reforma voluntaria, principalmente aos officiaes de postos superiores;
Considerando que é dever do Poder Executivo, ex-vi do que dispõe o art. 1º do decreto n. 3.169, de 29 de outubro de 1863, preencher as vagas que se derem nos differentes quadros da Armada, logo que dellas tenha conhecimento official, unico meio tambem que se lhe depara para ter completos os referidos quadros, os quaes o legislador não fixa sinão tendo em vista satisfazer imprescindiveis necessidades do serviço naval technico e profissional;
Considerando que o requisito do tempo de embarque, actualmente exigido para a promoção dos officiaes, nas circumstancias especiaes em que se encontra neste momento a Armada Nacional, está a prejudicar tanto aquella providencia considerada urgente e inadiavel, como a embaraçar o Governo no desempenho do seu dever de dar promoção aos officiaes, desde que as vagas occorram, preenchendo devidamente os quadros taes como os fixou o Congresso Nacional;
Considerando que ordinariamente, a falta do alludido requisito não corre por conta dos officiaes, sinão do proprio Governo, que não dispõe dos meios indispensaveis para proporcionar a todos, como aliás lhe cumpre, o ensejo de observar as exigencias legaes para o seu accesso;
Considerando ainda que os Poderes Publicos, em mais de uma circumstancia e com o fim de facilitar o preenchimento e rejuvenescimento dos quadros, teem dispensado o tempo de embarque, assim:
a) a lei n. 2.296, de 18 de junho de 1873, art. 1º, § 3º, e decreto n. 5.464, de 12 de novembro do mesmo anno, art. 4º, paragrapho unico, prescreviam como prazo minimo para o accesso ou serviço a bordo durante tres annos. Este prazo foi reduzido a dois annos, ex-vi, do art. 5º da lei n. 2.941, de 8 de novembro de 1879, e 1 do decreto n. 640 B, de 31 de outubro de 1891;
b) este prazo de dois annos é ainda reduzido á metade em serviço de guerra, quando o tempo é contado pelo dobro, e mesmo a um terço dada a hypothese de actos de bravura reconhecida, como facultam a citada lei n. 2.296, de 1873, art. 7º, e regulamento n. 5.461, art. 15;
c) e por fim, na emergencia do acto de bravura, por força do art. 13 do decreto 1.351, de 7 de fevereiro de 1891, como declarou o accordão do Supremo Tribunal Federal n. 1.430, proferido na acção proposta pelo capitão de corveta Altino Flavio de Miranda Correia, não ha necessidade de estagio para a promoção, a qual póde ser realizada até independente de vaga;
d) em acto de guerra tambem a citada lei n. 2.296, art. 7º, in-fine, e o regulamento n. 5.461, art. 16, permittem dispensar as condições de tempo de embarque quando não existam officiaes habilitados e fôr urgente a necessidade de preencher as vagas nos navios empregados nas operações;
e) mesmo em tempo de paz, ainda o art. 11 do decreto n. 1.351, de 7 de fevereiro de 1891, consente promover aquelles officiaes que contarem ao menos um anno de intersticio, quando os não haja com o intersticio completo;
f) nada obstante o art. 2º do decreto n. 640 B, de 31 de outubro de 1891, haver exigido o prazo de dois annos, sendo um, pelo menos, de embarque, para o capitão de mar e guerra ser promovido a contra-almirante, o accordão do Supremo Tribunal de 3 de dezembro de 1904, estribado no art. 9º do decreto n. 1.351, de 7 de fevereiro de 1891, que dispensou o intersticio de coronel para o generalato, declarou que, por força do art. 85 da Constituição, nenhum requisito se fazia mister para aquella promoção sinão a livre escolha do Governo;
g) os officiaes do quadro extraordinario, creado pelo decreto n. 108 A, de 30 de dezembro de 1889, são promovidos independentemente de vaga e sem tempo de embarque, o qual não podem satisfazer, desde que attinjam ao numero um da escala, e o mesmo acontece no Corpo de Saude da Armada, cujo regulamento dispensa o tempo de embarque de capitão de corveta pharmaceutico para o accesso a capitão de fragata;
h) ainda o decreto n. 6.330, de 17 de janeiro de 1907, expedido depois da audiencia do Supremo Tribunal Militar, declarou comprehendidos na excepção dos arts. 14 e 60 do decreto n. 4.323, de 15 de janeiro de 1902, os cirurgiões que tenham exercido o cargo de director do Hospital de Marinha, e, portanto, dispensados para a promoção a contra-almirante inspector de Saude Naval, da condição de dois annos de embarque;
i) finalmente o mesmo Supremo Tribunal Militar, em consulta de 3 de agosto de 1909, com a qual se conformou o procurador da Republica, foi de parecer que, para completar, como convinha, a organização da arma de engenharia se tornava necessario preencher os quadros do posto de capitão e officiaes subalternos, e não havendo para occupal-os officiaes com o intersticio de dois annos, poderia o Governo nesse caso usar da autorização conferida pelo decreto n. 1.351, de 1891;
Considerando em vista de todos estes precedentes, que, no sentir de todos os Poderes da Nação, o requisito em questão do tempo de embarque se torna dispensavel quando uma circumstancia especial occorre e as necessidades do serviço publico o exijam, facto este que agora, como em nenhuma outra occasião se verifica, podendo levar o Governo assim a preterir direitos incontestaveis sem culpa dos que são victimas dessas preterições;
Considerando, finalmente, em que na hypothese se trata de uma faculdade conferida ao Presidente da Republica pela Constituição, cujo art. 48, n. 5, attribue privativamente ao Poder Executivo o provimento dos cargos civis e militares de natureza federal, sem outras restricções que as expressas na mesma Constituição:
Resolve, no intuito de evitar que as vagas existentes ou que se venham a dar nos corpos da Armada fiquem por preencher pela falta de officiaes com o necessario tempo de embarque e não hajam satisfeito esta exigencia por motivos independente de sua vontade, dispensar, temporariamente, este requisito para a promoção aos postos immediatamente superiores, até que o Congresso Nacional providencie a respeito; revogadas as disposições em contrario.
Rio de Janeiro, 26 de março de 1912, 91º da Independencia e 24º da Republica.
HERMES R. DA FONSECA.
Manoel Ignacio Belfort Vieira.