DECRETO N. 9964 - DE 6 DE JUNHO DE 1888
Concedo a Cicero de Pontes, ao Engenheiro Benjamim Franklin de Albuquerque, Lima e a Francisco Freire de Brito, privilegio por 10 annos, que requereram para o serviço de navegação a vapor dos rios das Velhas e S. Francisco.
A Princeza Imperial Regente, em Nome do Imperador, Attendendo ao que requereram Cicero de Pontes, o Engenheiro Benjamim Franklin de Albuquerque Lima e Francisco Freire de Brito, Ha por bem Conceder-lhes privilegio por 10 annos, na fórma do art. 7º, § 1º, n. 6 da Lei n. 3349 de 20 de Outubro de 1887, para o serviço de navegação a vapor dos rios das Velhas e S. Francisco, observadas as clausulas que com este baixam assignadas pelo Bacharel Rodrigo Augusto da Silva, do Conselho de Sua Magestade o Imperador, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, que assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em 6 de Junho de 1888, 67º da Independencia e do Imperio.
PRINCEZA IMPERIAL REGENTE.
Rodrigo Augusto da Silva.
Clausulas a que se refere o Decreto n. 9964 desta data
I
O Governo Imperial concede a Cicero de Pontes, ao Engenheiro Benjamim Franklin de Albuquerque Lima e a Francisco Freire de Brito privilegio exclusivo por espaço de 10 annos para a navegação a vapor no rio das Velhas a partir da cidade de Sabará até á sua confluencia, e no rio S. Francisco desde o referido ponto de confluencia até ao extremo da parte desobstruida e da que o fôr sendo pelo Estado entre o alto da cachoeira do Sobradinho e Jatobá, ponto terminal da estrada de ferro de Paulo Affonso.
O prazo do privilegio será contado da data em que começar a franca navegação dos rios, em conformidade com a clausula 3ª.
II
Além do privilegio, o Governo Imperial concede aos concessionarios os seguintes favores:
1º Isenção de direitos sobre o material que importarem para o estabelecimento e custeio da navegação até findar o prazo do privilegio;
Esta isenção não se fará effectiva emquanto os concessionarios não apresentarem no Thesouro Nacional a relação dos objectos especificando a respectiva quantidade e qualidade, que aquella Repartição fixará annualmente conforme as instrucções do Ministerio da Fazenda.
Cessará o favor, ficando os concessionarios sujeitos á restituição dos direitos que teriam de pagar e á multa do dobro desses direitos imposta pelo Ministerio dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas ou pelo dos da Fazenda, si provar-se que elles alienaram, por qualquer titulo, objectos importados sem que precedesse licença daquelles Ministerios e pagamento dos respectivos direitos;
2º Cessão gratuita de terrenos devolutos e nacionaes, e bem assim dos comprehendidos nas sesmarias e posses, excepto as indemnizações que forem de direito, para a construcção de estações, armazens e outras dependencias necessarias da navegação;
3º Direito de desapropriação, na fórma do Decreto n. 816 de 10 de Julho de 1855, dos terrenos de dominio particular, predios e bemfeitorias que forem precisos para as obras de que trata o paragrapho precedente, e para todas as que interessarem á franca navegação;
4º A subvenção annual de 90:000$ durante o prazo do privilegio.
III
A concessão da subvenção annual mencionada na clausula precedente só se fará effectiva a contar da data em que, realizados os melhoramentos dependentes dos concessionarios, fôr aberta á franca navegação toda a linha comprehendida entre Sabará e o extremo da parte desobstruida pelo Estado no rio S. Francisco, e será paga no Thesouro Nacional em prestações mensaes depois de vencidas e á vista do attestado do fiscal do Governo, pelo qual os concessionarios provem haver cumprido as obrigações impostas nas presentes clausulas.
IV
Os concessionarios obrigam-se a fazer á sua custa os trabalhos e obras necessarias para melhorar o leito do rio das Velhas, e bem assim o do rio S. Francisco até á cachoeira do Sobradinho, de modo que se prestem em todas as épocas do anno a navegação constante, commoda e segura por vapores de pequeno calado.
Os trabalhos e obras a realizar para este fim serão da natureza dos que estão indicados nos relatorios apresentados pelos Engenheiros Emmanuel Liais, em 1865, W. Milnor Roberts, em 1880, e Benjamim Franklin, em 1882, e tendo-se em vista as seguintes condições da navegação a estabelecer: a profundidade minima na estiagem, a largura minima dos canaes e a velocidade maxima nas cachoeiras serão respectivamente 0m,60, 16m,0 e 13 kilometros, para que possam ser empregados vapores de 0m,40 de calado.
Estes limites serão tambem os da parte do rio S. Francisco comprehendida entre a cachoeira do Sobradinho e Jatobá, cujas obras continuam a cargo do Estado.
V
Effectuado o melhoramento nas condições expostas, os concessionarios apresentarão ao Governo, por intermedio do fiscal, uma planta indicando os trabalhos feitos, afim de poder ser concedida a autorisação necessaria para o estabelecimento definitivo da navegação nas condições e para os effeitos da clausula 3ª.
A planta poderá ser apresentada por secções da linha de navegação á medida que forem sendo melhoradas.
VI
Em dia fixado de cada mez partirá da cidade de Sabará um vapor que fará a viagem redonda entre os extremos da linha de navegação.
Este numero de viagens, bem como o material fluctuante dos concessionarios, poderão ser augmentados proporcionalmente ao desenvolvimento do trafego a juizo do Governo, caso os concessionarios por si proprios não attendam á necessidade de semelhante augmento.
Da decisão do Governo, porém, haverá recurso voluntario para o arbitramento, na fórma da clausula 20ª.
Sem prejuizo das viagens entre os pontos extremos da linha de navegação, os concessionarios poderão estabelecer, de accôrdo com o Governo, viagens regulares entre pontos intermedios.
VII
O numero das escalas dos vapores, o dia e a hora da partida e da chegada dos mesmos, o preço do transporte dos passageiros e das mercadorias, serão determinados em tabellas approvadas pelo Ministerio da Agricultura, as quaes serão revistas pelo menos de tres em tres annos.
O preço da tonelada-kilometro transportada não excederá em caso algum de 40 réis.
As tarifas serão além disso differenciaes.
VIII
Nas estações dos concessionarios o Governo terá o direito de exigir um compartimento com as necessarias accommodações para a agencia do Correio, e poderá nomear o mesmo empregado dos concessionarios para o logar de agente, si assim o reclamar o serviço publico.
IX
Os concessionarios transportarão gratuitamente nos seus vapores:
1º Quaesquer valores remettidos por ordem do Governo;
2º As malas do Correio, as quaes poderão ser acompanhadas de um empregado da respectiva Repartição, com direito a passagem de ré livre de toda a despeza, correndo tambem por conta dos concessionarios o embarque e o desembarque das malas;
3º O fiscal do Governo, com direito a passagem de ré e a comedorias.
O transporte da força publica ou de escoltas conduzindo presos terá o abatimento de 50 % sobre os preços ordinarios, e, em geral, qualquer transporte por conta do Governo Geral ou dos Provinciaes o abatimento de 20 %.
X
As materias inflammaveis e explosivas só poderão ser recebidas e transportadas em botes, lanchas ou em vapores especialmente destinados para este fim.
XI
O Governo Geral ou os Presidentes das Provincias poderão lançar mão dos vapores dos concessionarios para o serviço do Estado, em circumstancias imperiosas e imprevistas, mediante prévio accôrdo sobre o preço, quer do fretamento, quer da compra; tomar-se-ha, porém, para base o seguinte:
O fretamento será regulado pelo maior rendimento, que dentro do anno obtenham os concessionarios em uma das viagens da linha.
A compra o será pelo valor que tiver o navio no ultimo balanço, abatendo-se 10 %.
No caso de compra, os concessionarios serão obrigados a substituir os vapores que cederem ao Estado, por outros nas condições do contracto e dentro do prazo de um anno.
XII
O typo do material fluctuante que houver de ser empregado na navegação será sujeito á approvação do Governo.
Os concessionarios são obrigados a ter em serviço o material necessario para a boa execução do contracto.
O material fluctuante será revistado de seis em seis mezes pelo fiscal do Governo nos portos que elle designar.
XIII
O Governo nomeará um fiscal, ao qual incumbirá velar pelo fiel cumprimento do contracto, percebendo vencimentos pagos pelos contractantes até á importancia de 4:800$ por anno.
Para este fim os concessionarios recolherão ao Thesouro Nacional ou á Collectoria que fôr designada pelo Governo, na primeira quinzena de cada trimestre, a partir do começo das obras, a importancia correspondente no mesmo trimestre.
XIV
Os concessionarios remetterão annualmente á Secretaria de Estado do Ministerio da Agricultura mappas estatisticos dos trabalhos feitos, do trafego effectuado e do estado financeiro da empreza, segundo os modelos adoptados; e prestarão as mais informações que lhes forem exigidas officialmente.
XV
Os concessionarios obrigam-se a apresentar, antes de estabelecida a navegação, uma tabella das distancias a percorrer.
XVI
Os vapores e barcas empregados pelos concessionarios gozarão dos privilegios e isenções dos paquetes, observando-se a respeito da sua tripolação o mesmo que se pratica com os navios de guerra nacionaes; o que, entretanto, não os isentará dos regulamentos policiaes e da Alfandega.
XVII
Durante o tempo do privilegio os concessionarios são obrigados a manter em perfeito estado de conservação não só as obras do melhoramento que executarem para a navegação, como as que houverem sido feitas nos trechos do rio S. Francisco que por ordem do Governo lhes forem entregues entre Sobradinho e Jatobá; podendo o Governo na falta de cumprimento desta clausula mandar fazer por conta dos concessionarios os trabalhos necessarios.
Findo o prazo do privilegio reverterão para o Estado, sem indemnização alguma, as obras que os concessionarios houverem executado no leito dos rios para facilitar a navegação.
Os concessionarios serão preferidos em igualdade de condições, para os favores que o Governo quizer conceder á navegação a vapor dos rios das Velhas e S. Francisco nos trechos ora concedidos.
XVIII
Ficam marcados os seguintes prazos:
1º O de 18 mezes, contados da data do contracto, para o começo das obras do melhoramento dos rios.
2º O de tres annos, contados da mesma data, para a terminação das referidas obras e fornecimento do material necessario para a abertura da linha de navegação.
Caducará o contracto si estes prazos forem excedidos e o Governo não quizer prorogal-os, ou si, depois do estabelecida a navegação, fôr interrompido o serviço por mais de seis mezes consecutivos.
Em qualquer destes casos nenhuma reclamação poderão os concessionarios fazer relativamente ás obras que houverem realizado no leito dos rios em beneficio da navegabilidade.
XIX
Os concessionarios ficam sujeitos ás seguintes multas, salvo caso de força maior:
1ª Da quantia equivalente á subvenção respectiva, si não effectuarem algumas das viagens estipuladas;
2ª De 200$ a 500$, além da perda da respectiva subvenção na parte correspondente aos kilometros não navegados, si a viagem começada fôr interrompida;
3ª De 50$ a 200$ pela demora na entrega ou recebimento das malas do Correio, pelo extravio ou máo acondicionamento destas;
4ª De 50$ a 200$ por carta ou objecto postal que transportarem sem estar devidamente franqueado e inutilisados os sellos;
5ª De 100$ a 300$ pela inobservancia de alguma das presentes clausulas, para a qual não haja pena especial;
6ª Da metade da subvenção annual si fôr interrompido o serviço por mais de tres mezes.
XX
As questões que se suscitarem entre o Governo e os concessionarios sobre a interpretação das presentes clausulas serão decididas por arbitros.
Cada uma das partes contractantes designará o seu arbitro.
Si estes não concordarem será designado um 3º arbitro, que proferirá decisão definitiva.
Si não houver accôrdo quanto ao 3º arbitro, decidirá a questão a Secção dos Negocios do Imperio do Conselho de Estado.
XXI
Para cumprimento do contracto os concessionarios poderão organizar companhia na fórma das leis e regulamentos em vigor, a qual ficará subrogada em todos os direitos e obrigações resultantes do mesmo contracto.
XXII
Ficará sem effeito a concessão de que trata o presente Decreto, si no prazo de 30 dias, a contar da data em que fôr publicado no Diario Official, os concessionarios não depositarem no Thesouro Nacional a caução na importancia de 10:000$ em dinheiro, que não vencerá juro, ou em titulos da divida publica nacional; ou si não assignarem o respectivo contracto no mesmo prazo.
A caução tem por fim garantir a execução das clausulas estipuladas; reverterá para o Estado no caso de caducidade da concessão, e será completada sempre que por qualquer motivo, tal como deducção de multa imposta, se achar reduzida.
Palacio do Rio de Janeiro em 6 de Junho de 1888. - Rodrigo Augusto da Silva.