DECRETO N. 12.981 – DE 24 DE ABRIL DE 1918
Autoriza o ministro da Agricultura, lndustria e Commercio a, ajustar com o engenheiro Trajano Saboia Viriato de Medeiros a installação de diversas usinas de beneficiamento de algodão e seus sub-productos, sua prensagem, etc., nos Estados de Pernambuco, Parahyba, Rio Grande do Norte e Ceará.
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil, considerando que a cultura do algodoeiro, embora antiga no Brasil e com as maiores facilidades para desenvolver-se, pois, o algodão encontra, em vastas regiões da Republica, o seu habitat por excellencia, permanece estacionaria, quando, no Egypto e na America do Norte, constitue uma das mais abundantes fontes de riqueza particular e publica, o que é incontestavelmente devido ao amparo que lhe teem dispensado os governos daquelles paizes;
Considerando que os Estados Unidos constituem, presentemente, o maior centro productor de algodão, sendo o valor dessa producção, no Texas, superior, em moeda brasileira, ao da nossa exportação de productos agricolas, inclusive o café, ao passo que os Estados do nordeste, com população equivalente ao do Texas, offerecem á cultura do algodoeiro uma área mais vasta do que a cultivada naquelle Estado da grande Republica, donde se conclue que o desenvolvimento da nossa producção, corrigidos os defeitos da cultura actual pela escolha de melhores qualidades e conveniente beneficiamento da fibra, poderá duplicar o valor de nossa exportação agricola;
Considerando que, em vista do valor intrinseco do algodão e do seu consumo, sempre crescente, em todas as praças do mundo, augmentada a nossa producção, não lhe faltarão mercados, quando as fabricas nacionaes, em numero superior a duzentas, com o capital de 260.900:000$, empregam 60.000 toneladas de fibra indigena ou sejam tres quartos da safra média annual do paiz, e o consumo de sua manufactura é susceptivel de maior desenvolvimento, porque a importação de tecidos dessa especie, apezar da excellencia e belleza dos nacionaes, ainda é avultada, tendo em 1913 attingido a 12.710.760 kilogrammas, no valor de 58.715:320$000;
Considerando que a Conferencia Algodoeira, ultimamente realizada nesta Capital, entre as providencias lembradas ao Governo, para incrementar a cultura e o commercio do algodão, salientou a necessidade de estações experimentaes, usinas de beneficiemento e prenagem nos Estados productores, indicando como causas do atraso da nossa producção a rotina dos lavradores, a falta de selecção de sementes e methodos reacionaes de culturas, além da ausencia completa de beneficiamento e preparo do producto, ainda realizado em machinismo atrasados e improprios;
Considerando que, entre as providencias indicadas pela commissão nomeada para dar combate á lagarta rosea, que tão avutados prejuizos tem occasionado á lavoura algodoeira nos Estados do norte, figura, como essencial, o estabelecimento de estações experimentaes, em cada em dos Estados productores, competindo-lhes, além da cultura e selecção do aldodoeiro, a distribuição de sementes seleccionadas, o que, difficultando a disseminação da praga, concorrerá para o melhoramento das culturas, evitando-se, assim, o plantio com sementes misturadas e sem exame, adquiridas nas bolandeiras ou vapores em que, actualmente, se realiza o descaroçamento;
Considerando que a cultura do algodoeiro, pelos seus sub-productos, todos commercialmente valiosos, alimenta varias industrias, della dependentes, como a fabricação de oleo, e que já accusam, em alguns Estados, desenvolvimento que deve ser animado, porque esse producto, convenientemente purificado, é hoje, em varios paizes, maximé na America do Norte, legitimo succedaneo do oleo de oliveira, sob o nome de oleo doce, oleo para salada, oleo de mesa, e, generalizada no Brasil essa applicação, ter-se-ha poupado á economia nacional somma superior a 5.000:000$, que é, em média, o valor que representa a, nossa importação de oleo de oliveira ou azeite doce;
Considerando que o estabelecimento de estações experimeritaes nos Estados algodoeiros, visando a escolha das melhores variedades e a instrucção dos lavradores, quanto a plantio e defesa das culturas, bem como a montagem de usinas para beneficiamento, prensagem do algodão e emprego industrial de seus sub-productos, foram medidas igualmente indicadas pelo Comité de Producção, entre os alyitres que suggeriu ao Governo da Republica no sentido de incrementar a riqueza agricola do paiz;
Considerando, finalmente, que os favores concedidos peIo presente decreto ao engenheiro Trajano Saboia Viriato de Medeiros, industrial e agricultor, no Estado de Pernambuco, não importam em negação de vantagens identicas a quem, em igualdade de condições e com a idoneidade reconhecida no concessionario, as solicitar ao Governo Federal, para montagem de usinas do beneficiamento, prensagem do algodão e emprego industrial dos seus sub-productos, com a obrigação de crear e manter estações experimentaes correspondentes, em qualquer ponto do paiz em que a cultura do algodoeiro apresentar possibilidades economicas;
E usando da faculdade que lhe confere o art. 1º, n. I, lettra a do decreto n. 3.316 de 16 de agosto de 1917 e o artigo 97 § 18 da lei n. 3.454 de 6 de janeiro de 1918;
decreta:
Art. 1º Fica o ministro da Agricultura, Industria e Commercio autorizado a ajustar com o engenheiro Trajano Saboia Viriato de Medeiros, industrial residente no Rio de janeiro e agricultor no Estado da Pernambuco, por si ou empreza que organizar, a installação de diversas usinas do prensagem e beneficiamento de algodão e seus sub-productos, nos Estados de Pernambuco, Parahyba, Rio Grande do Norte e Ceará, de accôrdo com as seguintes clausulas e condições:
1ª, o concessionario obriga-se a installar nos Estados do nordeste do Brasil, as seguintes usinas de beneficiamento e prensagem de algodão: tres no Estado de Pernambuco, sendo duas no interior do Estado, ao lado das suas estradas de ferro de penetração na zona algodoeira – Linha do Limoeiro e Central de Pernambuco – e uma no Recife, na convergencia das mesmas linhas ferreas, destinada especiaImente ao fabrico e refino do oleo das sementes; duas no Estado da Parahyba, ao longo da estrada de penetração de Campina Grande a Patos e Souza, ou outro ponto de maior producção; duas no Estado do Rio Grande do Norte respectivamente nas bacias dos rios Piranhas e Mossoró; e duas no Estado do Ceará, ao lado das estradas de ferro de Sobral e Baturité;
2ª, cada uma das oito usinas do interior terá a capacidade minima para beneficiar mensalmente 180 toneIadas do algodão em caroço ou proximamente 60 toneladas mensaes de algodão descaroçado, limpo, prensado e enfardado e 120 toneladas de sementes de algodão, que serão convertidas em oleo e os residuos aproveitados em farello. O concessionario terá a faculdade de augmentar, a todo o tempo, a capacidade, dessas usinas e addicionar-lhes as dependencias necessarias ao refino do oleo e fabrico de sabão, segundo as condições locaes. A Usina Central do Recife será destinada ao fabrico do oleo das sementes desaproveitadas no interior e ao refino do oleo fabricado nas usinas do concessionario, cujos productos convirjam no Recife e bem assim ao preparo de sabão com os residuos do refino dos oleos;
3ª, independentemente do descaroçamento feito usinas do interior, o concessionario deverá, estabelecer nellas ou em pontos de grande exportação, o serviço de limpeza e prensagem de algodão, de modo que esse producto possa ser exportado, nas estradas do ferro o linhas de navegação, devidamente classificado e prensado. Quanto ao oleo bruto que não possa ser refinado na Usina do Recife, o concessionario terá a facilidade de preparal-o nas usinas do interior para servir como lubrificante, como illuminante ou para alimentação;
4ª, na Usina, Central de Recife, o concessionario terá faculdade de montar tambem a fabricação de oleo de mamona, amendoim, côco (da Bahia) ou outras nozes eleaginosas, e de fazer o respectivo refino e o aproveitamento completo dos sub-productos;
5ª as usinas terão dependencias para accommodar a materia prima e os productos manufacturados, bem como o material para embalagem e preparo de latas. Disporão igualmente de machinismos para expurgo das sementes pelo ar quente, com capacidade dupla ou tripla da necessaria aos servirços da propria usina, de modo a servir tambem aos particulares;
6ª, para cada uma das usinas installadas no interior o concessionario obriga-se a crear e manter uma estação experimental, destinada a promover o ensino agricola na zona e a produzir sementes de algodão seleccionadas e immunizadas para supprimento aos lavradores. Essas estações terão uma área minima de 500 hectares de boas terras, dos quaes 100 serão cultivados com algodão das variedades mais apropriadas ás regiões respectivas e os restantes reservados outras culturas e pastagens;
7ª, as estações experimentaes serão franqueadas á visita dos lavradores, que ahi poderão receber a instrucção necessaria ao manejo dos apparelhos agrarios e processos culturaes aperfeiçoados. Ser-lhes-ha tambem facultado o estudo dos meios para combater as diversas pragas que infestam os algodoeiros e outras plantações. Toda a instrucção que for ministrada nessas estações experimentaes será gratuita; o concessionario terá, entretanto, o direito de vender aos lavradores artigos de consumo, taes como adubos o desinfectantes, instrumentos agricolas, apparelhos de tratamento das sementes e em geral os materiaes e animaes que importar para melhoramento da lavoura e a producção das estações;
8ª, as estações experimentaes serão providas das machinas agricolas necessarias ao cultivo das terras, na proporção da área de cultura, e dos apparelhos para o beneficiamento dos cereaes e forragens, comprehendida a sua fenação e ensillagem. Sempre que for possivel far-se-ha irrigação total ou parcial das culturas;
9ª as astações experimentaes poderão ser montadas ao lado das usinas de beneficiamento de algodão ou separadamente, conforme melhor convier ao seu estabelecimento. Nellas serão construidas as dependencias da administração, estabulo, selleiro, sillo, deposito de machinas e ferramentas, e em geral tudo que interessar ao bom funccionamento das mesmas estações. Independente dos serviços da séde da estação o concessionario poderá construir, si lhe convier, casas para, colonos e estabelecer sitios de cultura com contracto de parceria;
10, a despeza proveniente dos direitos de importação (inclusive de expediente) das machinas e apparelhos necessarios á installação e montagem das diversas usinas o estações experimenaes, correrá por conta do Ministerio da Agricultura, Industria e Commercio;
11, para importação de drogas ou productos e apparelhos chimicos necessarios aos serviços das mesmas usinas e estações experimentaes, vasilhame e materiaes de embalagem, bem como ferro, aço ou folha de Flandres, para o fabrico de vasilhame e latas, poderá o Governo conceder ao concessionario os mesmos favores de que gosam os lavradores e engenhos centraes de assucar, nas condições estabelecidas pela Consolidação das leis das Alfandegas;
12, o ajuste para a installação das usinas ficará sem effeito em relação a cada um dos Estados, si o concessionario, dentro de um anno, não obtiver dos respectivos governos a reducção do imposto de exportação de que trata o art. 97 § XVIII do art. 97 da lei n. 3.454 de 6 de janeiro de 1918;
13, o Governo auxiliará o concessionario na installação das usinas e estações experimentaes com o emprestimo de setenta e cinco por cento (75 %) do valor de cada uma deIlas a juizo do ministro da Agricultura, Industria e Commercio, tendo como garantia a reponsabilidade pessoal do concessioanrio e a hypotheca das usinas e estações;
14, o maximo do capital a emprestar, é fixado em 400 contos de réis para a Usina Central de Recife, em 250 contos para cada uma das fabricas do interior dos Estados e em 50 contos do réis para cada uma das estações experimentaes;
15, os emprestimos serão feitos ao juro de 6 % ao anno, em moeda corrente e o concessionario fará a remissão delles em 10 annos a contar da inauguração dos trabalhos de cada usina ou estação experimental. Os juros e amortizações serão pagos semestralmente em 31 de julho e dezembro de cada anno, divididos estes pagamentos em 20 prestações iguaes.
O concessionario terá a faculdade de apressar o resgate total do emprestimo pagando quaesquer quantias por antecipação;
16, para facilitar a prompta importação do machinismo das usinas e acquisição de propriedades para installação das estações experimentaes o emprestimo será feito em duas prestações, sendo a primeira quando se acharem todos os machinismos no paiz e iniciada a respectiva montagem e a outra quando estiver funccionando regularmente cada usina;
17, realizada a primeira prestação, si o concessionario não fizer funccionar a usina correspondente dentro do prazo de seis mezes, ficará sujeito á multa mensal de um conto de réis e, findo o prazo de mais seis mezes, reverterá para o Governo a mesma usina, com todos os seus bens e direitos; independentemente de qualquer procedimento judicial e sem indemnização alguma, ficando responsavel o concessionario pela differença que houver.
18. O concessionario obriga-se a iniciar a installação das usinas de cada um dos Estados no prazo maximo de dezoito mezes, sob pena de ficar sem effeito o contracto na parte referente aos mesmos;
19, o concessionario obriga-se a completar a installação das usinas ou estações, quanto aos serviços ou machinismos que forem reputados insufficientes e a mantel-as funccionando sempre em perfeitas condições.
Art. 2º Ficam revogadas as disposições em contrario.
Rio de Janeiro, 24 de abril de 1918, 97º da Independencia e 30º da Republica.
WENCESLAU BRAZ P. GOMES
J. G. Pereira Lima.