DECRETO N. 12.599 – DE 11 DE AGOSTO DE 1917
Concede, á Central and South America Telegraph Company, por si ou por empreza que organizar, a lançar, aterrar, na costa do Brasil, manter e trafegar um cabo telegraphico submarino, ligando qualquer ponto do territorio da Republica Argentina com a cidade do Rio de Janeiro, bem como um cabo telegraphico submarino, ligando qualquer ponto do territorio daquella Republica com a cidade de Santos, sem privilegio ou monopólio de especie alguma, nem subvenção do Governo
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil, attendendo ao que requereu a Central and South American Telegraph Company, e
Considerando que, pelo contracto de 30 de junho de 1893, approvado por additivo na lei do orçamento para o anno de 1894, o Governo se obrigou para com a Western and Brasilian Telegraph Company Limited, a não conceder, no prazo de 20 annos, a contar da data da assignatura do accôrdo, autorização a companhia, empreza ou particular algum para o lançamento de cabo ou cabos, de linha ou linhas telegraphicas entre qualquer ponto do territorio dos Estados Unidos do Brasil e qualquer ponto do territorio das Republicas do Uruguay e Argentina;
Considerando que, em 30 de junho de 1913, terminou o monopolio assim concedido á Western and Brasilian Telegraph Company Limited e por esta transferido á The Western Telegraph Company Limited pelo decreto n. 3.307, de 6 de junho de 1899;
Considerando que, de conformidade com o estipulado na clausula II do referido contracto, terminado o prazo de 20 annos, continuariam a ser observadas suas clausulas, até que fosse o mesmo renovado, ou até que o Governo contractasse o estabelecimento de outro cabo, em cujo caso teria a The Western Telegraph Company Limited a preferencia em igualdade de condições;
Considerando que, antes de terminar o prazo do monopolio a Central and South American Telegraph Company requereu o lançamento e goso de um ou mais cabos do telegrapho submarino ligando a Republica Argentina com as cidades do Rio de Janeiro e Santos, mas pedindo essa concessão no regimen da inteira liberdade de concurrencia, isto é, sem monopolio, nem subvenção do Governo;
Considerando que, terminado o privilegio e submettido o projecto das clausulas do contracto proposto pela Central and South American Telegraph Company ao conhecimento da The Western Telegraph Company Limited, para o effeito de seu direito de preferencia constante da clausula II do seu contracto, declarou esta que não acceitava as clausulas I, VI e XXIII, repellindo assim as clausulas principaes do contracto projectado, isto é, a que excluia o monopolio, a que procurava garantir os interesses do Thesouro Nacional e assegurava a arrecadação dos impostos de importação;
Considerando que, cessando o seu contracto, não podia o Governo continuar a respeitar o privilegio, uma vez que tinha a faculdade de fazer novo contracto, com plena liberdade de instituir o regimen da livre concurrencia;
Considerando que, sendo attendivel a proposta da Central and South American Telegraph Company, este facto motivou uma acção de manutenção de posse promovida pela The Western Telegraph Company, Limited contra a União para impedir que se contractasse o lançamento dos cabos submarinos nos termos propostos;
Considerando que essa acção foi julgada procedente em primeira instancia, mas o Supremo Tribunal Federal, por accórdão que passou em julgado, reformou a sentença de primeira instancia para julgar improcedente a acção, declarando evidentemente extincto o prazo do contracto de 30 de junho de 1893 e reconhecendo a inteira liberdade por parte do Governo de levar a effeito o projectado contracto com a Central and South American Telegraph Company;
Considerando que é incontestavel a vantagem que resultará da ligação entre os Estados Unidos da America do Norte e o Brasil, de uma nova via de communicação telegraphica, permittindo a franca troca de correspondencia entre os dous paizes sem a interferencia das actuaes linhas pertencentes a companhias de outras nacionalidades,
decreta:
Artigo unico. Fica a Central and South American TeIegraph Company, por si ou por empreza que organizar, autorizada a lançar, aterrar na costa do Brasil, manter e trafegar um cabo telegraphico submarino, ligando qualquer ponto do territorio da Republica Argentina com a cidade do Rio de Janeiro, bem como um cabo telegraphico submarino, ligando qualquer ponto do territorio daquella Republica com a cidade de Santos, sem privilegio ou monopolio de especie alguma, nem subvenção do Governo, de conformidade com as clausulas que com este baixam assignadas pelo ministro de Estado dos Negocios da Viação e Obras Publicas.
Rio de Janeiro, 11 de agosto de 1917, 96º da Independencia e 29º da Republica.
Wenceslau Braz P. Gomes.
Augusto Tavares de Lyra.
Clausulas a que se refere o decreto n. 12.599, desta data
I
Fica concedida á Central and South American Telegraph Company, para si ou para empreza que organizar, permissão para lançar, aterrar na costa do Brasil, manter e trafegar um cabo telegraphico submarino, ligando qualquer ponto do territorio da Republica Argentina com a cidade do Rio de Janeiro, bem como um cabo telegraphico submarino, ligando qualquer ponto do territorio da Republica Argentina com a cidade de Santos, sem que essa permissão constitua privilegio ou monopolio de especie alguma em favor da companhia contractante, ficando o Governo dos Estados Unidos do Brasil com inteira liberdade de acção para, a seu juizo, conceder permissão semelhante ou identica a qualquer empreza que porventura venha solicital-a.
II
A companhia contractante poderá ligar á sua rêde geral, fóra do paiz, ambos os cabos de que trata a clausula I.
III
O aterramento do cabo no Rio de Janeiro se effectuará fóra da barra, e o cabo de Santos em logar apropriado e conveniente, de modo a não prejudicar o serviço do porto.
Paragrapho unico. Os pontos de aterramento, determinados e escolhidos de accôrdo com o Governo, serão ligados ás estações da companhia por meio de cabos lançados dentro da bahia, mediante permissão das autoridades competentes, ou por meio de conductores subterraneos, podendo a companhia, quando julgar conveniente ou necessario, adoptar os dous systemas.
IV
O lançamento e aterramento dos cabos ligando as cidades do Rio de Janeiro e de Santos com a Republica Argentina se effectuará dentro de dous annos a contar da assignatura do contracto, salvo caso de força maior, devidamente justificado, sendo as plantas dos pontos de aterramento e dos traçados das linhas de ligação entre esses pontos e as estações da companhia no Rio de Janeiro e em Santos submettidas á approvação do Governo 60 dias, pelo menos, antes do lançamento dessas linhas de ligação.
Paragrapho unico. O prazo estipulado nesta clausula poderá ser prorogado uma ou mais vezes, a juizo do Governo.
V
Quando nos edificios do Telegrapho Nacional nas cidades do Rio de Janeiro e de Santos houver commodos sufficientes, poderá a companhia nelles installar as suas estações, contribuindo com o aluguel que for convencionado, ou a companhia poderá installar as suas estações em edificios particulares, proprios ou não, sendo essas estações, em qualquer hypothese, ligadas ás estações do Governo por meio de canalização pneumatica (ou de outro systema mais aperfeiçoado) para a permuta mais rapida possivel da correspondencia.
VI
A respeito do trafego telegraphico, observar-se-ha o seguinte:
a) a concessionaria poderá receber e taxar os telegrammas locaes que lhe forem apresentados para ser expedidos e bem assim entregar a domicilio os telegrammas locaes recebidos emquanto serviços congeneres das demais companhias funccionando no paiz não passarem a ser feitos exclusivamente pelo Telegrapho Nacional;
b) serão, porém, permutados por intermedio das estações da Repartição dos Telegraphos do Rio de Janeiro e de Santos todos os telegrammas dirigidos a outras estações da rêde telegraphica da União, salvo a prescripção de outra via.
VII
A companhia é obrigada a estabelecer trafego mutuo com as linhas do Governo relativo ao serviço recebido das e dirigido ás estações da União, salvo serviço relativo ás cidades do Rio de Janeiro e de Santos, respeitada sempre a indicação da via pelo expedidor.
§ 1º As taxas a serem estabelecidas no contracto de trafego mutuo entre o Governo e a companhia serão iguaes ás existentes em contractos em vigor com as companhias congeneres actualmente funccionando no Rio de Janeiro e em Santos.
§ 2º Em caso de interrupção das vias terrestres «Jaguarão» e «Uruguayana» para as Republicas do Prata, constituirão os cabos da companhia «via por emprestimo», nas condições estabelecidas na clausula VIII.
VIII
Em caso de interrupção das linhas brasileiras, argentinas e uruguayas, será o serviço internacional destinado ás Republicas da Argentina, Uruguay, Paraguay, Bolivia e Chile, procedente da «zona norte» do Brasil (a começar pelas estações situadas no Estado do Espirito Santo) e bem assim o serviço internacional, com igual destino, procedente da «zona sul» (inclusive as estações do Estado do Rio de Janeiro, Minas Geraes, Goyaz e Matto Grosso), excepto o das estações das cidades do Rio de Janeiro e de Santos, encaminhado pelos cabos da companhia por emprestimo de via, sendo a quota brasileira que cabe pelo percurso nas linhas terrestres prorateada em partes iguaes entre o Governo e a companhia.
Paragrapho unico. Pelos telegrammas encaminhados por emprestimo de via não será devida a contribuição de que trata a clausula XI.
IX
A companhia obriga-se a conservar os seus cabos em condições de bem servir ao trafego, cumprindo-lhe communicar ao Governo, dentro de 48 horas, qualquer occurrencia que cause ou possa vir a causar interrupção de serviço.
X
A tarifa será organizada pela companhia e submettida a approvação do Governo, não podendo as taxas, que serão cobradas em papel-moeda, exceder as das companhias congeneres que actualmente funccionam no paiz.
Paragrapho unico. As taxas approvadas, quando forem reduzidas, não poderão ser novamente elevadas sem autorização do Governo.
XI
A companhia obriga-se a pagar ao Governo a contribuição de dez centesimos de franco por palavra dos telegrammas internacionaes que transitarem nos cabos de que trata a clausula I.
Paragrapho unico. Esta contribuição será reduzida a cinco centesimos de franco por palavra tratando-se de telegrammas do serviço do Governo brasileiro, telegrammas de imprensa e preteridos.
XII
As taxas terminaes e de transito a debitar á companhia pelo serviço internacional em trafego mutuo serão as em vigor no trafego mutuo com as demais companhias de cabos que funccionam no paiz.
XIII
A companhia não poderá fazer fusão, ajuste ou convenio com qualquer outra empreza congenere que funccione no Brasil sem prévio consentimento do Governo.
Paragrapho unico. Os telegrammas que, em virtude de indicação de via, tiverem de ser permutados com outras companhias funccionando no paiz serão baldeados pelas estações da Repartição Geral dos Telegraphos do Rio de Janeiro e Santos, por intermedio das quaes será feito o respectivo ajuste de contas, relativo a este serviço, pagando-lhe a concessionaria, nesse caso, um franco por telegramma, a titulo de indemnização de despeza de expediente.
XIV
O ajuste de contas com a Repartição Geral dos Telegraphos será feito trimestralmente, sendo o debito resultante liquidado dentro do trimestre seguinte ao qual se refere o ajuste.
XV
A companhia fica obrigada a adherir á Convenção Telegraphica de S. Petersburgo, de accôrdo com o regulamento internacional, expedido de conformidade com a mesma, sendo-lhe assegurados os beneficios decorrentes da referida convenção.
XVI
O Governo dará em aforamento á companhia os terrenos de marinha disponiveis que nos pontos do littoral forem necessarios para a amarração dos cabos telegraphicos, podendo a companhia desapropriar, na fórma da lei, os terrenos, madeiras e mais materiaes pertencentes a particulares que forem indispensaveis para o estabelecimento dos conductores subterraneos destinados a ligar os pontos de aterramento ás estações da companhia.
XVII
O Governo fiscalizará, como entender conveniente, todo o serviço da companhia no Brasil.
XVIII
Os telegrammas do Governo do Brasil serão transmittidos de preferencia e gosarão de uma reducção de 50 % sobre as taxas proprias da companhia.
XIX
Serão transmittidos gratuitamente:
1º, os telegrammas (não excedentes, cada um, de vinte palavras) expedidos pelo Governo do Brasil ou por seus agentes da America do Sul e do Norte communicando o apparecimento de alguma epidemia no paiz de onde forem expedidos, ou nos paizes visinhos, ou factos de notoria calamidade publica;
2º, dous telegrammas por dia (um em cada sentido) entre o Observatorio do Rio de Janeiro e um observatorio na America do Norte, pagando o Governo, pela taxa de telegrammas officiaes, as palavras que excederem de vinte em cada teIegramma.
XX
Para as despezas de fiscalização, contribuirá a companhia com a importancia de doze contos de réis (12:000$000), em papel-moeda, annuaes, pagaveis por semestre adeantado, que será recolhida ao Thesouro Nacional.
XXI
A companhia obriga-se a manter no Rio de Janeiro um representante com plenos poderes para tratar e resolver definitivamente todas as questões que, no paiz, se suscitarem com ella e com seu pessoal, podendo esse representante receber citação inicial e todas as outras para as quaes por direito se exigem poderes especiaes.
XXII
Pela suspensão do serviço nos casos previstos no art. 8º da Convenção Telegraphica de S. Petersburgo, nenhuma indemnização será paga á companhia, seja qual for a sua duração.
XXIII
A companhia gosará os favores concedidos a companhias e emprezas congeneres que funccionam no paiz, inclusive os favores que dizem a respeito ao material a importar para a installação do seu serviço e quanto aos navios de cabos que gosarão os privilegios de navios nacionaes.
Installadas, porém, as suas estações, ficará a companhia sujeita ao pagamento dos direitos aduaneiros sobre o material que importar para conservação e exploração do serviço a seu cargo.
XXIV
Pela inobservancia de qualquer das presentes clausulas, poderá o Governo impôr á companhia multas na importancia de duzentos mil réis a dous contos de réis (papel-moeda) e o dobro em caso de reincidencia. A importancia de qualquer multa imposta pelo Governo será recolhida ao Thesouro Nacional dentro de trinta dias da data da imposição, publicada no «Diario Official».
XXV
As leis do Brasil serão as unicas applicaveis para a decisão de qualquer questão relativa ao presente contracto, si a mesma não for resolvida por arbitramento.
Paragrapho unico. Para o arbitramento nomeará cada uma das partes um arbitro, e, não chegando estes a um accôrdo, designará a sorte o desempatador, dentro de dous nomes apresentados, cada um por uma das partes. Da decisão do desempatador não haverá appellação.
XXVI
Para garantir a execução do estabelecido na clausula IV, depositará a companhia no Thesouro Nacional, antes da assignatura do respectivo contracto, a importancia de 40:000$000 (quarenta contos de réis) em papel-moeda, sem direito a juros, ou em titulos da divida publica federal.
Paragrapho unico. Dessa importancia de quarenta contos de réis será restituida á companhia a metade seis mezes depois da inauguração definitiva do trafego na linha Rio de Janeiro-Argentina, e a outra metade seis mezes depois da inauguração definitiva do trafego da linha Santos-Argentina. Si o prazo estipulado na clausula IV for excedido e não for prorogado pelo Governo, o deposito de quarenta contos de réis reverterá em favor do Governo, sendo vinte contos de réis pela linha do Rio de Janeiro e vinte contos de réis pela linha de Santos.
XXVII
A permissão de que trata a clausula I poderá ser declarada nulla independente de acção ou interpellação judicial e sem que a companhia tenha direito a indemnização alguma:
1º, si, terminado o prazo fixado na clausula IV, os cabos que a companhia se obriga a lançar não tiverem começado a funccionar regularmente, salvo caso de força maior, a juizo do Governo;
2º, si a communicação telegraphica pelos cabos de que trata a clausula I for interrompida por mais de seis mezes consecutivos, salvo caso de força maior, a juizo do Governo;
3º, si a companhia executar qualquer accôrdo ou convenio com empreza ou companhia congenere que funccione no Brasil, sem prévia autorização do Governo;
4º, si a companhia deixar de recolher ao Thesouro Nacional, em tempo opportuno, as quotas devidas pela fiscalização, de accôrdo com a clausula XX.
XXVIII
A permissão de que trata a clausula I ficará sem effeito si a companhia recusar a assignar o respectivo contracto, dentro de trinta dias, a contar da publicação do decreto approvando as presentes clausulas.
Rio de Janeiro, 11 de agosto de 1917. – Augusto Tavares de Lyra.